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Percepção etnobotânica dos apicultores do município de Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte - Brasil

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE - PRODEMA

CARLOS PIFFERO CÂMARA

PERCEPÇÃO ETNOBOTÂNICA DOS APICULTORES DO MUNICÍPIO DE MARCELINO VIEIRA, RIO GRANDE DO NORTE – BRASIL

FORTALEZA 2019

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CARLOS PIFFERO CÂMARA

PERCEPÇÃO ETNOBOTÂNICA DOS APICULTORES DO MUNICÍPIO DE MARCELINO VIEIRA, RIO GRANDE DO NORTE – BRASIL

FORTALEZA 2019

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente do Programa de Pós - Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA) da Universidade Federal do Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Área de concentração: Ciências Biológicas.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Iracema Bezerra Loiola

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CARLOS PIFFERO CÂMARA

PERCEPÇÃO ETNOBOTÂNICA DOS APICULTORES DO MUNICÍPIO DE MARCELINO VIEIRA, RIO GRANDE DO NORTE – BRASIL

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente do Programa de Pós - Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA) da Universidade Federal do Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Área de concentração: Ciências Biológicas.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________ Profa. Dra. Maria Iracema Bezerra Loiola (Orientadora)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Prof. Dr. Ítalo Antônio Cotta Coutinho Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Prof. Dr. Oriel Herrera Bonilla

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À natureza divina por tudo que me concedeu até aqui.

À minha família, em especial a minha mãe querida Célia Regina, amiga, parceira e sempre presente; a melhor mãe do mundo. Amo você! À minha irmã Cecília, pelo apoio e incentivo nesse e em muitos momentos importantes da minha vida. Amo você! À minha companheira Camila Rocha, pelo carinho e amor, incentivo, alegria, e apoio dedicados durante todo o período que passei focado nesse projeto. Você ilumina meu dia com seu sorriso. Amo você!

Aos apicultores e moradores de Marcelino Vieira, pela acolhida amiga e inclusão nos trabalhos de forma amiga e descontraida. Agradeço imensamente ao Sr. Antônio de Paiva e Dona Valda; os quais me acolheram em casa como filho. Saibam que sem vocês não seria possível fazer esse estudo. Ao Sr. Elzir de Queiroz que me carregou para todo canto da comunidade e auxiliou em muitas atividades da pesquisa, com amizade e alegria; Ao Sr. Francisco Bento; Sr. Willises Ferreira; e Sr. Eudivan Gomes (Vaqueiro); agradeço tempo e disposição ofertados.Saibam que o mundo precisa de mais pessoas como vocês, apicultores sinceros, trabalhadores e produtores junto da natureza.

Ao amigo Fernando Moura por todo auxílio com a estatística, diálogos, conversas e amizade, as quais foram imprescindíveis para conclusão dessa pesquisa. Muito obrigado.

Aos amigos Enio Girão, Helenira Ellery e Joel Sampaio pelo crédito, apoio, auxílio com a logística do trabalho, viagens de campo, em diversos encontros resolutivos e descontraídos. Vocês me ajudaram a sonhar e realizar um sonho.

À Profa. Dra. Maria Iracema Bezerra Loiola, que me recebeu desde o início com carinho e zelo, dedicou seu tempo em diversas orientações necessárias, com assertividade e amizade. Muito obrigado.

Aos amigos do LASEV: Rayane Ribeiro, Valéira Sampaio, Fernanda Melo, Edenilce Batista, e Tatiane Nojosa; que contribuíram durante conversas descontraídas ou quando assistindo a apresentação desse e de outros trabalhos no Lab. Muito obrigado! Em especial gostaria de agradecer à Dra. Luciana Silva Cordeiro, por todas as sugestões e auxílios disponibilizados durante a minha qualificação e nos encontros no laboratório quando solicitei sua ajuda.

Aos colegas do PRODEMA que me inspiraram e compartilharam vários momentos de aprendizagem e amizade. Agradeço a Luiza Teixeira, Lucas Rozzoline, Renata

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Aos professores do PRODEMA que me acolheram e contribuíram com informações, conceitos, significados para minha formação e minha vida. Agradeço imensamente à Prof. Dra. Eliza Zanella, ao Prof. Dr. Levi Sampaio e ao Prof. Dr. José Carlos.

Ao CNPq pelo apoio financeiro com a manutenção da bolsa de auxílio, sem a qual não seria possível o desenvolvimento desse estudo.

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Contra o capitalismo neoliberal e sua megalomania destruidora: aos homens e mulheres desse século, a fim de lembrá-los que a Natureza é mais inteligente que eles, e que devemos preservá-la a exemplo de animais como as abelhas, que atuam sem apegos individuais, tudo em prol do coletivo e do universo.

Tudo que for da Natureza é do patrimônio cósmico. Nada pertence ao homem.

Ele só tem o direito de seu usufruto, retribuindo com sua parte. Adaptado de L. R. Schirmer (1985)

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RESUMO

Marcelino Vieira é um município do sudoeste do estado do Rio Grande do Norte que possui tradição na produção apícola, em contraste com a crescente prerrogativa de degradação ambiental e diminuição da biodiversidade com a expansão das cidades e áreas agrícolas sobre áreas preservadas. Os objetivos do estudo foram identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores possuem sobre a flora da Caatinga e descrever a percepção deste quanto ao uso dos recursos vegetais florestais e as mudanças climáticas. As ações foram realizadas no período de março a julho/2018, e, através de amostragem não-probabilística, foram selecionados 20 apicultores a partir dos dados da Associação Comunitária Jefferson Fernandes de Medeiros. As percepções dos entrevistados sobre mudanças climáticas e florestas foram levantadas buscando complementar informações em relação ao meio ambiente local. Para a obtenção de dados sobre o uso das espécies conforme oito descritores (alimentar, melífero, medicinal, madeireiro, místico, combustível, forragem e outro uso particular), a percepção sobre as florestas e as mudanças climáticas utilizou-se a observação participante, lista livre, turnê guiada, diário de campo e aplicação de formulário estruturado de acordo com o Parecer CEP nº 2.698.897. Os dados foram tratados e agrupados no Excel utilizando o Valor de Uso (VU) para análise exploratória no ambiente “R”. O maior número de citações foi no descritor melífero, sendo citadas 93 espécies com potencial apícola para a região, das quais 86% são nativas e 19 são endêmicas do Brasil. Combretum leprosum/ Mofumbo (1.85) e

Croton sonderianus/ Marmeleiro (1.8) foram as espécies com maior importância para a

apicultura local. O descritor medicinal obteve a segunda maior citação, 54 espécies, destacando-se Anacardium occidentale/ Cajueiro (0.45); Myracrodrum urundeuva/ Aroeira (0.4); Ximenia americana/ Ameixa (0.35). Conclui-se que os apicultores de Marcelino Vieira detêm importante conhecimento dos recursos naturais, desenvolvendo atividade que favorece a conservação da Caatinga e gera desenvolvimento regional. Além disso, as informações obtidas para o município indicam a necessidade de programas de preservação e conservação das espécies nativas, valorizando a cultura popular e protegendo a biodiversidade da Caatinga.

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Marcelino Vieira is a municipality in the southwest of the state of Rio Grande do Norte that has a tradition in beekeeping production, in contrast to the increasing prerogative of environmental degradation and diminished biodiversity with the expansion of cities and agricultural areas over preserved areas. The objectives of the study were to identify the ethnobotanical knowledge that beekeepers have about the Caatinga flora and to describe its perception regarding the use of forest plant resources and climate change. The actions were carried out from March to July/ 2018, and through non-probabilistic sampling, 20 beekeepers were selected from the data of the Jefferson Fernandes de Medeiros Community Association. Respondents' perceptions of climate change and forests were raised seeking to complement information regarding the local environment. To obtain data on the use of species according to eight descriptors (food, honey, medicinal, timber, mystic, fuel, fodder and another particular use), the perception of forests and climate change was based on participant observation, free list, guided tour, field diary and structured form application in accordance with CEP Opinion No. 2,698,897. Data were processed and grouped in Excel using the Use Value (VU) for exploratory analysis in the “R” statistic. The largest number of citations was in the honey descriptor, being cited 93 species with apicultural potential for the region, of which 86% are native and 19 are endemic from Brazil. Combretum leprosum/ Mofumbo (1.85) and Croton

sonderianus/ Marmeleiro (1.8) were the most important species for local beekeeping. The

medical descriptor obtained the second largest citation, 54 species, highlighting Anacardium

occidentale/ Cajueiro (0.45); Myracrodrum urundeuva/ Aroeira (0.4); Xymenia americana/

Ameixa (0.35). It is concluded that beekeepers of Marcelino Vieira have important knowledge of natural resources, developing activity that favors the conservation of Caatinga and generates regional development. In addition, the information obtained for the municipality indicates the need for preservation and conservation programs for native species, valuing popular culture and protecting Caatinga biodiversity.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Mapa de localização do município de Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte, Brasil. ... 20

Figura 2 - Imagens dos sítios onde foram realizadas as turnês guiadas no município de Marcelino Vieira – RN. A - Sítio 1: Várzea do Canto; B - Sítio 2: Caboré; C - Sítio 3: Varzinha; e Sítio 4: Junco. ... 21 Figura 3 - Histograma e Bloxpot das espécies vegetais citadas nas listas livres 1 e 2 em

Marcelino Vieira - RN: A - Boxplot indicando outlines e os quartis (3° quartil 0.41 valores de corte) e intervalo de confiança de 95% para os valores de uso (VU), n = 72 espécies. B - Histograma indicando a distribuição de

frequências dos valores de uso (VU).

... 26 Figura 4 - Mapa de localização do município de Marcelino Vieira - RN, nordeste do

Brasil... 35 Figura 5- Percentual das espécies úteis identificadas pelos apicultores do município de

Marcelino Vieira, conforme cinco descritores: alimentício, combustível,

forragem, madeireiro e medicinal.

... 41 Figura 6 - - Principais famílias botânicas identificadas pelos apicultores do município de

MarcelinoVieira... 41 Figura 7 - - Bloxpot e Histograma das espécies vegetais citadas, confome VU das listas

livres 1 e 2, informações disponibilizdas pelos apicultores de Marcelino Vieira - RN: A - Boxplot indicando média 0,21 (+ 0.45) e intervalo de confiança de 95% para os valores de uso (VU), n = 68 espécies. B – Histograma indicando a distribuição de frequências dos valores de uso (VU). ... 46

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1  Principais espécies vegetais melíferas citadas nas listas livres pelos apicultores de Marcelino Vieira, - RN. ... 24 Tabela 2  Lista das espécies vegetais citadas apenas durante a realização de turnê

guiada no município de Marcelino Vieira - RN. ... 28 Tabela 3  Lista livre 1: espécies vegetais medicinais citadas pelos apicultores de

Marcelino Vieira - RN. ... 38 Tabela 4  Principais espécies medicinais citadas pelos apicultores conforme VU ≥

0.2, em Marcelino Vieira - RN. ... 42 Tabela 5  Similaridade das principais espécies medicinais, conforme VU ≥ 0.2,

citadas para Marcelino Vieira - RN, em relação a outras publicações realizadas na Caatinga. ... 42 Tabela 6  Lista livre 2: espécies vegetais citadas como úteis para outros fins,

incluindo descritor medicinal, conforme ocorrência na tabela 1. Legenda: MA (Madeireiro); ME (Medicinal); AL (Alimentício); FO (Forragem); CO (Combustível). ... 44

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2 CAPÍTULO 1 - PERCEPÇÃO ETNOBOTÂNICA ASSOCIADA À

APICULTURA: ESPÉCIES VEGETAIS COM POTENCIAL

MELÍFERO PARA O SEMIÁRIDO POTIGUAR... 17

2.1 Introdução... 18

2.2 Metodologia... 19

2.2.1 Delimitação e caracterização da área de estudo... 19

2.2.2 Métodos e técnicas... 22

2.2.3 Análise de dados... 23

2.3 Resultados e discussão... 23

2.4 Conclusões... 29

3 CAPÍTULO 2 - PERCEPÇÃO ETNOBOTÂNICA ASSOCIADA À APICULTURA: USO DOS RECURSOS FLORESTAIS E MUDANÇAS CLIMÁTICAS NA CAATINGA POTIGUAR... 31

3.1 Introdução... 33

3.2 Metodologia... 34

3.2.1 Delimitação e caracterização da área de estudo... 34

3.2.2 Métodos e técnicas... 36

3.2.2.1 Identificação e dados socioeconômicos dos apiculatores... 36

3.2.2.2 Informações sobre o uso dos recursos florestais e as mudanças climáticas..... 36

3.2.3 Análise de dados... 37

3.3 Resultados e discussão... 38

3.4 Conclusões... 48

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 49

REFERÊNCIAS ... 51

APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)... 59

APÊNDICE B – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA USO DE IMAGENS (FOTOS)... 61

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1 INTRODUÇÃO GERAL

A apicultura é a ciência ou arte de criar abelhas da espécie Apis mellifera Linnaeus, 1758 (Hymenoptera, Apidae), a partir do desenvolvimento de técnicas para explorá-las racionalmente em benefício do homem e da natureza (Pegoraro et al., 2017). Essa atividade preenche todos os requisitos do tripé da sustentabilidade: o econômico, porque gera renda para os agricultores; o social, porque utiliza a mão de obra familiar no campo, diminuindo o êxodo rural; e o ecológico, porque não se desmata para criar abelhas, preservando a flora da melhor forma possível para que possam ser colhidos o mel e a própolis, produtos conhecidos e utilizados em praticamente todo o mundo (Guimarães, 1989).

Além desses, outros produtos são disponibilizados pelas abelhas como o pólen apícola, a cera, a apitoxina e a geléia real, gerando benefícios diretos ao ser humano. Beneficios indiretos também vêm sendo identificados no tocante a polinização das culturas de interesse econômico e de espécies vegetais nativas. As abelhas e outros polinizadores conservam as espécies vegetais nativas que auxiliam na preservação da água, servem de alimentos para o homem; e participam no equilíbrio biológico da natureza na relação entomofauna e avifauna (Pegoraro et al., 2017).

Conforme relataram Santos e Ribeiro (2009):

As abelhas são um dos insetos que mais proporcionam retornos econômicos para o homem, […] influenciando na disponibilidade de alimentos, questões religiosas, medicinais, culturais e ambientais, apresentando importante relação com a floresta através da ação polinizadora, auxiliando assim na disponibilidade de alimentos que são fundamentais como fonte de sobrevivência para os homens e outros animais.

A apicultura, considerada uma atividade sustentável importante no quesito benefícios a espécie humana e a outros seres vivos (Guimarães, 1989; Santos e Ribeiro, 2009; Pegoraro et al., 2017), vem crescendo no nordeste do Brasil (Milfont, Freitas e Alves, 2011), estando atrelada a polinizadores, especialmente a espécie Apis mellifera, que fornecem serviços ecossistêmicos essenciais para a reprodução e manutenção da diversidade de espécies de plantas nativas e podem aumentar a produção e qualidade das culturas de frutas e hortaliças (Freitas et al., 2015).

Entretanto, deve-se salientar que atualmente as abelhas e os serviços prestados por sua ação polinizadora estão sob ameaça devido a intensificação do uso da terra, a expansão do

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crescimento da população humana (Marques et al., 2015; Picanço et al., 2017) e do uso inadequado de herbicidas e pesticidas (Freitas e Pinheiro, 2012; Freitas et al., 2015; Potts et al., 2016). Atrelado a esse panorama, as mudanças climáticas aparecem com possibilidades assertivas de piorar esse cenário, causando uma crise múltipla na medida em que afetam os recursos naturais e o meio ambiente, gerando um impacto econômico que ainda não pode ser quantificado (Blank, 2015).

Assim, um desdobramento preocupante das mudanças do clima e da perda de biodiversidade é justamente o declínio de polinizadores, responsáveis por esse serviço ambiental em inúmeras culturas vegetais das quais se servem humanos e animais (Garófalo, 2013; Azevedo, 2016; Wolowski et al., 2019). As culturas agrícolas, por exemplo, têm diferentes graus de dependência por polinizadores de animais, sabe-se que, em uma escala mundial, 75% dos principais cultivos necessitam da polinização, enquanto que a flora silvestre depende entre 78% a 94% (Wolowski et al., 2019). No Brasil, 60% das culturas agrícolas (85 de 141) são dependentes de polinizadores (Giannini et al., 2015). De modo geral, o serviço ecossistêmico prestado pelos animais polinizadores à agricultura brasileira (67 cultivares) contribuiu com um valor econômico estimado de R$ 43 bilhões em 2018 (Wolowski et al., 2019).

O Brasil é considerado um dos sete países com os maiores índices de biodiversidade, sendo o primeiro do ranking quanto ao número de plantas, além de ser um país com grande diversidade de etnias indígenas, remanescentes de quilombos, caiçaras, ribeirinhos, jangadeiros, dentre outras. Estudar a concepção humana sobre as plantas e suas relações, é uma importante forma de conservação da integridade e conhecimento das comunidades tradicionais de acordo com Centro de Estudos Etnobotânicos e Etnofarmacológicos (CEE, 2007).

O conhecimento popular sobre o uso das espécies vegetais nativas pode contribuir para a conservação no que diz respeito à adoção de práticas de manejo, além de auxiliar no resgate e preservação da cultura popular (Hanazaki, 2002). Esse conhecimento popular é estudado pela etnobotânica, uma ferramenta valiosa na identificação de problemas, potencialidades e limitações de espaços específicos, possibilitando, também, a realização de estudos prospectivos para ambientes sustentáveis pautados no conhecimento tradicional de base agroecológica (Albuquerque, Lucena e Cunha, 2010)

O termo “etnobotânica” foi usado pela primeira vez em 1895 pelo botânico americano William Harshberger (Albuquerque, 2005) para designar o estudo da relação entre

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os humanos e as plantas utilizadas por eles. É ainda definida como sendo o campo de estudo que analisa o resultado da manipulação de plantas ou partes vegetais por culturas tradicionais, assim como, o contexto cultural em que cada planta é utilizada (Balick and Cox, 1997).

A etnobotânica, como vertente da etnobiologia, especialmente com enfoque quantitativo, tem dado grandes contribuições na compreensão das inter-relações homem/planta. Essa ciência possibilita desvendar formas específicas de manejo dos recursos naturais em cada ecossistema, bem como descobrir quais plantas apresentam um alto grau de importância econômica e cultural para as comunidades, sendo estas, reflexo de suas potencialidades, e aliado a estes fatores, propõe a elaboração de estratégias que garantam a conservação da diversidade local (Albuquerque et al., 2005). Nesse cenário científico, o papel das populações locais tem sido ressaltado como de fundamental importância para o manejo de recursos naturais, desenvolvimento sustentável e criação de unidades de conservação (Albuquerque, Lucena e Cunha, 2010).

Dada a atual situação de perda de biodiversidade é vital que se envidem esforços para sua conservação, não apenas em unidades legalmente protegidas, mas também nas paisagens culturalmente transformadas (Amoroso, 2007). Há uma necessidade de criar estudos para uma melhor compreensão especialmente do bioma Caatinga, de sua diversidade biológica e cultural, e para a conservação da biodiversidade de espécies vegetais e animais (Albuquerque, 2002), uma vez que a vegetação de Caatinga e os polinizadores vêm sofrendo sucessivas perdas de área nativa e grande parte de seus recursos florais estão desaparecendo permanentemente (Brasil e Brasil-Guimarães, 2018).

A atividade apícola no município de Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte, que teve início em 1991 por agricultores e pecuaristas, está organizada atualmente através de uma associação e uma cooperativa, que desenvolvem ações que aliam preservação da vegetação caatinga e produção de mel de abelha. Essa atividade desenvolvida de forma individual e coletiva, a qual alia polinizadores a vegetação nativa, apresenta-se como importante espaço para estudos etnobotâncos, pois resguarda informações culturais sobre a compreensão dos apicultores sobre a Caatinga e usos da vegetação, frutos do conhecimento de quem necessita da flora para desenvolver suas atividades com êxito.

A partir dessas informações, algumas perguntas norteadoras desse trabalho foram: 1) os apicultores de Marcelino Vieira são detentores de elevado conhecimento sobre a diversidade de plantas melíferas nativas; 2) os apicultores de Marcelino Vieira utilizam

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grande diversidade de plantas, fato esse que contribui com a atividade apícola, na cura de doenças, na segurança alimentar e na geração de renda das famílias, oportunizando uma melhor qualidade de vida, aliada a conservação ambiental; 3) a identificação de espécies existentes na área demonstram um conhecimento importante dos recursos vegetais úteis, bem como um parâmetro para avaliação do grau desse conhecimento etnobiológico da comunidade local; 4) Os apicultores tem relevante percepção sobre mudanças no clima no local e associam essa mudança com a diminuição das florestas.

O objetivo do presente estudo foi identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores de Marcelino Vieira possuem sobre a flora do semiárido Potiguar, a vegetação de Caatinga e as mudanças climáticas.

A dissertação foi estruturada em uma introdução geral e dois capítulos, de forma que os dois estão em formato de artigos científicos. O capítulo 1, com o título “Percepção etnobotânica associada à apicultura: espécies vegetais com potencial melífero para o Semiárido Potiguar “ teve como objetivo identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores possuem sobre a flora melífera em Marcelino Vieira, município do sudoeste do estado do Rio Grande do Norte que possui tradição na produção apícola. Este artigo foi submetido à revista Sociedade & Natureza, que tem Qualis A2 (quadriênio 2013-2016) na área de Ciências Ambientais. O capítulo 2, com o título “Percepção etnobotânica associada à apicultura: uso dos recursos florestais e mudanças climáticas na Caatinga Potiguar“ teve como objetivo identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores possuem sobre as espécies medicinais do semiárido e outros descritores relacionados aos recursos florestais da Caatinga. Este artigo será submetido à Gaia Scientia, que tem Qualis B1 (quadriênio 2013-2016) na área das Ciências Ambientais.

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CAPÍTULO 1 - PERCEPÇÃO ETNOBOTÂNICA ASSOCIADA À APICULTURA: ESPÉCIES VEGETAIS COM POTENCIAL MELÍFERO PARA O SEMIÁRIDO POTIGUAR.

RESUMO

Este estudo objetivou identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores possuem sobre a flora melífera em Marcelino Vieira, um município do sudoeste do estado do Rio Grande do Norte que possui tradição na produção apícola, em contraste com a crescente prerrogativa de degradação ambiental e diminuição da biodiversidade com a expansão das cidades e áreas agrícolas sobre áreas preservadas. As ações do presente estudo foram realizadas durante o período de março a julho/2018. Através de amostragem não-probabilística foram selecionados 20 apicultores com base em dados da Associação Comunitária Jefferson Fernandes de Medeiros. Para a obtenção de dados etnobotânicos utilizou-se observação participante, lista livre, turnê guiada, diário de campo e aplicação de formulário estruturado, de acordo com o Parecer CEP nº 2.698.897. Os apicultores citaram 93 espécies com potencial apícola para a região, sendo 86% nativas no Brasil e 19 endêmicas da Caatinga, distribuídas em 37 famílias botânicas, com destaque para Fabaceae que abrange 21% das espécies. Conforme o Valor de Uso (VU ≥ 0.4), Combretum leprosum (1.85) e

Croton sonderianus (1.8) foram identificas como as espécies de maior importância para a

apicultura local. Espera-se que as informações obtidas possam contribuir para um melhor desempenho da apicultura regional, com a conservação das plantas da Caatinga e a valorização dos saberes dos apicultores do alto-oeste potiguar do nordeste brasileiro.

Palavras-chave: Apis mellifera. Caatinga. Desenvolvimento local. Flora. ABSTRACT

This study aimed to identify the ethnobotanical knowledge that beekeepers have about the honey flora in Marcelino Vieira, a southwestern municipality of the state of Rio Grande do Norte, which has a tradition in bee production, in contrast to the increasing prerogative of environmental degradation and decreased biodiversity, with the expansion of cities and agricultural areas over preserved areas. The actions of this study were performed from March to July / 2018. Through non-probabilistic sampling, 20 beekeepers were selected based on data from the Jefferson Fernandes de Medeiros Community Association. In order to obtain data, we used participant observation, free list, guided tour, field diary and application ofstructured form, according to Opinion CEP No. 2,698,897. Beekeepers cited 93 species with beekeeping potential for the region, of which 86% are native, of which 19 are Caatinga endemic, distributed in 37 botanical families, highlighting Fabaceae, which covers 21% of the species. According to the Use Value (VU ≥ 0.4), some species stood out, among them Combretum leprosum (1.85) and Croton sonderianus (1.8) were identified as the most important for local beekeeping. It is hoped that the information obtained may contribute to a better performance of the regional beekeeping, with the conservation of Caatinga plants and the valorization of the knowledge of the Potiguar beekeepers of Northeastern Brazil.

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2.1 Introdução

A Caatinga, ou Savana estépica (IBGE, 2012), é o tipo vegetacional dominante na região Nordeste e um dos maiores e mais importantes ecossistemas brasileiros (Bessa e Medeiros, 2011). O clima da região, aliado à diversidade e abundância da flora existente, propicia condições adequadas para o sucesso das abelhas africanizadas (Freitas, 1991; Lima, 1995) e de espécies nativas (Brasil e Brasil-Guimarães, 2018).

A apicultura é uma atividade sustentável importante no quesito benefícios a espécie humana e a outros seres vivos (Guimarães, 1989; Santos e Ribeiro, 2009; Pegoraro et al., 2017), a qual vem crescendo no nordeste do Brasil (Milfont, Freitas e Alves, 2011), região considerada detentora de um dos maiores potenciais apícolas no mundo (Ximenes, 2011; Coradin, Camillo e Pareyn, 2018). Essa atividade está atrelada a polinizadores, especialmente

Apis mellifera Linnaeus, 1758, que fornecem serviços ecossistêmicos essenciais para a

reprodução e manutenção da diversidade de espécies de plantas e podem aumentar a produção e qualidade das culturas de frutas e hortaliças (Freitas et al., 2015).

De modo geral, uma função ecossistêmica gera um determinado serviço ecossistêmico quando os processos naturais subjacentes desencadeiam uma série de benefícios, direta ou indiretamente apropriáveis pelo ser humano, incorporando a noção de utilidade antropocêntrica. Uma função ecossistêmica pode ser definida como constantes interações entre os elementos estruturais, como: transferência de energia, ciclagem de nutrientes, regulação de gás, regulação climática, ciclo de água entre outros (Andrade e Romeiro, 2009). Em outras palavras, uma função passa a ser considerada um serviço ecossistêmico quando esta apresenta possibilidade/potencial de ser utilizada para fins humanos (Hueting et al., 1997; Andrade e Romeiro, 2009), o que ocorre durante a atividade apícola.

O conhecimento dos apicultores sobre as plantas que compõem a dieta alimentar das abelhas, denominadas de plantas melíferas (Coradin, Camillo e Pareyn, 2018) ou flora apícola, é essencial para assegurar a viabilidade econômica da atividade (Aleixo et al., 2014; Costa et al., 2018), como também para preservação da Caatinga, através da conservação e diversificação de espécies (Benevides e Carvalho, 2009; Serra et al., 2017).

Entretanto, deve-se salientar que atualmente as abelhas e o serviço prestado por sua ação polinizadora estão sob ameaça devido a intensificação do uso da terra, a expansão do crescimento da população humana (Marques et al., 2015; Picanço et al., 2017) e do uso

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inadequado de herbicidas e pesticidas (Freitas e Pinheiro, 2012; Freitas et al., 2015; Potts et al., 2016). Na Caatinga, os recursos florais e, consequentemente, os polinizadores, vêm sofrendo sucessivas perdas de área nativa e grande parte de seus recursos florais estão desaparecendo permanentemente (Brasil e Brasil-Guimarães, 2018).

Nesse contexto, o conhecimento popular sobre o potencial de uso das espécies vegetais nativas pode contribuir para a sua conservação no que diz respeito à adoção de práticas de manejo, além de contribuir para o resgate e preservação da cultura popular (Hanazaki, 2002).

A região Nordeste vem recebendo destaque no cenário nacional em sua produção apícola, obtendo o segundo lugar no ranking, com 32,6% do mel brasileiro, atrás apenas da região Sul em 2015 e 2017 (IBGE, 2015, 2018). Atrelado a isso, o Rio Grande do Norte vem ampliando sua produção, alcançando, em 2017, a quantia de 208 ton de mel, entre outros produtos apícolas, ficando atrás apenas dos estados do Piauí, Ceará, e Maranhão (IBGE, 2018). Este protagonismo do estado do Rio Grande do Norte se deve, dentre outros fatores, à existência do primeiro e único curso técnico de apicultura ofertado por um Instituto Federal (Globo Rural, 2018), sediado em Pau dos Ferros, município circunvizinho à Marcelino Vieira.

Considerando que a produção apícola vem sendo desenvolvida há quase três décadas nesta região do semiárido Potiguar, proporcionando um acúmulo de informações sobre a flora da Caatinga e fonte de renda para a população local, o presente estudo teve como objetivo identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores possuem sobre a flora melífera no município de Marcelino Vieira, localizado no sudoeste do estado do Rio Grande do Norte, região Nordeste do Brasil.

2.2 Metodologia

2.2.1 Delimitação e Caracterização da área de estudo

Marcelino Vieira (6°17'38,4"S 38°10'01,2"O) é um dos municípios do estado do Rio Grande do Norte, e dista 404 km da cidade de Natal, sua capital. O município faz limite a norte com Pau dos Ferros, ao sul com Tenente Ananias, a leste com Pilões, Antônio Martins e Alexandria e a oeste com os municípios de José da Penha e Rafael Fernandes (Beltrão et al., 2005). Ocupa uma área de 345,711 km² e sua população no censo de 2010 era de 8.265

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habitantes, sendo o 79º mais populoso do estado, dentre os 167 municípios reconhecidos para o estado (IBGE, 2016).

Figura 1 - Mapa de localização do município de Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte, Brasil.

Fonte: Base Cartográfica IBGE (2015).

O clima da região é do tipo semiárido quente (BSh), de acordo com a classificação climática de Köppen-Geiger, com temperatura média anual de 26,5 °C e precipitação média de 843 milímetros (mm) anuais, concentrados entre os meses de fevereiro e maio (IDEMA, 2008; Climate-Data, 2017). A umidade relativa do ar é de 66% e o tempo de insolação chega a 2.700 horas anuais (IDEMA, 2008).

De acordo com o mapa de uso e ocupação do solo de Marcelino Vieira elaborado pelo Inventário Florístico Apícola Georreferenciado (IFAG, 2017), a cobertura vegetal do município é constituída por Caatinga hiperxerófila (30%) e hipoxerófila (28%), com alto percentual de vegetação em recuperação (23%) e solo exposto (16%). A Caatinga hiperxerófila se caracteriza por ter abundância de cactáceas e plantas de pequeno porte, ficando a maioria sem folhas na estação seca (Beltrão et al., 2005; IDEMA, 2008). Já a Caatinga hipoxerófila é formada por espécies arbustivo-arbóreas mais ou menos densa, com

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ou sem cactáceas (UFPB, 1985), fazendo‐se também presentes espécies da mata úmida (Alves, 2008). Dados recentes do Serviço Florestal Brasileiro (SFB, 2018) indicam que o município possui atualmente 15,85% de florestas naturais.

Para a obtenção das informações sobre as plantas melíferas, foram feitas turnês guiadas em quatro áreas distintas (sítios) dentro do território do município de Marcelino Vieira– RN (Figura 2). Sítio 1: Várzea do Canto (6°18'50" S, 38°09'83" O); Sítio 2: Caboré (6°31'10" S, 38°16'99" O); Sítio 3: Varzinha (6°37'33" S, 38°16'16" O) e Sítio 4: Junco (6°33'52" S, 38°17'24" O). No sítio 1 foram observadas áreas com caatinga hiperxerófila (predomínio) e hipoxerófila, mata de galeria, áreas de plantio de culturas anuais como milho e sorgo; uma pequena área lacustre (açude), e quintais produtivos próximo as casas. No sítio 2, Caatinga hiperxerófila, com plantio de cultura anuais como milho. No sítio 3, áreas de Caatinga hipo (predomínio) e hiperxerófila, mata galeria, e áreas com plantio de culturas anuais como milho e abóbora, e quintais produtivos próximos as casas. No sítio 4, predomina a Caatinga hiperxerófila e uma grande área lacustre (açude Marcelino Vieira, principal reservatório da cidade).

Figura 2 – Imagens dos sítios onde foram realizadas as turnês guiadas no município de Marcelino Vieira – RN. A - Sítio 1: Várzea do Canto; B - Sítio 2: Caboré; C - Sítio 3: Varzinha; e Sítio 4: Junco.

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2.2.2 Métodos e técnicas

O estudo foi amparado por parâmetros qualitativos e quantitativos. A base qualitativa ou descritiva foi realizada através da observação participante, questionário estruturado e diário de campo (Albuquerque, Lucena e Cunha, 2010; Minayo, 2013). A base quantitativa foi obtida através da turnê guiada e listas livres (Albuquerque, Lucena e Cunha, 2010). O termo “etnoespécie” ou “folk” foi utilizado durante a identificação do conhecimento dos entrevistados acerca da flora local (Hanazaki et al., 2000).

A identificação dos apicultores foi feita através da técnica de amostragem não probabilística, selecionado aqueles registrados na Associação Jerfferson Fernandes de Medeiros, que representa a única Associação dos apicultores de Marcelino Vieira. Foram entrevistados 20 apicultores na faixa etária dos 19 aos 84 anos de idade e esta amostra correspondeu a 83% dos atuais apicultores do município. Cada um dos entrevistados, individualmente, se voluntariou a participar da pesquisa e assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), conforme Resolução CNS nº466/2012, após a aceitação e a compreensão dos objetivos da pesquisa, procedimentos e eventuais riscos, de acordo com o parecer CEP nº 2.698.897.

As coletas de dados socioeconômicos, informações sobre as espécies melíferas, listas livres 1 e 2, e a atividade apícola, foram obtidas através de formulário estruturado (Albuquerque, Lucena e Cunha, 2010), com perguntas abertas e fechadas. As entrevistas foram realizadas no período de maio a junho/2018, conforme disponibilidade de horário dos entrevistados. A lista livre 1 foi originada com base na pergunta do formulário estruturado: Quais as plantas melíferas do semiárido que o senhor conhece? Já a lista livre 2, a partir da pergunta: Na sua percepção, quais seriam as cinco espécies de plantas mais importantes para a apicultura em Marcelino Vieira?

As amostras vegetais foram obtidas durante os meses de abril a junho/2018, por meio da técnica turnê guiada (Albuquerque, Lucena e Cunha, 2010), que consistiu na indicação e coleta de amostras botânicas férteis realizadas na companhia de um ou mais entrevistados. Essas amostras vegetais foram herborizadas seguindo a metodologia de Bridson e Forman (1998) e identificadas através de consultas a bibliografias especializadas e/ou por comparação com exemplares do Herbário Prisco Bezerra - EAC, da Universidade Federal do Ceará, Fortaleza - CE. Também foram usadas as informações obtidas pelo Inventário Florístico Apícola Georreferenciado (IFAG, 2017), cujas amostras estão depositadas no

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Herbário Prof. Francisco José de Abreu Matos - HUVA, da Universidade Estadual Vale do Acaraú, Sobral-CE, para complementar as listas livres 1 e 2 e a lista da turnê guiada.

Para a grafia correta dos nomes dos táxons, a origem, endemismo e o hábito das espécies identificadas foi utilizado o banco de dados da Flora do Brasil 2020 em construção (2019).

2.2.3 Análise de dados

Os dados quantitativos foram tratados e agrupados no Excel. O Valor de Uso (VU) das espécies identificadas foi calculado através da razão entre o somatório das citações de uso para uma determinada espécie e o número total de informantes, através da fórmula proposta por Phillips e Gentry (1993).

Para o cálculo do Valor de Uso de cada espécie (VUs) foi utilizada a fórmula VUs = ΣVUis/n, onde VUis equivale ao valor de uso de uma espécie para um informante e n é o número total de informantes entrevistados. Logo, quanto maior o número de usos mencionados para a espécie, maior será a sua importância (Vendruscolo e Mentz, 2006).

As 72 espécies citadas nas listas livres 1 e 2, que apresentaram valor de uso, foram submetidos à análise exploratória, elaborando-se gráficos para evidenciar a distribuição das frequências dos valores de uso (VU) e feito o teste de normalidade de Shapiro-Wilk, utilizando o ambiente “R” (R Core Team, 2019). Através do delineamento estatístico verificou-se que cerca de 75% dos valores de uso obtidos foram abaixo de 0.41. Essa informação foi utilizada para o valor de corte ao definir as principais espécies citadas, gerando duas categorias: 20 espécies com VU > 0.4; e 52 espécies, com VU < 4. Para a análise comparativa do gráfico de frequências do VU utilizou-se como referência Crawley (2013).

2.3 Resultados e Discussão

Os 20 apicultores entrevistados são do sexo masculino e moram em domicílios rurais (70%), com fácil acessibilidade. Entre os entrevistados, a maioria possui propriedade rural (75%) que variaram entre 9 a 257 hectares.

A principal atividade econômica da maiora dos entrevistados (80%) não é a apicultura. Estes relataram que desenvolvem diversas outras atividades econômicas como a principal fonte de renda como a pecuária e a agricultura (20%), funcionlismo público (10%),

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aposentados pelo INSS (10%), entre outras. Entretanto, a grande maioria dos entrevistados (90%) afirmou que as plantas melíferas são muito importantes para eles e 55% afirmaram que a criação de abelhas é valorosa como fonte de renda secundária.

Com base nas citações dos entrevistados, um total de 93 espécies apresentaram potencial apícola para a região, das quais 72 espécies foram identificadas através das listas livres e apenas 21 com base nas turnês guiadas. De acordo com a literatura, 58% do total de espécies são relatadas como fornecedoras de néctar e pólen, 25% apenas de néctar e 15% de pólen. Apenas para 2% das espécies vegetais não foi identificada nenhuma fonte do recurso; entretanto, foram encontradas citações de que essas plantas eram visitadas por Apis mellifera.

As espécies identificadas representam 37 famílias botânicas e a maioria é nativa (86%), apresentando considerável nível de endemismo no território brasileiro (20%). Entre as famílias mais representativas em número de espécies destacaram-se Fabaceae (22%), Anacardiaceae (7%), Euphorbiaceae (7%), Amaranthaceae, Lamiaceae e Malvaceae (5% cada). Quanto ao tipo de hábito, o herbáceo (45%) foi predominante, seguido do arbóreo (38%), liana (9%), subarbusto (6%) e cactáceas (2%).

Considerando o Valor de Uso (VU ≥ 0.4), 20 espécies vegetais foram consideradas as mais relevantes para a apicultura em Marcelino Vieira (Tabela 1). Quase a totalidade destas espécies são nativas (95%) e apenas Prosopis juliflora/Algaroba (Fabaceae) é exótica (naturalizada).

Tabela 1 – Principais espécies vegetais melíferas citadas nas listas livres pelos apicultores de Marcelino Vieira, no Rio Grande do Norte, em 2018. OR= origem: NA= nativa; * = Endêmica do Brasil; EX = Exótica. Hábito: AR = Arbóreo; SA= Subarbustivo VU = Valor de Uso; Recurso Floral: N = Néctar; P = Pólen; (Freitas, 1991)1; (Milfont, Freitas e Alves; 2011)2; (Rede de catálogos polínicos online, 2019)3; (IFAG, 2017)4. RI = Referências

identificação: HUVA = Herbário Francisco José de Abreu – UVA; il. = identificada no local. Família Espécie (Nome Científico e

Popular)

OR Hábito VU RF RI

Amaranthaceae Alternanthera brasiliana (L.)

Kuntze (Cabeça-de-velho)

NA Erva 0.7 N/P1,3,4 21229 HUVA

Alternanthera brasiliana

var.villosa (Moq.) Kuntze (Cabeça-de-velho)

NA Erva 0.7 N/P2,4 20542

HUVA Anacardiaceae Myracrodruon urundeuva Allemão

(Aroeira) NA AR 0.9 N/P1,2,3,4 21425 HUVA Anacardium occidentale L. (Cajueiro) NA AR 0.5 N/P1,2,3,4 21412 HUVA Chrysobalanaceae Microdesmia rigida (Benth.)

Sothers & Prance (Oiticica)

NA* AR 0.45 N/P1,3,4 21413 HUVA Combretaceae Combretum leprosumMart.

(Mofumbo)

NA AR 1.85 N/P1,3,4 20538 HUVA

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Família Espécie (Nome Científico e Popular)

OR Hábito VU RF RI

Convolvulaceae Ipomoea bahiensis Wild. Ex.

Roem. & Schult. (Jetirana)

NA* Liana 0.7 N/P2,3,4 20543 HUVA

Jacquemontia gracilima (Choisy)

Hallier f. (Jetirana)

NA* Liana 0.7 N/P3,4 20544 HUVA

Merremia aegyptia (L.) Urb.

(Jetirana)

NA Liana 0.7 N/P3,4 20540 HUVA Euphorbiaceae Croton sonderianus Müll. Arg.

(Marmeleiro)

NA* SA 1.8 N/P1,2,3,4 il.

Croton heliotropiifolius Kunth.

(Velame)

NA SA 1.25 N/P2,4 20571

HUVA Fabaceae Anadenanthera colubrina (Vell.)

Brenan. (Angico)

NA AR 1.1 N1,2,3,4 21484 HUVA

Mimosa tenuiflora (Willd.) Poir.

(Jurema-preta)

NA AR 0.45 N/P1,2,3,4 21424 HUVA

Poincianella pyramidalis (Tul.)

L.P. Queiroz (Catingueira) NA* AR 0.5 N1,2,3,4 20553 HUVA Prosopis juliflora (Sw.) DC. (Algaroba) EX AR 0.4 N/P1,2,3,4 20572 HUVA

Senna uniflora (Mill.)

H.S.Irwin&Barneby (Mato-pasto)

NA Erva 0.4 P1,3,4 20555 HUVA Lamiaceae Mesosphaerum pectinatum (L.)

Kuntze (Samba coité, Alfazema brava)

NA Erva 0.6 N4 20591

HUVA Rhamnaceae Ziziphus joazeiro Mart. (Joazeiro) NA* AR 1.1 N/P1,2,3,4 21481

HUVA Rubiaceae Borreria scabiosoides Cham.

&Schltdl. (Cabeça-de-velho)

NA Erva 0.7 N/P1,3,4 20609 HUVA

Borreria spinosa Cham. et Schltdl.

(Cabeça-de-velho)

NA Erva 0.7 N/P1,3,4 20565 HUVA Fonte: elaborado pelo autor.

As espécies listadas na tabela 1 são importantes fontes de recursos principalmente para as abelhas da Caatinga, como já evidenciado em outros levantamentos apícolas também realizados no semiárido brasileiro (Benevides e Carvalho, 2009; Milfont, Freitas e Alves, 2011; Brasil e Guimarães-Brasil, 2018). Esses estudos apresentaram, respectivamente, 45%, 60%, e 50% de similaridade, com as espécies aqui identificadas com VU ≥ 0.4.

Combretum leprosum/ mofumbo (VU = 1.85) e Croton sonderianus/ marmeleiro

(VU = 1.8) foram identificadas como as duas espécies de maior importância para a apicultura em Marcelino Vieira. Essas espécies também foram citadas em diversos levantamentos sobre a flora apícola da Caatinga (Benevides e Carvalho, 2009; Reis, 2009; IFAG, 2017; Martins et al., 2017; Brasil e Guimarães-Brasil, 2018; Costa et al., 2018). Ambas espécies possuem um elevado significado cultural, devendo ser valorizadas e preservadas dentro da realidade local inserida (Albuquerque, 2005).

A espécie com VU ≥ 0.4 têm suas importâncias relatadas por diferentes autores tanto no período seco, quanto no período chuvoso como fonte de néctar e pólen. No período Tabela 1 - Continua...

(26)

chuvoso (fevereiro a maio) as espécies Combretum leprosum, Croton sonderianus e

Alternanthera brasiliana/ Cabeça-de-velho são identificadas como importante recurso de

néctar e pólen (Freitas, 1991; Milfont, Freitas e Alves, 2011; Rede de catálogos polínicos online, 2019).

Ainda de acordo com a literatura, no período seco (agosto a dezembro), destacaram-se as espécies Ziziphus joazeiro/ Joazeiro, Anadenanthera colubrina/ Angico, e

Myracrodrum urundeuva/ Aroeira como importantes fontes de néctar e pólen (Milfont, Freitas

e Alves, 2011; Costa et al., 2018). Prosopis juliflora/ Algaroba e Mimosa tenuiflora/ Jurema-preta, também foram reconhecidas como fontes importantes nesse período (Freitas, 1991; Reis, 2009; Costa et al., 2018).

As análises estatísticas indicam que os dados obtidos no presente estudo não se distribuíram de acordo com a curva normal (teste de Shapiro-Wilk: 0.67764, p-value = 2.734e-11, n = 72 espécies). A média dos valores de uso foi 0.29 (+ 0.39) com intervalo de confiança de 95% (Figura 2A). As frequências dos valores de uso das listas livres sugerem uma distribuição negativa binomial (Figura 2B), evidenciando que para a maioria das espécies foram atribuídos valores de uso baixo, próximo a 0.2. Isso indica que embora exista uma grande diversidade de espécies melíferas, no universo amostral de 72 espécies, poucas têm potencial reconhecido pelos entrevistados.

Figura 3 – Histograma e Bloxpot das espécies vegetais citadas nas listas livres 1 e 2 em Marcelino Vieira - RN: A - Boxplot indicando outlines e os quartis (3° quartil 0.41 valores de corte) e intervalo de confiança de 95% para os valores de uso (VU), n = 72 espécies. B - Histograma indicando a distribuição de frequências dosvalores de uso (VU).

Fonte: elaborado pelo autor.

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Com base no valor de corte (VU ≥ 0.4), as espécies com VU < 0.4 formam um segundo grupo que reuniu 52 espécies. Essas espécies também se configuram como importantes fontes de néctar e/ou pólen as abelhas, no entanto com menor destaque.

Entre as espécies com VU < 0.4, em ordem decrescente do VU, as que fornecem néctar e pólen foram: Spondias macrocarpa Engl. (VU = 0.25); Marsypianthes chamaedrys (Vahl) Kuntze. (VU = 0.25); Tarenaya spinosa (Jacq.) Raf. (VU = 0.25); Melochia

pyramidata L. (VU = 0.15); Mimosa caesalpiniifolia Benth. (VU = 0.15). Alternanthera tenella Colla; Boerhavia diffusa L.; Commiphora leptophloeos Mart. J.B. Gillett.; Enterolobium contortisiliquum (Vell.) Morong.; Sida acuta Burm. f.; Sida spinosa L.; Antigonon leptopus Hook & Arn.; e Turnera subulata Sm., todas com VU = 0.1. Spondias tuberosa Arruda; Cereus jamacaru DC.; Jatropha gossypiifolia L.; Inga Mill.; Sida galheirensis Ulbr.; Waltheria indica L.; Ximenia americana L.; e Coutarea hexandra (Jacq.)

K. Schum., todas com VU = 0.05.

As espécies com VU < 0.4 que fornecem apenas néctar foram: Mesosphaerum

suaveolens (L.) Kuntze (VU = 0.25); Handroanthus heptaphyllus (Vell.) Mattos (VU = 0.2); Amburana cearensis (Allemão) A.C.Sm. (VU = 0.2); e Aspidosperma pyrifolium Mart. &

Zucc. (VU = 0.2). Ruellia asperula (Mart. ex Ness) Lindau.; Bauhinia sp.; Luetzelburgia

auriculata (Allemão) Ducke.; Passiflora sp.; e Piptadenia stipulacea (Benth.) Ducke., todas

com VU = 0.1. Amaranthus viridis L.; Fridericia sp.; Libidibia ferrea (Mart. exTul.) L.P.Queiroz; e Lantana camara L., ambas com VU = 0.05.

As espécies com VU < 0.4 que fornecem apenas pólen foram: Spondias mombin L. (VU = 0.15); Senna spectabilis var. excelsa (Schrad.) H.S. Irwin & Barneby (VU = 0.1).

Gomphrena demissa Mart.; Ricinus communis L.; e Portulaca oleracea L. (VU = 0.05);

As espécies cultivadas e naturalizadas que tiveram VU < 0.4 Zea mays L. obteve maior VU (0.35). Citrullus lanatus (Thunb.) Matsum. &Nakai; Phaseolus vulgaris L.; Lippia

alba (Mill.) N.E.Br. ex P. Wilson; e Malpighia sp., todas com VU = 0.1. Mangifera indica L.; Cocos nucifera L.; Cucumis melo L.; Azadirachta indica A. Juss.; Moringa oleífera Lam.; Psidium guajava L.; Sesamum indicum. L.; e Helianthus annuus L., apresentaram VU = 0.05.

Durante a turnê guiada (tabela 2) foram identificadas 21 espécies não citadas nas listas livres, que também configuram-se como importantes fontes de alimentos para as abelhas.

O elevado número de espécies descritas com VU < 0.4 e as espécies identificadas apenas durante a turnê guiada sugerem que o conhecimento da flora apícola de Marcelino

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Vieira está representado na diversidade de seus informantes, e que essas espécies também configuram como importantes recursos para as abelhas no local.

Tabela 2 – Lista das espécies vegetais identificadas somente durante a realização de turnê guiada no município de Marcelino Vieira - RN. OR= origem: NA= nativa; EX= exótica; * = endêmica do Brasil. RF = Recurso Floral: VA = Visitada por Apis mellifera L. N = Néctar; P = Pólen; (Freitas, 1991)1; (Santos, Kill e Araújo, 2006)2; (Reis, 2009)3; (Lima, 2011)4; (Milfont, Freitas e Alves, 2011)5; (Silva et al., 2012)6;(IFAG, 2017)7; (Jorge et al., 2018)8; (Rede de catálogos polínicos online, 2019)9. RI = Referência Identificação: EAC = Herbário

Prisco Bezerra – UFC; HUVA = Herbário Francisco José de Abreu – UVA; il. = identificada no local; s/n = sem número.

Famílias Espécie (Nome Científico e Popular). OR Hábito RF RI Acanthaceae Dicliptera ciliares Juss. (Cachimbo) NA Erva P2 62126EAC

Apocynaceae Cryptostegia madagascariensis Bojerex

Decne. (Cravo de Urubu)

EX Liana N7,9 20568 HUVA

Asteraceae Melanthera latifolia (Gardner) Cabrera

(Girassol do mato)

NA Erva N/P7,9 20559 HUVA

Bixaceae Cochlospermum regium (Schrank) Pilg. NA Árvore P7 62129EAC

Bromeliaceae Encholirium spectabile Mart. ex Schult.

& Schult.f. (Macambira)

NA* Erva VA8 il.

Cactaceae Pilosocereus gounellei (F.A.C.Weber)

Byles & Rowley. (Xique-xique)

NA* Arbusto N/P1,5 il.

Cucurbitaceae Cucurbita sp. (Abobora) NA Liana N/P9 il.

Euphorbiaceae Cnidoscolus urens (L.) Arthur.

(Cansanção)

NA Erva N6 il.

Croton hirtus L'Hér (Malva-de-pelos) NA Erva N/P7,9 20564 HUVA

Fabaceae Aeschynomene benthamii (Rudd) Afr.

Fern.

NA* Erva N7,9 62133EAC;

20603 HUVA

Crotalaria spectabilis L. (Chocalho de

cobra)

EX Erva N7,9 20537 HUVA

Erythrina velutina Willd. (Mulungu) NA Árvore N/P1 s/n EAC

Macroptilium lathyroides (L) Urb.

(Feijão de rola)

NA Erva N/P3,7,9 21228 HUVA

Mimosa candollei R. Grether. (Malícia) NA Erva N/P7,9 20578 HUVA

Senna macranthera (D.C. ex Callad.)

H.S. Irwin e Barneby. (São João, Pão de São João, Erva de São João)

NA SA P5,7,9 20602 HUVA; 62130EAC

Lamiaceae Hypenia salzmannii (Benth.) Harley

(Barriguda)

NA Erva N/P2 il.

Nympheaceae Nymphaea pulchella DC. (Guaipeba) NA Erva VA4 62135EAC

Poaceae Sorghum halepense (L.) Pers. (Sorgo) EX Erva P7,9 21419 HUVA

Polygonaceae Triplaris gardneriana Wedd. (Coaçu) NA Árvore N/P3 62136EAC

Sapindaceae Cardiospermum corindum L.

(Balãozinho)

NA Liana N7,9 20581 HUVA; 62138EAC

Sapindus saponaria L. (Saboneteira) NA Árvore N/P7,9 21224 HUVA

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Merece destacar que o Inventário Florístico Apícola Georefenciado – IFAG (2017) realizado em Marcelino Vieira identificou 101 espécies de plantas arbóreas, arbustivas e herbáceas, entre nativas, naturalizadas e cultivadas, obtendo 100% de similaridade com as espécies com VU ≥ 0.4. Nesse Inventário foram identificadas 47 espécies com potencial melífero diferentes das apresentadas aqui, configurando também como importantes fontes de alimento para as abelhas.

Somando as 93 espécies identificadas aqui com as levantadas pelo IFAG (2017), são reconhecidas um total de 140 espécie melíferas de plantas arbóreas, arbustivas e herbáceas, entre nativas, naturalizadas e cultivadas, associadas a criação de Apis mellifera em Marcelino Vieira – RN.

2.4 Conclusões

O conhecimento gerado a partir da percepção etnobotânica dos apicultores sobre as plantas melíferas possibilitou identificar 93 espécies vegetais com potencial apícola para Marcelino Vieira, revelando um número expressivo de espécies nativas (86%) e endêmicas do Brasil (20%). As espécies vegetais citadas são fontes importantes de néctar e/ou pólen em diferentes períodos, possibilitando que as abelhas obtenham os recursos florais durante todo o ano, garantindo o sucesso da atividade apícola no local e proporciondo benefícios econômicos e ambientais para o município.

Combretum leprosum/ Mofumbo (VU = 1.85) e Croton sonderianus/ Marmeleiro

(VU = 1.8) foram as espécies mais citadas conforme VU, sendo identificadas como as mais importantes para a apicultura no referido município. Essas espécies apresentam elevado significado cultural no local, devendo ser valorizadas e preservadas dentro da realidade cultural inserida.

Entre as espécies nativas identificadas, outras 17 obtiveram destaque devido ao elevado Valor de Uso (VU ≥ 0,4), entre estas Croton heliotropiifolius, Anadenanthera

colubrina, Ziziphus joazeiro e Myracrodruon urundeuva estão também entre as principais

espécies vegetais com potencial apícola na área de estudo. Essas espécies foram citadas em diversos estudos sobre flora apícola da Caatinga como importantes fornecedores de recursos as abelhas.

Os dados obtidos confirmam a hipótese de que os apicultores de Marcelino Vieira são detentores de considerável conhecimento sobre a diversidade de plantas nativas melíferas

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da Caatinga, as quais proporcionam benefícios a comunidade e a biodiversidade do local. No entanto, as altas incidências (75%) de valores de uso baixos (VU < 0.2) indicam que embora exista uma grande diversidade de espécies melíferas, poucas espécies têm potencial reconhecido pelos entrevistados. Isso provavelmente ocorre porque a maioria dos apicultores reconhece apenas as principais plantas que as abelhas têm preferência, conforme observação de campo.

É esperado que as informações geradas a partir da percepção dos apicultores contribuam com o reconhecimento de espécies vegetais nativas da Caatinga e das espécies melíferas; de maneira que favoreça o desenvolvimento regional da atividade apícola, a partir da preservação das plantas da Caatinga e a valorização dos saberes dos apicultores do Alto-oeste Potiguar do Nordeste do Brasil.

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CAPÍTULO 2 - PERCEPÇÃO ETNOBOTÂNICA ASSOCIADA À APICULTURA: USO DOS RECURSOS FLORESTAIS E MUDANÇAS CLIMÁTICAS NA CAATINGA POTIGUAR

RESUMO

Os objetivos do estudo foram identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores do município de Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte, possuem sobre a flora da Caatinga, conforme oito descritores: alimentar, artesanato, medicinal, madeireiro, místico, combustível, forragem e outro uso particular; e levantar informações relacionadas percepção deles sobre as mudanças climáticas e seus impactos. As ações do projeto ocorreram no período de março a julho/2018. Um total de 20 apicultores foram selecionados através de amostragem não-probabilística a partir dos dados da Associação Comunitária Jefferson Fernandes de Medeiros, entidade que reúne os apicultores do município. Nesse contexto, utilizou-se observação participante, listas livres, turnê guiada, diário de campo, e aplicação de formulário estruturado, conforme parecer CEP nº 2.698.897. Os apicultores fazem uso de 68 espécies vegetais que foram agrupados em cinco descritores: alimentar, madeireiro, medicinal, combustível, e forragem. A maioria das espécies (54) tem utilidade medicinal, conforme valor de uso (VU) destaque para Anacardium occidentale/ Cajueiro (VU = 0.45); Myracrodrum

urundeuva/ Aroeira (0.4) e Ximenia americana/ Ameixa (0.35). Em relação aos outros usos

como madeireiro, combustível e forragem, Croton sonderianus/ Marmeleiro (0,65);

Anadenanthera colubrina/ Angico (0,4) e Amburana cearensis/ Cumaru (0,4) foram as

espécies que obtiveram, respectivamente, os maiores números de citações. Conforme percepção dos apicultores, 85% deles, acreditam que o clima está mudando confome as florestas estão diminuindo no município e associam às mudanças climáticas. Conclui-se que os apicultores detêm importante conhecimento sobre os recursos naturais manejados, e devem ser valorizados para a sustentabilidade da Caatinga no Alto-oeste potiguar.

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ABSTRACT

The objectives of the study were to identify the ethnobotanical knowledge that beekeepers of the municipality of Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte, have about the Caatinga flora, according to eight descriptors: food, handicraft, medicinal, timber, mystic, fuel, fodder and other private use; and raise information related to their perceptions of climate change and its impacts. The project actions took place from March to July / 2018. A total of 20 beekeepers were selected through non-probabilistic sampling, based on data from the Jefferson Fernandes de Medeiros Community Association, an entity that brings together the city's beekeepers. In this context, participant observation, free lists, guided tour, field diary, and application of structured form were used, according to CEP No. 2,698,897. Beekeepers make use of 68 plant species that were grouped into five descriptors: food, timber, medicinal, fuel, and fodder. Most species (54) have medicinal utility, according to use value (VU), highlighting Anacardium occidentale / Cashew (VU = 0.45); Myracrodrum urundeuva / Aroeira (0.4) and Ximenia americana / Plum (0.35). In relation to other uses such as timber, fuel and fodder, Croton sonderianus / Quince (0.65), Anadenanthera colubrina / Angico (0.4) and Amburana cearensis / Cumaru (0.4) were the species with the highest number of citations, respectively. According to beekeepers' perception, 85% of them believe that the climate is changing as forests are decreasing in the municipality, as well as in association with climate change. It is concluded that beekeepers have important knowledge about the managed natural resources, and should be valued for the sustainability of Caatinga in the potiguar high-west.

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3.1 Introdução

A Caatinga, ou Savana estépica (IBGE, 2012) vem sofrendo sucessivas perdas de área nativa e grande parte de seus recursos vegetais estão desaparecendo drástica ou permanentemente (Silva e Freire, 2010; Brasil e Brasil-Guimarães, 2018). Representa o tipo vegetacional dominante na região Nordeste, sendo considerado um dos maiores e mais importantes ecossistemas brasileiros (Bessa e Medeiros, 2011).

Na Caatinga, domínio exclusivamente brasileiro, são descritas 4.347 espécies de plantas (Forzza et al., 2010) e muitas dessas plantas fornecem os recursos básicos como alimentação, remédios, forragem para os mais variados tipos de rebanhos, madeira para construções, entre outros, para a sobrevivência das populações que vivem neste ambiente semiárido (Giulietti et al., 2003; Queiroz, 2009), contribuindo consideravelmente para a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas. Conforme relata Giannini e colaboradores (2017) a diversidade cultural regional de pequenos agricultores faz uso de um número significativo de espécies vegetais de interesse econômico e muitas destas são cultivadas localmente e contribuem para o aumento da renda familiar em todo o país.

Assim, considerando que à medida que a relação com a terra passa por processos de modernização e o contato com centros urbanos se intensifica, a rede de transmissão do conhecimento sobre plantas pode sofrer alterações (Roque, Rocha e Loiola, 2010), tal fato justifica a necessidade de se identificar essas informações sobre o conhecimento etnobotânico, de modo a preservá-las e repassá-las para as gerações futuras.

Além disso, no atual panorama de crise ambiental em que o mundo está, as mudanças climáticas têm gerado incertezas e cenários indesejados para o futuro. De modo que os efeitos das mudanças climáticas na natureza têm consequências nas relações sociais, nos níveis populacionais, no estoque de alimentos, em novas doenças e expansão de algumas antigas, e nos deslocamentos ambientais (Blank, 2015). Outro desdobramento preocupante é a perda de biodiversidade, causando o declínio de polinizadores, importantes a inúmeras culturas vegetais das quais se servem humanos e animais (Garófalo, 2013; Azevedo, 2016; Wolowski et al., 2019).

O Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE, 2017) afirma que as mudanças climáticas previstas para os próximos anos pelo (IPCC, 2007) certamente são as maiores ameaças para os polinizadores e exigem ações imediatas para conter os seus efeitos como à recuperação de áreas degradadas. Esses dados indicam que no município de

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Marcelino Vieira haverá impacto significativo no que tanje a redução de polinizadores e consequente desaparecimento de espécies vegetais utilizadas por eles, importantes para sua atividade econômica, bem estar social e ambiental, além de fonte local de medicamentos naturais.

No município de Marcelino Vieira, RN, os apicultores credenciados junto à Associação Jefferson Fernandes de Medeiros desenvolvem prática que relacionam a criação de polinizadores da espécie Apis mellifera Linnaeus, 1758, associado a utilização dos recursos ofertados pela flora local, interação necessária para assegurar a viabilidade econômica dessa atividade (Aleixo et al., 2014; Costa et al., 2018). Dessa forma, apicultores experientes são identificados como potenciais informantes sobre as espécies vegetais existentes no local.

Assim, considerando que a atividade apícola vem sendo desenvolvida há quase três décadas nesta região do semiárido Potiguar, existindo um acúmulo de informações sobre a flora, e que os apicultores também necessitam dessas plantas como fonte de recuros como alimentar, madeireiro, e medicinal, entre outros, o presente estudo teve como objetivos identificar o conhecimento etnobotânico que os apicultores do município de Marcelino Vieira possuem sobre a flora da Caatinga, conforme oito descritores: alimentar, artesanato, medicinal, madeireiro, místico, combustível, forragem e outro uso particular; e levantar informações relacionadas percepção deles sobre as mudanças climáticas e seus impactos.

3.2 Metodologia

3.2.1 Delimitação e Caracterização da área de estudo

O estudo foi realizado no município de Marcelino Vieira (6°17'38,4"S 38°10'01,2"O), Rio Grande do Norte, região Nordeste do Brasil (Figura 4). Ocupa uma área de 345,711 km² e teve a população estimada de 8.265 habitantes no Censo de 2010 (IBGE, 2016). O município faz limite com diversos outros municípios: a norte com Pau dos Ferros, ao sul com Tenente Ananias, a leste com Pilões, Antônio Martins e Alexandria e a oeste com os municípios de José da Penha e Rafael Fernandes (Beltrão et al., 2005).

O clima do município é do tipo semiárido quente (BSh), de acordo com a classificação de Köppen-Geiger, com temperatura média anual de 26,5 °C e precipitação média de 843 milímetros (mm) anuais, com chuvas concentradas entre os meses de fevereiro e maio (CLIMATE-DATA, 2017). A umidade relativa do ar é de 66% e o tempo de insolação

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chega a 2.700 horas anuais (IDEMA, 2008). A cobertura vegetal é constituída por Caatinga hiperxerófila (30%) e hipoxerófila (28%), com alto percentual de vegetação em recuperação (23%) e solo exposto (16%).

Figura 4 - Mapa de Localização do município de Marcelino Vieira - RN, nordeste do Brasil.

Fonte: Base Cartográfica IBGE (2017).

O estudo foi desenvolvido em quatro áreas distintas (sítios) dentro do território de Marcelino Vieira– RN. Sítio 1: Várzea do Canto (6°18'50" S, 38°09'83" O); Sítio 2: Caboré (6°31'10" S, 38°16'99" O); Sítio 3: Varzinha (6°37'33" S, 38°16'16" O) e Sítio 4: Junco (6°33'52" S, 38°17'24" O). No sítio 1 foram observadas áreas com Caatinga hiperxerófila (predomínio) e hipoxerófila, mata de galeria, áreas de plantio de culturas anuais como milho e sorgo; uma pequena área lacustre (açude), e quintais produtivos próximo as casas. No sítio 2, Caatinga hiperxerófila, com plantio de cultura anuais como milho. No sítio 3, áreas de Caatinga hipo (predomínio) e hiperxerófila, mata galeria, e áreas com plantio de culturas anuais como milho e abóbora, e quintais produtivos próximos as casas. No sítio 4, predomina a Caatinga hiperxerófila e uma grande área lacustre (açude Marcelino Vieira, principal reservatório da cidade).

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