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Formação de educadores para o campo na perspectiva do programa de apoio à formação superior em licenciatura em educação do campo / Training of educators for the field from the perspective of the support program for higher education training in field educa

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n. 8, p.57491-57501 aug. 2020. ISSN 2525-8761

Formação de educadores para o campo na perspectiva do programa de apoio à

formação superior em licenciatura em educação do campo

Training of educators for the field from the perspective of the support

program for higher education training in field education

DOI:10.34117/bjdv6n8-237

Recebimento dos originais:08/07/2020 Aceitação para publicação:14/08/2020

Jucélia Oliveira Santos

Mestre em Gestão de Políticas Públicas e Segurança Social pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - UFRB

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB

Endereço: Rua Rui Barbosa, nº. 710, Centro, Cruz das Almas - BA, Brasil

E-mail: juoli.ufrb@gmail.com

Rosineide Pereira Mubarack Garcia

Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia -UFBA

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB

Endereço: Rua Rui Barbosa, nº. 710, Centro, Cruz das Almas - BA, Brasil

E-mail: rose.mubarack@ufrb.edu.br

RESUMO

O presente artigo integra uma pesquisa de mestrado em desenvolvimento e tem como objetivo discutir sobre as políticas de formação de professores-educadores para o campo, com ênfase no Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (Procampo). O estudo encontra-se na fase de revisão bibliográfica, em que estão sendo utilizados como principais fontes de investigação: artigos científicos, livros e teses. A partir dos dados obtidos, conclui-se preliminarmente que o Procampo constitui-se uma política educacional que propõe um projeto de educação inovador e diferenciado para as populações do campo visando uma formação ampla, globalizada e, ao mesmo tempo, contextualizada com o território rural brasileiro.

Palavras-chave: Educação do Campo, Formação de Professores, Procampo. ABSTRACT

This article is part of a master's research in development and aims to discuss the policies of teacher-educator training for the field, with emphasis on the Support Program for Higher Education in Rural Education (Procampo). The study is in the bibliographic review phase, in which the main research sources are being used: scientific articles, books and theses. From the data obtained, it is preliminarily concluded that Procampo constitutes an educational policy that proposes an innovative and differentiated education project for rural populations, aiming at a broad, globalized formation and, at the same time, contextualized with the rural territory Brazilian.

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1 INTRODUÇÃO

Durante todo o século XX, no Brasil não se teve notícia da existência de políticas educacionais que considerassem as particularidades, valores e crenças dos sujeitos do campo, pelo contrário, as poucas políticas desse período basearam-se num discurso urbano-capitalista que anunciava a necessidade de modernização do povo do campo e do próprio campo, enquanto espaço de produção, considerado atrasado e desnecessário frente ao forte processo de urbanização e industrialização que o país e o mundo estavam vivendo no período. Visando principalmente o lucro e o desenvolvimento econômico do país, essas políticas sustentaram um modelo de escola rural que regulava e negava a cultura e identidade da população atendida por ela.

Nas duas últimas décadas, os movimentos sociais, sindicais e demais organizações do campo, através de luta e pressão sobre o poder público, contribuíram muito para que a educação desse meio passasse a ser discutida em outras bases, alcançando resultados significativos no sentido de conquistar uma “Educação do Campo e no Campo”. É neste cenário, como fruto dessa resistência organizada, que se conquista o Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (Procampo), em 2007, como uma política pública de formação de profissionais docentes oriundos do campo, cujo objetivo é a formação de educadores em diferentes áreas de conhecimento, para atuar nas séries finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio nas escolas do campo, consistindo numa proposta de formação diferenciada e inovadora (BRASIL, 2018).

O presente artigo propõe uma discussão sobre as políticas de formação de professores-educadores para o campo, com ênfase no Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (Procampo). Trata-se de um recorte de uma pesquisa de mestrado em andamento, de cunho exploratório e, orientada por uma abordagem qualitativa, configurando-se num estudo de caso, do tipo “histórico-organizacional” (TRIVIÑOS, 2006), cuja unidade de análise será a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB.

Tendo em vista que a pesquisa se encontra na fase de revisão sistemática de literatura, propõe-se aqui um estudo essencialmente teórico, em que recorremos aos principais autores que discutem sobre Educação do Campo, formação de docentes-educadores para o campo, a política Procampo e Licenciatura em Educação do Campo (LEDOC), dos quais merecem destaque: Leite (1999), Molina e Barbosa (2011), Molina e Antunes-Rocha (2014), Molina e Hage (2015), Hage, Silva e Brito (2016) e Bicalho (2018).

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2 POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O CAMPO

Defendendo a ideia de que as políticas públicas norteiam a ação estatal, Hofling (2001) coloca que a criação e manutenção de políticas públicas é responsabilidade do Estado, enquanto conjunto de instituições permanentes. Outrossim, elas são compreendidas como o “Estado em ação”, desenvolvendo planos de governos por meio de atuações e programas destinados a esferas específicas da coletividade, como forma de dar materialidade aos direitos, principalmente os sociais, garantidos em lei. Nessa linha, Viegas, Santana e Noda (2020, p. 43418) sustentam que “a concepção de política pública adotada está estreitamente relacionada ao conceito e entendimento de Estado que se tem”.

Importante ressaltar que mesmo os direitos sociais sendo reconhecidos e amparados legalmente, como por exemplo, saúde, trabalho, educação e seguridade social, grande parte das políticas sociais “[...] nascem de reivindicações e de mobilizações contínuas em busca de conquistas ou manutenção de direitos” (Ibid., p. 43422). Nesse sentido, o direito a uma educação básica gratuita e de qualidade vem se ampliando, notadamente, a partir da Constituição Federal de 1988, reafirmado pela Lei 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Contudo, quanto a sua efetivação, é notório que ainda hoje existem entraves.

A literatura especializada evidencia que o sistema educacional brasileiro sempre foi motivo de conflitos e espaço de disputa pela hegemonia, uma vez que por meio dos conhecimentos trabalhados na escola os grupos que possuem o poder de decisão transmitem aos sujeitos suas ideologias, concepções de sociedade e de cidadania, transformam a realidade, interferindo na história. Desde o período colonial, a escola brasileira - criada pelos jesuítas - foi pensada para atender aos filhos da elite branca ocidental. Com o passar do tempo, esse modelo de escola perpetuou e, nos dias atuais, depois de séculos, ainda encontra-se a serviço de poucos, legitimando uma cultura hegemônica e excluindo outras pertencentes a grupos socialmente desfavorecidos, cujos modelos étnico-culturais se afastam do dominante.

A percepção dessa função excludente do sistema educacional teve como percussor o sociólogo francês Pierre Bourdieu, o qual por meio de estudos teóricos e práticos mostrou que o sistema de ensino reproduz a superioridade e cultura dos grupos dominantes, servindo para perpetuar as desigualdades culturais e sociais já existentes na sociedade. A teoria de tal autor defende que o nível de aprendizagem dos sujeitos no ambiente escolar está diretamente relacionado com o seu capital cultural, sendo este determinante para o sucesso ou fracasso escolar. Neste sentido, os alunos provenientes de famílias das classes dominantes, ricas em capital cultural, conseguirão se apropriar da linguagem e cultura transmitida pela escola e avançarem nos estudos, já aqueles que pertencem

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a grupos desprovidos de capital cultural, indispensável para decifrar os códigos da mensagem pedagógica, não terão êxito, o que levará a sua exclusão desse sistema (BOURDIEU, 2007).

As primeiras iniciativas públicas de formação de professores do campo que se tem conhecimento ocorreram nas décadas de 1920/30. As autoridades brasileiras começaram a depositar atenção à educação rural só a partir do momento em que se sentiram ameaçadas com o forte movimento migratório (êxodo rural) para os centros urbanos, onde o processo de industrialização estava se fortalecendo, ocasionando grande inchaço nestes espaços. Nesse sentido, para conter o êxodo, contando com a ajuda das elites urbanas em busca de evitar os problemas sociais que poderiam vir a surgir, criaram o Ruralismo Pedagógico. Este movimento pretendia uma escola rural que atendesse as especificidades da região onde fosse inserida e criasse uma consciência agrícola, tentando manter o homem no campo e deixando-o convicto de que ali, através da lida com a terra ele poderia enriquecer (CALAZANS, 1993; LEITE, 1999).

Segundo Molina e Antunes-Rocha (2014), o movimento do Ruralismo Pedagógico possibilitou o debate e elaboração de propostas para a educação escolar das populações rurais. Araújo (2011) aponta tal movimento como uma experiência pioneira e tendência importante na área de formação de professor para o campo. “É neste contexto que ocorre a criação das Escolas Normais Rurais, projeto de formação docente influenciado pelas ideias nacionalistas e ruralistas” (ARAÚJO, 2011, p. 238). Tanuri (2000, p. 75) relata que essas escolas foram defendidas “com vistas à preparação de professores especializados para o magistério na zona rural, [...] cuja denominação expressava não apenas a localização da escola em zonas agrícolas e pastoris, mas, sobretudo o objetivo de transmitir conhecimentos de agronomia e higiene rural”.

Nos anos 50, destacam-se a Campanha Nacional de Educação Rural (CNER), o Serviço Social Rural (SSR) - ambos desenvolvidos com o objetivo de preparar técnicos para atuar na educação de base rural e proporcionar uma vida de qualidade e bem-estar para os rurícolas e o Serviço Especial de Saúde Pública, atualmente SESPI, cujas atividades eram desenvolvidas na zona rural. Vale ressaltar que, estes programas pretenderam fixar o homem no campo, evitando o êxodo rural (CALAZANS, 1993; LEITE, 1999). Entre as décadas de 1960 a 1970, no cenário educacional e político, houve um total esquecimento e abandono da educação pública formal nas áreas rurais do país, sem políticas públicas e sem produção acadêmica sobre a educação escolar e a formação de docente para atuar nas escolas rurais. (MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014).

A escola rural volta a ser lembrada nos anos 80 do século XX, nas discussões acerca das políticas públicas, tendo em vista a notável articulação dos movimentos sociais e sindicais dos territórios rurais em reivindicação ao poder público, tanto pelo acesso a terra como por uma

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educação formal de qualidade, com docentes capacitados e instalações adequadas (MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014).

Esses movimentos, apoiados por outros grupos, como universidades públicas e instituições religiosas, realizaram em 1998 a Primeira Conferência Nacional por Uma Educação Básica do Campo (I CNEC), evento no qual, além de outras pautas, se pleiteava uma política de formação específica para educadores do campo. No entanto, este debate só foi fortalecido na Segunda Conferência Nacional, realizada em 2004.

3 O PROGRAMA DE APOIO À FORMAÇÃO SUPERIOR EM LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO (PROCAMPO)

Em atendimento às reivindicações apresentadas na II Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo (II CNEC), o governo federal, através do Ministério da Educação, instituiu um Grupo de Trabalho (GT) que elaborou uma proposta de política de formação contextualizada de educadores do campo, a qual foi avaliada pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão - SECADI, e, em seguida, aprovada pelo Ministério da Educação (MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014; MOLINA; HAGE, 2015; HAGE; SILVA; BRITO, 2016). Tal proposta se refere ao Programa de Apoio às Licenciaturas em Educação do Campo (Procampo).

A experiência inicial do Procampo se deu através da abertura de Edital, em 2007, convidando algumas universidades públicas federais, indicadas pelos movimentos sociais do campo, a realizarem uma espécie de teste do programa, Quatro universidades aceitaram o desafio de serem as pioneiras: Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Federal de Sergipe (UFS) (MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014; HAGE; SILVA; BRITO, 2016; BICALHO, 2018 ) mediante a oferta de cursos presenciais de Licenciatura em Educação do Campo, com o seguinte modelo de formação:

Os cursos de licenciatura em educação no campo do programa Procampo têm um modelo básico, definido pelo Ministério da Educação. Tempo de duração, currículo e regime de alternância são pontos a serem seguidos pelas instituições de educação superior que oferecem os cursos. O modelo prevê cursos de quatro anos, com etapas presenciais (tempo-escola), em regime de internato, num período de 40 a 60 dias por semestre, e fases em que os estudantes combinam teoria e prática, desenvolvem pesquisas ou mobilizam a comunidade onde residem ou trabalham (tempo-comunidade) (MEC, 2018, s/p).

Com os resultados positivos da primeira experiência, nos dois anos seguintes, o MEC lançou novos editais para formação de turma única de alunos, abrindo oportunidade para outras Instituições Públicas de Ensino Superior interessadas aderirem ao programa. Nestas seleções, 32 (trinta e duas)

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universidades federais lograram aprovação de seus projetos submetidos, as quais passaram a ofertar Licenciaturas em Educação do Campo (LEDOCs) apoiadas pelo Procampo (MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014; MOLINA; HAGE, 2015; BICALHO, 2018).

Anos depois, o MEC publicou o Edital nº 02/2012 - SESU/SETEC/SECADI/MEC, propondo às universidades federais o desafio de tornarem os cursos de licenciatura permanentes, mediante o envio de projetos político-pedagógicos, conforme apontam Molina e Antunes-Rocha, (2014) e Bicalho (2018). Ambos os autores destacam uma conquista significativa para o fortalecimento do Procampo, nesse momento, que diz respeito à liberação de códigos de vagas de concurso para docentes de nível superior e técnicos-administrativos, pelo governo federal: 18 vagas para cada instituição, sendo 15 para a primeira categoria e 03 para a segunda. Segundo Anhaia (2015, p. 10), “o Edital Procampo 2012 transforma o curso em política de Estado com código de vagas docente e de técnico especifica para atuar no referido curso e recurso financeiro na matriz da universidade”.

O programa em tela é financiado pelo Governo Federal, via Secretaria de Educação Superior (Sesu), com execução financeira do FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (HAGE; SILVA; BRITO, 2016). Atualmente, está regido pela Resolução/CD/FNDE nº 06 de 17 de março de 2009. Todavia, às vésperas de completar uma década de existência, o programa começou a passar por restrições orçamentárias. Em virtude disso, as universidades federais se esforçam para manter essa política e continuar garantindo o acesso e a permanência dos estudantes, que dependem de recurso financeiro para se sustentarem nos cursos.

Apesar desse percalço, Bicalho (2018) cita alguns acontecimentos que têm contribuído para o fortalecimento dessa política. Trata-se do reconhecimento de diversos grupos de pesquisa pelo CNPq, publicação de teses, dissertações e monografias sobre as LEDOCs e cursos de especialização nas áreas de conhecimento do programa.

A LEDOC propõe uma formação de educadores por área de conhecimento (rompendo com o modelo disciplinar tradicional que o fragmenta). São quatro as áreas compreendidas: Artes, Literatura e Linguagens; Ciências Humanas e Sociais; Ciências da Natureza, Matemática; Ciências Agrárias. Porém, as universidades têm o livre-arbítrio de ofertarem a licenciatura em qualquer uma dessas áreas, ou em mais de uma delas, a depender do interesse e possibilidades de cada instituição. A Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), por exemplo, oferta essa licenciatura nas áreas de Ciências Agrárias e Ciências da Natureza/Matemática (FREITAS; RIOS; LIMA, 2014; VELLOSO et al., 2014), cujos projetos de cursos foram aprovados no edital 02/2012, supramencionado.

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Essa tática de formar professores-educadores de forma ampliada constitui-se um desafio para as universidades, e, ao mesmo tempo, uma novidade acadêmica tanto para os alunos quanto para o corpo docente da LEDOC, posto que, ambos passaram por um modelo de formação disciplinar, tradicionalmente presente nos currículos da Educação Básica e dos cursos de profissionalização docente (MOLINA; SÁ, 2010). Para tais autoras, a formação por área de conhecimento é uma das principais características da licenciatura em tela, enquanto política de habilitação de professores do campo, e uma das suas intenções consiste em “ampliar as possibilidades de oferta da Educação Básica no campo, especialmente no que diz respeito ao Ensino Médio, pensando em estratégias que maximizem a possibilidade das crianças e jovens do campo estudarem em suas localidades de origem” (p.370).

Ademais, o Procampo/LEDOC propõe um modelo curricular diferenciado, em que a formação se dá em regime de alternância (SANTOS; SILVA, 2016), conforme especificado por Bicalho (2018, p. 229),

A organização curricular da Licenciatura em Educação do Campo prevê etapas presenciais, ofertadas em alternância, entre Tempo Escola (TE) e Tempo Comunidade (TC), com intensa articulação entre os aspectos educacionais e a realidade específica das populações camponesas, considerando, entre outros aspectos, o acesso e a permanência dos professores em exercício nas escolas do campo. Tem ainda a intenção de evitar que o ingresso dos estudantes na educação superior signifique deixar de viver no campo.

Essa forma de organizar o currículo foi idealizada no intuito tanto de evitar a evasão nas LEDOCs, fazendo com que os licenciandos que lecionam no campo realizem o curso sem comprometer a prática profissional, como de prevenir o êxodo dos demais estudantes do campo para a cidade, tendo em vista a dificuldade de deslocamento diário para frequentarem as aulas.

De acordo com Molina (2009) e Sá, Molina e Barbosa (2011), ao se tratar da questão da formação profissional no campo, faz-se necessário pensar num projeto político-pedagógico que contemple uma nova matriz científico-tecnológica. Uma educação em conformidade com a lógica da sócioeconomia familiar, para o trabalho no campo coerente com a agricultura camponesa sustentável. Esse público carece de uma formação que lhe ofereça suporte para pensar em projetos de vida, no sentido de encorajar o modo de produção camponês, o que implica fortalecimento das economias locais e regionais, e, consequentemente, da economia nacional, fazendo com que esses agricultores se admitam como sujeitos que contribuem para desenvolvimento da sociedade. Reforçando essa ideia, Bicalho (2018) afirma que:

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[...] é essencial formar educadores comprometidos com o desenvolvimento educacional, cultural, social e econômico dos povos camponeses, para atuação prioritária nas escolas do campo; para promover a gestão de processos educativos escolares e não escolares no campo; para comprometer-se com a educação pública e gratuita atenta aos problemas estruturais que afetam tais escolas; para atentar às questões educacionais oriundas do campo, seus movimentos e projetos educativos, com base nos princípios agroecológicos, visando a sustentabilidade (BICALHO, 2018, p. 232).

Afora as questões já apresentadas, vale ressaltar a importância do programa em destaque para a ampliação do acesso dos sujeitos do campo ao Ensino Superior público, anseio que parecia estar fora do alcance das populações campesinas, tendo em vista que uma das ações propostas pelo programa centra-se em: “promover a formação inicial de educadores e educadoras que atuam em escolas do campo e possuem o ensino médio, sem possibilidades de frequentar uma universidade regularmente” (BRASIL, 2018, s/p).

Esse novo projeto de habilitação preconizado pelo Procampo é inovador e traduz mais uma significativa conquista para a educação dos povos do campo, diferente das ações de formação oferecidas na sua trajetória, em que supervalorizava os costumes e as profissões urbanas, inculcando nos jovens a ideia de que no campo não há espaço nem oportunidades de progresso para quem nele vive e produz. A respeito disso, Menezes (2009) ilustra,

Trata-se de uma vitória política por parte dos movimentos sociais, que ajuda a romper com a hegemonia histórica de um modelo educacional totalmente baseado na cultura e nas necessidades do povo da cidade. Uma das poucas iniciativas desenvolvidas com o objetivo de habilitar legalmente os professores já atuantes no campo, bem como outros sujeitos residentes no campo, que desejam atuar como educadores do campo, numa perspectiva educacional libertadora, cuja base didática e pedagógica se apoia na pedagogia de Paulo Freire.

A educação é concebida por Paulo Freire como arma poderosa para humanizar e conscientizar os sujeitos pertencentes às classes populares (dominadas) da importância de exercerem papel ativo no mundo, de questionar e transformar a sociedade, encorajando-os a buscarem a libertação da opressão sofrida pelas classes dominantes. Assim, estariam se libertando e libertariam o opressor, favorecendo a emancipação humana (MENEZES NETO, 2012; MENEZES; SANTIAGO, 2014).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisarmos a proposta pedagógica das LEDOCs, podemos perceber o seu potencial para a promoção do conhecimento a jovens e adultos campesinos, através de uma formação humana, atrelada ao papel que esses sujeitos podem exercer no mundo produtivo, para que encontrem

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alternativas de permanecer no campo com qualidade de vida e satisfação, evitando o inchaço populacional nos centros urbanos e, consequentemente, uma série de problemas sociais.

Uma formação proposta para o campo não significa valorizar apenas os conhecimentos populares das comunidades rurais, em detrimento ao conhecimento global. Longe disso, deve-se priorizar uma formação ampla e integral para o campo e para o mundo, sem desconsiderar as particularidades inerentes ao território rural, tal como defendia Paulo Freire. Desta feita, a formação de educadores do campo torna-se um desafio. Espera-se que, em meio às dificuldades, o Procampo não siga pelo tradicional caminho das poucas ações implementadas no campo, que objetivavam a formação docente para atuar neste território.

É de extrema importância que o programa consiga cumprir a sua proposta de formação ampliada, focalizando os diversos aspectos: sociais, econômicos, culturais e políticos, de modo que se obtenha, dentro de um prazo razoável, um número significativo de profissionais da Educação do Campo conscientizados do seu papel no mundo e do seu potencial enquanto mediador, que ensina e aprende junto com o educando e, nesse processo, contribui para que este se torne formador de opiniões.

Posto isso, destacamos a necessidade e relevância de se construir indicadores de acompanhamento da política em tela, no âmbito das IES, para que seja possível evidenciar o seu desempenho e resultados. Esta ação pode contribuir para legitimar a efetividade da política perante a sociedade e os agentes implementadores, o que culminará em seu fortalecimento e, por conseguinte, na sua continuidade.

Não deixando de enfatizar a importância da conquista e implementação do Procampo, cumpre-nos destacar que o país ainda precisa avançar muito para conseguir, pelo menos, remediar as carências históricas da Educação do Campo. Para projetos com essa magnitude serem efetivados, outros desafios nesse espaço precisam ser superados, o que se torna possível por meio de ações que proporcionem a esses indivíduos a garantia do direito que lhes assistem: acesso e permanência a uma Educação Básica pública e de qualidade, que considere suas especificidades e no próprio meio onde vivem e tiram o seu sustento.

REFERÊNCIAS

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