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O CONCEITO DE PESQUISA EM FILOSOFIA

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(1)

DISCUSSÃO

O CONCEMO DE PESQIJISA EM

FII,OSOFIA

Os

quatro

artigos que se seguem, de José

Arthur Giannotti,

Raul

I¿ndin

Filho, I)anilo

Marcondes

de

Souza

Filho e Zeljko loparió,

foram

apresentados durante a reunião sobre Pesquisa em

Filosofìa

realizuda em 22

e 23

de março de 1983 em Brasília, sob os auspícios do CNPq, e durante a qual houve a fundação da Associação Nacional de

Pós- Graduação em Filosofìa (ANPGF).

A

PESQI.TISA FILOSÓFICA NO BR,ASIL{'

Nas circunstâncias atuais p¿uece-me impossfvel desvincular as universidades de massa dos

institutos

financiadores de pesquisa, pois enquanto asprimeiras tendem a oferecer a base duma educação cadavez mais geral do que universitária, os segundos sÍio capazes

de pinçar, na

multidão

em vias de se profissionalizar, aqueles que poderão

vir

a ser a

elite

do pensamento nacional. As universidades não são mais capÍrzes de preparar suas

próprias elites: a burocratização

interna,

a ideologia estatizante que iguala por baixo e

pensa a carrei¡a em termos de

tempo

de serviço são fatores que confluem

no

sentido de afogar os grupos de ponta

no

marasmo

do

trabalho

improdutivo. Tudo

indica que somente pressões vindas de fora podem estimular a diferenciação.

Daí

a necessidade de

pensar

o

processo

de

democratização da Universidade como

um

movimento que vai

além

da quebra

do

autoritarismo

no

seu funcionamento

interno,

completando-se

por

canais que vêm expô-la para

o

resto da sociedade, que

tanto

a financia quanto deman-da dela

maior

eficácia. Cumpre, então, realizar a

diflcil

tarefa de

equilibrar

a autono-mia

universitâia,

a não ser confundida com os pruridos duma burocracia que se aferra a seus privilégios, como modos de exposição das atividades acadêmicas, a

fim

de que os mais diversos setores sociais tomem conhecimento de seus meandros.

Se a pesquisa em Filosofìa padece das mesmas vicissitudes que afetam a pesquisa em geral

no

Pafs, isto é agravado pelo preconceito que

niatgnalna

a atividade fìlosófica ao mesmo

tempo

que a envolve numataurat que a projeta para

fora

da realidade. Conti-nuÍrm a prevalecer, na seleção das elites, critérios tecnocratas e,

hoje

em dia, mais do que nunca,

o

economista

continua

a ser

visto

como o funcionário por excelência. Isto num momento em que os padrões de divisão social do trabalho transformam qualquer pessoa dotada duma raz oável educação

formal,

inteiramente czpaz de ser reciclada para ocupar a maioria das funções existentes nas empresas ou na administração pública. Mas essa permeabilidade

do fìlósofo,

assim como a de qualquer

outro

universitário, não de-ve ofuscar o

fato

de que a maior utilidade social dele ainda reside na sua marginalidade, espaço onde

lhe

cabe fazer

act{tica

do presedte e encenar as silhuetas do

futuro.

'tPublicado tamÉm no Suplemento "Cultura" do jomal Zero Horø, Porto Alegre, 13 de maio de

1983, p. 4.

(2)

126

fosé

Arthur

Giannotti

Não é segredo para ninguém que a Universidade não tem logrado nem mesmo ofere-cer uma base sólida para o desenvolvimento da pesquisa. Nelas, além do emprego, o

fi-lósofo

busca ainda material e ambiente para a

troca

de idéias. Na maioria dos

institu-tos,

este ambiente é sufocado pela competição em busca de postos e de visibilidade, o que leva a tomar as idéias como propriedade privada. No que respeita à infra-estrutuia, vale a pena

citar o

exemplo da

biblioteca

do Departamento de Èilosofìa e de Ciências Sociais da USP que conta com apenas 30.000 volumes dos quais metade

nÍo

está con-venientemente catalogada. Não é escandaloso que a universidade mais rica do Pals não possua uma biblioteca

central?

No

entanto, mais esdruxula parece-me a própria con-cepção de biblioteca, pensada

muito

mais como acúmulo de livros do que

aquìh

cole-ção

de

bibliografias

que

está sendo

utilizada

por

estudantes e pesquisadores.

E

para

mudar

essa situação

um

passo pode ser dado desde

já:

bolsistas

têm

recebido

auxflio

para a comPra de livros; esta medida pode ser generalizada desde que este material

ve-nha

a ser propriedade dos

institutos

a que tais investigadores estã'o ligados. Não seria esta uma forma de começar a ter bibliotecas vivas?

Não creio

que

a

investigação

fìlosófica

æ distinga de tantas outras que se movem nos

mais

abstratosl ramos do saber. Assim como o matemático, o fìlósofo necessita de

lápis, papel, livros e diálogo; o resto, só a invenção pode trazer-lhe.

o

que particular-mente afeta ao

filósofo

é menos

o

caráter artesanal de seu trabalho do que o processo de socialização a que está sujeito o

produto

dele. Fora da teia duma tradição fìlosófìca, ele cai no mercado dos livros e das revistas para desaparecer na massa das publicações. Quantos de nós

tivemos a experiência de publicar um

livro

como se estivéssemos lan-çando uma pedra num

poço

sem

fim,

sem receber o

mlnimo

eco? Aqueles que dentre nós conseguem ultrapassar

o

anonimato o fazem

muito

mais

po,

tu.rìtiuidaães

polfti-cas do que pelo

vulto

ou interesse de sua obra. Este parece-me

o

problema crucial da investigação fìlosófìca no Brasil dos dias de hoje. A produção

,..ræ

diu a dia, a

polltica

de

formar

pesquisadores no

exterior

começa a

produzir

sãus frutos elevando o nfvel da reflexão além do que se poderia imaginar nos anos 50.

continua,

porém, o preconceito de que aprodução brasileira, por causa de sua inegável inferioridaåe, pode sãr ignorada.

Tudo

se passa como se a atividade de

filosofa¡

se resumisse em

publiiar

e ganhar reno-me no exterior.

No

isolamento da sala de trabalho vale qualquer assunto. O estudo da Flsica de Aris-tôteles

ou

das teses de Pico della Mirandola, a reflexão sobre a positivdade das ciências

ou

sobre a individualidade expressiva da obra de arte, todos essãs temas podem

desem-bocar num

texto

admirável. Não cabe, de modo algum,

interferir

nessa escolha. Mas na

falta

dum

processo de socialização, esses trabalhos caem

no

vazio,

no miíximo

dispa-ram clarões isolados cujo

brilho

não deixa atrás de si nem mesmo o traço dum comeìa. Não entendo, porém, qtrc razer

filosofia

consista emtrazer seu

tijolinho

para a constru-ção dum

ediffcio

universal. Disso nos convencemos rapidamentó se atentarmos para o

fato

de que

as correntes anglo-saxônicas

pouco

dialogam com aquelas

do

continente europeu. O que signifìca, porém, uma fìlosofia b¡asileira? Por certo não é aquela

fìloso-fia

que apenas se faz no Brasil. Também nada me parece mais bobo do que a

crftica

do que acusa de alienado o pensamento

filosófico

nacional por recusar-se a investigar

(3)

nos-A

Pesquisa Filosófica no

Brasil

121 sa

própria

realidade. Os grandes problemas que nos afligem demandam outros instru-mentos de análise e a vocação universal da Filosofìa me parece

irredutível. tlma

coisa, entretanto, é vocação,

outra,

como essa fìnalidade se realiza no concreto. Por isso uma

fìlosofìa

se

tomará

brasileira se b-rasileiros começarem a se entender por intermédio da

fìlosofia. E na barbárie em que estamos submersos, na crise de qualquer forma tradicio-nal de racionalidade, a Filosofia como

crltica

radical, movimento do pensar æmpre dis-posto a dissolver suas próprias pressuposições, pode

ter um

papel nuclear no trabalho de tecer novas formas de sociabilidade. Dal se æguirá naturalmente uma seleção de

te-mfu

e de autores que sirvam de trampolim para entender o

outro

e si mesmo.

fuistóte'

les ou Hegel pouco

importam

se não nos transformarn em melhores.

Existe alguma maneira de orientar o processo de socialização do produto

filosófïco,

de fomentar uma tradição que nos ate numa reflexão comum? Sem dúvida ela existe. Antes,

porém, é

preciso abandonar certos preconceitos.

O primeiro

deles é imaginar

que

a simples injeção de recursos nas universidades existentes possa melhorar

o

nível da investigação.

A

burocratnagão da Universidade caminhou

em

passos

tão

rápidos durante estes tristes anos de ditadura que os recursos podem sumir sem deixar pegadas.

Outro é

conceber os encontros

entre

investigadores

como

se fossem grandes espetá-culos

onde

cada

um

procura encenar sua parte e seu lugar ao sol. Se este processo é

importante

nos Estados Unidos, onde

o

congresso

aglizao

mercado de trabalho, se as

grandes Reuniões da SBPC foram cruciais numa fase em que o

próprio

Governo estilha-çava qualquer

vlnculo

entre os pesquisadores

-

sem esquecer sua enolme importância na

própria luta polltica

-;

acredito que

hoje

em dia estamos começando

um

perfodo em que se necessita, de um lado, cumprir com a¡¡ exigências da mæsificação do ensino, de

outro,

promover a constituição de grupos capazes de inovar e travar uma discussão comum. Por isso parece-me fundamental a divisão de tarefas, deixando a Universidade

tratar

dos problemas da massificação, enquanto os

institutos

financiadores

tratam

de

fomenta¡ os grupos de

ponta. Isto

desde que ambos os lados sejam orientados por po-llticas que resultem duma ampla discussÍio de todas as partes interessadas. Mas para que tais grupos se formem, precisam de

auxílio

que os

tome

como gtupos' que avalie seus

resultados grupalmente

e

não

apenas

pelo que

cada

indivlduo

é

capaz de

produzir'

JOSÉ ARTHI.JR GIANNOTTI (Ìnivqsiùde de

ffofulo

hesidetteúøANÆF

(4)

li

NOTAS SOBRE

O

CONCEIIO DE

PESQUISA

EM

FIITOSOFIA

Nas ciências formais ou empfrico-formais sâ'o nltidas as fronteiras que separam as ativi-dades de estudo de

um

tema das atividades de pesquisa sobre esse mesmo tema. Em fì-losofia, estudos não

introdutórios

de

um

assunto serão atividades de pesquisa? Como

distinguir,

a

partir

de uma questão filosófica, um estudo aprofundado de uma pesquisa sobre essa questllo?

I.

O

termo

"pesquisa"

formu

semelhtnça de

fømílíts

Os

diversos usos significativos

do termo

"pesquisa" nos diferentes contextos discur-sivos indicam que não se deve procurar um significado comum que elucide esse termo, mas, ao

contrário,

deve-se procurar a rede de significações múltiplas formada por esses

diversos usos. Assim, æ cada uma das expressões "pesquisa em matemática",

"pesqui-sa em

filosofia",

"pesquisa em

flsica"

etc., exprime um significado no seu contexto de

uso,

nenhum

desses usos revela

um

signifìcado

comum

a

todas essas expressões. Hd semelhanças que formam uma cadeia de significações, mas nenhum elo da cadeia pode

exprimir

o "verdadeiro" signifìcado.

Não cabe neste momento reconstruir a rede de signifìcações da expressão "pesquisa em

I" ,

onde

"t

"

indica o nome de uma ciência. Mas a tradição fìlosófica fez do discur-so matemático

um

modelo para

o

discurso

filosófico. É

na matemática que se inspira-ram os grandes sistemas que na modernidade ergueram uma pretensão de objetividade para

o

discursos

filosófìco;

recorreram também à matemática os que pretenderam

tor-nar

a

filosofia

não

um

saber, mas

um

método.

Por outro

lado, o conceito de pesquisa nas ciências empfricas está estritamente ligado à natureza dos seus enunciados elemen-târes

ou

observacionais e à noção de experimentação.

Ao

contrário, o caráter nã'o

em-plricp

dos enunciados matemáticos

permite

uma analogia com as proposições analíti-cas

que constituem

o

discursos

fìlosófico.

Assim, uma rápida análise do conceito de

pesquisa nas ciências

formais nos

introduzirá

nessa rede de signifìcações múltiplas formada pelos diversos contextos de uso desæ termo.

2. Pesquisa nas ciências fôrmais

Grosso

modo,

nas ciências formais o uso do termo "pesquisa" está entrelaçado com as

atividades de invenção, descoberta

-

enfim,

com as atividades de produção de conhe-cimento. Não é

poslvel,

portanto,

assimilá-lo com os conceitos ligados exclusivamente aos atos de conhecimento: ensinar, apreender, estudar

etc. Além

de ser uma atividade de estudo

(ou

de pressupor

tal

atividade) a pesquisa visa a descoberta, isto é,, a

solugo

de questões abertas de uma teorio.

Nlo

é, pois,

o

conhecimento rigoroso e preciso de

uma questâ'o que pode caracterizar' a noção de pesquisa; elucidar esse conceito equivale a esclarecer o signifìcado da expressão "solubilidade de problemas".

Duæ

noções são, assim, essenciais para a elucidação do

termo

"pesquisa" nas ciên-cias

formais:

(a)

a noção de problema (para uma

teoria);

(b)

a noção de resolução de

problema

(5)

Notas sobre

o

Conceito de Pesquisa em

FíIosoftø

129

A

catzcterização da noção de problema é relativamente simples nas teorias formais.

Do

ponto

de vista

intuitivo,

um problema numa

teoria

r,

formulada numa linguagem

L,

é uma expressio de

L,

compatfvel

com

z,

mas que ainda não

foi

demonstrada (em

T)

e para a qual não existe prova da sua indemonstrabilidade (em

Z).

se a noção de problema remete à noção de demonstração, e

portanto

de prova, para

os

nossos objetivos

é

sufìciente assinalar que é'possfvel caructernar a

própria

noção de

provø

independentemente da

noção

de

teoria.

E,

assim,

o método

de soluçõo de problemas de uma Teoria independe da

própria

Teoria. As noções de Teoria, proble-mas e métodos de solução (prova) são, assim, independentes nas ciências formais. Dada uma expressão

x,

que é

um

problema em

T,

é possfvel encontrar uma solução pa:ia

X

(uma prova de

xem

z)

através de

um

método cujacaracterizaçãonão depende de T.

A

teoria

z

e o método de solução de problemæ em T são duas questões que podem ser caracterizadas independentemente uma da outra, e a consistência da teoria não implica

a validade do método (e vice-versa).

É

exatamente a independência dessas noções que

permite

dar

um

sentido preciso,

nos

contextos formais, à noção de pesquisa. Pesquisar é encontrar soluções para pro-blemas abertos. E pode-æ determinar que

x

tem uma solução justamente porque o

mé-todo

de resolver

Xnão

depende da teoria em que

X

é problema.

E

se

a noção

de pesquisa ganha

um

sentido

determinado nos contextos formais, pode'se, então,

falar

de uma maneira significativa em história ou progresso da ciência.

O histórico

nas ciências formais é o quadro teórico-metodológico que permite o

nasci-mento, a formulação,

e

a

superação,

a

solução, dos problemas. Assim, cada questão

tem

a

sua

data, a sua certidão de nascimento: é a teoria que transforma uma determi-nada formulação num problema, e são os recursos metodológicos que transformam o problema num enunciado da teoria, ou então

modificam

a

própria teoria.

se é o

qua-dro

teórico-metodológico que

permite

a formulação do problema, é a sua solução que possibilita a transformação e,

por

conseguinte, o aparecimento de novas teorias e novas questões.

3. Existem problemts filosóficos?

Evidentemente não se pode estender à

fìlosofìa o

significado

do

conceito de pesquisa nas ciências formais.

Em primeiro

lugar, é bastante questionável a noção de problema

fibsófico.por

um

lado,

as filosofias que se compreendem como método de análise negam a existência de

problemas exclusivamente

fìlosóficos.

Ao

se

definirem

como método, essas filosofias

rejeitam a

especificidade de

um

conhecimento

filosófico. ora,

o

reconhecimento da existência de problemas supõe, como já

foi

indicado, a especifìcação do que é

conheci-do

(resolvido),

e do

que

é

ainda

problemático

(questão aberta).

supor, portanto,

a

existência de problemas

filosóficos

significa reconhecer em contrapartida a existência de conhecimentos fìlosófìcos. Por outro lado, os sistemas filosóficos que pretendem ser mais

do

que um

método

definem os problemas em função das teorias que constróem.

Tudo

se passam como se os problemas fossem caracteizados independentemente dos

(6)

I30

Raul Landin

Filho

siqtemas, e que as teorias servissem justamente para elucidar esses problemas. Mas o

ca-ráter

tofalizador

dos sistemas

toma

a noção

de problema

um

momento

da própria construção teórica. Problema e teoria são momentos de um mesmo sistema, e é o

siste-ma

que

permite

caraclerizar

um

tema como

problema. Se

na

gênese

(temporal)

de

construção

do

sistema

um

problema pode

motivar

a êlaboração da teoria, é a teoria

que, construfda,

determina as questões que são

ou

foram problemas; ela termina,

as-sim, dependente da "conoepção" OU

"natureza"

dO siStema

filOsófico:

tantas serão aS

caracterizaçóes

do

conceito

"problema

filosófico"

quantas forem as concepções de

fi'

losofia.

Além

disso, a pluralidade de sistemas concorrenciais impede uma caracteru,ação

ge-ral

da questão problema

filosófico;e,

o mais gfave, transforma o que seria considerado

problema

para

um

sistema

num

falso problema, na perspectiva de

outro

sistema con-conencial.

A

questâ'o do método reproduz as mesmas dificuldades acima assinaladas: as noções de prova, demonstração, etc., não encontram, e por razões análogas às mencionadas an-teriormente, uma caracterização independente dos sistemas

filosóficos. Um

método é

sempre o

método

de

um

sistema.

A

sua correção ou legitimidade é determinada pelo

próprio

sistema do qual ele é um método. Assim, a questão "soluçõo de um

problema"

é dependente do método, que,

por

sua vez, é legitimado pela teoria que caracteriza os

problemas a sefem resolvidos pelo método. Não é,

portanto,

surpreendente que solu-ções apresentadas

por

teorias (filosófìcas) sejam sempre rejeitadas

por

outras concor-renciais,

e

que ainda hoje na fìlosofia contemporânea permaneçam as mesmas questões

que

o

método

de Descartes e a

Crítica

de

Kant

procuraram,

no

seu tempo, resolver.

4. Pesquisø em

lilosofa

Se

o

discurso

filosófìco

não

pode

caructeÅzar a noção de problema e de método inde-pendentemente dos sistemas que

permitiram

a sua formulação, não pode também

for-mular crítérios de solução de problemas que ultrapassam os quadros teóricos que

possi-bilitaram

a legitimação do método, e a identificação de problemas.

Se essa análise

é

coneta,

o

significado da expressão "pesquisa em

fìlosofia"

é sem-pre ambíguo. Com efeito, ressalvando-se o caso da historiografia de teorias, não é possí-vel determinar o significado da expressão "conhecimento

filosófico"

sem considerar os sistemas em que ela é

definida.

"Resolver problemas", "solucionar questões", "desco'

brir

uma nova proposição", etc.,

têm

sempre significado

contextual, isto

é,

um

signi' fìcado que é determinado pelos sistemas ou pelos métodos em que aparecem essas ex-pressões. "Pesquisa

em filosofia"

significa,

assim,

procurar

soluções

de

problemas gerados

por

um

sístemø

X

segundo

um

método engendrado por

X.

Como é sempre no

âmbito

de uma

teoria

determinada que se assinalam os

critérios

de solução de proble-mas, a pesquisa

filosófìca

consiste na procura da completude de

um

sistema (a

desco-berta

das novas proposições da

teoria),

na análise da sua consistência, ou,

enfim,

na formulação de novos quadros teóricos.

Em

vista

disso,

o

recurso ò tradição é uma condição necessária para qualquer pes' quisa em

fìlosofia:

é

no

seu

horizonte

que são definidas as regras

dojogo.

O

conheci

(7)

Notas sobre

o

Conceito de Pesquisa em

Fílosofw

l3I

mento

dessas regras é condição para a solução de uma questão, para prolongamento de

uma

análise, para

a

descoberta do

novo

ou, mesmo, para a modificação das próprias regfas.

Mas se o recurso à tradição é condição nec€ssária, é a noção derelevância que

for'

nec,e

os

critérios de atualidade

ou

contemporaneidade da pesquisa. Se a tradição

for-nece as fegras,

a

relevância fornece

os critérios

de escolha para o uso das regras. E, como dizia um clássico da filosofia, uma regra só é regra porque é usada.

RATJL LANDINFILHO

(8)

A

QLIESTAO

DA

PESQrJISA

EM

FTT,OSOFIA

Ê

tarefa bastante

diflcil

procurar

defìnir

em termos

muito

genéricos e abstratos, e

so-bretudo

de maneira

definitiva,

o

que seria a pesquisa em

filosofia.

Talvez, .afìnal, isso seja,

de

algum

modo,

fundamental para

a

própria

filosofia:

seu caráter inconcluso, inesgotável. Dizem que, neste sentido, Pitágoras

teria

sido o

primeiro

a sentir a neces-sidade, precisamente, de

distinguir

entre,sophia

-

o

saber

-

e philosophia

-

o

amor

ao

saber.

A

fìlosofìa

seria assim,

portanto,

essencialmente uma busca,

um

questiona-mento, uma

atitude frente

ao real,

muito

mais do que um saber constituído, uma ciên-cia. De certa forma, essa questão percorre

o

desenvolvimento da própria tradição

fìlo-sófìca

que

assistiu

em

mais de um momento

histórico

a proclamação seja do

fim

da

filosofia

e de sua superação, seja da necessidade de sua subordinação à teologia ou até à

própria

ciência.

A

filosofia tem

sobrevivido. Nem

tanto

devido à imutabilidade ou a

uma

superioridade

inatinglvel,

mas talvez, principalmente, graças ao assédio que tem

sofrido. Em

seu desenvolvimento histórico, a fìlosofia gerou ciências que acabaram por

adquirir

sua

própria

autonomia. Nem

por

isso, ao

"perder"

partes que integravam tra-dicionalmente seu saber, a

filosofia

teve suas questões

ou

seu campo reduzidos, nem

tampouco

tornou-se superada

ou

dispensável;

ao contrário,

essas mesmas ciências,

por

sua vez, vieram a gerar novas questões filosóficas.

A

Flsica e, mais recentemente,

a Psicologia, são exemplos disso.

Creio que

hoje,

também em várias formas e graus, enfrentamos esse problema. Fre-qüentemente, sobretudo

em

nossos cursos de pós-graduação,

nos

defrontamos com projetos e mesmo dissertações e teses cujo caráter fìlosófico parece discutfvel às comis-sões julgadoras. Note-se que não se

trata

de uma questão de qualidade, mas sim de

c¿-ráter

filosófico.

Somos levados, entÍio, a discutir o que seria esse "caráter

fìlosófico"

e tentados

a

ser mais exigentes, neste sentido, com os candidatos que nos apresentam trabalhos de fìlosofìa. Isso parece decorrer de vários fatores, dentre os quais a abertura dos programas de pósgraduação em

fìlosofia

a graduados.de outras áreas, na maioria das vezes sem formação

filosófìca

prévia mais consistente; e mesmo devido à

proxi-midade da

filosofìa

com outras áreas

do

saber

cientlfìco,

como

foi

dito

acima. Todos reconhecemos,

entretanto, a importância

desse

contato interdisciplinar, que não

tem

sido

vital

para o desenvolvimento da filosofìa, como tem sido talvez também

resul-tado

desse

próprio

desenvolvimento. Neste sentidp, a demarcação

muito

rfgida da

fìlo-sofìa em relação a essas outras áreas do saber

científico

parece

difícil,

até mesmo por

falta

de critérios mais precisos sobre

o

que seria

"filosófico", e

talveznão seja sequer desejável, como a história da

filosofia

parece indicar.

Isso não signifìca, é claro, que nâ'o deva haver uma preocupação

ou

uma exigência quanto a esæ aspecto. Mas sim que, uma vez assegurado

um

conhecimento básico da

tradição filosófica,

e

sobretudo do

tipo

de reflexão que se desenvolve na

filosofia,

o carátet

fìlosófico

deverá surgir, nem

tanto

como elemento substantivo, mas como

for-ma de

se

tratar

o

tema.

É tanto

posslvel fazer-se uma tese pouco

fìlosófica

sobre a

Metafísica de Aristóteles, quanto uma tese

filosófica

sobre a tragédia grega. Por

outro

(9)

A

Questão da Pesquisa em

Filosofia

133 lado, é

signifìcativo

que aPoética tenha sido escrita por Aristóteles e não por Sófocles.

O

momento da reflexão fìlosófìca não se confunde com

o momento

da produção

ar-tfstica ou cientffica. O

que, se não

exclui

que aquele que

faz

arte ou ciência também faça

fìlosofia,

eige

que uma dimensão nova se abra

aí.

Nfo

creio, entretanto, que se

possa chegar,

ou

ao menos que se tenha chegado, a

um critério ou conjunto

de crité-rios que assegure o caráter

fìlosófico

de um determinado trabalho.

Se até agora

procurei

considerar a questão

do

caráter

filosófico

de uma pesquisa, penso ser necessário examinar também

o

caráter de pesquisa de

um trabalho

de

fìlo-sofia, exatamente porque

af

a questÍÍo se completa.

E

preciso

distinguir

a pesquisa

fì-losófica

do estudo da

filosolìa,

que pode, por exemplo, ser meramente historiográfico.

O

que torna

um

trabalho

propriamente

fìlosófìco em

um

sentido mais completo é, precisamente, seu caráter de

pesquiv,

isto

é, de busca, de investigação, de criação, de

inovação, de elaboração

própria. É

claro que a pesquisa nãò se faz independentemente do estudo, mas o estudo não é ainda a pesquisa, e um centro de produção filosófìca irn,

porta

sobretudo enquanto

centro de

pesquisa. É, nisso que estará mais evidente sua contribuição ao desenvolvimento

vital

da fìlosofìa.

Tendo

em vista estas considerações, gostaria de ocupar-me agora de alguns pontos de caráter mais

prático

e

imediato,

que poderiam servir de sugestões para a discussão sobre a melhor maneira de desenvolver a pesquisa e as atividades filosóficas entre nós. Enumero, a seguir, os pontos que, a meu ver, seriam

prioritários:

l.Integração

entre a pesquisa individual e coletiva. Freqüentemente nosso trabalho de-senvolve-se de maneira bastante isolada, o que pode ser natural e necessário em um

pri-meiro

momento. Porém, a discussâ'o de trabalhos ainda em curso pode

contribuir

para seu desenvolvìmento e servir de

estfmulo

a novas pesquisas.

A

formação de grupos de interesse organizando-se em Centros,

Institutos,

Seminários, etc., a promoção de coló-quios e reuniões regulares, e o envolvimento de alunos, sobretudo orientandos, nas pes-quisas, podem ser soluções para a superação desse problema.

2.

O ponto anterior

seria complementado com

a

realização periódica de reuniões

øm-plas

(Congressos, Encontros), de cardter nncíorwl, para a divulgação de publicações e trabalhos em andamento, projetos e linhas de pesquisa, possibilitando um maior

conta-to

entre diferentes centros e um intercâmbio de idéias e propostas.

3.

É

de

vital

importância o

fomento

da pesquísa em centros universitários ainda caren-tes, para

o

que pode

contribuir

o oferecimento, por parte dos centros mais

desenvolvi-dos,

de

uma

programação

de

Cursos de especialização, extensão, aperfeiçoamento, alualização nas diversas áreas da

fìlosofia,

através de professores visitantgs, cursos de férias, cursos intensivos,

"workshops",

etc.

4. As

Bibliotecas

sã;o

o ponto'de partida

da pesquisa, e por isso gostarfamos de sugerir

a

formação de núcleos comuns de pesquisa nos grandes centros

(ex.: Rio

de Janeiro:

(10)

134

Danilo Marcondes de Souza

Filho

PUC-RJ,

UFRJ, UFF,

UERJ,

etc.;

São Paulo: USP, PUC-SP, UNICAMP, PUCC, etc.) e até mesmo a nlvel interestadual, visando a integração dos acervos existentes. Essa in-tegração não precisa, evidentemente, ser

ffsica, o

que seria

muito diffcil,

mas pode se dar através da disponibilidade de consulta, da divulgação de catálogos, do

planejamen-to

de

aquisições, da

facilidade

de empréstimos,

do

intercâmbio

de

fotocópias,

etc. 5, Pubticações. As publicações são o momento

fìnal

das pesquisas, a divulgação de seus

resultados, sem

o

que a pesquisa permanece, até certo ponto, incompleta, deixando de

atingir um

de seus objetivos fundamentais. Neste æntido, é importante criar condições para incentivar as publicações, apoiando as

existentes, de diversos tipos como

revis-tas, boletins informativos,

fraduções,

livros

de

autores nacionais,

etc.

Sobretudo no que diz respeito a material didático, que possÍt ser

utilizado

em cursos.

6. Participação em associações e congressos

no Exterior. É importante

que a pesquisa

filosófica no

Brasil se faça representar

no Exterior

de

forma

mais permanente e siste-mática,

nos

diversos congressos internacionais existentes, bem como em associações, sociedades fìlosóficas,

etc.,

visando

o

intercâmbio de idéias, a atualização, a participa-ção no debate fìlosófico a nlvel internacional. etc.

7. Relação entre a Pesquisa Filosófîca e a Comunidade. É importante ressaltar a neces-sidade de

a

pesquisa

fìlosófica

encontrar divuþação que

permita

que seus resultados possam ser aproveitados pela comunidade acadêmica, em

um

sentido mais restrito em

que

a

interdisciplinaridade pode

ter

uma função importante,

e pela comunidade em geral, para que esta possa

vir

a tomar conhecimento do sentido e do teor das discussões fìlosóficas e, eventualmente,

vir

a

participæ

delas.

Acreditamos que

muitos

dos pontos

aqui

destacados, que evidentemente não

esgo-tam

a questão, são preocupações comuns de todos os que se ocripam com a pesquisa

filosófica

entre nós. Certamente que algumæ dessas sugestões talvez

estejam sendo adotadas e sejam até prática

corrente;

trata-se neste caso de, ar"aliando seus resultados, intensifìcá-las e difundi-las.

DANILO MARCONDES DE SOUZA FILHO

(11)

soBRE

O

CONCEITO

DE

PESQLISA

EM

FIITOSOFIA

Os gregos pediam da pesquisa em fìlosofìa teórica (a única considerada nesta nota) que descobrisse os primeiros princípios, entendendo que o saber

cientffìco

podia ser funda-mentado em proposições e conceitos primitivos. O primeiro a fazer uma teoria

nonna-tiva

dos fundamentos do conhecimento, Aristóteles, exigiu que

o

número de

elemen-tos

constitutivos dos rundamentos de uma'ciênciafosse

fÌnito,

e

que esses elementos dissessem respeito a

um

mesmo domlnio do real. Estipulou que os conceitos primeiros devessem ser imediatamente compreenslveis (sendo, por isso, indefiníveis) e suficientes para

definir

todos os outros conceitos. Além disso, que as proposições primitivas deves-sem ser imediatamente evidentes (sendo,

por

isso, indemonstráveis) e sufìcientes para derivar todos os teoremas.

Sabemos pela

história

da pesquisa

filosófica

que a busca dos fundamentos do saber

cientffìco dentro

do programa aristotélico resultou em repetidos fracassos. Invariavel-mente, as ptopostas de

fundamento

de

tipo

aristotélico'revelaram-se insuficientes; e

as que se mostravam suficientemente poderosas para

definir

e derivar o que se queria,

ou

não eram compreensfveis

ou

careciam de evidência.

O

Ceticismo

histórico

que

de-corre

dessa experiência de pensamento levou

Kant

a

reformular

o

programa

aristoté-lico

de pesquisa em filosofia teórica.

Segundo

Kant,

o

objetivo

da pesquisa

científìca

é

o

de ampliar de um modo

maxi'

mal

consistente

o

saber

empírico. As

condições básicas para alcançar

tal objetivo

são dadas pela constituição do aparelho cognitivo humano. Elas são as formas de

intuição,

os

princlpios

do entendimento e as máximas

dt

nzão.

As formas da operação de

in-tuição

impõem a

priori

uma estrutura ao mundo fenomenal. Os_princípios do

entendi-mento,

por

sua

vez,

desempenham

um

duplo

papel:

por

um

lado,

garantem a possi'

bilidade,

isto

é,

a verdade e a decidibilidade das proposições filosóficas, matemáticas

e

de experiência nesse mesmo

mundo

fenomenal;

por outro

lado,

justificam

a apli-cação de construções matemáticas

e

de procedimentos heurlsticos mais fracos (tais

como,

por

exemplo, as analogias)

na

decisão das proposições possfveis. Finalmente,

as mdximas

da

ll;azão

fornecem

guias

heurlsticos para

uma

ampliação sem

limites

do saber emplrico em forma de um sistema.

Nenhuma dessas condições kantianas de pesquisa

científica

é aristotélica. As

for-mas da intuição

caracteizam

apenas as propriedades

dos objetos que podem

ser

constitrfdas pelo

noso

aparelho

cognitivo

no domfnio

das sensações. Os

prínclpios

de

entendimento não

são aristotélicos

por

também só valerem para nós,

por

não se'

rem

diretamente evidentes

e por

não

serem suficientes para

deriiar

a

totalidade

das

proposições de nossa ciência em

particular.

Tanto as formas da

intuição

como os

prin-cípios

do entendimento são, na verdade, um

tipo

inteiramente novo de primeiros

prin-clpios, pois

não mais caracterizam

um domfnio do

real e sim as operações subjetivas

de constituição

do

real

para nós. Assim, os

princlpios

do.entendimento,

incluindo

o

princfpio

da causalidade, não fazem mais

parte

de uma ontologia no sentido

tradicio-nal,

mas

da

semântica tranæendental das proposições objetivamente válidas em geral e

do

cânone

doutrinal

de srla

deci€o.

(12)

136 Zeliko

LoPariô

As m¿íximas da razão são ainda menos aristotélicas. Pois, segundo a semântica trans-cendental que acabo de mencionar, elas

não

são

nem

mesmo proposições posslveis, não podendo,

portanto,

ser decididas como verdadeiras

ou

falsas.

O

seu papel na

pes-quisa

científica

é

apenas

o

de

orientar a busca de uma unidade sistemática do saber objetivo possfvel.

Está

claro que a

teoria kantiana de pesquisa

cientlfica,

coextensiva, como vemos,

à crítica da

razão

teórica

e

à

filosofia

transcendental, é baseada em soluções dos

se-guintes problemas:

t

.

Qual é o

domínio

das proposiçõ es a

priori

possíveis e por isso decidíveis?

2.

Quais os procedimentosa

priori

para decidir proposições?

Parece sensato supor que

Kant

pediria,

a

qualquer teoria complementar

ou

alter-nativa

à

sua, soluções

pala

os mesmos problemæ. Estamos,

portanto,

autorizados a pensar

que,

segundo

Kant,

o

objetivo

básico da pesquisa em

filosofi¿

teórica é

o

de

resolver

o

problema geral

de

solubilidade

e

de especificar as propriedades gerais dos procedimentos de resolução.

creio

que, ainda

hoje, o

melhor programa para a pesquisa na

filosofia

teórica é o

kantiano, tomado

no

sentido aqui

especificado.

É óbvio

que esse programa sugere a

busca de uma teoria geral da descoberta

científica,

Tal teoria deverá dar conta do

sur-gimento

dos problemas em

gelal,

da representação e formulação dos problemæ, dos procedimentos gerais para

a

resolução de classes

(infinitas)

de problemas, da

nature-za

do

solucionador,

humano

ou mecânico, desses problemas, etc. Uma conseqüência desse programa é que a pesquisa filosófica teó¡ica passa a ser estreitamente ligada ri pes-quisa

científìca.

A

teoria dos métodos da resolução dos problemas matemáticos, por

e-xemplo,

é hoje em dia uma parte substancial da própria matemática, Do mesmo modo, a teoria geral da descoberta não poderá dispensæ as contribuições da lógica, psicologia, lingüística e outras ciências cognitivas. Nem por isso o seu caráter

filosófico

poderá ser contestado. Pois ela conterá necessariamente teses gerais sobre leis lógicæ,verdade, pro-vas, decidibilidade, etc.,

isto

é, sobre teses típicas da fìlosofìa teórica moderna. É claro que

o

estudo de tais teses precede logicamente qualquer tentativa racional de formula-ção

ou

de resposta de qualquer questão científìca. Assim, o problema de dizer o que é uma prova

legítima

é

anterior

ao problema de achar uma tal prova, O primeiro,

tipica'

mente

filosófìco por

envolver considerações sobre as leis lógicas aceitáveis, sobre a ver-dade,

etc.,

condiciona

o

segundo, que caracteriza a pesquisa positiva. Generalizando, podemos tratar como pertencentes à filosofìa teórica todos os problemas cujas soluções contribuem para especificar, e assim

tornar

possíveis ou decidlveis, os problemas

cien-tíficos.

Todos aqueles problemas poderiam, por isso, ser chamados de transcendentais'

Poderia

parecer

pouco

pedir

da

filosofia

teórica que

estude apenas

a

descoberta

cientffica.

Essa

é,

entretanto,

a

conseqüência

inevitável

do

ceticismo

histórico:

ou abandonamos de vez o empreendimento de buscar o saber teórico, ou nos contentamos em

formulá-lo como

um

sistema de respostas a questões sobre

a îatvteza,

que

sabe-mos

solúveis

em

virtude

da

constituição

do

aparelho

cognitivo

de que dispomos.

A

elaboração de

um

ta1 sistema

foi

repetidamente proposta como tarefa precípua da

(13)

cien-Sobre o Conòeito de Pesquisa em

Filosofîa

737 tistas modernos, acostumados a conviver com

o

ceticismo. Ouçamos Boltzmann: "Se,

portanto,

a

filosofìa

conseguisse

criar um

sistema

tal

que, em todos os casos, fìcasse

claro

quando uma questão não é

justifìcada,

de

modo

que aos poucos fosse se

extin:

guindo

o

impulso natural que nos faz

levantá-la, terfamos resolvido de

uma

vez os enigmas mais obscuros e a filosofìa tornaria a fazer jus ao nome de rainha das ciências."

O

ca¡áter transcendental dos problemæ fìlosóficos teóricos

proíbe

que eles sejam

confundidos com

problemas

cientlficos. Por

isso, a pesquisa na

fìlosofìa

teórica não deve ser naturalizada. Do mesmo modo, ela não deve ser politizada. Sem dúvida, idéias práticas

e

interesses

práticos

concretos de cada época ou lugar poderão

dirigir

a

for'

mulação dos problemas

filosóficos

teóricos, como se dá em

Kant.

Ele mesmo forne-ceu bons argumentos que mostram como a solubilidade dos problemas práticos

depen-de da

solubilidade dos

problemas

teóricos.

Mas

exigências irrecusáveis sobre as

soluções dos problemas

teóricos que não

pertencem ao

domlnio

de nenhuma teoria prâtica,

pois

caracterizam as condições de possibilidade

do

conhecimento,

e

não

as

da

ação

livre.

Por

isso mesmo,

o

conceito de uma

filosofìa

teórica nacional, brasilei'

fa, por

exemplo,

ou

é vazio de sentido

ou

é apenas

um

conceito de ciência positiva, isto é, da sociologia.

A

presente

explicitação

do

conceito

de

pesquisa

em fìlòsofìa teórica é

baseada

numa

determinada compreensão da

história

da þesquisa fìlosófìca e

cientlfìca,

resul-tado

de

um

diálogo com grandes filôsofris e cientistas. Esse dirílogo sô é possível

ha-vendo

acordo

e

divergência.

A

responsabilidade para

com

ambos

fìca

por

conta

de

quem

quer

fazer

filosofia:

ele mesmo deve estabelecer

a identidade

que sustenta o

acofdo,

é ele

também quem

deve

constituir a

diferença, que

impõe

a

divergência.

Nos dois

casos,

colre

o

risco de

se perder. Mas sem esse

rico

não há boas

oportuni-dades filosófìcas. Quem

corre

riscos buscando oportunidades está

em

crise.

É

a

cri-se,

portanto,

que faz, a meu ver, a fìlosofia

ter

seu lugar e sua vez.

ZELJKO LOPARIO

Univ er sida de E staduøl de C.ampina s

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