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Realizado de 25 a 31 de julho de Porto Alegre - RS, ISBN

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RETRATO DO BRASIL AOS OLHOS DOS VIAJANTES: RICHARD BURTON E A “VIAGEM DO RIO DE JANEIRO A MORRO VELHO”

Lígia Faria Tavares de Souza Graduando em Geografia da Universidade Federal de Viçosa – ligia.souza@ufv.br Leonardo Civale Universidade Federal de Viçosa – civale@ufv.br

INTRODUÇÃO

O Brasil da metade do século XIX chamou a atenção pelas suas riquezas e belezas naturais. O país vivia uma época de construção de seu próprio império, agora que já não mais pertencia aos domínios de Portugal. Tentava, então, firmar-se diante de um mundo de competições vorazes, um imperialismo emergente, que resultou da revolução industrial, e colocava a disputa de territórios do mundo como meta primordial.

Nesse contexto, surgem as viagens de exploração, para que se conheçam melhor os territórios que possam servir aos interesses de outra nação, e, naquele tempo, principalmente para a Inglaterra, que já tinha se firmado como potência. Não coincidentemente, Sir Richard Burton, explorador, orientalista e cônsul da Inglaterra, desembarcou no Brasil por ordens do governo Britânico. Ele pôde observar o processo de formação da cultura brasileira pela miscigenação de diversas etnias, e como cada uma influiu na outra para que assim se desse o que hoje temos como identidade cultural frente ao mundo. Pode-se ver, também, através do que foi escrito no livro, a diferença da economia brasileira da época com os diversos países do mundo.

Da visão eurocêntrica da época é que surgiu a curiosidade acerca dos diversos olhares estrangeiros sobre o território brasileiro. Assim, esse trabalho tem como objetivo primordial analisar o discurso do autor e trazê-lo à tona, assim como também relacioná-lo ao olhar geográfico do autor sobre o espaço

O BRASIL DA ÉPOCA

Richard Burton, autor de Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho, publica seu livro no ano de 1868, tendo a viagem ocorrida no ano anterior. Nesse contexto, o Brasil havia deixado se ser colônia há pouco tempo, e vivia um momento conturbado, de transformações

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políticas, tentando se afirmar como Império consistente frente ao mundo. Contudo, a vinda de diversos viajantes estrangeiros para território brasileiro não se deu de forma gratuita, pois devido aos acontecimentos da época, tal lugar tornou-se interesse primeiro para a exploração de possíveis recursos naturais ofertados pelo exuberante meio ambiente do país.

Nessa época, fruto da Revolução Industrial do século XVIII, começava a emergir um Imperialismo, resultado da competição de países europeus por matéria-prima para atender às demandas de um mercado consumidor incipiente. Assim, o fluxo de viajantes da época intensificou-se, porém suas intenções, agora, se diferenciavam do que já foram. Anteriormente, tais expedições tinham caráter apreciativo, de observação e admiração pelo que se via. Porém, no contexto em que Burton é inserido, ainda mais ele sendo um enviado do consulado britânico, e mesmo pelo o que se nota nas suas densas descrições, o Brasil foi visto como uma local de grandes riquezas naturais que poderiam ser de grande interesse ao governo inglês.

Portanto, a viagem que ele realiza, e suas descrições acerca do que é observado, indo desde a vida animal até costumes da população, não ocorrem por mero acaso. Afinal de contas, tudo o que se pode retirar do meio ambiente que tenha algum valor para a Inglaterra foi minuciosamente detalhado. Para ilustrar esse pensamento de que o país tem perdido muito não explorando seu potencial econômico, o autor chega a colocar em uma de suas páginas “Até agora, o Brasil sofreu as conseqüências de ter uma terra virtualmente incógnita para a Europa” (p. 30), reforçando, ainda, a idéia de que o europeu seria a salvação para a vida que existe fora de seu território.

O que se encontra ao longo do livro são páginas com descrições minuciosas que remontam à Geografia Tradicional, àquelas famosas monografias sobre espaços diversos, que são testemunhas de um país que começava a formar um povo que se identificasse com seu espaço, que era de extremo interesse para outras nações do mundo, devido à sua riqueza e exuberância, sendo também testemunhas da formação do que se hoje chama de povo brasileiro.

CORRENTES DE PENSAMENTO E SUAS INFLUÊNCIAS

Outro acontecimento do contexto em que Burton escreve e que se mostra importante para o entendimento das influências de tal autor foi a publicação da Origem das

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Espécies, de Charles Darwin. Essa se faz mais notável ao que concerne à questão da fauna.

Suas descrições sobre os animais são impressionantemente detalhadas, havendo comentários sobre hábitos e formas de vida de alguns animais, como pode-se ver na página 84, onde o autor descreve a predação de uma espécie de cupim por uma denominada formiga.

As observações geológicas também são bastante precisas, mas o avanço do conhecimento em diversos campos, naquela época, possibilitou a Burton um arcabouço teórico de extrema importância para suas anotações. Além disso, a experiência que ele adquiriu em suas diversas viagens pelo mundo, aliado ao saber de diversas línguas, abriram as portas para conhecer outros tipos de culturas e ensinamentos.

O avanço que a ciência alcançou naquele século, principalmente levando-se em conta o contexto e as inúmeras dificuldades da época, foram de notável influência na obra de Burton, assim como em diversas outras contemporâneas a essa, todavia, contudo, a que mais se faz notar é a presença da geologia. A Física, a Química e a Biologia, com todos os seus avanços, deram suporte necessário para a continuidade da evolução das teorias surgidas naquele tempo.

Entretanto, não se deve esquecer a presença do eurocentrismo da época no livro. Mesmo que ainda o autor pareça mais razoável ao que concerne à questão racial, a idéia que se passa é de um mundo que necessita dos conhecimentos da Europa para seguir seu trajeto rumo ao progresso por eles traçado.

Uma outra influência notável é a de Humboldt, considerado pai da Geografia, pois Burton dedica a esse algumas palavras, e tem como referência alguns de seu livros. É interessante fazer esse tipo de observação, pois o caráter desse geógrafo que o autor cita em diversas partes no livro é justamente voltado para a vegetação e o clima que encontra. Aliás, ele também esteve, assim como Burton, em território sul-americano, quando dedicou parte de uma viagem à Amazônia para fazer diversas descrições sobre paisagem do lugar, resultando em um livro Le Voyage Aux Régions Equinoxiales du Nouveau Continent, fait en

1799-1804, par Alexandre de Humboldt et Aimé Bonpland.

Diversas descobertas contemporâneas ao livro deixaram sua marca em uma das inúmeras páginas da descrição de parte do território brasileiro no livro a que se destina o trabalho. Todavia, a teoria darwinista, já destacada, é a influência que se fez mais expressiva nas palavras do autor.

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O OLHAR DE BURTON

Como já dito anteriormente, a viagem de Richard Burton ao Brasil não ocorreu gratuitamente. Ele desembarca em território brasileiro enviado pelo consulado britânico, depois de muito já ter viajado pelo mundo, quando ainda não era parte do governo inglês.

Sua viagem se iniciou no dia 12 de junho de 1867, saindo do Rio de Janeiro, e durou até o dia 12 de novembro do mesmo ano. Desde então, nada passou despercebido aos seus olhos. Tudo que lhe rodeava era descrito. Ao contrário do que possa se pensar, não apenas os recursos que a natureza podia oferecer eram vistos por Burton. Aliás, o processo de formação da cultura brasileira é alvo de diversas anotações por parte do autor, tendo dedicados capítulos inteiros à descrição acerca da população local.

Um dos aspectos mais interessantes sobre essa é a preocupação pelo indivíduo indígena. Em algumas passagens, o autor faz referências sobre tal assunto, comentando o desaparecimento desse elemento do território brasileiro. Em diversas partes do livro, Burton deixa anotações sobre a origem de algumas palavras, sendo, a maioria delas, provenientes dos dialetos indígenas.

Em uma das várias páginas de seu livro, ele chega a citar como a “aristocracia da pele “ (p. 321) é extremamente forte, usando como exemplo o fato de que duas pessoas que apresentem diferentes fortunas, caso sejam brancas, são tratadas igualmente perante a sociedade como um todo. Assim, os habitantes são divididos por duas “classes”: os brancos e os negros (majoritariamente, os escravos).

É um fato curioso que ele se atenha tanto à descrição da população, porém compreensível. Afinal, a Inglaterra tentava livrar o Brasil da escravidão desde o começo do século, pois tal exercício no país atrapalhava o possível mercado consumidor inglês: quanto mais escravos houvessem, eles não poderiam usufruir dos produtos ingleses, cabendo a apenas a parte livre da população o acesso a esses.

Além da questão dos costumes da sociedade brasileira, seu olhar também se voltou, como não seria diferente, à natureza como um todo, e não apenas seus recursos naturais. Ele não vê apenas o que pode ser oferecido pelo exuberante meio ambiente que pode encontrar, mas também observa como tal espaço era aproveitado. Em uma parte do livro, no caminho de Juiz de Fora à Barbacena (capítulo 5), ao analisar a paisagem, ele descreve uma paisagem

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por uma visão basicamente econômica: “O capim apresentava flores e sementes vermelhas, evocando a criação de gado [...]” (p. 84). São nessas pequenas anotações sobre a paisagem que se percebe a preocupação não apenas com a beleza que a Mata Atlântica mostra, mas também com o que ela pode ofertar que tenha algum valor comercial.

Embora, de modo geral, o olhar de Burton seja, naturalmente, voltado para a análise dos recursos disponíveis no território do brasileiro, ele parece carregar consigo uma visão um tanto quanto humanista, pois suas descrições, às vezes até mesmo estupefata com alguns acontecimentos, podem ser vistas como favoráveis à população da época, que foi caracterizada como agradável pelo mesmo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

São nessas minuciosas observações que podemos ter um retrato do que Burton tinha daquele Brasil da metade do século XIX. Um país que tentava se afirmar como nação, com um povo único, ainda que com todos os seus problemas, num contexto local e global conturbado, sendo o último marcado por disputas territoriais acirradas, na busca por matérias primas que alimentassem aquela industrialização que começava a se consolidar, assim como àquele capitalismo que começava a emergir.

Burton juntou suas anotações e publicou-as, criando um livro de leitura fácil e encantadora. As descrições sobre o que ele viu são, de certa forma, realistas, pois nos deixa com liberdade suficiente para interpretações próprias, nos fazendo sentir inseridos naquela realidade, tornando a espacialização do território brasileiro algo bem mais fácil de imaginar.

Através da análise sobre o que o autor escreveu em seu livro é que se foi possível chegar às visões que foram descritas nesse trabalho, o que acabou caracterizando um Brasil de pessoas receptivas, beleza exuberante e rica em recursos naturais, ainda que o governo não soubesse utilizar o que é ofertado pela natureza.

Resultados sobre essa leitura acabam se tornando algo pessoal, pois o pensamento que cada um formula acerca do que é lido compõe diferentes opiniões. Porém, o retirado como essencial é um povo ainda dominado pelas questões raciais, que protagonizaram lutas sociais por igualdade, e deixaram-nas como herança até os dias de hoje.

Sem dúvida, o livro de Richard Burton, Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho, é uma das mais belas obras que podem ser analisadas pela Geografia.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Patrícia Vargas de Lopes. Viajantes do Século XIX: Uma Reflexão Sobre as

Estéticas do Pitoresco e do Sublime na Construção de Representações para o Brasil.

Campinas: IFCH – Unicamp, 2006.

BELLUZZO, Ana Maria. O Viajante e a Paisagem Brasileira. Porto Alegre: Revista Porto Arte, v. 15, nº 25, 2008.

BURTON, Richard Francis. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2001.

MARTINS, Luciana de Lima. O Rio de Janeiro dos Viajantes – O Olhar Britânico

(1800 – 1850). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

MINDLIN, José E. Viajantes no Brasil: Viagem em Torno de Meus Livros. Rio de Janeiro: Estudos Históricos, vol. 4, nº 7, 1991.

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