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O ensino das ciências musicais e a retórica: discurso musical no período barroco

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Academic year: 2020

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Instituto de Educação

julho de 2016

O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica:

Discurso Musical no Período Barroco

Paulo Jor

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e tórica: Discur so Musical no P eríodo Barroco UMinho|20 16

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Paulo Jorge Miranda Araújo

julho de 2016

O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica:

Discurso Musical no Período Barroco

Trabalho realizado sob a orientação da

Professora Doutora Elisa Maria Maia Silva Lessa

Relatório de Estágio

Mestrado em Ensino de Música

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Nome: Paulo Jorge Miranda Araújo

Endereço eletrónico: pjmirandaa@gmail.com Número de Cartão de Cidadão: 10858009

Titulo do Relatório: O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período

Barroco.

Orientadora: Professora Doutora Elisa Maria Maia Silva Lessa Designação do Mestrado: Mestrado em Ensino de Música Ano de Conclusão: 2016

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTE TRABALHO APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERSSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE.

Universidade do Minho ___ / ___________ / 2016

________________________________________ (Paulo Jorge Miranda Araújo)

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AGRADECIMENTOS

Um agradecimento especial à Professora Doutora Elisa Lessa, minha orientadora e supervisora de estágio, pela orientação, apoio, otimismo e incentivo não só na elaboração deste trabalho como também no meu crescimento pessoal e profissional.

Agradeço ao Conservatório de Música do Porto, cujos órgãos de gestão e administração permitiram a concretização do meu estágio profissional em Música, ao qual se refere o presente Relatório.

Aos professores cooperantes Sônia Marques e Nuno Rocha, pelo seu apoio e aconselhamento da prática letiva.

Aos alunos das turmas com as quais trabalhei do Conservatório de Música do Porto, no ano letivo 2015-2016, pela colaboração e empenho demonstrados ao longo de todo o projeto.

Aos meus colegas de estudo, David Rodrigues e Leandro Monteiro, pelos momentos partilhados e pelo incentivo constante ao longo destes dois últimos anos.

À Carina, em especial, pela paciência, carinho, incentivo, compreensão, apoio constantes, sempre com um otimismo contagiante, nos momentos mais decisivos deste trabalho.

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RESUMO

O estudo intitulado “O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical

no Período Barroco”, é uma abordagem à temática da retórica musical no ensino das

Ciências Musicais. Este projeto foi implementado no Conservatório de Música do Porto, no âmbito do mestrado em Ensino de Música na Universidade do Minho. O trabalho detém-se nas seguintes questões de investigação:1) o que é a retórica musical, 2) como abordar com os alunos a problemática da retórica musical barroca, e 3) qual o contributo da temática em estudo para a formação dos alunos. A metodologia utilizada nesta investigação é de natureza qualitativa e os participantes foram os alunos de quatro turmas das disciplinas de Iniciação Musical IV, Formação Musical (6º Ano/ 2º Grau e 9º Ano/ 5º Grau) e História da Cultura e das Artes (11º Ano) do Conservatório de Música do Porto. Em síntese, o estudo visa a compreensão a aplicação na didática das Ciências Musicais das estruturas de discurso retórico nas obras do período musical do barroco, tendo em conta que a retórica musical é uma temática pouco conhecida/ trabalhada pelos alunos; que a retórica musical é um tema que se cruza com diversas disciplinas existentes no currículo nomeadamente Filosofia e Português; que os alunos se interessam pela temática, conseguindo estabelecer relações com as disciplinas supramencionadas e ainda pelo facto do material de apoio pedagógico de suporte ser quase inexistente. O presente trabalho é uma contribuição a uma possível abordagem ao universo da comunicação e organização do pensamento musical.

Palavras-chave: Retórica Musical, Período Barroco, Didática das Ciências Musicais.

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ABSTRACT

The study entitled “The Education of Musicology and the Rhetoric: Musical

Discourse in the Baroque Period”, is an approach to the subject of musical rhetoric in

the teaching of Musicology. This project was implemented at the Oporto Music Conservatory, within the framework of a Master's degree in Music Education at the University of Minho. The study gives close attention to the following research questions: 1) what is music rhetoric, 2) how to deal with the issue of Baroque musical rhetoric with students, and 3) what is the contribution of the subject matter at hand to the training of students. The methodology used in this research is qualitative and participants were students from four different classes studying Music Initiation IV, Music Training (grade 6 / level 2 and grade 9 / level 5) and History of Culture and Arts (Grade 11) at the Oporto Music Conservatory. In short, the study aims to understand and apply the structures in rhetoric discourse in the didactics of Musicology in the works of the baroque period, taking into account that musical rhetoric is a subject that is often unknown / worked on by students; understand that the musical rhetoric is a theme that overlaps with several existing subjects in the curriculum including Philosophy and Portuguese; get students interested in the subject, establishing relationships with the above mentioned subjects taking into consideration that pedagogical support material is almost non-existent. This study is a contribution to a possible approach to the world of communication and organization of musical thought.

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ÍNDICE

ÍNDICE DE FIGURAS ... x

INTRODUÇÃO ... 11

I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA ... 13

1.1 A Retórica – Breves Apontamentos ... 13

1.2 A Teoria dos Afetos ... 18

1.3 Música e Retórica ... 24

1.3.1 As sete artes liberais: Trivium e Quadrivium ... 24

1.3.2 Musica Poetica – Tratados ... 25

1.3.3 Retórica Musical ... 27

1.4 Retórica – Análise do Discurso Musical ... 30

II – INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA ... 39

2.1 Contexto geral de intervenção ... 39

2.1.1 História e caracterização do Conservatório de Música do Porto ... 39

2.1.2 Caracterização das turmas alvo de intervenção ... 41

2.2 Observação de aulas ... 43

2.2.1 Formação Musical ... 46

2.2.2 História da Cultura e das Artes ... 46

2.3 Plano Geral de intervenção ... 47

2.3.1 Transdisciplinaridade no Ensino das Ciências Musicais... 47

2.3.2 Formação Musical ... 49

2.3.3 História da Cultura e das Artes ... 55

2.3.4 Projeto Artístico “O Bandolim na Era Barroca” ... 65

III – RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS ... 69

3.1 Formação Musical ... 69

3.2 História da Cultura e das Artes ... 71

IV – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ... 77 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 81 Anexo 1 ... 87 Anexo 2 ... 89 Anexo 3 ... 91 Anexo 4 ... 95

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1- As Sete Artes Liberais ... 25

Figura 2 - Para uma Análise Retórica ... 32

Figura 3 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589)) ... 33

Figura 4 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin ... 33

Figura 5 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ... 33

Figura 6 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) c. ... 34

Figura 7- Excerto de Largo do Concerto nº5, BWV 1056, de Johann Sebastian Bach .. 34

Figura 8 - Excerto Responsório nº2 do Ofício dos Defuntos (1816) de José Maurício Nunes Garcia. ... 35

Figura 9 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ... 35

Figura 10 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ... 36

Figura 11 - Excerto do Behold a virgin shall conceive & O thou that tellest good tidings to Zion do Messias de Haendel ... 36

Figura 12 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin .... 36

Figura 13 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin .... 37

Figura 14 - Figura 12 - Excerto do Vinea Fact Est, das Matinas e Vésperas de Sábado Santo, de Manoel Dias de Oliveira ... 37

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INTRODUÇÃO

The union of music with rhetorical principles is one of the most distinctive characteristics of Baroque musical rationalism and gave shape to the progressive elements in the music theory and aesthetics of the period (Buelow, s.d.).

O interesse por este tema foi-nos despertado desde a nossa formação de base, na Unidade Curricular de História da Música e Análise Musical do período Barroco. Uma das características deste período é a Teoria dos Afetos, que embora merecesse um destaque na UC não nos satisfez e sentimos necessidade de o aprofundar.

O tema surgiu ainda durante as primeiras observações de aulas, em que nos apercebemos que a incidência desta temática nos conteúdos da Disciplina de História da Cultura e das Artes era demasiado reduzida. As razões do pouco tempo despendido devem-se sobretudo ao demasiado volume de conteúdos a serem lecionados, incluindo apenas uma breve abordagem à Teoria dos Afetos. Para que a abordagem desta temática possa ampliada e compreender de uma forma mais assertiva o pensamento musical e as obras do período Barroco, e conhecer a respetiva Retórica Musical.

Tendo em conta que a Retórica Musical está umbilicalmente ligada à Filosofia na Grécia Antiga, nos temas abordados no programa do 11º Ano de Filosofia Argumentação

e retórica, Argumentação e Filosofia como também através do Racionalismo de René

Descartes abordado no conteúdo Estatuto do conhecimento científico (Barros, Henriques, & Vicente, 2001), e contém um forte paralelismo com a Disciplina de Português do 10º/ 11º Ano no módulo Do Renascimento ao Pré-Romantismo, especificamente na elaboração retórica literária dos Sermões do Padre António Vieira (Campos, Grosso, Loureiro, Pascoal, & Seixas, 2002), torna-se imperativo relacioná-la com estas disciplinas aproveitando e direcionando o conhecimento prévio dos alunos deste tema através da sua génese literária/ filosófica como também na sua contemporaneidade.

Com esta investigação pretendemos responder a questões como: O que é a retórica musical, como trabalhar com os alunos a problemática da retórica barroca, qual o contributo da temática em estudo para a formação cultural e profissional dos alunos. Para concretização dessas respostas teremos que esclarecer a relação da Retórica Musical com os temas desenvolvidos na disciplina de Filosofia da Grécia Antiga e do racionalismo do

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século XVII, compreender a forma das obras musicais à luz de uma análise retórica e compará-la com a estrutura retórica de um sermão do Padre António Vieira.

O trabalho de investigação que apresentamos, O Ensino das Ciências Musicais e

a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco está organizado em quatro capítulos.

No primeiro capítulo abordamos de forma sintética uma revisão da literatura sobre Retórica desde a antiguidade clássica até à Idade Média, a Teoria dos Afetos, um enquadramento da disciplina da Retórica no curriculum académico medievalista até se tornar em Musica Poetica e a sua sistematização enquanto corpus para a composição musical e, por último, ferramentas para uma realização de análise musical numa perspetiva retórica.

O segundo capítulo, intitulado Intervenção Pedagógica, incide na contextualização do local de intervenção (Conservatório de Música do Porto), a caracterização das turmas alvo do projeto, a Intervenção Pedagógica ocorrida nas mesmas como também a exposição e implantação do projeto artístico “O Bandolim na Era Barroca”.

No terceiro capítulo, Recolha e Análise dos Dados, analisamos e interpretamos os resultados obtidos, de acordo com as questões formuladas.

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I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

1.1 A Retórica – Breves Apontamentos

O Grande Dicionário da Língua Portuguesa indica que:

Retórica (è), s.f. (do lat. Rhetorica ). A arte de bem falar. || A arte que expõe as regras para bem dizer ou falar eloquentemente; conjunto dessas regras; a arte do orador. ||A aula em que se ensina essa arte. || Tratado ou livro que contém as regras da oratória. || Expansão eloquente; exibição de meios oratórios. || Tudo aquilo de que nos servimos no discurso para produzir bom efeito no público, para persuadir os ouvintes. || Afectação da eloquência; discurso empolado e pomposo. || Discurso pobre de ideias, embora possa ser brilhante na forma. […] Fazer retórica, falar ou escrever com estilo empolado e em grande opulência de forma […] Figuras de retórica, artificio de linguagem que modifica a expressão do pensamento, para a tornar mais viva, mais enérgica ou mais compreensível (Machado, 1981, p. 338).

Segundo Reboul “[A] retórica é anterior à sua história, e mesmo a qualquer história, pois é inconcebível que os homens não tenham utilizado a linguagem para persuadir” (Reboul, 2004, p. 1). O que está determinado é a invenção da técnica retórica. Esta técnica retórica (doravante chamaremos sempre retórica), originou-se em Siracusa, na ilha da Sicília por volta do ano de 465 a.C.. Esta origem foi devida a uma guerra civil em que os cidadãos viram retiradas as suas terras pelos tiranos Gélon e Hiéron. Após a guerra civil, os verdadeiros donos das terras as reclamaram e entraram num processo judicial. Para oferecer meios de persuasão aos litigantes, Córax e o seu discípulo Tísias publicaram uma “coletânea de preceitos práticos que continha exemplos para usos de pessoas que recorressem à justiça” (Reboul, 2004, p. 2). Dá-se também a Córax a primeira definição da retórica, «a arte da persuasão». De estreitas ligações com Sicília, a Magna Grécia adotou rapidamente a arte retórica. Para isso contribui em grande parte Górgias, discípulo de Empédocles como também o foi Córax que, partindo da ilha siciliana para Atenas no ano de 427 a.C., deslumbrou os cidadãos de Atenas com a sua prosa. A sua prosa aproximava-se da poesia devido aos recursos estilísticos utilizados como (…) “assonâncias, rimas, paronomásias, ritmo da frase […] perífrases, metáforas, antíteses” (…) (Reboul, 2004, p. 4). Atenas, em meados do século V a.C. e em plena instituição da

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democracia, necessitava de cidadãos hábeis na arte de bem falar e persuadir para fazer valer o seu ponto de vista na vida pública.

É neste contexto que surgem os sofistas, que mediante uma remuneração, ensinavam aos jovens cidadãos a técnica do discurso através da análise de poesia, definição de partes do discurso e estudo de estilos de debate. Para isso, elaboraram (…) uma espécie de modelo acrónico, ou melhor, uma certa conjunção de concepções epistemológicas e éticas” (…) (Barilli, 1979, p. 13), fazendo os primeiros (…) “esboços de gramática, bem como a disposição do discurso e um ideal de prosa ornada e erudita” (…) (Reboul, 2004, p. 9). Os fundamentos da retórica sofística baseavam-se na forma e não no conteúdo, onde o discurso não apresentava uma realidade objetiva, valendo-se da sua forma/ técnica para persuadir e ganhar o auditório como o apresenta Górgias no seu diálogo com Sócrates:

Quanto mais se soubesse tudo, Sócrates, a retórica, por assim dizer, abrange o conjunto das artes, que ela mantém sob sua autoridade. Vou apresentar-te uma prova eloquente disso mesmo. Por várias vezes fui com meu irmão ou com outros médicos à casa de doentes que se recusavam a ingerir remédios ou a deixar-se amputar ou cauterizar; e, não conseguindo o médico persuadi-lo, eu o fazia com a ajuda exclusivamente da arte da retórica. Digo mais: se na cidade que quiseres, um médico e um orador se apresentarem a uma assembleia do povo ou a qualquer outra reunião para argumentar sobre qual dos dois deverá ser escolhido como médico, não contaria o médico com nenhuma probabilidade para ser eleito, vindo a sê-lo, se assim o desejasse, o que soubesse falar bem. E se a competição se desse com representantes de qualquer outra profissão, conseguiria fazer eleger-se o orador de preferência a qualquer outro, pois não há assunto sobre que ele não possa discorrer com maior força de persuasão diante do público do que qualquer profissional. Tal é a natureza e a força da arte da retórica! (Platão, Górgias, 2010).

Sócrates (470-399 a.C.) distanciou-se da retórica sofista ao promover primeiro o autoconhecimento e só depois a arte de bem falar, e, a retórica não entrava nos domínios da arte sendo uma habilidade prática e empírica. Já Platão (428/427-348/347 a.C.) valorizava a filosofia sobre a retórica estando na filosofia a descoberta da verdade, enquanto a retórica, na sua generalidade, destinava-se a ganhar argumentos através de manipulação e alguma desonestidade.

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Foi Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) que organizou de forma alargada a retórica, sistematizando-a em quatro partes (…) “que representam as quatro fases pelas quais passam quem compõe um discurso” (…) (Reboul, 2004, p. 43): Invenção, Disposição, Elocução e Ação.

Invenção [heuresis]

Invenção é a procura do tema que se vai tratar no discurso. Estes temas podem ser três como Aristóteles enuncia:

As espécies de retórica são três em número [deliberativo, judicial e epidíctico]; pois outras tantas são as classes de ouvintes dos discursos. Com efeito, o discurso comporta três elementos: o orador, o assunto de que fala, e o ouvinte; e o fim do discurso refere-se a este último, isto é, ao ouvinte (Aristóteles, 2005, p. 104).

O tipo deliberativo serve para lidar com assuntos públicos que irão acontecer no futuro tratando o orador de convencer o público a concordar ou a discordar de um argumento. O tipo judicial serve para lidar com a acusação ou a defesa de episódios que aconteceram no passado. Finalmente, o tipo epidíctico lida com a homenagem ou a crítica individual.

Depois do tema estar decidido, deve-se encontrar instrumentos de persuasão, os argumentos. Estes são o ethos, o pathos e o logos:

 Ethos: é a dimensão relativa ao carácter do orador. Este deve ser virtuoso e credível para conseguir a confiança do seu auditório.

 Pathos: é a dimensão relativa ao auditório. Este deve ser emocionalmente impressionado e seduzido.

 Logos: é a dimensão relativa aos argumentos, ao discurso. O discurso deve estar bem estruturado do ponto de vista lógico-argumentativo, para que a tese se imponha como verdadeira.

(Borges, Paiva, & Tavares, 2014, p. 96)

Para um discurso persuasivo torna-se necessário um leque de etiquetas (Topoi), que funcionam como um esquema de argumentação transversal a todos os géneros de discursos.

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Independentemente da categoria temática, Aristóteles dividiu o corpo principal de um discurso em quatro partes, de forma semelhante a Córax, estabelecendo exórdio ou introdução, narração, confirmação e peroração. Exórdio é a parte inicial do discurso, na tentativa de conquistar o auditório. A narração é a parte devotada à exposição dos factos que mais interessam ao orador. A confirmação (…) “uma parte nitidamente mais longa […] [traz] […] um conjunto de provas, seguido por uma refutação (confutatio), que destrói os argumentos dos adversários” (…) (Reboul, 2004, p. 57). A peroração é a parte final do discurso, onde o orador conclui de forma categórica.

Elocução [lexis]

A parte em que se redige o discurso e passam as ideias a estarem fixas. O orador deve escrever bem, ou seja, num bom vernáculo, orientado para o tema para que este seja o mais persuasivo possível. Para isso, deve escolher bem o estilo que se adapta melhor ao assunto que vai tratar. Também deve adaptar o estilo do seu discurso ao auditório a fim de se tornar claro e convencer o público da sua causa. Por último, o orador deve (…) “mostrar-se em pessoa no seu discurso, ser colorido, alerta, dinâmico, imprevisto, engraçado ou caloroso, numa palavra, vivaz” (…) (Reboul, 2004, p. 63).

Ação [hipócrisis]

A ação é o culminar do discurso retórico, quando o orador se apresenta diante do seu público e através da sua interpretação leva este ao encontro do que diz.

Após a conquista da Grécia pelo Império Romano, a retórica foi introduzida em Roma, tendo tido um rápido desenvolvimento. O tratado de autor anónimo Rhetorica ad

Herennium (c. 85 a.C.) e os sete tratados de Cícero (106-43 a.C.) como também o tratado Institutio oratoria (92-94 d.C.) de Quintiliano (35-100 d.C.) organizaram

sistematicamente os conteúdos didáticos, latinizando os termos do discurso retórico. As fases traduziram-se em Inventio, Dispositio, Elocutio e Pronuntiatio, e foi acrescentada a fase da Memoria. As definições das quatro fases da elaboração do discurso retórico latinizadas são as mesmas dos gregos só definindo a Memoria como um processo de interiorizar as informações com o intuito de falar de improviso (Mccreless, 2002, pp. 849-850). O corpo principal do discurso mantém-se em seis partes, mas com termos latinos:

exordium, narratio, partitio, confirmatio, refutatio e peroratio, mantendo também as suas

definições. Para Cícero, os objetivos da retórica são docere, movere e delectare, ou seja, a (…) “capacidade de atingir o entendimento (ensinar), de mover os afetos e a vontade

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(inclinar), de estimular os sentidos (deleitar)” (…) (Massimi, 2008, p. 55) e o orador deve possuir, além das técnicas da retórica, uma fundamentação filosófica e ética.

Com o declínio do Império Romano do Ocidente, a retórica política foi também desvanecendo, mas, foi sendo apropriada e reinventada pelo primeiro Cristianismo, mudando de paradigma, do político para o religioso. A igreja, depositária da cultura e retórica do Império Romano, rejeitou os autores pagãos de retórica, mas (…) “não podia deixar esses meios de persuasão em mãos de adversários” (…) (Reboul, 2004, p. 77) e, para fazer uma leitura produtiva da Bíblia, cheia de recursos retóricos, tinha que compreender a arte que rejeitava, como postula Santo Agostinho (354-430):

É um facto, que pela arte da retórica é possível persuadir o que é verdadeiro e o que é falso. Quem ousará, pois, afirmar que a verdade deve enfrentar a mentira com defensores desarmados? Seria assim? Então, esses oradores, que se esforçam por persuadir o erro, saberiam desde o proémio [exórdio] conquistar o auditório e torná-lo benévotorná-lo e dócil, ao passo que os defensores da verdade não o conseguiriam? (Agostinho, 2002, p. 208).

A utilização da retórica por Santo Agostinho tinha como fim ensinar a verdade cristã pelo uso de eloquência e, para isso, valia-se dos autores antigos como Cícero, citando-os com frequência. A retórica desenvolveu-se na Idade Média sobretudo sob a alçada e desígnios da Igreja, mas também na literatura profana. A educação secular medieval incluía, nos seus currículos de estudos académicos nas universidades, a retórica englobando-a no Trivium, que compreendia outras duas disciplinas, a gramática e a lógica. Pertencendo ao Quadrivium estavam as disciplinas de música, aritmética, geometria e astronomia. Estas, o Trivium e o Quadrivium, compreendiam as setes artes liberais. A retórica deixou de ter uma participação com um auditório, ou seja, um discurso público e voltou-se para as artes literárias, a poesia e a prosa (Mccreless, 2002, p. 850).

A retórica, desvalorizada para as suas disciplinas irmãs do Trivium, (…) “alcanzará

un papel preponderante durante os siglos XV, XVI y XVII, tanto na arte da enseñanza como en el de la cultura” (…) (Hernández & García, 2005, p. 91). Para isso contribuíram

as descobertas dos autores latinos como Cícero e Quintiliano, que levaram os humanistas a revalorizarem a retórica grega pois esta era a geradora das formas e dos conteúdos e também dos adornos, dos textos clássicos. O campo da retórica alargou-se a outros campos e a outras disciplinas com natural incidência na literatura e de forma preponderante na música.

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1.2 A Teoria dos Afetos

Desde sempre existiu uma clara tentativa de representar em música algo exterior a ela. Segundo Harnoncourt (1995) pode indicar-se quatro linhas de aproximação: 1) imitação acústica, 2) representação musical de imagens visuais, 3) retrato musical de pensamentos e emoções e 4) música como linguagem (Harnoncourt, 1995, p. 118). Destas, a última foi explorada exaustivamente pelos compositores barrocos.

Porém, a palavra música, como a entendemos atualmente, tem a sua génese etimológica da palavra grega mousiké, que no período clássico significava «a arte das musas» e, estava intrinsecamente ligado com as ciências do saber (matemática, geometria e astronomia), e incorporando todas as artes como a poética, a prosa, o teatro, a dança e a música.

Platão (427 a.C. -347 a.C.) na sua obra “A República”, através do diálogo entre Sócrates e Gláucon1, discrimina as harmonias (ou modos medievais) que farão a boa

formação de guerreiros e as que, pelo seu carácter, atraem atitudes e comportamentos inadequados a um estado ideal. Assim, as harmonias menos viris e as de carácter mais ébrio são excluídas, pois umas são lamentosas e as outras festivas e apropriadas para os banquetes. Nestas englobam-se as mixolídia e sintonolídia, quanto ao aspeto menos viril ou lamentoso, e umas variedades da jónia e da lídia, próprias da preguiça e da moleza. As harmonias ótimas para uma boa educação são a dória e a frígia que traduzem na perfeição a coragem, a força e o bom senso pedidos a um guerreiro. Mesmo com estas duas harmonias, basilares na educação dos jovens, não se deve praticar música em excesso, pois assim condicionará a sua personalidade tornando-a mais mole e efeminada, e acontecerá exatamente o contrário, com uma personalidade bruta e rude, se só exercitar o corpo na ginástica. Assim, o equilíbrio ideal para a educação de um indivíduo é entre a música e a ginástica, cada uma na sua justa parte, trabalhando o corpo no ginásio e a mente nas aulas de música. Também é feita a distinção entre a música de Apolo, associada a instrumentos de corda como a khitara2, de sons sóbrios e pacificadores, próprias para uma educação regrada e de acordo com as harmonias atrás referidas, e a de Dionísio, com

1 Irmão mais velho de Platão. 2 Cítara – instrumento de cordas.

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a sonoridade excitante e vibrante do aulos3, mais próxima da diversão e do relaxamento

inerentes aos desvios de carácter. Esta dicotomia notava-se nas grandes festas gregas: o apolíneo, utilizado em grande escala nas festas Apolíneas, e o dionisíaco nas festas Dionisíacas. Platão, sem entrar em pormenores musicais de natureza técnica, observa como a música pode influenciar profundamente a personalidade de um indivíduo e assim, com a educação através desta e da ginástica, encontra um equilíbrio na formação de cidadãos ideais (Platão, 2001).

Discípulo de Platão e professor na sua academia, Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), em particular no livro VIII da sua obra “Política”, alargou o estreito espectro das harmonias sugeridas pelo seu mestre, acrescentando à música um carácter lúdico e não só educacional, como seu mestre fez. Para ele, a educação musical teria um objetivo de cultivar o gosto pela música, que se tornará transversal durante toda a vida. Esta educação musical não teria tanto impacto nos músicos profissionais, mas sim naqueles que a fruem e assim veicular formas mais fáceis de partilha e de prazer na sua audição. Não reduzindo a música só ao seu deleite, distingue três tipos de melodias: as éticas, as de ação e as entusiásticas. Estas duas últimas são as ideais para apreciar enquanto os outros tocam, ora procurando entretenimento nas de ação, ou de catarse (katharsis4) nas entusiásticas. Para a educação, as que melhor se adequam são as melodias éticas, indo ao encontro do pensamento de Platão. Quanto à aprendizagem dos instrumentos na escola, Aristóteles aconselha como limite de idade a infância, pois é pouco digno os homens livres serem instrumentistas profissionais, e tentou abolir as audições dos alunos com as suas peças de difícil técnica a fim de não criar entusiasmo nas crianças. Os instrumentos a aprender seriam os de sopro (aulos), a que ele não se refere como prejudiciais à educação, ao contrário dos de corda (khitara) que deveriam ser retirados da educação (Strunk, 1950).

Na Idade Média, o texto e a música atuavam em conjunto para servir a adoração, contemplação e doutrinação religiosa, os modos e os ritmos eram escolhidos de acordo com o que se pretendia, de acordo com a herança grega, como Santo Agostinho postula:

O deleite da minha carne, ao qual não convém entregar a mente, que por ele seria necessariamente enfraquecida, engana-me muitas vezes, quando o sentimento não acompanha a razão de modo a ir resignadamente após ela, mas além disso, uma vez

3 Instrumento de sopro de palheta dupla.

4 Katharsis - no século IV a.C. significa assumir a vontade dos deuses. Procura obter a purificação através

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que mereceu ser admitido por causa dela, tenta até ir adiante e guiá-la. Assim, sem me dar conta, peco nestas coisas e depois dou-me conta disso. (...). Quando me lembro das minhas lágrimas, que derramei perante os cânticos da Igreja, nos primórdios da recuperação da minha fé, e quando mesmo agora me comovo, não com o canto, mas com as coisas que se cantam, quando são cantadas com uma voz clara e uma modulação perfeitamente adequada, reconheço de novo a grande utilidade desta prática. Assim, flutuo entre o perigo do prazer e a experiência do efeito salutar, e inclino-me mais, apesar de não pronunciar uma opinião irrevogável, a aprovar o costume de cantar na igreja, a fim de que, por meio do prazer dos ouvidos, um espírito mais fraco se eleve ao afeto da piedade. Todavia, quando me acontece que a música me comova mais do que as palavras, confesso que peco de forma a merecer castigo e, então, preferiria não ouvir cantar. (Confissões. X, 33)

O texto e a música atuavam em conjunto para servir a adoração, a contemplação e a doutrinação religiosa e, como na Grécia Clássica, os modos e os ritmos eram escolhidos de acordo com a finalidade objetiva funcional da música.

Com a gradual relevância das disciplinas linguísticas no Renascimento e a paralela humanização do pensamento musical, o texto expressivo levou a uma redução do peso da

musica theorica (música especulativa). A preocupação latente do compositor

renascentista deveria incidir na expressão dos afetos através do texto, adequando as palavras com a música de forma harmoniosa, equilibrada, deixando de lado a capacidade desta no despertar de afetos no ouvinte. Este equilíbrio entre música e texto foi perturbado quando o texto ganhou demasiada preponderância resultando no maneirismo musical. O compositor/ teórico barroco procurava com a música despertar e mover espírito humano, criando afetos e demarcando-se do período anterior, que os espelhava passivamente. Como refere Bartel:

To the Renaissance affectus exprimere the Baroque added affectus movere. It was no longer enough simply to present the affection objectively through the music: the listener was to be drawn into the drama of the presentation, to be emotionally affected himself. The Baroque composer wanted to move the listener to a heightened emotional state (Bartel, 1997, p. 32).

Para o ouvinte ficar num estado emocional intensificado surge um conceito barroco dos afetos em que o compositor trabalhava, de forma racional/ calculada, para uma dada reação emocional do ouvinte, controlando o seu estado emocional através do poder da

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21

música. O afeto desejado poderia ser despertado através de um modo apropriado ou de uma tonalidade, de um compasso ou ritmo juntamente com todo o arsenal de métodos e artifícios retóricos. Ou seja, os compositores e teóricos barrocos, para o melhor despertar de sentimentos e dos afetos, racionalizaram os conceitos tornando-os objetivos e codificando-os numa linguagem puramente musical.

De uma grande quantidade de obras literárias barrocas concernentes ao tema, Les

Passions de l'âme5 (1649) de René Descartes foi a primeira tentativa moderna para desenvolver uma teoria sistematizada e abrangente dos afetos, bem como uma das mais influentes no mundo artístico da época sendo obrigatória para conhecer a visão barroca sobre os afetos.

Descartes distingue entre alma e corpo, em que o corpo é explicado racionalmente (através de processos mecânicos) e a alma localizada no cérebro na glândula Pineal, comandando-a e assim provocando as paixões. Segundo o sistema cartesiano, existem quatro temperamentos humanos, nomeadamente sanguíneo, melancólico, fleumático e colérico concatenados com os elementos da Terra: ar, terra, água e fogo e determinam-se por uma combinação de dois dos quatro atributos principais: quente e frio, húmido e seco. Cada temperamento também está associado a um certo fluido corporal ou humor, produzido por um órgão.

O temperamento humano está de acordo com a sua fisiologia, determinado em parte, no momento do nascimento através dos astros. A idiossincrasia revelava-se na conjugação equilibrada destes fatores, reagindo diferentemente a qualquer estímulo afetivo externo. Este estado de equilíbrio altera-se quando se é despertado para determinados afetos por estímulos, neste caso a música, provocando diferentes reações dos ouvintes. Então, um modo ou tonalidade pode despertar a um indivíduo um determinado afeto e a outro um diferente.

Embora não existisse uniformidade na atribuição de temperamentos diferentes a diferentes modos/ tonalidades, teóricos e compositores versaram sobre a temática e propuseram relações como sintetiza Cano (2000):

5 Editado em português com o titulo As Paixões da Alma. Este foi o último texto filosófico de René

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22 CHARPENTIER (1643-1704) MATTHESON (1681-1764) RAMEAU (1683-1764) Dó Maior Alegre, guerreiro Cólera, Raiva, impertinencia Vivo, jubilante Dó menor Deprimido, triste Doçura transbordante, tristeza

intensa

Ternura, lamentação Ré Maior Alegria, raiva Obstinação, acuidade, escândalo,

beligerância, animação

Vivo, jubilante Ré Menor Solene, devoto

[religioso]

Calma, religiosidade, grandiloquência, alegria refinada

Doçura, tristeza Mi bemol Maior Cruel, duro Agudeza, seriedade, reflexão,

lastimoso Mi bemol menor Horror, espanto

Mi menor Afeminado, amoroso e lacrimoso

Reflexão, profundidade, tristeza, expressa dor

Doçura, ternura Fá Maior Fúria, cólera Generosidade, resignação, amor Tempestuoso,

raiva Fá menor Deprimido, magoado Ansiedade, desespero, fragilidade,

relaxado

Ternura, lamento, deprimente Fá sustenido menor Tristeza profunda, solidão,

languidez

Sol Maior Doce, jovial Insinuação, persuasão, brilho, alegria

Canções ternas e alegres Sol menor Severo, magnificente Graça, complacência, nostalgia

moderada, alegria e ternura moderadas

Ternura, doçura

Lá Maior Jovial, pastoral Lamentação, comovedor, tristeza Vivacidade, regozijo Lá menor Terno, lacrimoso Choro, nostalgia, dignidade,

relaxado

Si bemol Maior Magnificente, jovial Diversão, ostentação Agitação, raiva Si bemol menor Deprimido, terrível Extroversão Canções tristes

Si Maior Duro, lacrimoso

Si menor Solitário, melancólico Raro, temperamental, melancolia, mudança de humor constante Traduzido a partir de (Cano, 2000, p. 67)

O ritmo, compasso e pulsação também foram examinados, explicados e aplicados na composição musical de acordo com as suas propriedades afetivas, como também os vários tipos de danças e outras composições. Cano (2000) sintetiza desta forma as interpretações de Johann Mattheson no seu tratado Der Vollkommene Capellmeister6 (1739) em relação

ao tempo musical/ andamento:  Adagio: tristeza  Lamento: lamento  Lento: alivio  Andante: esperança  Afetuoso: amor  Allegro: consolo  Presto: desejo

6 Tradução do titulo para português “O Maestro de Capela Perfeito”. Este tratado contempla a descrição

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23

A alguns tipos de danças e composições:  Minueto: alegria moderada  Gavota: alegria jubilosa

 Bourrée: contentamento, satisfação, indiferença e laxismo  Rigaudon: deliciosa coqueteria  Marcha: heroísmo e valentia  Entrée: altivez e majestosidade  Giga inglesa: ardente e

precipitada; ansiedade, raiva efémera.

 Louvre: altivez e pomposidade  Canarie: desejo

 Giga italiana: velocidade e ímpetos extremos

 Polonaise: sinceridade e franqueza

 Angloise: obstinação  Passepied: frivolidade

 Rondeau: firmeza e convicção  Sarabanda: ambição

 Courante: doce esperança

 Allemande: espírito contente e feliz que se deleita na calma e na ordem

 Fantasia: imaginação

 Chacona e Passacaglia: saciedade  Intrata: promessa

 Sonata: complacência: cada um encontrará o afeto, de acordo com o movimento indicado (adagio, andante, presto, etc.)

 Concerto grosso: sensualidade, inveja, vingança e ódio

 Sinfonia: o mesmo do resto da obra

 Abertura: nobreza

As tonalidades, o ritmo/ compasso e o texto (quando cantado) são as primeiras indicações/ prescrições que um compositor deveria considerar para alcançar um determinado afeto com a composição musical. Embora em algumas indicações os teóricos barrocos não sejam concordantes, essas diferenças esbatem-se no panorama geral, obtendo-se uma certa homogeneidade, não variando da alegria para a tristeza o afeto proposto para uma certa tonalidade.

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24

1.3 Música e Retórica

1.3.1 As sete artes liberais: Trivium e Quadrivium

A existência de um vocabulário comum entre a disciplina de retórica e música como tropo, colores, clausula, cópula, diminutio e variatio, a utilização de figurae (ornamentos retóricos de estilo presentes no elocutio), e a utilização de recursos mnemónicos como a mão Guidoniana como forma de memorizar as figuarae musicais são certamente pontos com algum contacto entre a retórica literária e a musical.

No período renascentista, os compositores utilizaram, de forma isolada, a projeção afetiva do texto, o uso de acordes em suspensão (fermata) em palavras-chave, a elegância no texto poético, assim como a preocupação latente da expressão musical das palavras, a gramática, as cadências, o ritmo utilizado entre outros, denotando uma ligação mais próxima com a retórica, vitalizada pela descoberta dos tratados de Cícero e de Quintiliano neste período (Wilson, s.d.).

Tal como na Antiguidade clássica, a música, na educação medieval, estava associada ao Quadrivium das sete artes liberais. Esta configuração é creditada a Boécio (480-524), filósofo romano e educador que veiculou a conceção Pitagórica da música, ou seja, uma disciplina intimamente relacionada com relações matemáticas, sendo por isso especulativa, teórica. No seu tratado, De institutione musica, define três categorias de música: Musica Mundana na sua dimensão cosmológica; musica humana na sua relação com o corpo e o espírito humanos; e musica instrumentalis, a relação entre música e os instrumentos.

Este conceito de música como uma arte matemática mudou no início do século XVI, sendo o estudo da música abordado em duas perspetivas diferentes. Ao Quadrivium pertenciam as disciplinas matemáticas, com o número na sua génese. O conhecimento procurado através destas disciplinas é racional e a música é abordada na sua dimensão matemática pitagórica, sendo a manifestação sonora desta. Os músicos que abordavam a música por esta perspetiva consideravam-se superiores aos músicos práticos.

No Trivium encontram-se as disciplinas dedicadas à palavra, ou seja, à linguagem. A musica practica, sendo uma aplicação prática da música foi considerada com uma relação mais estreita com as disciplinas da palavra. Quem pertencia à musica practica era

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25

compositor, dirigia os coros e ensinava a sintaxe musical como também Latim e Retórica, estando assim muito próximos do Trivium (Bartel, 1997).

Esta divisão da música seria aumentada por Nicolaus Listenius no seu tratado

Musica (1537), ao acrescentar a musica poética às duas existentes. A nova disciplina

voltava-se para o ensino da composição musical e, naturalmente, a retórica tornou-se a fonte desta (Cano, 2000).

Figura 1- As Sete Artes Liberais (Liao, 2015, p. 20)

A musica theorica radicada no Quadrivium relaciona-se intimamente com a matemática como a musica practica, na sua dimensão aplicada une-se à retórica. Nesta configuração das disciplinas das universidades teria sido instruído o músico (compositor ou cantor) e apreendido esta dimensão poética da música.

1.3.2 Musica Poetica – Tratados

Segundo Cano “El término “poética” (del griego “crear”) se refiere a la

teorización, normativización, sistematización e invención de instrucciones, conocimientos y recursos técnicos con los cuales cuenta el artista durante el proceso de creación” (Cano, 2000, pp. 38-39). Os tratadistas pré-barrocos e barrocos sistematizaram

e normalizaram a Musica Poetica. Passaram da utilização da terminologia retirada da retórica literária a uma conceção da música seguindo os princípios retóricos. Segundo Bartel (1997), os mais importantes tratadistas e seus respetivos tratados, são os seguintes:

Septem artes liberales

Quadrivium: Arithmetica Musica Geometrica Astronomia Musica

Musica theorica Musica practica

Ars cantus Ars executionis Ars compositionis (Musica poetica) Trivium: Grammatica Rhetorica Dialectica

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26

Joachim Burmeister (1564-1629) Hypomnematum musicae poeticae (1599) Musica autoschediastike (1601)

Musica Poetica (1606)

Johannes Nucius (ca. 1566-1620) Musices Poeticae (1613)

Joachim Thuringus (?-?) Opusculum Bipartitum (1624)

Athanasius Kircher (1601-1680) Musurgia Universalis (1650)

Christoph Bernhard (1628-1692) Tractatus compositionis augmentatus (ca. 1660)

Ausführlicher Bericht vom Gebrauche der Con – und Dissonantien (?-?)

Wolfgang Caspar Printz (1641-1717) Phrynis Mytilenaeus (1676-79)

Johann Georg Ahle (1651-1706) Sommer-Gespräche (1695)

Tomás Baltazar Janovka (1669-1741) Clavis ad Thesaurum magnae artis musicae (1701)

Mauritius Johann Vogt (1669-1730) Conclave thesauri magnae artis musicae (1719)

Johann Gottfried Walther (1684-1748) Praecepta der musicalischen Composition (1708)

Musicalisches Lexicon (1732)

Johann Mattheson (1681-1764) Der vollkommene Capellmeister (1739)

Meinrad Spiess (1683-1761) Tractatus musicus compositorio-practicus (1745)

Johann Adolf Scheibe (1708-1766) Der critische Musikus (1745)

Johann Nikolaus Forkel (1749-1818) Allgemeine Geschichte der Music (1788-1801)

(Bartel, 1997, pp. 93-164)

Todos estes tratados têm temas em comum, embora em alguns não sejam abordados todos eles. Dos assuntos principais destacam-se a estreita relação com a retórica, o seu contributo significativo como função pedagógica e o caráter divino da música, de acordo com a doutrina luterana onde se manifestou com grande expressão.

(28)

27

1.3.3 Retórica Musical

A partir das fases de construção de um discurso (Invenção, Disposição, Elocução, Memória e Representação/ Ação), Joachim Burmeister, no seu tratado Musica Poetica de 1606, adaptou-a para a composição musical e estabeleceu três partes na estrutura do

Dispositio/ Disposição: Exórdio (Exordium), Corpo da Composição e Conclusão como

também uma lista de figuras musicais a serem utilizadas pelo compositor como assegura Harrison:

Burmeister's analysis of Lassus's In me transierunt perfectly illustrates an analysis based on principles of secondary rhetoric. The analysis consists of a division of the text into sections using the rhetorical terms exordium, confirmatio, and epilogue as well as a listing of musical figures (Harrison, 1990, p. 4).

Desde o tratado de Joachim Burmeister (1566-1629) foram escritos vários tratados, mas foi o tratado de Johann Mattheson de 1739, Der volkommene Capellmeister, o mais elaborado e discricionário da utilização da Retórica Musical na composição, com um receituário de estruturas retóricas musicais a serem utilizadas pelo compositor (Bukofzer, 1939). Segue-se uma exposição do que se trata nas fases de composição musical.

Inventio – Invenção

Para a composição é necessário obter ideias ou argumentos musicais adequados. O sistema funcional do Inventio musical denomina-se loci topici, (…) “conceito de tópico [que] vem da retórica aristotélica. Esse conceito concerne a um sistema pelo qual se obtém argumentos eficazes com o mínimo de informações disponíveis. […] A fórmula loci-topici, pela qual os tópicos eram designados, apresentava uma série de estratégias composicionais para a produção do discurso musical” (Duarte, 2006, p. 48). Para Matheson, haviam 15 topi-lopici diferentes:

Locus notationis Locus descriptionis Locus generis et specie Locus totius et partium Locus causae efficientis

Locus effectorum Locus adjunctorum Locus circumstantiarum Locus comparatorum Locus oppositorum

(29)

28 Locus causae materialis

Locus causae formalis Locus causae finalis

Locus exemplorum Locus testimoniorum

(Cano, 2000, pp. 76-77)

Dispositio – Disposição

Dispositio é a estruturação do discurso, como ordenar o(s) lopi-topici do inventio

para obter mais impacto e assim mais persuasão. Nas palavras de Cano:

La dispositio musical es una infraestructura, un ordenamiento subyacente que permite entender cada momento musical como parte funcional de un todo orgánico y se vincula directamente con el discurso musical en acción, es decir, en el mismo instante en que se percibe como sonidos distribuidos en el tiempo, dirigidos en un espacio y a un público específicos (Cano, 2000, p. 88).

A estrutura (flexível) do dispositio literário compreende Exordium, Narratio,

Propositio, Confutatio, Confirmatio e Peroratio, como já referido anteriormente, assim

como a musical, embora sofresse pequenas alterações na sua aplicação. Na sua aplicação prática é o esboço da composição, as linhas gerais.

Exordium – introdução ao tema musical com a finalidade de captar a atenção do público

e preparar para o que vem a seguir. Para Bartel (…) “this might take the form of a prelude

to a fugue or […] an opening ritornello in an aria or concerto (Bartel, 1997, p. 81)”. Narratio – a definição ou afirmação do tema e a sua natureza. Pode ser a entrada da voz

numa aria ou a entrada do instrumento solista num concerto. Este pode ser incorporado no Propositio.

Propositio – como o narratio pode ser incorporado no propositio. Numa fuga pode ser a

primeira reexposição do sujeito. Apresenta o propósito da composição.

Confutatio, Confirmatio – confutatio ou refutatio faz alterações substanciais ao tema com

cromatismos, modulações entre outros, afastando-se do tema, refutando-o e depois com uma resolução eficaz o eleva. Confirmatio afirma o tema através de repetições mais ou menos variadas. Podem ser dois processos contrastantes, mas com o mesmo objetivo, reforçar e elevar o tema principal através da sua discussão.

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29

Peroratio – a conclusão da composição podendo ser através da repetição do exordium ou ritornello.

Elocutio – Elocução

No elocutio ou decoratio ocorre o ajuste da escrita ao esboço prévio, obtido do

dispositio. Para tornar a composição musical mais apelativa ou mais persuasiva

acrescentam-se alterações, ornamentações, entre outros. No discurso literário é a escolha acertada das palavras como também das figuras de estilo e na composição musical é a escolha de figuras retóricas musicais. Para Cano a figura retórica musical:

Es el proceso de transgresión a la regla musical que provoca que, en un contexto determinado, la forma “correcta” de la realización musical, ceda su lugar a otra de carácter sorpresivo, inesperado, inusitado y extracotidiano que se propone ofrecer al discurso musical belleza, refinamiento, elegancia, atractivo y, sobre todo, se propone mover los afectos del oyente (Cano, 2000, p. 109).

Uma figura musical opera basicamente de quatro modos: adição, subtração ou supressão, permutação e substituição. Podem ser classificadas segundo a sua hierarquia, o seu estilo e os elementos musicais afetados.

Classificação por hierarquia

Nucius (1613) divide as figuras em dois grandes grupos: A) Figurae principalis: fuga, commisura, repetitio.

B) Figurae minus principalis: climax, complexio, syncopatio, homoioteleuton. Classificação por estilos

Segundo Bernhard (1660), as figuras classificam-se pelos seguintes estilos: A) Stylus gravis: polifonia religiosa tradicional. Prima prattica.

B) Stylus luxurians communis: música de câmara. Seconda prattica. C) Stylus luxurians theatralis: ópera, oratório, cantata, etc.

Classificação por elementos musicais afetados Figuras que afetam a melodia:

(31)

30

 Figuras descritivas: Hypotiposis Figuras que afetam a harmonia:

 Figuras de dissonância  Figuras de acordes

Figuras que afetam vários elementos:  Por adição

 Por subtração

 Por permutação e/ou substituição (Cano, 2000, pp. 117-121)

Memoria – Memória.

A memória é importante para quem executa/ interpreta música, recorrendo a sistemas mnemónicos para melhor assimilar. No período barroco, a música era para a contemporaneidade e como tal não era necessário memorizar peças do passado, e não tendo tempo para memorizar as do imediato. Mas pode considerar-se o Baixo Contínuo um sistema mnemónico.

Pronuntiato – Representação/ Ação

Representação, ou seja, a forma de executar a composição musical foi bastante importante para vários compositores do período barroco, como François Couperin, deixando várias indicações para uma forma correta de tocar. François Couperin e J.S. Bach deram indicações precisas de como executar as suas obras bem como se deviam estudar, mostrando uma forte preocupação com a representação do seu discurso musical (Benedetti, 2012).

1.4 Retórica – Análise do Discurso Musical

A retórica é a arte da persuasão e assim, qualquer análise retórica deve começar com uma única pergunta: “Qual é o objetivo persuasivo no discurso ou na composição?” Esta pergunta leva a outras questões de que se destaca: “Quais os meios retóricos pelo qual o orador/ compositor se recorre para tornar o seu discurso/ composição o mais persuasivo/a possível?” (Anderson, 2012, p. 39).

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31

Como já foi supramencionado, ao longo do período barroco os princípios da retórica eram prescritivos: eles forneceram técnicas de rotina para o processo de composição em vez de técnicas descritivas para uma análise. Assim, para realizar uma análise eficaz, torna-se necessário desconstruir uma composição à luz dos seus princípios prescritivos (Bent & Pople, 1980).

Como sintetiza Bartel (1997), um compositor, na fase do inventio, primeiramente escolhe um tema que será a base para evocar um determinado afeto. Em segundo lugar, determina a tonalidade de acordo com o afeto pretendido. Em terceiro, escolheria o ritmo (compasso) e a métrica adequada. Se o compositor trabalhasse num texto pré-determinado, este sugeriria de acordo com a sua natureza, uma certa tonalidade, um ritmo e obviamente a métrica. Para uma composição vocal, a análise naturalmente começará pelo texto. No caso das composições instrumentais, em que as palavras não ajudam para determinar o tema ou afeto pretendido, o ritmo e o andamento serão determinantes como também a tonalidade. No caso das Suite de dança, os diferentes compassos, ritmos e andamentos utilizados estão conotados com um determinado afeto.

Depois de determinar o género de inventio, a análise deve incidir no dispositio, ou seja, como a composição se apresenta estruturada. Para isso, torna-se necessário uma análise à estrutura harmónica para melhor compreender as partes do discurso musical. Com uma estrutura harmónica realizada torna-se mais óbvia a segmentação em partes do discurso musical, seguindo as prescrições dos teóricos da época. Como já referido anteriormente, o Exordium faz a introdução ao tema musical, o Narratio define ou afirma o tema e a sua natureza, o Propositio (que pode ser incorporado no narratio) reafirma o tema, o Confutatio (Refutatio) e o Confirmatio em que o primeiro faz alterações substanciais ao tema com cromatismos, modulações entre outros e o segundo assegura o tema através de repetições mais ou menos variadas e, por último, o Peroratio, a conclusão da composição.

Para finalizar, identifica-se as figuras retóricas utilizadas na composição, associando-as ao afeto pretendido no geral como também no seu particular. Se uma composição é alegre e festiva, naturalmente as figuras retóricas terão esse carácter na sua generalidade, mas o compositor, com a intenção de reforçar a alegria e a jovialidade pode utilizar outras menos próprias a esse afeto desejado. Nas composições vocais analisam-se as figuras retóricas de acordo com o afeto preanalisam-sente no texto.

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Segue um esquema de como proceder a uma análise retórica:

Figura 2 - Para uma Análise Retórica

Análise do Elocutio

Determinação das Figuras Musicais

Estrutura do dispositio

Análise harmónica

Exordium - pode ser o prelúdio que antecede a fuga, o próprio sujeito da fuga, o ritornello inicial numa aria ou concerto.

Narratio e Propositio - pode ser a entrada da voz ou do instrumento solista num concerto. Confutatio - passagens contrastantes com utilização de suspensões, cromatismos.

Confirmatio - repetições variadas e inventivas do Propositio/ Narratio.

Peroratio - a conclusão da composição que pode ser a repetição do ritornello inicial, do exordium ou uma passagem pedal.

Determinação do Inventio e/ou dos afetos pretendidos

Natureza do texto (se a composição for vocal) Tonalidade

Compasso Andamento

Métrica

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33

Seguem alguns exemplos de figuras retóricas comumente utilizadas, e o seu significado afetivo7:

Catabasis – Passagem musical descendente, que expressa imagens ou afetos negativos, de lamento, submissão ou humildade.

Figura 3 – Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com uma Catabis nos compassos 2 e 3 (Rodrigues, 2006, p. 41)

Figura 4 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 93)

Suspiratio – Expressão musical de um suspiro através de uma pausa.

Figura 5 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Suspiratio no compasso 18 (Rodrigues, 2006, p. 42)

7 No capítulo III, Definitions and Translations of the Musical-Rhetoric Figures, do livro Musica Poetica do

autor Dietrich Bartel (Bartel, 1997, pp. 165-438) e na seção Registro de Figuras do livro Música y Retórica en el Barroco do autor Rubén López Cano (Cano, 2000, pp. 123-237) tem uma lista e definição pormenorizada das Figuras Musicais.

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34 Saltus duriusculus – Salto dissonante.

Figura 6 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Saltus Duriusculus no compasso 27 (Rodrigues, 2006, p. 45).

Figura 7- Excerto de Largo do Concerto nº5, BWV 1056, de Johann Sebastian Bach com um Saltus Duriusculus entre o compasso 3 e o 4 (Lanzoni, 2013)

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35

Passus Duriusculus – Ocorre quando a voz sobe ou desce meio-tom.

Figura 8 - Excerto Responsório nº2 do Ofício dos Defuntos (1816) de José Maurício Nunes Garcia.

Auxesis – Repetição de uma passagem musical um tom acima.

Figura 9 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Auxesis no solo dos compassos 19 e 20 (Rodrigues, 2006, p. 44)

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36

Circulatio – Série geralmente oito notas de forma formação circular ou senoidal.

Figura 10 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Circulatio na voz no texto Agnus Dei, Filius Patris (Rodrigues, 2006, p. 42)

Noema – Passagem homofónica inserida numa textura de contraposição.

Figura 11 - Excerto do Behold a virgin shall conceive & O thou that tellest good tidings to Zion do Messias de Haendel (Mateus, 2016, p. 47)

Interrogatio – pergunta musical.

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37

Anabasis – Passagem musical ascendente, expressando imagens positivas.

Figura 13 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 94)

Aposiopesis – Pausa ou silêncio inesperado.

Figura 14 - Figura 12 - Excerto do Vinea Fact Est, das Matinas e Vésperas de Sábado Santo, de Manoel Dias de Oliveira (Soares & Neto, 2014)

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39

II – INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

2.1 Contexto geral de intervenção

2.1.1 História e caracterização do Conservatório de Música do Porto

O projeto O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no

Período Barroco foi implementado no Conservatório de Música do Porto (CMP), que é

uma escola pública do Ensino Artístico Especializado em Música e é, conjuntamente com todos os outros conservatórios e escolas artísticas públicas, um setor específico do nosso sistema educativo.

O CMP surgiu para responder a uma necessidade de criar uma instituição pública destinada ao ensino de Música, na cidade do Porto. Esta necessidade foi despoletada desde a segunda metade do século XIX, após a criação do Conservatório Nacional de Lisboa em 1835 e foram feitas várias tentativas por nomes insignes como Carlos Dubbini ou Ernesto Maia.

Porém, o CMP foi fundado somente no século XX, em reunião de 1 de junho de 1917, por votação unânime do senado da Câmara Municipal e inaugurado no dia 9 de dezembro de 1917, sendo o mérito reconhecido ao diretor de orquestra e pianista Raymundo Macedo. Logo no ano letivo de inauguração do CMP, matricularam-se 339 alunos, para os cursos de Piano, Violino e Violeta, Violoncelo, Canto, Instrumentos de Sopro e Composição, sendo o corpo docente constituído por 12 professores entre os quais Raymundo Macedo, Moreira de Sá e Luís Costa.

O acervo bibliográfico e documental, as obras de arte, instrumentos e objetos pessoais de personalidades da nossa história constituem o seu património, bem como os espólios de Guilhermina Suggia e Nicolau Ribas, doados a esta instituição.

A necessidade de instalações com maior capacidade e com mais potencial para responder à procura de formação artística, aliado às (re)organizações consequentes do 25 de abril de 1974, levaram a que fosse possível uma transferência do CMP para um palacete municipal8, a partir de 13 de março de 1975.

8 O Palacete Municipal pertenceu à família Pinto Leite e situa-se no nº13 da Rua da Maternidade na cidade

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40

Embora o edifício e jardins envolventes fossem repletos de qualidade e beleza, não conseguiam responder às necessidades de espaço que o CMP precisava. No sentido de responder à procura exponencial deste tipo de ensino bem como assumir outros regimes de frequência, o CMP mudou de instalações, passando a ocupar a área oeste da Escola Secundária Rodrigues de Freitas, a partir do dia 15 de setembro de 2008, até à atualidade.

Hoje em dia, tem mais de 1000 alunos matriculados, desde o primeiro ciclo até ao final do ensino secundário. Dado que se trata de uma escola de Ensino Artístico Especializado em Música, é necessário que os alunos (com idades compreendidas entre os 6 e os 23 anos) realizem provas de admissão/ aferição. Os critérios de seleção baseiam-se exclusivamente nas suas aptidões musicais, independentemente do estatuto socioeconómico das suas famílias ou da sua área de residência. É importante salientar que o CMP não consegue dar resposta ao elevado número de estudantes que anualmente procuram ter acesso, não só pelo número (ainda) limitado de meios físicos (salas de aula ou outros espaços e equipamentos) como também de recursos humanos (professores e pessoal não docente).

Deste modo, a escola (re)orientou conceções relativas a normas de organização e de oferta formativa, nomeadamente o alargamento da frequência a outros regimes.

Assim, os alunos podem matricular-se escolhendo um de diversos regimes de frequência que a legislação atual (Decreto-Lei n.º 344/90 de 2 de novembro) admite, nomeadamente: a) regime integrado; b) regime supletivo e c) regime articulado.

a) regime integrado: quando os alunos obtêm a formação geral e a formação específica (neste caso música) na mesma escola.

b) regime articulado: quando os alunos obtêm a formação geral numa outra escola e integram o CMP neste regime para aprender música. É a solução mais adequada para estudantes que vivem fora da cidade pois permite uma maior facilidade de gestão do seu horário e do seu currículo. Por exemplo, o CMP tem um horário bastante alargado, funcionando das 8h20 às 22h20 de 2ª a 6ª, e das 8h20 às 13h20 ao sábado. Este prolongamento noturno conduz a uma panóplia de escolhas de horários, principalmente para as famílias cujos filhos frequentam duas escolas. O CMP não cede apoio socioeducativo a estes alunos pois cabe à escola que leciona a formação geral prestar este tipo de apoio.

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c) regime supletivo: quando os alunos frequentam o ensino especializado de música numa escola para esse efeito independentemente das habilitações que possuem.

Por exemplo, o ano letivo de 2013/ 2014, de 1053 alunos, 545 frequentaram o regime supletivo, 445 o integrado e apenas 63 o regime articulado.

É fundamental realçar que a escolha de estudar música, qualquer que seja o regime, tem algumas implicações, nomeadamente o trabalho individual e continuado por parte dos alunos em casa; apresentações públicas (concertos, audições, concursos, provas e exames), algumas delas fora da escola; acompanhamento, compreensão e envolvimento dos encarregados de educação. Para os alunos que não têm possibilidade de adquirir o seu próprio instrumento musical, o CMP cede por empréstimo (Conservatório de Música do Porto, 2016) (Rocha, 2007) (Conservatório de Música do Porto, 2016).

2.1.2 Caracterização das turmas alvo de intervenção

A prática pedagógica supervisionada desenvolveu-se no Conservatório de Música do Porto, ao longo do ano letivo 2015/2016 dividindo-se em duas fases distintas: uma fase de observação e uma fase de intervenção. A observação das aulas iniciou-se no final do mês de outubro em níveis diferentes: Formação Musical ao 4º, 6º e 9º Ano e História da Cultura e das Artes a uma turma de 11º Ano, lecionadas respetivamente pelos professores cooperantes Nuno Rocha e Sónia Marques. A fase de observação revelou-se fundamental no sentido de uma compreensão da realidade das turmas alvo para uma melhor formulação de planificações, estratégias e metodologias adequadas a cada turma. Para esta compreensão foram também de enorme importância, as informações obtidas por parte dos professores cooperantes.

Formação Musical 6º Ano A/ 2º Grau

A turma de Formação Musical do 6º Ano A em regime de ensino integrado da escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é constituída por 11 alunos, 6 elementos do sexo feminino e 5 elementos do sexo masculino entre os 11 e 12 anos de idade. Todos os alunos frequentam o curso básico de Música de interpretação.

Das informações cotejadas ao longo do ano, de observação direta de aulas e transmitidas pelo professor cooperante, constatou-se que a turma apresenta níveis díspares de conhecimento das matérias, salientando-se dois/três elementos que

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sobressaem em relação aos demais. Doravante, a turma exibe capacidades suficientes para a assimilação dos conteúdos da disciplina.

De uma forma geral, o ambiente na sala de aulas é saudável, propiciando a aprendizagem só contrariado algumas vezes por dois/ três alunos, que por vezes iniciam conversas paralelas perturbando o normal funcionamento da disciplina.

Formação Musical 4º Ano/ Iniciação IV

O primeiro turno de Formação Musical do 4º Ano em regime de ensino integrado da escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é constituída por 12 alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8 elementos do sexo masculino entre os 9 e 10 anos de idade. Todos os alunos frequentam o curso básico de Música de interpretação.

O segundo turno é constituído por 12 alunos, 5 elementos do sexo feminino e 7 elementos do sexo masculino, também entre os 9 e 10 anos e também frequentam o curso preparatório de Música de interpretação.

Através das informações recolhidas da observação direta ao longo do ano como também das partilhadas pelo professor cooperante, constatou-se que a turma apresenta níveis similares de conhecimentos dos conteúdos, sobressaindo 4 elementos em cada turno com uma facilidade de aprendizagem e assimilação de conhecimentos acima da média.

A nível comportamental, é uma turma calma, que acata e entusiasma-se com os conteúdos da disciplina, respondendo maioritariamente de forma positiva. Como na generalidade, existem alunos mais introvertidos e alguns mais expansivos, mas não interferem de forma significativa no desenrolar normal da aula.

Formação Musical 9º Ano B/ 5º Grau

O primeiro turno de Formação Musical do 9º Ano B em regime de ensino integrado da escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é constituído por 12 alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8 elementos do sexo masculino entre os 14 e os 15 anos. Todos os alunos frequentam o curso preparatório de Música de interpretação.

Imagem

Figura 1- As Sete Artes Liberais (Liao, 2015, p. 20)
Figura 2 - Para uma Análise Retórica
Figura 5 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Suspiratio no compasso 18  (Rodrigues, 2006, p
Figura 6 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Saltus Duriusculus no compasso  27 (Rodrigues, 2006, p
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Referências

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