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APLICAÇÃO DAS MEDIDAS ATÍPICAS NA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA: O STJ E O ART. 139, IV, DO CPC

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CURSO DE BACHARELADO

EM CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS

APLICAÇÃO DAS MEDIDAS ATÍPICAS NA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA:

O STJ E O ART. 139, IV, DO CPC

Felipe Rebelo Alves

São Paulo 2020

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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

CURSO DE BACHARELADO

EM CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS

APLICAÇÃO DAS MEDIDAS ATÍPICAS NA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA:

O STJ E O ART. 139, IV, DO CPC

Felipe Rebelo Alves

Monografia apresentada à banca examinadora da Uni- versidade Cruzeiro do Sul, como exigência parcial para a obtenção do grau de bacharel em direito, sob a orien- tação do professor Julio Augusto Lopes.

São Paulo 2020

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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

CURSO DE BACHARELADO

EM CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS

APLICAÇÃO DAS MEDIDAS ATÍPICAS NA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA:

O STJ E O ART. 139, IV, DO CPC

Felipe Rebelo Alves

Banca Examinadora:

_____________________________________________

Presidente:

_____________________________________________

2º Membro:

_____________________________________________

3º Membro:

São Paulo, ____de ______________de 2020.

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Agradecimentos

Agradeço primeiramente a Deus, pois a sua infinita bon- dade me revela a luz dos céus.

Igualmente, sou grato a minha inestimável família, que me ensina os valores mais importantes da vida.

Agradeço a querida Juliana, que me encanta todos os dias com os seus gestos de amor.

E também sou grato aos advogados que contribuíram com a minha iniciação e percurso na academia, especi- almente ao colega Dr. Clemente Cardoso de Almeida Dias da Rocha, cuja ajuda imensurável, dedicação e pa- ciência foram indispensáveis para a realização desta monografia.

Agradeço a Universidade de São Paulo (USP) pela opor- tunidade de participar como aluno especial do Departa- mento de Processo Civil, no ano de 2020, oportunidade na qual se ascendeu a chama da presente monografia.

Por fim, registro meus agradecimentos ao orientador e demais professores da Universidade Cruzeiro do Sul.

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“O tempo é um implacável inimigo do processo, contra o qual todos – o juiz, seus auxiliares, as partes e seus procuradores – devem lutar de modo obstinado”.

TUCCI, José Rogério Cruz e. Tempo e processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 119.

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RESUMO

Com o presente estudo, investigou-se o art. 139, IV, do CPC/2015, como cláusula geral processual executiva, calcada pelo legislador, sobretudo, com a finalidade de garantir a máxima efetividade da tutela jurisdicional executiva. Contudo, os conceitos vagos e indeterminados desse dispositivo normativo, bem como o seu ineditismo em relação às execuções pecuniárias, resultaram nas mais inusitadas decisões judiciais, cujos fundamentos, em sua imensa maioria, foram revisados e revertidos pelo Supe- rior Tribunal de Justiça. Nesse contexto, denota-se que são inúmeros e, por vezes, parecem inconciliáveis os fundamentos jurídicos adotados para deferir ou afastar a aplicação das medidas executivas atípicas. Mas, cremos que esse cenário instável por si só não afasta a nobre intenção legislativa. Com efeito, veremos que os motivos pelo quais são diversas as suas interpretações residem no fato de que o dispositivo não cuidou de delimitar critérios específicos de controle sob a ótica da estrita legali- dade. Com a ampliação desse horizonte de atuação, os tribunais têm se socorrido dos postulados gerais estampados no CPC/2015, sob o enfoque de uma interpretação sistemática do ordenamento processual. Assim, pretende-se no decurso desta mono- grafia subtrair os parâmetros de controle já definidos exclusivamente pelo STJ até aqui, para, posteriormente, comentá-los, isoladamente, com o propósito de emaranhar essa clausula geral processual executiva nas balizas do ordenamento jurídico.

Palavras-chaves: Código de Processo Civil. Processo de Execução. Superior Tribu- nal de Justiça. Medidas Executivas Atípicas. Suspensão de CNH e Passaporte.

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ABSTRACT

This study analyze the section 139, IV, of the brazilian Civil Procedure Code of 2015, whose objective is to guarantee the greatest effectiveness of judicial decisions, due to its own inaccuracy and your vague concepts that lead to several contradictory decisi- ons during the execution proceedings. The legal bases of these decisions were several times reviewed by the Superior Court of Justice - STJ. But, yet, we believe that this unstable scenario does not undermine the remarkable intention of the legislative text.

In fact, we will see that the reasons why the interpretations extracted from this legal text are diverse boil down to the fact that the legislator was not concerned with defining specific legality control criteria for the use of this legal artifice. With the increased use of this device, the courts have relied on the general postulates inserted in the Code of Civil Procedure of 2015 under the focus of a systematic interpretation of the procedural order. This, it is intended in the course of this monograph to subtract the control para- meters already defined exclusively by the brazilian Superior Court of Justice until now, to later comment on them, in isolation, with the purpose of inserting this atypical enfor- cement measures within the limits of the national legal system.

Keywords: Civil procedure. Execution proceedings. Superior Justice Tribunal. Atypi- cal enforcement measures. Suspension of driver's license and passport.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1 A TÉCNICA EXECUTIVA ATÍPICA NA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA ... 10

1.1 Alterações Legislativas ... 12

1.2 As espécies de Medidas Executivas Atípicas ... 15

2 O DIREITO FUNDAMENTAL À JURISDIÇÃO ADEQUADA E EFETIVA ... 18

2.1 A Crise de Efetividade da Jurisdição ... 19

2.2 A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5941/DF ... 22

3 STANDARDS PROCESSUAIS DA TÉCNICA EXECUTIVA ATÍPICA ... 26

3.1 Leading Cases do STJ sobre a Aplicação das Medidas Executivas Atípicas na Execução por Quantia Certa ... 30

3.2 Parâmetros de Controle Definidos pelo STJ ... 38

3.2.1 Garantia e momento do contraditório ... 39

3.2.2 Os postulados gerais do CPC/2015... 41

3.2.3 Aplicação subsidiária ... 43

3.2.4 Indícios de existência e ocultação de patrimônio ... 46

3.2.5 Fundamentação específica da decisão ... 47

4 CONCLUSÃO ... 50

REFERÊNCIAS ... 51

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INTRODUÇÃO

Se por um lado a cláusula geral executiva do art. 139, IV, do CPC/2015, reforça o poder criativo da atividade jurisdicional, com o propósito de garantir a má- xima efetividade da execução, em meio à grave crise de eficácia da atividade jurisdi- cional instalada no país, pelo outro, a sua aplicação carece prima facie da definição de parâmetros específicos de controle desse instituto, sob a ótica da legalidade.

Nessa circunstância, entendemos que seria necessário adequar a aplica- ção dessa técnica através da interpretação sistemática dos postulados gerais estam- pados no CPC/2015, para garantir a máxima efetividade do poder de imperium confe- rido ao órgão jurisdicional, tal como preceitua a mens legis, sem que haja violação às garantias fundamentais do devedor.

Com o frescor do CPC/2015, especialmente em relação ao tema estudado, a jurisprudência e a doutrina processual ainda se debruçam para fixar critérios co- muns, adequando-os aos ditames constitucionais do processo civil, mediante ao que se entende pela razoável restrição de direitos fundamentais do devedor.

E assim, com a presente pesquisa jurídica, acompanhada de anotações da doutrina processual selecionada, pretende-se especialmente mapear quais foram os parâmetros já definidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) na exegese de seus julgamentos a respeito da aplicação da técnica executiva anômala, por aplicação do art. 139, IV do CPC, sobretudo aos julgados que se referem às execuções pecuniárias.

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1 A TÉCNICA EXECUTIVA ATÍPICA NA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA

Durante muitos anos, como forma de controlar a atividade jurisdicional pelo prisma da legalidade, o sistema processual autorizava apenas a aplicação de meios executivos tipicamente previstos no ordenamento. "Em outras palavras, a lei, ao definir os limites da atuação executiva do juiz, seria uma garantia de justiça das partes no processo" (DIDIER JR., 2017, p. 100 apud MARINONI, 2004, p. 43).

Levando em consideração as particularidades dos casos concretos e a so- fisticada blindagem patrimonial adotada pelos devedores, a doutrina reconheceu que seria impossível de se exigir do legislador a prévia abstração de todas as hipóteses de medidas executivas apropriadas para assegurar a efetividade da tutela jurisdicional executiva, inclusive nos casos de execução por quantia certa.

E assim, o princípio da tipicidade dos meios executivos, que antes vigorava solitário (ao menos para as hipóteses envolvendo obrigação de pagar quantia), cedeu espaço ao chamado princípio da concentração dos poderes de execução do juiz, ou, simplesmente, ao moderno princípio da atipicidade dos meios executivos.

Esse é o ensinamento de Theodoro Jr. (2020):

Na execução de sentença relativa às obrigações de fazer e não fazer sempre se autorizou o recurso a meios coercitivos para induzir o de- vedor a cumprir a prestação devida, a exemplo das astreintes (CPC/2015, art. 814), e das diversas providências elencadas exempli- ficativamente no art. 536, § 1º, do CPC/2015 (busca e apreensão, re- moção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, inclusive com auxílio de força policial). Havia, no en- tanto, séria resistência à utilização desses meios coercitivos (apelida- dos de medidas de apoio, segundo uns, ou de medidas de execução indireta, segundo outros) nas execuções de obrigações por quantia certa, por falta de autorização expressa em lei.

(11)

O CPC/2015 enfrentou o problema e no art. 139, IV, ultrapassou a an- tiga tese da tipicidade dos meios executivos praticáveis na execução das obrigações de quantia certa, que a excluía do alcance dos meios coercitivos atípicos. Agora, o dispositivo do Código referido inclui, tex- tualmente, entre os poderes do juiz determinar “todas as medidas in- dutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária” (g.n.).

Instituiu-se, dessa maneira, um poder geral de efetivação, “permitindo a aplicação de medidas atípicas para garantir o cumprimento de qual- quer ordem judicial, inclusive no âmbito de cumprimento de sentença e no processo de execução baseado em títulos extrajudiciais.

Segundo nos ensina, também, Fredie Didier Jr. (2017, p. 100 apud MARINONI, 2007, p. 61):

“Há, atualmente, uma tendência de ampliação dos poderes executivos do magistrado, criando-se uma espécie de poder geral de efetivação, que permite ao julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequados ao caso concreto, sejam eles de coerção direta, se- jam de coerção indireta. Parte-se da premissa de que as ‘modalidades executivas devem ser idôneas às necessidades de tutela das diferen- tes situações de direito substancial’”.

Por essa razão, o Código de Processo Civil de 2015 estruturou um sistema híbrido de técnicas executivas, conferindo ao juiz os poderes de imperium, para me- lhor concretizar as ordens dadas no curso do processo, não só antes da decisão de mérito, como também, para materializar as suas ordens finais, com a máxima de ga- rantir a efetividade jurisdicional (MARINONI, ARENHART E MITIDIERO, 2018).

Sucede que, como cláusula geral executiva, a problemática apresentada é que o art. 139, IV, do CPC/2015 compõe-se essencialmente por termos vagos e inde- terminados, o que, por um lado, reforça o poder criativo da atividade jurisdicional, compreendo uma ampla margem de atuação do magistrado, para melhor atender o princípio constitucional da efetividade jurisdicional, mas pelo outro, demanda dele a

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correta fixação de diretrizes interpretativas para a sua efetivação, sob pena de incidir- se na violação às garantias fundamentais do devedor.

Mesmo nesse cenário instável em relação ao manejo da técnica executiva atípica, são conhecidos inúmeros casos concretos em que foram determinadas a ado- ção dessa novel técnica pelos juízes e tribunais do país, com as quais foram determi- nadas, por exemplo, a apreensão de carteira de habilitação para condução de veículos (CNH), a proibição de empréstimos, de participação em licitações ou concursos públi- cos, a suspensão do direito de viajar ao exterior, etc.

Todavia, somente a ineficiência do processo de execução não justificaria a adoção desenfreada da técnica coercitiva atípica, na medida em que todas as deci- sões judiciais, especialmente àquelas que restringem direitos fundamentais das par- tes, sujeitam-se ao rígido controle da legalidade e dos postulados constitucionais, tal como preconizam os arts. 1º e 8º do CPC/20151.

1.1 Alterações Legislativas

Conforme atesta a exposição de motivos do anteprojeto do CPC/2015 (BRASIL, 2010), as inúmeras alterações legislativas concretizadas no CPC/1973 re- sultaram num desaparecimento paliativo de toda a sua sistemática, o que contribuiu

1 Art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as dis- posições deste Código (BRASIL, 2015).

Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem co- mum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência (BRASIL, 2015).

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com a sua abrupta derrocada e com a aspiração do que hoje se conhece como o código de processo civil democrático.

Por esses motivos, em 30 de setembro de 2009, por meio do Ato 379/20092, a Presidência do Senado Federal deu o primeiro passo para introduzir essa inovação legislativa, instituindo a nobre Comissão de Juristas, composta por onze membros, com o propósito de elaborar o anteprojeto de um novo Código de Processo Civil, num prazo de cento e oitenta dias.

Os trabalhados da Comissão foram capitaneados pelo renomado proces- sualista e então Ministro-Presidente do STJ, Luiz Fux, hoje ministro da Suprema Corte, tendo, ainda, como relatora a saudosa jurista Teresa Arruda Alvim, além de outros grandes nomes do direito processual civil brasileiro.

Nela, o dispositivo equivalente ao atual art. 139, IV, do CPC, já autorizava a adoção de “todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogató- rias necessárias para assegurar o cumprimento da ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.

Após a análise pelo Senado Federal, o projeto foi enviado à Câmara dos Deputados, que contribuiu com uma pequena alteração de ordem técnica no texto normativo originário, segundo a qual, incumbiria ao juiz “determinar, de ofício ou a requerimento, todas as medidas coercitivas ou sub-rogatórias necessárias para asse- gurar a efetivação da decisão judicial e a obtenção da tutela do direito”.

2 O Ato 379/2009, assinado pela Presidência do Senado Federal, nomeou os seguintes juristas para participar da Comissão: Luiz Fux (presidência), Teresa Wambier (relatora-geral dos trabalhos), Adro- aldo Fabrício, Bruno Dantas, Elpídio Nunes. Humberto Teodoro Junior, Jansen Almeida, José Miguel Medina, José Roberto Bedaque, Marcos Vinícius Coelho e Paulo Cezar Pinheiro Carneiro.

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Na visão de Borges (2019, p. 70), como será demonstrado em tópico espe- cífico (v. subtítulos 1.2 e 1.3), a pequena modificação feita pela Câmera dos Deputa- dos “objetivava a correção de imprecisões de ordem técnica e, em especial, o estabe- lecimento de uma espécie de harmonização com o dispositivo geral de efetivação das tutelas, previsto no então vigente art. 461, § 5º, do CPC/1973”.

E ainda, segundo ele (BORGES, 2019, p. 72):

(...) a versão descartada realmente era superior. E não só pelo fato de ser mais sucinta, mas, sobretudo, porque o dispositivo dispunha pre- cipuamente sobre meios executórios, os quais – de forma já consa- grada na doutrina – são coercitivos ou sub-rogatórios. Desnecessário, portanto, classificar a medida em quatro espécies, quando, em ver- dade, existem apenas duas.

Em que pesem os precisos argumentos que defendem a alteração sugeri- das pela Câmara dos Deputados, posteriormente, o Senado Federal rejeitou comple- tamente a edição alcançada pela Casa do Povo, mantendo-se, então, a redação ori- ginal do anteprojeto, tal como disposta ainda hoje no CPC/2015:

IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de or- dem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pe- cuniária (BRASIL, 2015).

Digno de nota, por fim, que, desde a vigência do Código, o texto normativo do art. 139, IV, do CPC/2015 permanece inalterado, pois, segundo acreditamos, a falta de técnica do legislador, anteriormente exposta, não diminuiu a contribuição pre- tendida com a reforma legislativa.

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1.2 As espécies de Medidas Executivas Atípicas

Como já expusemos, a redação do art. 139, IV, do CPC/2015, possibilita ao juiz a aplicação de todas as “medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub- rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial”.

Contudo, embora o texto legal tenha efetivamente atribuído ao magistrado amplo poder para a garantia da eficácia de suas decisões, há na doutrina certo con- senso em afirmar que o legislador se referiu de forma redundante às distintas técnicas e espécies de execução.

Com efeito, pois, explica Didier Jr (2017, p. 101):

O texto legal sofre de uma atecnia: medidas mandamentais, indutivas e coercitivas são, rigorosamente, a mesma coisa. Trata-se de meios de execução indireta do comando judicial. Sem distinções. As medidas sub-rogatórias são meios de execução direta da decisão.

E nesse mesmo entendimento, Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2018):

Há evidente excesso nas expressões empregadas (“medidas induti- vas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias”), na medida em que as medidas coercitivas são espécie de medidas indutivas (as me- didas indutivas podem ser de pressão positiva, quando se oferece uma vantagem para o cumprimento da ordem judicial, ou coercitiva, quando se ameaça com um mal para a obtenção da satisfação do comando).

Há também confusão de categorias, já que o efeito mandamental – ao lado do efeito executivo – é o efeito típico das ordens judiciais (que veiculam medidas indutivas e sub-rogatórias).

É conhecido que, nas execuções por quantia certa, o ordenamento jurídico autoriza a aplicação de técnicas executivas diretas (sub-rogação) e indiretas (coer- ção), para a concretude da decisão judicial, pois, segundo a regra do art. 789 do CPC3,

3 Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei (BRASIL, 2015).

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o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações.

Em síntese, na técnica executiva por sub-rogação, também alcunhada de execução direta, o Estado empreende medidas agressivas contra o patrimônio do de- vedor, independentemente da vontade dele, tais como, o bloqueio de seus ativos fi- nanceiros, a expropriação de seus bens, a adjudicação de seus imóveis, sempre com o escopo de convertê-lo em dinheiro, para futuramente entregá-lo ao exequente.

Por outro lado, na técnica indireta, não se agride diretamente o patrimônio do devedor, mas sim a sua própria vontade, por meio da fixação de hipóteses nas quais a situação dele se agravará enquanto perdurar o descumprimento da ordem judicial, como é o caso da aplicação de multa e honorários prevista no art. 523, §1º, do CPC4, ou até mesmo através de efeitos em que a sua responsabilidade é atenuada, como no pagamento espontâneo da execução (e. g., o beneplácito previsto no art.

827, §1º, do CPC5), ou pela opção de parcelamento da execução, prevista no art. 916 do mesmo Código Processual6.

E ainda, segundo a doutrina processual, os meios executivos diretos (sub- rogatórios) e indiretos (coercitivos) se subdividem na seguinte forma:

4 Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exe- quente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

§ 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento (BRASIL, 2015).

5 Art. 827. Ao despachar a inicial, o juiz fixará, de plano, os honorários advocatícios de dez por cento, a serem pagos pelo executado

§ 1º No caso de integral pagamento no prazo de 3 (três) dias, o valor dos honorários advocatícios será reduzido pela metade (BRASIL, 2015).

6 Art. 916. No prazo para embargos, reconhecendo o crédito do exequente e comprovando o depósito de trinta por cento do valor em execução, acrescido de custas e de honorários de advogado, o execu- tado poderá requerer que lhe seja permitido pagar o restante em até 6 (seis) parcelas mensais, acres- cidas de correção monetária e de juros de um por cento ao mês (BRASIL, 2015).

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Os poderes coercitivos dividem-se em poderes: a) coercitivos por meio de restrição de direitos (p. ex.: de liberdade pessoal mediante prisão;

restrição de saída do país, com a retenção de passaporte; restrição de dirigir, com a apreensão da CNH) e b) de coerção patrimonial (multa).

Os poderes sub-rogatórios, por sua vez, dividem-se em poderes: c) de desapossamento, que podem ser preparatórios (apreensão/imissão na posse e depósito) e finais (de entrega da coisa); d) de transforma- ção; e e) de expropriação, que podem ser preparatórios (penhora e depósito) e finais (adjudicação, alienação, arrematação, desconto etc.) (CAMBI et al., 2019).

Contudo, conforme adverte Neves (2017), ainda que o CPC/2015 tenha autorizado a aplicação de técnicas indiretas para a satisfação da execução por quantia certa, o sistema processual veda aprioristicamente a responsabilidade pessoal do de- vedor sobre as suas obrigações (exceção feita à prisão civil inata ao inadimplemento de prestação alimentícia):

Nesse sentido, é importante registrar que a adoção de medidas exe- cutivas coercitivas que recaiam sobre a pessoa do executado não sig- nifica que seu corpo passa a responder por suas dívidas, o que, obvi- amente, seria um atentado civilizatório. São apenas medidas executi- vas que pressionam psicologicamente o devedor para que esse se convença de que o melhor a fazer é cumprir voluntariamente a obriga- ção. Mostra-se óbvio que, como em qualquer forma de execução indi- reta, não são as medidas executivas que geram a satisfação do direito, mas sim a vontade, ainda que não espontânea, do executado em cum- prir a sua obrigação.

Portanto, entendemos que a simples menção à aplicação das técnicas di- retas ou indiretas de execução patrimonial seria suficiente para a concretude da cláu- sula geral processual executiva. Mas, como concluíram Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2018), “essa falta de rigor técnico, porém, não compromete a intenção do preceito, que é dotar o magistrado de amplo espectro de instrumentos para o cumprimento das ordens judiciais”.

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2 O DIREITO FUNDAMENTAL À JURISDIÇÃO ADEQUADA E EFETIVA

O art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, garante que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1998). E nesse mesmo sentido, após a inclusão pela EC 45/2004, a Carta Magna também passou a assegurar o direito fundamental à “razoável duração do processo e os meios que ga- rantam a celeridade de sua tramitação” (ibidem).

Com a afirmação de tais direitos fundamentais e por efeito da invocação do monopólio jurisdicional, a doutrina constitucional compreende que o Estado também atraiu para si o dever de assegurar aos seus cidadãos o acesso à justiça de forma adequada e efetiva (MARINONI; MITIDIERO; SARLET, 2013, p. 701-703).

Como também lecionam Fux e Bodart (2019, p. 31):

(...) O ordenamento precisaria ser capaz de implementar o comando contido na ordem judicial, a fim de que vencedores em juízo não saís- sem perdedores na vida. Como consignou a Corte Europeia de Direi- tos Humanos no caso Hornsby v. Greece (19 de março de 1997), a garantia de acesso às Cortes prevista no art. 6º da Convenção Euro- peia de Direitos Humanos seria ilusória se o sistema legal do Estado- parte permitisse que uma decisão judicial final e vinculante restasse inoperante em detrimento de uma das partes, de modo que a execu- ção de um julgamento proferido por qualquer Tribunal deve ser consi- derado como parte integral da aludida garantia.

Nesse mesmo entendimento, Zavascki (2005, p. 65):

O direito fundamental à efetividade do processo – que se denomina também genericamente, de acesso à justiça, o direito à ordem jurídica justa – compreende em suma, não apenas o direito de provocar a atu- ação do Estado, mas também e principalmente o de obter, em prazo adequado, uma decisão justa e com potencial de atuar eficazmente no plano dos fatos.

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No status de ônus estatal, o direito à tutela jurisdicional efetiva recai não somente aos magistrados e tribunais, mas também sobre a atividade legislativa, na medida em que o Poder Legislativo deve se concentrar na edição de normas proces- suais garantidoras de meios concretos e eficazes dos direitos materiais dos litigantes, tal como preceitua a Carta Política (BRASIL, 1988).

Ressalta-se ainda que, mesmo na hipótese de carência de normas institui- doras de técnicas processuais efetivas e concretas, o magistrado não se eximiria do dever de proteção garantido pela Constituição Federal, de modo que a sua interpre- tação sobre as regras processuais deve sempre ser conduzida à luz do direito funda- mental de uma tutela jurisdicional efetiva, extraindo das normas processuais a sua máxima potencialidade (MARINONI, 2013, p. 152):

Se o dever do legislador editar o procedimento idôneo pode ser repu- tado descumprido diante de determinado caso concreto, o juiz, diante disso, obviamente não perde o seu dever de prestar a tutela jurisdici- onal efetiva. Por tal razão, o juiz tem o dever de interpretar a legislação à luz do direito fundamental à tutela jurisdicional, estando obrigado a extrair da regra processual, sempre com a finalidade de efetivamente tutelar os direitos, a sua máxima potencialidade, desde – e isso nem precisaria ser dito – que não seja violado o direito de defesa.

E assim, a aplicação do poder geral de efetividade do art. 139, IV, do CPC/2015, pelos prismas da legalidade e constitucionalidade, é revelada atualmente como instrumento indispensável para a garantia da atividade jurisdicional efetiva.

2.1 A Crise de Efetividade da Jurisdição

O último levantamento da Justiça em Números (CNJ, 2020, p. 178) revela que o processo de execução concentra o maior gargalo nos acervos dos tribunais.

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Os resultados contidos na pesquisa (CNJ, 2020, p. 180) demonstram que, na Justiça Federal, por exemplo, o processo de execução levava em média 8 anos e 3 meses até a satisfação da obrigação, enquanto o processo de conhecimento depen- dia de apenas 1 ano e 7 meses para a prolação da sentença de mérito.

Em comparação com o ano anterior, o mesmo relatório anual (CNJ, 2020) registrou o surpreendente aumento de 0,2 milhão de processos na fase de execução e a queda de 1,7 milhão na fase de conhecimento, a qual foi conduzida principalmente pela Justiça do Trabalho, após o advento da reforma trabalhista.

Conforme o relatório antecessor do CNJ (2019), “o Poder Judiciário contava com um acervo de 79 milhões de processos pendentes de baixa no final do ano de 2018, sendo que mais da metade desses processos (54,2%) se referia à fase de exe- cução”.

Aliás, chama-nos atenção o fato de que, enquanto o processo de conheci- mento demanda a ampla postulação das partes, audiências e a dilação probatória até a sentença, a execução sequer exige do magistrado atividade cognitiva, mas somente a concretização do direito já reconhecido no título executivo judicial ou extrajudicial.

Mas, ainda assim, o processo de execução é o apogeu da lentidão.

Ada Pellegrini Grinover (1998, p. 20-21) nos alertava a respeito da grave enfermidade da tutela jurisdicional:

A crise da justiça está na ordem do dia: dissemina-se e serpenteia pelo corpo social, como insatisfação dos consumidores de Justiça, assu- mindo as vestes do descrédito nas instituições; atinge os operadores do direito e os próprios magistrados, como que impotentes perante a complexidade dos problemas que afligem o exercício da função juris- dicional; desdobra-se em greves e protestos de seus servidores; rico- cheteia, enfim, pelas páginas da imprensa e ressoa pelos canais de comunicação de massa, assumindo dimensões alarmantes e estimu- lando a litigiosidade latente. A Justiça é inacessível, cara, complicada, lenta, inadequada. A Justiça é denegação de Justiça. A Justiça é

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injusta. Não existe Justiça. Nos países em que a função jurisdicional é desempenhada exclusivamente pelo Poder Judiciário, a crise da Jus- tiça confunde-se e se identifica com a crise do Judiciário e de seus membros. Crise da Justiça, crise do Judiciário, crise da Magistratura.

Tudo é levado de roldão, como que a fazer tabula rasa das instituições, dos Poderes, dos homens que os constituem, do produto que geram.

Mais recentemente, Wolkart (2020) também teceu importantes considera- ções a respeito da crise de efetividade e seus reflexos econômicos no processo civil:

A premissa básica é a de que o cumprimento de sentença é, por si só, uma anomalia do processo, decorrente de uma patologia nascida no útero do tratamento de uma patologia anterior. Se a crise de uma re- lação jurídica de direito material é o pressuposto de processo de co- nhecimento que ofereça a tutela jurisdicional como remédio para essa crise, o cumprimento de sentença deve propiciar a tutela executiva como uma nova terapia para uma nova crise: a que decorre do des- cumprimento da própria decisão judicial.

Como toda anomalia, o que se deseja, acima de tudo, é que ela não exista. É a ideia de que é melhor prevenir do que remediar. Conec- tando o ditado popular ao tema principal deste trabalho, pode-se afir- mar que a necessidade de se iniciar o cumprimento de sentença de- corre da postura não cooperativa do réu que descumpriu a decisão judicial.

Parece estranho, mas o que realmente se deseja da execução é que ela não aconteça, ou seja, que seu regime jurídico seja rigoroso o su- ficiente (credible threat) para que o réu cumpra “voluntariamente” o que lhe fora determinado no título executivo judicial.

(...)

A execução é, sem dúvida, o maior problema do direito processual civil brasileiro. Mais do que o largo reconhecimento doutrinário a respeito, a força dessa afirmação vem dos sucessivos relatórios do CNJ, que dedicam, como já vimos, capítulo exclusivo para o chamado gargalo da execução. Não há exageros. O tema foi por nós tratado em seção 1.1.4, de modo que não vamos repetir a análise. Não obstante, é ilus- trativo ressaltar o fato de que tempo médio de uma execução bem- sucedida (no sentido de ser extinta por sentença, não de ser necessa- riamente efetiva) é superior ao tempo médio da fase de conhecimento do processo (terminada por sentença).

É nesse cenário que a aplicação das medidas executivas atípicas ganha suma importância, na medida em que o instituto promete contribuir drasticamente para a redução dos inadimplementos voluntários, especialmente na execução por quantia certa, a partir da inovação legislativa trazida pelo CPC/2015.

(22)

2.2 A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5941/DF

Em 11 de maio de 2018, o Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizou ação declaratória de inconstitucionalidade (ADI 5941), com pedido de medida cautelar, tendo por objeto o art. 139, IV, do CPC, além de outros dispositivos do mesmo Codex7. Como parâmetro de controle de constitucionalidade sobre a norma abor- dada no presente estudo, o PT apontou violação aos arts. 1º, III; 5º, II, XV e LIV; 37, I e XXI; 173, § 3º; e 175, caput, todos da Constituição da República Federativa de 1988.

O Partido Político não pretendeu a declaração de inconstitucionalidade so- bre o texto normativo, mas tão somente que eventual restrição incorresse para impedir decisões que culminam em “apreensão de carteira nacional de habilitação e/ou sus- pensão do direito de dirigir, a apreensão de passaporte, a proibição de participação em concurso público e a proibição de participação em licitação pública.”

Não nos cabe aqui tecer opiniões aprofundadas a respeito dos fundamen- tos jurídicos adotados na aludida ação concentrada, pois o escopo deste trabalho se limita à análise dos standards8 de controle definidos pela Corte Infraconstitucional, para a correta aplicação das medidas executivas atípicas em casos concretos.

Contudo, fato é que as decisões judiciais sob o enfoque do art. 139, IV, do CPC, já se sujeitam ao controle de legalidade pela via recursal e pela via difusa de

7. Refere-se aos arts. 297, caput; 380, parágrafo único; 403, parágrafo único, 536, caput e § 1º; e 773, todos do CPC/2015.

8 Segundo Legale Ferreira (p. 13, 2010): os standards “representam uma técnica de ponderação para atingir fundamentações racionais e justas, que procura estabelecer ‘relações de precedência condicio- nada’, presunções ou preferências em favor de um dado direito ou interesse quando presentes certas condições (preferred rights ou preferred interests).

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constitucionalidade, as quais igualmente podem reavaliar o emprego dessa técnica executiva, de acordo com as particularidades de cada caso concreto.

No mais, ambas as alternativas se mostram igualmente adequadas para a reforma de decisões teratológicas, pois é impossível se chegar a uma teoria que seja capaz de amparar abstrata e previamente a solução executiva correta para a particu- laridade, tampouco para estancar a urgência de cada caso particular, sem que se resulte em prejuízo à eficácia da tutela jurisdicional executiva (MARINONI, 2006, p.

77).

É porque, com todo respeito, entendemos que o manejo da técnica execu- tiva atípica depende essencialmente da análise dos elementos fáticos dos autos9, como adiante se demonstrará, observando-se principalmente o postulado de propor- cionalidade (lato sensu) e os ditames constitucionais do processo civil (v. tít. 3 e 4).

E nesse sentido, a doutrina constitucional também se posiciona em relação às ações de controle de constitucionalidade da lei ou ato normativo pela via difusa (GOÉS e MELLO, 2016, p. 148 e ss):

O controle difuso surge de um conflito real embutido dentro de uma relação jurídica qualquer, dentro de um processo judicial subjetivo nor- mal, no qual se demanda uma prestação jurisdicional para o caso con- creto. É na solução desta lide submetida à apreciação do Poder Judi- ciário que nasce o controle incidental, na medida em que o Estado-juiz necessita antes de apreciar o pedido principal, aferir a arguição de in- constitucionalidade do ato normativo que circunscreve tal lide de modo incidental.

E continuam GOÉS e MELLO (2016, p. 149):

9. Aliás, nesse sentido, o anexo parecer redigido pela Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil (p. 8): (...) o melhor modelo de revisão da proporcionalidade da medida concretamente estabelecida é por meio do controle difuso, quando se terá conhecimento suficiente a respeitos dos elementos fáticos que compõem a lide, capazes de determinar se o meio coercitivo é de fato ou não proporcional”.

(24)

(...) o pedido do autor não pode ser a declaração da inconstitucionali- dade da lei ou ato normativo, mas, sim, a defesa de um direito consti- tucional violado, cuja constitucionalidade é arguida incider tantum.

Nesse sentido, quando o autor da ação procura o Estado-juiz para de- fesa de um direito constitucional violado, não pode pretender a decla- ração de inconstitucionalidade da lei em tese, em abstrato. Ao revés, sua pretensão deve limitar-se à satisfação de um direito violado, exi- gível em face da parte adversa.

Lado outro, ao nosso juízo, o acolhimento integral do pedido contido na ADI do Partido Político afetaria abstrata e diretamente o princípio constitucional da efetivi- dade da tutela jurisdicional, com a perpetuação da alta inadimplência na fase de exe- cução. Mas, já adiantamos, não é nesse caminho que se esteia, ao menos, a jurispru- dência infraconstitucional (v. item 3 infra).

Mutatis mutandis, curiosamente, a aludida ADI foi distribuída ao Ministro Luiz Fux, membro do Supremo Tribunal Federal (STF), quem chefiava a Comissão de Juristas10 responsável pela elaboração do anteprojeto do primeiro código de processo civil nacional-democrático, enquanto também presidia o STJ, na época, como notici- ado anteriormente, em tópico específico (v. subtítulo 1.1, supra).

Sua Excelência considerou que o conteúdo da ADI 5941 “se reveste de grande relevância, apresentando especial significado para a ordem social e a segu- rança jurídica”, motivo pelo qual, em 17 de maio de 2018, adotou-se nela o rito espe- cial previsto no art. 12 da Lei 9.868/1999 (BRASIL, 1999)11, cujo procedimento a sub- mete diretamente ao Plenário do Tribunal, para julgamento definitivo da ação direta de inconstitucionalidade.

10. Cf. subitem 1.1 supra.

11 Art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informa- ções, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

(25)

Instados a prestar informações, o Senado Federal e a Advocacia Geral da União opinaram pela absoluta improcedência dos pedidos contidos na ADI 5941. Por outro lado, opinaram em sentido contrário, isto é, pela procedência dos pedidos nela contidos, a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Associação Brasileira de Di- reito Processual (ABDPro), essa última admitida na qualidade de amicus curie para intervir no processo12.

Registra-se, finalmente, que, no momento da conclusão desta monografia, essa ação abstrata de controle de constitucionalidade, ajuizada pelo Partido dos Tra- balhadores, estava pronta para julgamento, aguardando apenas a sua inclusão em pauta de julgamento da Suprema Corte.

12 DJE nº 43, divulgado em 28/02/2019.

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3 STANDARDS PROCESSUAIS DA TÉCNICA EXECUTIVA ATÍPICA

Em 10 de setembro de 2020, o levantamento do acervo de jurisprudência virtual do Superior Tribunal de Justiça (STJ), disponível em seu repositório eletrô- nico13, apontou que foram proferidas 1.159 decisões a respeito da aplicação do art.

139, IV, do CPC, sendo 1.132 acórdãos e 27 decisões monocráticas. Dentre eles, apenas duas foram selecionadas pelos informativos de jurisprudência de nº 0631 e 0673.

Analisando as decisões monocráticas sobre o tema em estudo, observa- mos que a maioria dos recursos especiais interpostos para discutir a aplicação das medidas coercitivas atípicas, muitas vezes não atendem os requisitos de admissibili- dade exigidos pela jurisprudência defensiva do STJ, razão pela qual o levantamento demonstrou que a maioria deles sequer é conhecida pela referida Corte Superior.

Com efeito, pois, nesses casos, o STJ entende que a análise da adequa- ção, efetividade, razoabilidade e proporcionalidade da medida coercitiva atípica apli- cada deve ser feita exclusivamente pelo tribunal a quo, uma vez que o enfrentamento do mérito recursal demandaria o reexame das circunstâncias fático-probatórias dos autos, o que é vedado pelo escudo processual estampado na Súmula 7 do mencio- nado Tribunal Superior.

13 Plataforma disponível em: <https://scon.stj.jus.br/SCON/>, em 10/09/2020 às 14h37min.

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Nesse sentido, por exemplo, temos os seguintes acórdãos: AgInt no AREsp 1.604.372/SP (DJe 14/05/2020)14, AgInt no REsp 1.837.680/SP (DJe 25/03/2020)15, AgInt no REsp 1.837.309/SP (DJe 13/02/2020)16, AgInt no REsp 1.785.726/DF (DJe 22/08/2019)17 e diversos outros julgados.

Ainda sobre o tema, cumpre-nos anotar que o STJ firmou o entendimento de que a aplicação de medidas coercitivas atípicas, que restringem a liberdade de locomoção do indivíduo, poderia, em tese, configurar constrangimento ilegal e arbitrá- rio pela autoridade judiciária, de modo que a decisão proferida no curso da execução cível é passível de ser analisada, excepcionalmente, pela via do habeas corpus.

Advertimos, contudo, que o STJ tem concluído que a aplicação dessas téc- nicas atípicas não configura por si só ofensa ao direto de locomoção do devedor, na medida em que essa análise dependeria da análise das circunstâncias particulares do

14 Transcrição do aresto: “No caso em exame, o Tribunal de origem, analisando o acervo fático-proba- tório dos autos, concluiu que os pedidos formulados pelo exequente, de suspensão de passaporte, de suspensão da CNH e de cancelamento dos cartões de crédito e débito, seriam excessivamente gravo- sos aos executados e desproporcionais à obrigação de pagamento do débito, mormente considerando que, no caso, o Juízo a quo já deferira medida adequada a compelir os devedores ao adimplemento, determinando inclusão de seus nomes nos cadastros de proteção ao crédito. A revisão de tal entendi- mento, na via estreita do recurso especial, sobretudo para perquirir a adequada aplicação do princípio da menor onerosidade no caso concreto, encontra óbice na Súmula 7 do STJ.” (AREsp 1.604.372.

Relator: João Otávio de Noronha, DJe 09/12/2019).

15No mesmo sentido: “Para se ultrapassar a conclusão alcançada pelo Tribunal estadual quanto a adequação, efetividade, razoabilidade e proporcionalidade da medida coercitiva, a fim de acolher a tese recursal, seria necessário o reexame das circunstâncias fático-probatórias da causa, que não se admite em âmbito de recurso especial. Súmula 7 do STJ” (AgInt no REsp 1.837.680/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, 3ª Turma, julgado em 23/03/2020, DJe 25/03/2020).

16 Da mesma forma: “a pretensão recursal demanda o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, providência vedada nesta sede especial a teor da Súmula 7/STJ, pois é inviável perquirir, nesta sede, se há ou não indícios de que o devedor possui patrimônio expropriável e que esteja ocultando-o, a fim de viabilizar a utilização das medidas coercitivas subsidiárias pretendidas.” (AgInt no REsp 1.837.309/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 10/02/2020, DJe 13/02/2020).

17Idem: “Para se ultrapassar a conclusão alcançada no tocante ao juízo de adequação, efetividade, razoabilidade e proporcionalidade da medida, a fim de acolher a tese recursal, seria necessário o ree- xame das circunstâncias fático-probatórias da causa, o que não se admite em âmbito de recurso espe- cial, ante o óbice da Súmula 7 deste Tribunal, aplicável, também, em relação aos recursos interpostos com amparo na alínea c do permissivo constitucional. Agravo interno desprovido.” (AgInt no REsp 1.785.726/DF, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 19/08/2019, DJe 22/08/2019)

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caso concreto. Nessa linha de entendimento, transcreve-se abaixo decisão da 3ª Turma do STJ:

Esta Corte Superior de Justiça, pelas suas duas Turmas da Seção de Direito Privado, tem reconhecido que o acautelamento de passaporte é medida capaz de limitar a liberdade de locomoção do indivíduo, o que pode significar constrangimento ilegal e arbitrário, passível de ser analisado pela via do "habeas corpus".

A adoção desta medida coercitiva atípica, no âmbito do processo de execução, não configura, em si, ofensa direta ao direito de ir e vir do indivíduo, razão pela qual a eventual abusividade ou ilegitimidade da ordem deve ser examinada no caso concreto.

Habeas corpus não conhecido, inexistindo substrato para o deferi- mento da ordem de ofício.

(HC 558.313/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/06/2020, DJe 01/07/2020)

Na mesma esteira, temos também os seguintes precedentes do STJ: HC 525.378/RJ (DJe 11/10/2019)18, HC 453.870/PR (DJe 15/08/2019)19, etc.

Noutra importante decisão sobre o assunto, o relator Napoleão Nunes Maia Filho, no bojo do HC 453.870/PR, concluiu que a execução fiscal não comporta a apli- cação de medidas coercitivas atípicas contra o devedor.

18 Ementa: HABEAS CORPUS. DÍVIDA PROVENIENTE DE EXECUÇÃO CONTRA DEVEDOR INSOLVENTE. WRIT IMPETRADO COMO SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ARTIGO 139, IV, DO CPC. PACIENTES IMPEDIDOS DE DEIXAR O MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO EM VIRTUDE DA TRAMITAÇÃO DE PROCESSO DE INSOLVÊNCIA CIVIL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. (...) O Superior Tribunal de Justiça, na esteira da nova jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal a partir do julgamento do HC n.º 109.956/PR, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, DJe de 11/9/2012, orientou-se no sentido de não conhecer de habeas cor- pus impetrado como substitutivo de recurso ordinário. No entanto, dada a magnitude da garantia cons- titucional do habeas corpus, a existência de vício formal na impetração não dispensa o julgador de analisar a possibilidade de concessão da ordem de ofício, na hipótese de flagrante ilegalidade ou abuso de poder. (...) Liminar em habeas corpus concedida (HC 525.378/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 11/10/2019).

19 Do mesmo modo: “o habeas corpus é instrumento de previsão constitucional vocacionado à tutela da liberdade de locomoção, de utilização excepcional, orientado para o enfrentamento das hipóteses em que se vislumbra manifesta ilegalidade ou abuso nas decisões judiciais. O acautelamento de pas- saporte é medida que limita a liberdade de locomoção, que pode, no caso concreto, significar constran- gimento ilegal e arbitrário, sendo o habeas corpus via processual adequada para essa análise (HC 453.870/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2019, DJe 15/08/2019).

(29)

Em seu voto, referido ministro assentou que o Estado já é um credor su- perprivilegiado na execução fiscal, pois, diferentemente da execução comum, promo- vida por particulares, o processo fiscal segue curso através de varas especializadas e possui lei específica, com privilégios irredarguíveis para a administração pública.

Nas palavras da 1ª Turma do STJ:

A discussão lançada na espécie cinge-se à aplicação, no Executivo Fiscal, de medidas atípicas que obriguem o réu a efetuar o pagamento de dívida, tendo-se, como referência analítica, direitos e garantias fun- damentais do cidadão, especialmente o de direito de ir e vir.

Inicialmente, não se duvida que incumbe ao juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias ne- cessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária. É a dicção do art. 139, IV do Código Fux.

(...) Para tanto, o Poder Público se reveste da Execução Fiscal, de modo que já se tornou lugar comum afirmar que o Estado é superpri- vilegiado em sua condição de credor. Dispõe de varas comumente es- pecializadas para condução de seus feitos, um corpo de Procuradores altamente devotado a essas causas, e possui lei própria regedora do procedimento (Lei 6.830/1980), com privilégios processuais irredarguí- veis. Para se ter uma ideia do que o Poder Público já possui privilégios ex ante, a execução só é embargável mediante a plena garantia do juízo (art. 16, § 1o. da LEF), o que não encontra correspondente na execução que se pode dizer comum.

Como se percebe, o crédito fiscal é altamente blindado dos riscos de inadimplemento, por sua própria conformação jusprocedimental.

(...) Nesse raciocínio, é de imediata conclusão que medidas atípicas aflitivas pessoais, tais como a suspensão de passaporte e da licença para dirigir, não se firmam placidamente no Executivo Fiscal. A aplica- ção delas, nesse contexto, resulta em excessos.

Excessos por parte da investida fiscal já foram objeto de severo con- trole pelo Poder Judiciário, tendo a Corte Suprema registrado em Sú- mula que é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio co- ercitivo para pagamento de tributos (Súmula 323/STF).

(....) Parecer do MPF pela concessão da medida. Habeas Corpus con- cedido em favor do Paciente, confirmando-se a medida liminar anteri- ormente concedida, apta a determinar sejam excluídas as medidas atí- picas constantes do aresto do TJ/PR apontado como coator (suspen- são da Carteira Nacional de Habilitação, apreensão do passaporte).

(HC 453.870/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2019, DJe 15/08/2019)

Segundo a decisão atrás reproduzida, a aplicação de medidas atípicas afli- tivas pessoais, no processo executivo fiscal, tais como a suspensão de passaporte e

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a CNH, resultaria em excessos, com caráter meramente punitivo, o que deve ser re- pelido a todo custo pelo ordenamento jurídico.

Superadas algumas importantes questões introdutórias delineadas pelo en- tendimento uniforme das turmas do STJ, passemos, então, à análise dos critérios de- finidos pelos órgãos fracionários da Corte Infraconstitucional, no que diz respeito es- tritamente ao tema objeto desta monografia.

3.1 Leading Cases do STJ sobre a Aplicação das Medi- das Executivas Atípicas na Execução por Quantia Certa

Como já adiantamos, a aplicação do art. 139, IV, do CPC, e sua abrangên- cia, nas execuções pecuniárias, são palco de grande controvérsia na jurisprudência.

Mas, na medida em que são proferidas decisões absolutamente díspares pelos tribu- nais a quo, o STJ vem enfrentado o tema constantemente e já apresenta alguns stan- dards próprios na tentativa de uniformizar o entendimento a respeito da matéria.

Nesse sentido, as pesquisas jurisprudenciais demonstraram que o informa- tivo nº 631 veiculou um importante precedente em relação ao tema, extraído dos autos RHC 97.876/SP, no qual se fixaram os primeiros parâmetros para a aplicação das coerções atípicas nas execuções pecuniárias.

Porém, antes de adentrarmos aos requisitos definidos no julgamento desse recurso ordinário, vale, primeiramente, registrarmos um breve retrospecto das princi- pais questões fáticas e jurídicas que permearam aquele litígio.

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Em 2017, nos autos da execução de título extrajudicial, o juiz de origem suspendeu o passaporte e a carteira nacional de habilitação do executado, pois, em- bora citado, ele não teria efetuado o pagamento ou ofertado bens à penhora.

Posteriormente, sob o fundamento de que houve restrição exagerada ao seu direito fundamental de livre locomoção, o devedor impetrou habeas corpus pe- rante o Tribunal de Justiça de São Paulo, o qual foi extinto sem resolução de mérito, em razão da suposta inadequação da via eleita pelo impetrante, conforme se depre- ende da ementa do acórdão do TJSP abaixo transcrita:

Habeas Corpus. Impetração em face de decisão proferida nos autos de execução de título extrajudicial, a qual deferiu os pedidos de sus- pensão do passaporte e da carteira de habilitação do executado. De- cisão passível de interposição de agravo de instrumento, nos termos do artigo 1.015, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Writ que não pode ser utilizado como sucedâneo do recurso legalmente cabí- vel. Precedentes. Inadequação da via eleita. Processo extinto sem re- solução do mérito (TJ-SP; Habeas Corpus Cível 2127691- 70.2017.8.26.0000; Relator (a): Ruy Coppola; Órgão Julgador: 32ª Câ- mara de Direito Privado; Foro de Sumaré - 3ª Vara Cível; Data do Jul- gamento: 28/09/2017; Data de Registro: 28/09/2017).

Inconformado com a decisão do Tribunal de Justiça paulista, o executado interpôs recurso ordinário, autuado sob o nº RHC 97.876/SP, com fundamento no art.

105, II, "a", da CF/1988, por meio do qual se pretendeu o reconhecimento da ilegali- dade da ordem judicial, cujos efeitos mantiveram-no privado de sua liberdade de ir e vir.

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O MPF opinou pelo desprovimento do recurso ordinário, pois, segundo o seu parecer, o remédio heroico não poderia ser utilizado como sucedâneo de recurso próprio (no caso, o agravo de instrumento).20

Ao julgar o RHC 97.876/SP, a 4ª Turma do STJ conheceu parcialmente do recurso ordinário, para, no mérito, provê-lo, apenas com a finalidade de desconstituir a apreensão do passaporte do devedor, na medida em que, de acordo com o relator, a decisão de origem teria sido proferida de forma genérica, desacompanhada sobre- tudo de justificativas para a restrição razoável dos direitos e garantias do devedor.

Por outro lado, entendeu o relator, Ministro Luis Felipe Salomão, que a me- dida coercitiva, que recaiu sobre a CNH do devedor, não poderia ser conhecida, por não restringir, no caso concreto, o seu direito de locomoção:

Noutro ponto, no que respeita à determinação judicial de suspensão da carteira de habilitação nacional, anoto que a jurisprudência do STJ já se posicionou no sentido de que referida medida não ocasiona ofensa ao direito de ir e vir do paciente, portanto, neste ponto o writ não poderia mesmo ser conhecido. Isso porque, inquestionavelmente, com a decretação da medida, segue o detentor da habilitação com capacidade de ir e vir, para todo e qualquer lugar, desde que não o faça como condutor do veículo. De fato, entender essa questão de forma diferente significaria dizer que todos aqueles que não detém a habilitação para dirigir estariam constrangidos em sua locomoção.

Com efeito, e ao contrário do passaporte, ninguém pode se considerar privado de ir a qualquer lugar por não ser habilitado à condução de veículo ou mesmo por o ser, mas não poder se utilizar dessa habili- dade. É fato que a retenção deste documento tem potencial para cau- sar embaraços consideráveis a qualquer pessoa e, a alguns determi- nados grupos, ainda de forma mais drástica, caso de profissionais, que tem na condução de veículos a fonte de sustento. É fato também que, se detectada esta condição particular, no entanto, a possibilidade de impugnação da decisão é certa, todavia por via diversa do habeas cor- pus, porque sua razão não será a coação ilegal ou arbitrária ao direito de locomoção, mas inadequação de outra natureza.

(RHC 97.876/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018)

20 No entanto, como já vimos (v. título 3, supra), o STJ tem permitido, expecionalmente, a impetração de habeas corpus nas hipóteses de restrição do direito de locomoção decorrente da aplicação de me- dida coercitiva em execução cível.

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Em seu voto, o relator demonstrou que, para aplicação da medida coercitiva atípica, seria necessária uma leitura constitucional do art. 139, IV, do CPC:

Assim, é possível afirmar que, se o art. 139, IV, da lei processual, que estendeu a positivação da atipicidade dos atos executivos, teve como escopo a efetividade, é dubitável também que devem ser prestigiadas as interpretações constitucionalmente possíveis.

Vale dizer, pois, que a adoção de medidas de incursão na esfera de direitos do executado, notadamente direitos fundamentais, carecerá de legitimidade e configurar-se-á coação reprovável, sempre que vazia de respaldo constitucional ou previsão legal e à medida em que não se justificar em defesa de outro direito fundamental.

É que objetivos pragmáticos, por mais legítimos que sejam, tal qual a busca pela efetividade, não podem atropelar o devido processo cons- titucional e, menos ainda, desconsiderados direitos e liberdades pre- vistos na Carta Maior.

(RHC 97.876/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018)

Oportuno destacar que o acórdão em exame não refutou a aplicabilidade das medidas executivas atípicas no curso de execução por quantia certa, mas apenas reconheceu que a restrição de direitos fundamentais do devedor, por ser medida ex- trema, deve ser aplicada cautelosamente e desde que observados todos os parâme- tros de controle deste instituto jurídico:

O reconhecimento da ilegalidade da medida consistente na apreensão do passaporte do paciente, na hipótese em apreço, não tem qualquer pretensão em afirmar a impossibilidade dessa providência coercitiva em outros casos e de maneira genérica. A medida poderá eventual- mente ser utilizada, desde que obedecido o contraditório e fundamen- tada e adequada a decisão, verificada também a proporcionalidade da providência.

(RHC 97.876/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018)21

21 Nessa mesma esteira, a decisão turmária proferida no julgamento do REsp 1.782.418/RJ, com o voto da relatora Nancy Andrighi, fixou o seguinte entendimento:

(...) “não se pode falar em inaplicabilidade das medidas executivas atípicas meramente em razão de sua potencial intensidade quanto à restrição de direitos fundamentais. Isso porque o ordenamento jurí- dico pátrio prevê a incidência de diversas espécies de medidas até mesmo mais gravosas do que es- sas.”

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Pela análise do RHC 97.876/SP, observamos que a sucinta fundamentação da decisão proferida pelo juízo de origem não observou os requisitos mínimos de va- lidade exigidos pela sistemática do CPC/2015, na medida em que foi proferida sem qualquer aprofundamento técnico, sendo, pois, vazada simplesmente nos seguintes termos e fundamentos:

Vistos.

Defiro o pedido de p.104/105, oficiando-se ao Detran e a Policia Fede- ral,

Intime-se.

Sumaré, 17 de abril de 2017

Eis, então, o motivo pelo qual a 4ª Turma do STJ entendeu que para ser considerado razoável, sob a ótica da estrita legalidade, o manejo da técnica executiva atípica depende dos seguintes parâmetros mínimos de controle:

Assim, no caso concreto, após esgotados todos os meios típicos de satisfação da dívida, para assegurar o cumprimento de ordem judicial, deve o magistrado eleger medida que seja necessária, lógica e pro- porcional. Não sendo adequada e necessária, ainda que sob o escudo da busca pela efetivação das decisões judiciais, será contrária à or- dem jurídica.

Nesse sentido, para que o julgador se utilize de meios executivos atí- picos, a decisão deve ser fundamentada e sujeita ao contraditório, de- monstrando-se a excepcionalidade da medida adotada em razão da ineficácia dos meios executivos típicos, sob pena de configurar-se como sanção processual.

A adoção de medidas de incursão na esfera de direitos do executado, notadamente direitos fundamentais, carecerá de legitimidade e confi- gurar-se-á coação reprovável, sempre que vazia de respaldo constitu- cional ou previsão legal e à medida em que não se justificar em defesa de outro direito fundamental.

(...) “Não se nega, no entanto, que, em certas ocasiões, a adoção de coerção indireta ao pagamento voluntário possa se mostrar desarrazoada ou desproporcional, sendo passível, nessas situações, de configurar medida comparável à punitiva.”

“A ocorrência dessas situações deve ser, contudo, examinada caso a caso, e não aprioristicamente, por se tratar de hipótese excepcional que foge à regra de legalidade e boa-fé objetiva estabelecida pelo CPC/15” (REsp 1782418/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 23/04/2019, DJe 26/04/2019).

(35)

(...) Revela-se ilegal e arbitrária a medida coercitiva de suspensão do passaporte proferida no bojo de execução por título extrajudicial (du- plicata de prestação de serviço), por restringir direito fundamental de ir e vir de forma desproporcional e não razoável. Não tendo sido de- monstrado o esgotamento dos meios tradicionais de satisfação, a me- dida não se comprova necessária.

(...) Recurso ordinário parcialmente conhecido.

(RHC 97.876/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018)

Aliás, a decisão colegiada atrás reproduzida confluiu perfeitamente com o entendimento do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC), o qual abaixo se destaca, ipsis litteris:

Enunciado 12, FPPC. (arts. 139, IV, 523, 536 e 771) A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título execu- tivo extrajudicial. Essas medidas, contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 489, § 1º, I e II.

(Grupo: Execução)

Na mesma esteira, no julgamento do AgInt no REsp nº 1.785.726-DF, a 3ª Turma do STJ firmou o seguinte entendimento acerca da aplicação da cláusula geral executiva do CPC/2015:

Para que o julgador se utilize de meios executivos atípicos, a decisão deve ser fundamentada e sujeita ao contraditório, demonstrando-se a excepcionalidade da medida adotada em razão da ineficácia das que foram deferidas anteriormente.

No caso, segundo assinalou o órgão julgador, após esgotados os meios típicos de satisfação da dívida, a fim de reforçar os atos tenden- tes ao cumprimento da obrigação reconhecida pelo título judicial, op- tou o magistrado por eleger medida indutiva e coercitiva que conside- rou adequada, necessária, razoável e proporcional. Esse entendi- mento foi encampado pelo Tribunal local, que ainda ressaltou o fato de que o executado possui alto padrão de vida, incompatível com a alegada ausência de patrimônio para arcar com o pagamento da inde- nização decorrente do acidente que provocou.

(AgInt no REsp 1785726/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2019, DJe 22/08/2019)

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