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Que desafios para a avaliação formativa de paradigma construtivista na escola moçambicana?

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Academic year: 2021

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Que desafios para a avaliação formativa de paradigma construtivista na escola moçambicana?

David Silvestre Chabai Mudzenguerere1

Resumo

Desenvolver uma nova postura avaliativa requer desconstruir e reconstruir a concepção e a prática da avaliação e romper com a cultura de memorização, classificação, selecção e exclusão, tão presente no sistema de ensino. Isto remete a uma reflexão em torno de algumas questões básicas que constituem a compreensão epistemológica e pedagógica do conceber e do fazer da avaliação. São elas: para que avaliar? O que é avaliar? O que avaliar? Quando avaliar? Como avaliar e o que fazer com os resultados da avaliação? Estes questionamentos representam as principais dúvidas dos docentes na hora de concretizar seu trabalho pedagógico e elaborar e implementar a dinâmica avaliativa. O domínio sobre estas perguntas colabora para o desenvolvimento da autonomia didáctica do professor, conduzindo-o a uma sólida fundamentação teórica e prática do seu fazer docente e a sua implementação de forma consistente, sistemática e intencional. Nisso, vários investimentos são necessários: mudança da mentalidade docente para as inovações na avaliação, formação regular e abrangente sobre as novas metodologias (de avaliação), instrução sobre aplicação dessas novas a situações concretas/reais das escolas moçambicanas. Não custa pouco em termos económicos. Mas vale a pena investir.

Palavras-chave: Avaliação da aprendizagem, Avaliação formativa, Paradigma construtivista.

0. Introdução

O presente artigo enquadra-se na área temática de Avaliação da Aprendizagem no processo de ensino-aprendizagem. A partir do início do século XX, as concepções sobre avaliação vêm-se diversificando evolutivamente ao atravessar, pelo menos, quatro gerações, nomeadamente:

- Geração da Mensuração: que não distinguia avaliação da medida, e a

preocupação dos estudiosos, nessa fase, era a elaboração de instrumentos ou testes para verificação do rendimento escolar;

- Geração da Descrição: que surgiu em busca de melhor entendimento do

objectivo da avaliação. Aqui o avaliador estava muito mais concentrado em descrever padrões e critérios. Foi nessa fase que surgiu o termo “avaliação educacional”;

- Geração de Julgamento: que questionava os testes padronizados e o

reducionismo da noção simplista de avaliação como sinônimo de medida; tinha como preocupação maior o julgamento; e, finalmente:

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- Geração de Negociação: que considera a avaliação como um processo interactivo, negociado, que se fundamenta num paradigma construtivista. É uma forma responsiva de enfocar e um modo construtivista de fazer.

Segundo Serafim (2010), no seu artigo sobre a educação, “neste contexto de historicidade é que se trabalha na compreensão de uma prática avaliativa cuja finalidade da avaliação, de acordo com a quarta geração, é: fornecer, sobre o processo pedagógico, informações que permitam aos agentes escolares decidir sobre as intervenções e redireccionamentos que se fizerem necessários em face do projecto educativo, definido colectivamente, e comprometido com a garantia da aprendizagem do aluno.”

Ora, num país como Moçambique, em que os intervenientes no processo de ensino-aprendizagem, sobretudo os professores, ainda entendem avaliação como instrumento ou teste para verificação do rendimento escolar, o que é necessário fazer ou quais são os desafios por forma a que principalmente os professores (porque os implementadores) concebam a avaliação da aprendizagem como processo construtivo de um novo saber – fazer, de uma negociação?

Este é o problema que nos propomos discutir neste trabalho, com o objectivo de identificar os problemas que impedem a concretização desse tipo de avaliação de aprendizagem e a partir daí as condições necessárias para a sua implementação ou a passagem de uma avaliação normativa para a formativa, de uma avaliação de mensuração para uma de negociação.

E discutir/resolver este problema significa contribuir para uma educação mais integrada, multidimensional e inclusiva (promovendo as capacidades de cada aluno e respeitando as suas fraquezas) de que os moçambicanos precisam para o desenvolvimento próprio e do país em geral.

1. Por que os professores resistem à avaliação formativa ou negociada (em Moçambique)?

A diversidade e a coerência entre os instrumentos e o processo avaliativo visam atingir as várias dimensões dos sujeitos/objectos avaliados. Tal postura avaliativa intenciona superar a visão restrita do aluno e do professor como seres apenas cognitivos, desconsiderando outras dimensões como a afectiva, a social, a cultural, etc.. Portanto, o resgate da multidimensionalidade dos sujeitos da educação escolar é

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imprescindível, pois "... a formação integral é a finalidade principal do ensino e, portanto, seu objectivo é o desenvolvimento de todas as capacidades da pessoa e não apenas a cognitiva" (Zabala, 1998).

Pelo que se faz necessário inventariar um maior número de instrumentos avaliativos, perpassando o trabalho pedagógico, para colectar o máximo de informações possíveis em torno das aprendizagens e das histórias de vida dos alunos e das intervenções e posturas dos professores. A título de exemplo, restringir a avaliação aos testes finais e aos alunos implica não avaliar certos aspectos dos alunos, como o desempenho oral, a capacidade investigativa e a participação em trabalhos em grupos, nem tão pouco o desenvolvimento da aquisição dos conceitos testados finalisticamente, como também não toma a intervenção didáctica como objecto da avaliação. Diversificar os instrumentos avaliativos não é simplesmente adoptar vários instrumentos aleatoriamente, a avaliação é um campo teórico e prático que possui um carácter metódico e pedagógico que atende à sua especificidade e intencionalidade.

Por isso, os programas dos diversos níveis de escolarização em Moçambique, como o de filosofia, já propõem

metodologias activas e participativas (…), centradas no aluno e viradas para o desenvolvimento de competências para a vida, pretendendo significar que o professor não é mais um centro transmissor de informações e conhecimentos, expondo a matéria para reprodução e memorização pelos alunos. O aluno deve ser um sujeito activo na construção do conhecimento e pesquisa de informação, reflectindo criticamente sobre a sociedade. (MEC-INDE, 2008).

Hoffmann (1993) tem razão ao afirmar que "... o quotidiano da escola desmente um discurso inovador de considerar a criança e o jovem a partir de suas possibilidades reais. A avaliação assume a função comparativa e classificatória". Perrenoud (1999) também tem a mesma opinião quando escreve que "... a teoria avaliativa já avançou muito, mas o fazer avaliativo no quotidiano da escola ainda traz resquícios de uma avaliação mensuradora e coerciva". Pois, o que se vive na prática escolar moçambicana é isso: os professores continuam no centro do processo de ensino-aprendizagem, o aluno um receptáculo de seus discursos (método expositivo, apontamento do professor-única fonte do conhecimento), avaliação baseada somente nos testes (e aspectos como participação oral na sala, assiduidade, TPC, são postos de fora), etc..

Ora, o receio de perder o seu poder/autoridade sobre os alunos (quando tudo é negociado e não mais se usa a dificuldade do aluno para humilhá-lo, chumbá-lo), a falta de domínio das metodologias da avaliação construtivista (porque não preparados), a

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exiguidade do material didáctico em muitas escolas moçambicanas, o número de alunos por turma exagerado (dificulta o acompanhamento de cada um e de todos, ao mesmo tempo que se cumpre o programa de ensino), etc., colocam-se como causas evidentes dessa atitude resistente dos professores. Vale dizer que não se trata só de mentalidade conservadora, por parte dos profissionais da educação, que está em causa, como também as condições estruturais e profissionais de trabalho para a implementação das mudanças/inovações contam.

2. Que desafios para o paradigma construtivista de avaliação de aprendizagem?

2.1. Mudar a concepção dos intervenientes na educação, sobretudo os

professores, se faz urgente e necessário, deslocando a ideia da avaliação do ensino para a avaliação da aprendizagem, de modo que se evite que o avanço nas formas de organizar o ensino não tenha correspondência com as práticas avaliativas, ocorrendo, portanto, uma discrepância entre inovadoras práticas educativas e as vigentes formas avaliativas.

Aliás, Perrenoud (1993) já nos chama atenção ao afirmar que " ... mudar a avaliação significa provavelmente mudar a escola. Automaticamente, mudar a prática da avaliação nos leva a alterar práticas habituais, criando inseguranças e angústias e este é um obstáculo que não pode ser negado, pois envolverá toda a comunidade escolar". Todos os intervenientes na acção pedagógica devem ter bem em mente que a função nuclear da avaliação é colaborar para que o aluno aprenda e que o professor consiga, ao ensinar, determinar também quanto e em que nível os objetivos estão sendo atingidos. Para isso, é necessário o uso de instrumentos e procedimentos de avaliação adequados (Libâneo, 1994). A importância da avaliação está no facto de o aluno poder tomar conhecimento de seus avanços e dificuldades. Cabe ao professor desafiá-lo a superar as dificuldades e continuar progredindo na construção dos conhecimentos. (Luckesi, 1999).

Para Hadji (2001), "... a passagem de uma avaliação normativa para a formativa implica, necessariamente, uma modificação das práticas do professor em compreender que o aluno é, não só o ponto de partida, mas também o de chegada. Seu progresso só pode ser percebido quando comparado com ele mesmo: Como estava?

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Como está? As ações desenvolvidas entre as duas questões compõem a avaliação formativa".

É necessário que se perceba claramente que as metodologias se definem pelas intenções e formas de agir do professor. Assim, as tarefas avaliativas são instrumentos de dupla função para professores e alunos: Para o professor – elemento de reflexão sobre os conhecimentos expressos pelo aluno e elemento de reflexão sobre o sentido da sua acção pedagógica; Para o aluno – oportunidade de reorganização e expressão de conhecimentos e elemento de reflexão sobre os conhecimentos construídos e procedimentos de aprendizagem.

Por isso, na avaliação da aprendizagem, o professor não deve permitir que os resultados das provas periódicas, geralmente de caráter classificatório, sejam supervalorizados em detrimento de suas observações diárias, de carácter diagnóstico. E o professor que trabalha numa dinâmica interactiva, cooperativa, tem noção, ao longo de todo o ano, da participação efectiva e produtividade de cada aluno. Como, em geral, a avaliação formal é datada e obrigatória, é preciso que se tenha inúmeros cuidados em sua elaboração e aplicação. Em síntese, como afirma Perrenoud (1999), “O importante não ‘é fazer como se’ cada um houvesse aprendido, mas permitir a cada um aprender”.

2.2. Com a transição paradigmática no campo educacional, a discussão em torno

das emergentes concepções e práticas educativas e suas relações com o conceber e o fazer avaliativos constitui um universo denso e novo. Este universo requer do docente sua aproximação e seu envolvimento crítico para que ele possa repensar autonomamente sua postura político-pedagógica e reelaborar constantemente seu fazer profissional e, em particular, a acção avaliativa.

Daí que não se pode esquecer que qualquer mudança no processo avaliativo não foge de um debate sobre as condições da formação inicial e continuada do professor (através de seminários regulares de capacitação a nível nacional e a de cada escola moçambicana) e de suas condições de trabalho (material didáctico disponível e número razoável de alunos por turma) e valorização social e económica (pelo menos que receba o seu salário à data). Esse pressuposto visa desmistificar uma perspectiva ingénua de que é apenas mudando a avaliação em si mesma que os problemas educacionais estarão resolvidos.

Diante desse quadro, "justifica-se a necessidade de uma maior reflexão em torno da prática educativa" (Zabala, 1998), que envolve a relação pedagógica entre o

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planeamento do trabalho docente, a sua efectivação através do ensino e da aprendizagem, o processo avaliativo e as condições estruturais de trabalho dos profissionais da educação. Buscar compreender a coerência didático-pedagógica entre os elementos da prática educativa (planeamento, ensino/aprendizagem e avaliação) e sua interdependência com a especificidade sócio-educacional do contexto escolar poderá possibilitar aos professores reflectirem sua acção para reelaborar sua postura pedagógica como um todo e, em especial, a avaliativa, cientes dos limites e possibilidades dessa reflexão.

Em nome dos objectivos actuais, e com razão, da educação (centrados no aluno), importa lutar pela materialização da avaliação formativa reguladora por favorecer ao professor desenvolver "intervenções diferenciadas, que, por sua vez, precisam vir acompanhadas de (...) meios de ensino, de organização dos horários, de organização do grupo-aula, até mesmo de transformações radicais das estruturas escolares" (Perrenoud, 1999). Isto é, torna-se imperativo um repensar e uma reestruturação do sistema educacional como um todo e da escola em específico, tomando como referência uma perspectiva emancipadora da educação (Silva, 2002).

Conclusão

Desenvolver uma nova postura avaliativa requer desconstruir e reconstruir a concepção e a prática da avaliação e romper com a cultura de memorização, classificação, selecção e exclusão, tão presente no sistema de ensino. Isto remete a uma reflexão em torno de algumas questões básicas que constituem a compreensão epistemológica e pedagógica do conceber e do fazer da avaliação. São elas: para que avaliar? O que é avaliar? O que avaliar? Quando avaliar? Como avaliar e o que fazer com os resultados da avaliação? Estes questionamentos representam as principais dúvidas dos docentes na hora de concretizar seu trabalho pedagógico e elaborar e implementar a dinâmica avaliativa. O domínio sobre estas perguntas colabora para o desenvolvimento da autonomia didáctica do professor, conduzindo-o a uma sólida fundamentação teórica e prática do seu fazer docente e a sua implementação de forma consistente, sistemática e intencional.

Nisso, vários investimentos são necessários: mudança da mentalidade docente para as inovações na avaliação, formação regular e abrangente sobre as novas metodologias (de avaliação), instrução sobre aplicação dessas novas a situações

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concretas/reais das escolas moçambicanas. Não custa pouco em termos económicos. Mas vale a pena investir.

Bibliografia

HADJI, C. Avaliação desmistificada. Porto Alegre, Artes Médicas, 2001.

HOFFMANN, J. Avaliação mito e desafio: uma perspectiva construtivista. Porto Alegre, Educação e Realidade Revistas e Livros, 1993.

LIBÂNEO, J. C. Didáctica. 15. ed. São Paulo, Cortez, 1999.

LUCKESI. C.C. Avaliação da aprendizagem escolar. 9. ed. São Paulo, Cortez, 1999. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA (MEC); INSTITUTO NACIONAL DE

DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO (INDE) Programa do 2º Ciclo, Introdução à Filosofia. Maputo, MEC/INDE, 2008.

PERRENOUD, P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens. Porto Alegre, Artmed, 1999.

___________. “Não mexam na minha avaliação! Para uma abordagem sistêmica da mudança pedagógica”. In: NÓVOA, A. Avaliação em educação: novas perspectivas. Porto, Porto Editora, 1993.

SERAFIM, L. (2010). A avaliação da aprendizagem como processo construtivo de um novo saber – fazer, (in: http//www.algosobre.com.br/index2), consultado em 18 -06-2010.

SILVA, J. F. “Modelo de formação para professores da educação infantil e dos primeiros anos do ensino fundamental: aproximações e distanciamentos políticos, epistemológicos e pedagógicos”. In: Igualdade e diversidade na educação. Anais do XI Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino (ENDIPE). Goiânia, 2002.

ZABALA, A. “A Avaliação”. In: ZABALA, A. A Prática educativa: como ensinar?. Porto Alegre: Artmed. 1998.

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