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Título: Ecologias em terra paulista: as relações entre o homem e o meio ambiente durante a expansão agrícola ( )

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Academic year: 2021

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Autor: Marcelo Lapuente Mahl

Filiação Institucional: Unesp-Assis (Doutorando)

Título: Ecologias em terra paulista: as relações entre o homem e o meio ambiente durante a expansão agrícola (1894-195)

O desenvolvimento da pesquisa científica no Brasil, durante o decorrer do século XIX, contribuiu para a expansão dos processos de exploração e conhecimento da natureza. Dentre as disciplinas que mais colaboraram para isso, pode-se indicar a zoologia, a botânica, a geografia, a geologia e, principalmente, a biologia, que ofereceram subsídios - a partir de um olhar teórico sobre o mundo - e indicaram caminhos a serem percorridos pelos naturalistas exploradores, nos mais longínquos cantos do território brasileiro.

Nesse sentido, deve-se destacar a colaboração das ciências naturais, que ao direcionarem seus estudos à natureza acabaram tornando-se espaços privilegiados de discussões sobre as relações entre o homem e o mundo natural, além de organizarem de uma forma sistemática saberes sobre o tema a partir de uma ordem teórico-metodológica própria.

A trajetória dessa área de pesquisa no Brasil se inicia destacadamente a partir da chegada da família real portuguesa, em 1808, dando continuidade ao processo de consolidação destas disciplinas, iniciado na metrópole nas últimas décadas do século XVIII, durante o governo iluminista de D. José. O príncipe regente recém chegado ao Rio de Janeiro, D. João VI, deu os primeiros passos para o desenvolvimento da zoologia, da botânica, da mineralogia e da biologia em terras nacionais. (NOGUEIRA, 2000).

Cabe ressaltar que, no período anterior à transferência da família real portuguesa, o conhecimento científico sobre o mundo natural brasileiro era precário e fragmentado. As poucas informações confiáveis sobre a natureza do país tinham sido organizadas e elaboradas por viajantes estrangeiros, muitas vezes desenvolvendo seus estudos sem a autorização régia necessária. Por outro lado, as limitadas iniciativas para mudar esta realidade, empreendidas pela coroa portuguesa, estavam necessariamente ligadas à busca de metais preciosos, e acabavam, por motivos de segurança, permanecendo restritas sob o domínio das esferas governamentais e, conseqüentemente,

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longe dos olhos da maioria dos pesquisadores (BOXER, 2002). Assim, foi somente a partir do inicio do século XIX que ocorreram as primeiras tentativas bem sucedidas de se construir um conhecimento oficial e sistemático sobre o território nacional, a partir das ciências naturais (LEITÃO, 1937).

Os primeiros espaços europeus totalmente dedicados ao estudo das ciências naturais foram os Museus de História Natural e os Jardins Botânicos, que se desenvolveram sobretudo no período Iluminista, fundamentados sob a ótica da construção de conhecimentos racionais e empíricos sobre o mundo. Foi o biólogo Carlo Lineu quem mais se destacou na tentativa de consolidar uma metodologia capaz de homogeneizar os processos descritivos do mundo natural, estabelecendo as bases teóricas para a classificação e apresentação pormenorizada de animais e plantas (GERBI, 1996). O padrão que fundamentou essas primeiras etapas do processo de divisão e hierarquização do mundo natural, durante os séculos XVIII e XIX, foi estabelecido a partir da serventia dos seres e elementos da natureza para o homem, respeitando as concepções utilitaristas e antropocêntricas, marca fundamental das relações entre as sociedades e o meio ambiente que vigoravam naquele momento (THOMAS, 2001).

Foi portanto o governo português que trouxe ao Brasil, durante o período Joanino, as duas primeiras instituições dessa natureza ligadas ao desenvolvimento das ciências naturais: o Real Horto Botânico, fundado em 1808, e o Museu Real, de 1818, que alguns anos mais tarde passou a ser conhecido como Museu Nacional. Estas duas instituições – unidas sob uma mesma administração a partir de 1819 - seguiam o caráter colecionador iluminista, agregando em seus locais de funcionamento vários tipos de objetos, convertendo-se em espaços ecléticos que incluíam exemplares do mundo natural, além de objetos de valor etnológico e histórico. Por outro lado, essas duas casas também serviam como fornecedoras de material aos museus europeus, abastecendo inúmeras instituições e coleções localizadas no estrangeiro (LOPES, 1997).

O jardim botânico carioca tinha como um dos seus mais caros objetivos a aclimatação de muitas espécies estrangeiras com virtuais interesses econômicos. Dessa maneira, produzia-se em terras brasileiras estudos que permitissem o futuro plantio de espécies estrangeiras, ou fazia-se também o caminho inverso, ou seja, ao enviar exemplares de plantas nativas para serem adaptadas às condições ecológicas da Europa.

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No século XVIII, alguns jardins de aclimatação já tinham sido instalados no Brasil, mais especificamente nas cidades de São Paulo, Belém, Salvador e Ouro Preto, porém sem muitos resultados satisfatórios para a coroa. O Jardim Botânico do Rio de Janeiro buscou preencher tal lacuna e não repetir o fracasso das tentativas anteriores.

Inspirado no Real Jardim Português, que desde os trabalhos do naturalista italiano Domenico Vandeli fazia pesquisas sobre a adaptação de plantas tropicais em solo lisboeta, o Jardim Botânico do Rio chegou a desenvolver experiências bem sucedidas com o chá, o gengibre e o cravo. Entretanto, com a independência do Brasil e a mudança nos rumos políticos do país, a realidade da instituição transformou-se, tornando-se basicamente um local de passeio público, repetindo em certa medida a sina de seus predecessores (DEAN, 1991).

O Museu Nacional, por outro lado, teve uma história muito mais complexa e longeva. A instituição tornou-se um verdadeiro centro de estudos das ciências naturais, e teve em seus quadros alguns dos nomes mais proeminentes da história natural brasileira, com destaque para as figuras de Frederico Leopoldo César Burlamarque, Francisco Freire Alemão e Ladislau de Sousa Melo Neto, ambos responsáveis pela consolidação dos ideais científicos no museu, e também pelo reconhecimento deste centro de pesquisa no Brasil e no mundo (LOPES, 1997).

A crescente importância que o Museu Nacional alcançava no Brasil, sendo praticamente a única instituição desse tipo no país até a última década do século XIX – tendo estendido seus interesses para além das ciências naturais, como no caso dos estudos etnológicos - não isentou o local de crescentes problemas financeiros, da falta de apoio governamental, de carências materiais e das disputas políticas que acabaram muitas vezes prejudicando o andamento das pesquisas e dos trabalhos desenvolvidos no local (LOPES, 1997; FIGUERÔA, 2000).

A história do Museu Nacional também está ligada ao processo, empreendido após a independência oficial, de consolidação do Estado Nacional brasileiro. A instituição contribuiu com seus trabalhos científicos, tanto na área das ciências naturais quanto na de etnologia, para a construção de representações sobre o povo e a natureza nacional, dialogando com os paradigmas raciais-científicos europeus tão em voga no século XIX; tarefa que era dividida com os Institutos Históricos, notadamente o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fundado em 1838 (SCHWARCZ, 1993). Assim sendo, tanto o conhecimento quanto a catalogação do mundo natural brasileiro

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não estavam somente vinculados aos interesses utilitaristas e econômicos em voga no momento, mas também a objetivos simbólicos e imagéticos de construção de uma identidade nacional.

O processo de busca de um saber racional sobre a natureza, fundamentado nas ciências naturais, também chegou às terras paulistas. Estimulados pelo desenvolvimento da economia cafeeira, que se expandia vertiginosamente rumo ao interior, o governo imperial e posteriormente os líderes do Estado republicano perceberam a importância e a necessidade de se buscar um maior conhecimento técnico-científico sobre os possíveis recursos naturais do Estado, com o objetivo de favorecer o domínio e a exploração sobre os mesmos.

Não há dúvida de que um dos marcos desse decurso foi a criação, em 1886, da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, dirigida pelo geólogo norte-americano Orville A. Derby, e que contou com a colaboração de importantes nomes que fizeram parte da história das ciências naturais no Brasil em finais do século XIX, como a do Geógrafo Theodoro Sampaio e do naturalista sueco Alfredo LÖfgren.

A comissão paulista teve como propósito fundamental contribuir para o mapeamento geográfico, geológico, botânico e climático do Estado de São Paulo; num esforço notadamente ligado aos interesses das forças econômicas e políticas estaduais que, naquela época, buscavam e desfrutavam de certa hegemonia no governo federal, já a partir das últimas décadas do século XIX.

Os cientistas que compunham a CGG de São Paulo buscaram não repetir o fracasso das iniciativas idealizadas ainda durante o Império, como a Comissão Científica de Exploração, que desenvolveu seus trabalhos entre os anos de 1859 e 1861, mas poucos resultados práticos trouxe, publicando parcos relatórios, em meio a uma série de críticas da imprensa carioca, que apelidou-a de Comissão das Borboletas. Aparentemente, quem mais ganhou com a expedição foi o Museu Nacional, que acabou recebendo material coletado nas regiões Norte e Nordeste do país pela equipe de exploradores (LOPES, 1997).

Alguns anos adiante, mais precisamente em 1874, uma outra comissão geológica foi organizada, agora com a participação do importante geólogo Frederick Hartt e de uma série de naturalistas brasileiros e estrangeiros. Entre os anos de 1875 a 1877, esta nova comissão viajou por várias províncias brasileiras, coligindo material e empreendendo importantes estudos de geologia, zoologia, botânica e geografia.

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Entretanto, uma série de dificuldades econômicas levou à extinção dos trabalhos também desta segunda organização exploratória (FIGUERÔA, 2000). Os mais importantes naturalistas estrangeiros que fizeram parte do grupo foram embora, provavelmente decepcionados com o governo imperial. No entanto, o norte americano Orville Derby acabou fixando residência no Brasil, tornando-se não só, alguns anos mais tarde, um dos principais nomes da Comissão Geográfica e Geológica Paulista, mas também um proeminente nos meios intelectuais da Primeira República.

Muitos dos cientistas que participaram da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, como os já citados Orville Derby, além de Alberto Lofgren, Theodoro Sampaio e Francisco de Paula Oliveira, acabaram fazendo parte de outras instituições científicas organizadas mais tarde em São Paulo, como O Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e o Museu Paulista.

Dessa maneira, a comissão estendeu seus trabalhos ao longo de 45 anos, mais precisamente entre os anos de 1886 a 1931, elaborando uma série de cartas cartográficas, relatórios geológicos e artigos científicos, que contribuíram para a compreensão do território paulista a partir dos paradigmas e das metodologias científicas do período. Além do mais, vários de seus participantes contribuíram para o incremento da vida intelectual da capital do Estado.

As iniciativas das autoridades republicanas visando estimular a formação de conhecimentos sobre o território de São Paulo, a partir de um olhar científico, foram complementadas por uma série de institutos fundados com o objetivo de fornecer subsídios para o desenvolvimento agrícola do estado.

Respondendo principalmente aos interesses dos cafeicultores e das zonas cafeeiras paulistas, foram fundados vários Institutos Agronômicos, com destaque para a Estação Agronômica de Campinas, em 1889, e em 1898, a criação da Escola Prática de Agricultura de Piracicaba, mais tarde denominada Escola Agrícola Luis de Queiróz. Estes são somente dois exemplos muito conhecidos de uma série de iniciativas que partiram principalmente das esferas governamentais – municipal, estadual e federal – com o objetivo de incrementar as atividades agrárias em todo o país.

Tais iniciativas ligavam-se, portanto, diretamente aos inúmeros discursos que clamavam pela necessidade de se estabelecer novas formas de relação entre o homem e a terra. Esses defensores de uma nova economia rural, fundamentados no ideal de progresso que buscava transformar a agricultura nacional e o homem do campo por

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meio da ciência, marcaram sobremaneira os debates sobre o processo de expansão agrícola na primeira metade do século XX.

Bibliografia citada:

BOXER, Charles R. O Império Marítimo Português 1415-1825. Trad. Anna Olga de Barros Barreto. São Paulo: Cia das Letras, 2002.

DEAN, Warren. A industrialização de São Paulo. trad. Octávio Mendes Cajada. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1991.

FIGUERÔA, Silvia F. de M. (org). Um olhar sobre o passado – história das ciências na

América Latina. Campinas: Ed. Unicamp, Imprensa Oficial, 2000.

GERBI, Antonello. O novo mundo. História de uma polêmica 1750-1900. Trad. Bernardo Jofflily. São Paulo: Cia das Letras, 1996.

LEITÃO, Candido de Mello. A biologia no Brasil. São Paulo: Cia Editora Nacional, Coleção Brasiliana, vol 99, 1937.

LOPES, Maria Margaret. O Brasil descobre a pesquisa científica: os museus e as

ciências naturais no séc. XIX. São Paulo: Hucitec, 1997.

NOGUEIRA, Eliana. Uma história brasileira da botânica. Brasília: Paralelo 15, 2000. SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo das raças – cientistas, instituições e questão

racial no Brasil – 1870-1930. São Paulo: Cia das Letras, 1993.

THOMAS, Keith. O homem e o mundo natural. Trad. João Roberto Martins Filho. São Paulo: Cia das Letras, 2001.

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