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Responsável pelo Conteúdo: Prof. Rodrigo Medina Zagni

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Academic year: 2021

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As Diferenças Culturais

Nessa unidade, vamos tratar do tema “A ação transformadora do meio e do homem” Nesta unidade, nos debruçaremos sobre as principais teorias que permitem compreender ação transformadora do homem no meio ambiente.

Sendo assim, este é um conteúdo fundamental não só porque nos serve de base informativa para compreender como se formam e se transformam distintas culturas; mas nos servirá também de instrumento para compreensão da ação do homem na transformação do meio.

Atenção

Para um bom aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar as atividades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma.

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A Ação Transformadora do Meio e do Homem

Uma forma de se compreender a constituição cultural das sociedades é a partir da sua função transformadora do meio ambiente, do meio social e do próprio Homem.

Já nos dissera Herbert Spencer, que o Homem não é tal qual aquele das pinturas chinesas, ou seja, solto no espaço, como se estivesse caindo no nada: o Homem existe no meio geográfico. Mais do que isso, retira desse meio o necessário a sua sobrevivência. Pensemos então a dimensão cultural humana a partir das relações entre Homem e meio-ambiente.

O Homem, que é dotado de necessidades materiais, literalmente obedecendo a programações biológicas (comer, evacuar, beber, dormir, procriar etc.), realiza-as essencialmente no meio-ambiente.

Pensemos no Homem que atende as suas necessidades de sobrevivência no meio-ambiente, mas sem interferir nele. A caça e a coleta, por exemplo, foram as atividades econômicas da maior parte do tempo de vida humana sobre a Terra, e nela o Homem apenas retirava do meio aquilo que necessitava, sem interferir nele, ao menos gravemente.

Ocorre que o economista britânico Thomas Malthus (1766-1834) identificou que haveria um descompasso nessa relação. As necessidades humanas seriam maiores, em relação àquilo que o meio ambiente pode ofertar naturalmente. Malthus demonstrou que as necessidades humanas seriam então maiores que aquilo que o meio ambiente poderia prover, sem que o Homem interferisse nele.

Desse descompasso resultaria um grave problema à sobrevivência humana, que depende vitalmente de alimento e água. Já dissera o filósofo grego Platão, no séc. IV a.C., que “a necessidade é a mãe de todas as invenções” e; portanto, para esse problema de sobrevivência a solução encontrada pelo Homem foi interferir no meio-ambiente.

Material Teórico

Engraving of Economist Thomas Robert Malthus by John Linnell Título original: Thomas Robert Malthus (1766-1834) English economist. Photo shows Malthus in a formal head and shoulder portrait. Undated engraving by J. Linnell. IMAGEM: © Bettmann/CORBIS NOME DO CRIADOR John Linnell DATA DE CRIAÇÃO 19th century COLEÇÃO Bettmann

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A primeira forma encontrada pelo Homem para empreender essa ação transformadora do meio foi a agricultura. Aliando um bastão de madeira, extraído da natureza, conjugando-o a uma lasca de pedra polida com o uso de uma amarra feita com tripas secas de um animal

abatido, o Homem desenvolveu a enxada. Com o uso

adequado desse instrumento o Homem passou a arar a terra e prepará-la para o plantio de sementes que, por meio da observação, percebeu que poderia germinar e dar frutos. Irrigando periodicamente o terreno plantado, foi possível obter mais alimentos e solucionar o problema do descompasso identificado por Malthus, possibilitando a sobrevivência.

Ocorre que, para que isso ocorresse, foi preciso o desenvolvimento de materiais e técnicas: o desenvolvimento dos materiais necessários à atividade do plantio bem como das técnicas adequadas para sua utilização. Os materiais constituem, segundo o filósofo alemão Karl Marx (1818-1883), os “meios de produção da vida social”, junto do mais importante meio: a terra; as formas ou as técnicas para utilizá-los consistem na tecnologia desenvolvida, ambos, para o trabalho. Segundo a definição marxista, o trabalho é a ação transformadora do meio ambiente que tem a finalidade de garantir a sobrevivência humana.

Contudo, todas essas relações acabam determinando um outro aspecto da vida social: a cultura. O desenvolvimento da agricultura, que aqui mencionamos, implica num desenvolvimento cultural, nesse caso, da “cultura da enxada”. Não é por acaso que o termo “cultura” foi utilizado pela primeira vez para se referir a atividades

econômicas na lavoura, isso porque, ainda segundo Marx, por meio do trabalho o Homem altera não só o meio ambiente, mas a sim mesmo.

Platão de Atenas

429 x 600 - 43k - jpg cafehistoria.ning.com

Portrait of Karl Marx An engraving by Charles Baude after Gaston Vuillier. IMAGEM: © Stefano Bianchetti/Corbis NOME DO CRIADOR Gaston Vuillier DATA DE CRIAÇÃO ca. 1883 FOTÓGRAFO Stefano Bianchetti COLEÇÃO Historical

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E como isso ocorre?

Não dissemos, citando Spencer, que o Homem não existe solto no espaço, que ele existe no meio geográfico? Sendo assim, sua identidade social se constrói na interação do indivíduo com o seu entorno, com o meio físico, e como esse entorno foi modificado pelo próprio Homem, nesse sentido o Homem alterou a si mesmo, por conseguinte, alterou suas necessidades e, sendo novas necessidades, a mesma forma de trabalho não pode mais dar conta delas, são necessárias novas ações transformadoras para atender a esse novo Homem e suas novas necessidades. Por sua vez, o meio é mais uma vez alterado, criando um novo Homem, portador de novas necessidades, novas formas de trabalho e, essencialmente, novos sistemas culturais.

É por isso que não existem sociedades estacionadas, todas estão fadadas à transformação.

Mas isso dito, parece que estamos então contradizendo Malthus, citado no início da análise do quadro em questão. Isso porque, tendo alterado o meio ambiente, o Homem teria resolvido o descompasso entre suas necessidades e aquilo que o meio ambiente poderia lhe oferecer, isso porque suas necessidades não mais seriam maiores em relação ao que o meio poderia, transformado, fornecer. Sendo assim, por que então as sociedades mudam, se o problema do descompasso teria deixado de existir?

Feature: Syria at the Crossroads The family of Jamil Hemedoush picks olives in their fields in the Alawite Mountains.

IMAGEM: © Ed Kashi/Corbis DATA DA FOTOGRAFIA 6 de outubro de 2008

LOCAL Damascus, Syria, Syria FOTÓGRAFO Ed Kashi COLEÇÃO Corbis New

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Mudam e mudarão constantemente, isso porque Malthus demonstrou que o descompasso mencionado nunca deixaria de existir. Para defender essa tese, Malthus demonstrou que os homens crescem em progressão geométrica (multiplicando-se entre si), enquanto os meios de subsistência cresceriam em progressão aritmética (por somatória, não por multiplicação).

Sendo assim, um novo meio (alterado pela ação humana) traria novos problemas à existência humana, que demandariam sempre novos tipos de soluções, novas ações transformadoras, e novos sistemas culturais vão se formando daí.

Por que sistemas culturais teriam então, segundo a visão marxista, uma determinação decorrente das relações de produção?

Ora, para Marx, a infraestrutura econômica das sociedades, ou seja, sua base econômica, determinaria a superestrutura política e ideológica, sendo a cultura a somatória dessas relações, pois se inscreve no modus vivendi das sociedades.

A infraestrutura seria o modo de produção da vida social, ou como aquela sociedade produz o suficiente a sua existência material, produzindo os sentidos, significados, valores, morais e identidade que mencionamos no início desse texto. O modo de produção da vida social seria determinado pelo modo de produção de bens de consumo, composto por sua vez pelos meios de produção (instrumentos, terra – incluindo seu regime de propriedade -, etc.), força de trabalho (se é assalariada, escrava, servil, voluntária etc.), tecnologia (forma com que a força de trabalho opera os meios de produção), determinando os aspectos políticos, ideológicos e culturais dessa sociedade.

Nessa perspectiva, o trabalho é a ação transformadora humana do meio ambiente, geradora de cultura (que também pode ser definida como trabalho), ato exclusivamente humano por ser consciente de sua finalidade, no que é portanto intencional.

É preciso estar claro que por meio do trabalho o Homem transforma o mundo e a si mesmo, porque ao alterar o meio o Homem altera o próprio Homem. É preciso que fique claro que, transformando o meio e a si mesmo, o Homem redefine suas dinâmicas culturais, redefinindo valores, sentidos, significados e identidades.

Liberia - Fisherman detangles fishing net

A man untangles his fishing net on the beach in Robertsport, Liberia.

IMAGEM: © Jane Hahn/Corbis DATA DA FOTOGRAFIA 22 de março de 2009

LOCAL Robertsport, Liberia FOTÓGRAFO Jane Hahn COLEÇÃO Corbis News

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A ação transformadora humana na natureza passa a ser mediada pelos símbolos criados pelo Homem, que dão sentido as suas ações, desta forma a Cultura pode também ser definida como o conjunto desses símbolos, relativos no tempo e espaço, com múltiplas manifestações.

Com isso o Homem, colocando em movimento o meio, a cultura e desta forma a si mesmo, é o único ser histórico consciente de sua condição e portanto produtor de sua própria história.

Elaborando o Problema da Cultura

O mais importante questionamento já feito pelo Homem em torno dos fenômenos da cultura foi, indubitavelmente, aquele que se referia às diferenças culturais. Isso porque, desde os primeiros contatos que grupamentos humanos tiveram com outros grupos provenientes de outras regiões ou, ainda, dadas as distintas visões de mundo que as gerações mais velhas manifestavam frente às gerações jovens, com maior ou menor intensidade, a existência humana pressupõe o contato com o diverso.

Sendo assim, desde o período mais remoto da existência humana, o Homem foi impelido pelo questionamento sobre as origens da diversidade não apenas biotípica (cor da pele, dos olhos, tipo e cor dos cabelos, estatura, compleição física etc.); senão também de diferenças culturais (tipos de organização social, de habitação, de utensílios e técnicas para a sobrevivência, forma de organização econômica, religiosa, familiar etc.).

Obviamente, este questionamento se torna mais grave nos períodos em que o contato entre distintos grupos humanos se intensifica. Podemos então inferir que, com o advento das primeiras cidades que se desenvolveram, contemporaneamente, na região do Oriente Próximo (Egito e Mesopotâmia), Índia e China - provenientes dos primeiros grandes aglomerados humanos em torno de atividades que requeriam o trabalho organizado (primordialmente as obras hidráulicas, dado que se tratam, os três casos, de regiões cortadas por importantes rios que permitem as práticas agrícolas) -, as atividades comerciais, os deslocamentos populacionais e até mesmo as guerras colocaram em contato não apenas povos distintos, senão culturalmente diferentes, movendo a reflexão humana a questionar as origens das desigualdades.

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Desde a Antiguidade, o Homem desenvolveu explicações míticas ou filosóficas que respondiam a esta questão por meio da hereditariedade e da origem geográfica.

Vimos na unidade anterior,

dedicada às “teorias da cultura”, que quando, no séc. XIX desenvolve-se a Antropologia como ciência humana e social, gozando de rigor metodológico e

primeiros referenciais teóricos, o

darwinismo social tendia a fornecer explicações científicas (pautadas na teoria da evolução das espécies) para uma compreensão então já muito antiga: a da

determinação biológica e geográfica. Sabemos também que o debate teórico em torno dessas questões desmontou, paulatinamente, as convicções rácicas que determinavam as diferenças culturais, impondo não apenas outra ordem de compreensão, mas modificando de forma irreversível os objetos, objetivos, métodos e natureza desta nascente ciência. Contudo, ainda que liberta das amarras explicativas do evolucionismo, a cultura não carecia apenas de explicações sobre a questão das diferenças, mas primordialmente sobre sua natureza, origens e dinâmicas de transformação.

Essas questões ganharam também, com o advento dessas percepções pós-evolucionistas, outro âmbito de ocorrência, uma vez que diferenças culturais se verificavam não somente externamente aos grupos sociais, mas também internamente. Se as explicações evolucionistas não davam conta de esclarecer as diferenças entre povos distintos, também falhou em atribuir as diferenças entre homens e mulheres por meio da hereditariedade. Obviamente homens e mulheres mantêm relevantes diferenças biológicas, contudo, o papel que desempenham em distintas sociedades, segundo essas novas percepções, foram sendo definidos por essas

480 x 508 - 50k - jpg - www.iped.com.br/sie/uploads/9362.jpg Veja abaixo a imagem em: www.colegioweb.com.br/.../evolucao-das-especies

245 x 305 29k jpg

- imho.com.br/.../2008/11/diferenca-cultural.jpg

Veja abaixo a imagem

em: imho.com.br/2008/11/24/diferenca s-culturais/

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mesmas sociedades, ou seja, os papéis de gênero, e também geracionais, religiosos, laborais etc., são construídos socialmente, não determinados.

Junto do meio geográfico, o clima também deixou a condição de fator determinantemente explicativo de diferenças culturais primordialmente utilizados para escalonar povos mais aptos para o trabalho em climas frios, e menos aptos em climas quentes. Isso porque uma série de povos, postos sob análise e comparação, desenvolveram dinâmicas diametralmente opostas em regiões cujas condições climáticas eram praticamente idênticas. A questão seria então a de que a cultura que adjetiva outra como menos apta ao trabalho utiliza as suas próprias referências sobre o que seria a forma e o ritmo ideal de trabalho, ou seja, trata-se de uma postura etnocêntrica.

Obviamente o clima, assim como a configuração geográfica, incide sobre as práticas econômicas (agricultura, pastoreio, indústria, comércio etc.) e, assim sendo, sobre a própria totalidade da vida social (estruturas políticas, práticas culturais); contudo, não se trata de fatores únicos e, tampouco, unicamente determinantes.

O que explicaria então as diferenças no próprio perfil desses grupos? Por que alguns estariam mais inclinados às hostilidades? Por que outros estariam mais inclinados para a paz?

O Conceito Antropológico de Cultura

Foi preciso praticamente um século para que fosse definida conceitualmente a “cultura”. Inicialmente, o termo apareceu em documentos escritos que se referiam ao âmbito da agricultura e, de sua designação como tipo de prática agrícola (cultura da cana-de-açúcar, cultura do café etc.), passou a ser utilizado para se referir ao modo de vida dos camponeses. Com o passar do tempo, do modo de vida de sociedades simples, o termo passou a ser utilizado para designar a área de estudo que tentavam compreender esses modos de vida.

Mas é a perspectiva antropológica que define mais precisamente a cultura, a partir de 5 de suas características principais:

Slaves Picking Cotton in Field Título original: As a slave. IMAGEM: © Bettmann/CORBIS COLEÇÃO Bettmann

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1) a cultura se refere a transmissão de caracteres extra-somáticos, ou seja, não se transmitem geneticamente;

2) a cultura é particular ao Homem. Os animais possuem, no máximo, sociedades;

3) adaptação: os animais se adaptam ao meio de modo genético e o Homem culturalmente, a despeito das adaptações genéticas ao meio ambiente. Ao inserir elementos de cultura material no processo adaptativo, o Homem acelera sua adaptação; contudo, retarda sua resposta genética ao meio ambiente;

4) a cultura é padronizada: língua, religião, economia etc., são convenções simbólicas que existem, ao alcance dos olhos, nas sociedades constituindo culturas dominantes. Neste caso, os itens de cultura se converteriam em vetores de relações sociais, cujas referências para a compreensão dessas convenções e símbolos são partilhadas no contexto dessa sociedade culturalmente padronizada;

5) a sociedade é o veículo da cultura, que só existe sob essa condição. A cultura dá a tônica da interação entre núcleos, como o educacional e o econômico, por exemplo.

Sendo assim, em termos antropológicos, pode-se entender a cultura como o sistema humano de hábitos ou costumes adquiridos por processos extra-somáticos, difundidos na sociedade por símbolos ou convenções criados nas dinâmicas de adaptação do indivíduo ao meio ambiente.

Essa definição ganha corpo teórico na década de 1930, a partir da obra de dois autores: Franz Boas (1858-1942) e Bronislaw Malinowski (1884-(1858-1942), que rompem com o evolucionismo linear assumido pela Antropologia por meio das teses de Spencer, representante máximo do darwinismo social e que postulava que o Homem evoluiria do estágio de barbárie ao estágio de civilização.

Malinowski, rompendo com o evolucionismo, dando ênfase ao relativismo e à pluralidade da cultura, acrescentou que em um determinado contexto a cultura funcionaria como uma unidade com engrenagens relacionadas.

American Anthropologist Franz J. Boas with Ashton Talbott IMAGEM: © Bettmann/CORBIS DATA DA FOTOGRAFIA ca. 1940s COLEÇÃO Bettmann

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A resposta dessa Antropologia para a questão da diversidade cultural é o aprendizado, que se dá por sua vez por meio de relações culturais muito especificas. Por meio da educação o indivíduo é introduzido ao mundo ou, se quisermos ser mais profundos, é humanizado; por meio da educação transmitem-se saberes que explicam (cada qual a sua forma) o mundo e o Homem, bem como o papel do Homem no mundo. Diferentes povos desenvolvem diferentes formas de transmitir seus saberes ou diferentes formas de educar, processo no qual são transmitidos repertórios culturais inteiros.

Sendo assim, não é nem a genética e nem o meio geográfico que determinariam o comportamento dos povos e suas diferenças; mas a cultura, por sua vez distinguida por conta da diversidade de experiências de aprendizado verificáveis em diferentes povos.

Não se trata de um processo de ensino meramente teórico. A criança que recebe os primeiros ensinamentos de seus pais, da família, do grupo social ao qual pertence, da educação formal ou da religião, aprende não só a como interpretar o mundo; mas como agir sobre ele.

Chamou a atenção de inúmeros estudiosos, fundamentalmente, o fato de que o Homem, graças à cultura, teria superado suas limitações biológicas. Se pensarmos nas possibilidades de sobrevivência do Homem frente à hostilidade da natureza – desde a diversidade do meio, as intempéries do clima, o assédio de animais predadores e a fragilidade frente aos desastres naturais -, ele não teria sobrevivido sem o advento da cultura.

Ou seja, ainda que portador de capacidades biológicas simples, se compararmos o Homem em força, por exemplo, em relação a um leão, o Homem está muito mais apto a sobreviver do que o leão, primordialmente porque o Homem é, antes de um ser biológico, um ser cultural.

Isso para dizer que o Homem é capaz, por ser produtor, portador e difusor de cultura, de adaptar-se ao meio natural ou mesmo de adaptar o próprio meio natural as suas necessidades; coisa que os leões não podem fazer, apesar da sua imensa força física e destreza na caça.

Family Eating Cookies IMAGEM: © Ken Seet/Corbis COLEÇÃO Flame

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A diferença consiste no poder que guarda a cultura, o que faz com que o Homem não limite a sua existência e suas possibilidades de sobrevivência única e exclusivamente ao seu potencial biológico; mas também aos instrumentos que cria para facilitar sua sobrevivência.

Por exemplo, ainda que o Homem seja mais frágil que um urso em relação a regiões de clima frio, ele é capaz de desenvolver instrumentos e técnicas que lhe permitam caçar o urso, extrair sua pele, secá-la e usá-secá-la como vestimenta, para escapar ao frio e viabilizar com isso sua existência.

Outra questão primordial e que coloca o conhecimento humano à frente das demais espécies em natureza, é seu caráter cumulativo. Ou seja, por meio da educação são transmitidos saberes culturais já erigidos, permitindo ao Homem que os recebe pensar para além dessas culturas, propondo e realizando inovações que, por sua vez, por meio do aprendizado, serão transmitidas às gerações futuras. Ao longo das gerações, portanto, as culturas se transformam apontando invariavelmente para horizontes até então inexplorados pelo humano.

Etnocentrismo e apatia

Uma forma extremamente eficiente para entendermos questões de estranhamento cultural é imaginar que as pessoas vêem o mundo a partir da sua cultura. Sendo assim, não se trata do mesmo mundo, mas de como ele é lido e interpretado de diferentes formas por diferentes pessoas, isso porque são portadoras de diferentes sistemas culturais.

O etnocentrismo consiste no fenômeno de o indivíduo, ou um grupo de indivíduos, considerar a sua

20 x 246 19k jpg -2.bp.blogspot.com/.../N_i1TV4fUoc/s320/urso.jpg A imagem pode ter direitos autorais.

Veja abaixo a imagem em: xamanismolegadodenossosancestrais.blogspot.com

ROCHA, Everaldo. O que é etnocentrismo.

Coleção Primeiros Passos. São Paulo:

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forma de interpretar o mundo como a única possível ou a melhor dentre as demais. Com isso, outros sistemas culturais passariam a ser alvo de discriminação por serem consideradas “tortos”, “distorcidos” ou “equivocados”.

O etnocentrismo é portanto valorativo, ou seja, a cultura diversa é sempre objeto de juízos de valor, entendida como inferior, exótica ou absurda.

Contudo, o comportamento etnocêntrico, nocivo como é, verifica-se como fenômeno cultural universal; isso porque toda cultura tende a posicionar-se como central no mundo que interpreta, sendo todas as demais culturas periféricas.

O etnocentrismo, absorvido pela cultura que é dada como inferior, absurda ou desviada, leva ao fenômeno oposto: o da apatia. Consiste na absorção dos valores de uma cultura etnocêntrica por parte daquela valorada negativamente, resultando na depreciação dos indivíduos pertencentes àquela cultura por seu próprio sistema cultural.

As Mudanças Culturais

A existência humana não consiste apenas numa existência biológica; trata-se primordialmente de uma existência cultural. Isso porque tudo aquilo que o Homem cria, ensina, aprende e volta a criar, constitui-se como cultura. Ao aprender sobre aquilo que seus antepassados criaram, o Homem recria a cultura, a natureza e a si mesmo, e quando passa seu conhecimento às demais gerações, já se trata de uma cultura recriada.

Mesmo que um indivíduo esteja imerso em um sistema cultural, ele nunca terá domínio pleno de todos os elementos que constituem aquela cultura, dada a riqueza e diversidade que preenchem os sistemas culturais. Contudo, ele é forçado a dominar um número mínimo de caracteres culturais para que seja reconhecido pelo grupo como alguém pertencente à mesma cultura. Mas a questão é que, ainda que os indivíduos de um grupo se conectem por meio do mesmo sistema cultural, ele não é lido nem praticado de forma idêntica por todos. São exatamente essas nuances e pequenas distinções que desvelam uma importante dimensão dos fenômenos de mudança cultural.

wind turbines and smoke stacks IMAGEM: © Images.com/Corbis NOME DO CRIADOR ImageZoo COLEÇÃO Images.com (RF)

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Culturas mudam constantemente, mesmo porque a natureza, sua base material, também muda por conta da interferência humana, primordialmente cultural. Isso para dizer que, ao alterar a natureza (que provem o Homem da base material, em estado bruto, de sua existência) para atender as suas necessidades, o Homem, por meio do trabalho (que envolve o desenvolvimento de meios, ferramentas e técnicas) altera não só a natureza, mas a si mesmo. Isso quer dizer que, ao alterar o meio, altera suas formas de interação social, sendo assim, ainda que suas necessidades biológicas sigam sendo as mesmas, suas necessidades sociais, ou culturais, mudam; mudando junto com o meio, novas formas de interferência à natureza que, como dissemos, não é mais a mesma, tende a produzir sempre um novo Homem, junto de novas formas de trabalho, organização social e, primordialmente, sistemas culturais fadadas à perene transformação.

Com isso, já podemos dizer que as culturas são distintas não tão somente no espaço; mas também no tempo, já que nunca permanecem inalteradas pois, ainda que lentamente, sempre se verificam transformações sendo operadas.

As mudanças culturais podem ser:

 Internas ao próprio sistema cultural, transformando-se lentamente e obedecendo a manifestações internas de mudança.

 Externas ao sistema cultural, como produto do contato com outro sistema, caso no qual, em relação à forma interna, é muito mais rápida e dinâmica.

Endoculturação

Antes de tratarmos das categorias fundamentais da Antropologia para a definição dos mecanismos de mudança cultural, é importante tratarmos daquela que se refere a sua transmissão que, de alguma forma, também implica em transformação.

Trata-se do conceito de “endoculturação”, conforme empregou o lingüista e antropólogo norte-americano Roger Martin Keesing (1935–1993) para se referir ao permanente processo de aprendizagem de uma cultura que se inicia já

1536 x 2048 906k jpg

-www.princeton.edu/.../g-k/hoebel/hoebel.jpg Veja abaixo a imagem

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desde o nascimento do indivíduo, quando passam a ser-lhe ensinados os valores e experiências que constituem, paulatinamente, seu repertório cultural. Trata-se de um processo contínuo, cujo término só se dá com a morte do indivíduo.

Tanto Felix Keesing quanto E. Adamson Hoebel (1906-1993), também antropólogo norte-americano, e Frost Herskovits, referem-se à função da endoculturação em constituir o suporte de transmissão dos códigos de conduta sociais, por meio dos padrões de comportamento social que difunde, o que tem um papel importantíssimo para a estabilidade do corpo social e do próprio sistema cultural.

Obviamente, apesar de padrões culturais serem difundidos e assimilados pelo indivíduo, o espaço do livre-arbítrio opera criando gradações distintas de comportamento; contudo, é notável a assimilação de comportamentos, verificáveis inclusive em condutas de desobediência.

Uma contrapartida a essa possibilidade, é o caráter de controle exercido pela sociedade, para condutas desviadas do padrão socialmente construído, bem como as formas de coerção exercidas para constranger o indivíduo à assimilação dos valores culturais dominantes.

Sendo assim, a idéia de liberdade deve ser relativizada ao padrão cultural por meio do qual o indivíduo age, uma vez que suas referências comportamentais, inclusive para as condutas de obediência e desobediência, são resultado do meio em que foi socializado.

Contracultura e subcultura

Ocorre que não podemos incorrer no erro de imaginar que por haver uma cultura dominante em sociedade, todos passem a incorporá-la plenamente. Como dito, há comportamentos de desobediência. Por sua vez, esses comportamentos desviantes da norma geram outros sistemas culturais, chamados de subculturas, para o caso de sistemas à margem da cultura dominante; ou contraculturas, para o caso de sistemas que se defrontam com a cultura dominante.

Hippie Couple, Cat, and Payphone A hippie couple hangs out on Sunset Boulevard in Los Angeles. Absent a bowl, their cat is served spilt milk in a payphone. "Hanging Out" was a full time occupation while waiting for a party. IMAGEM: © William James Warren/Science Faction/Corbis LOCAL Los Angeles, California, USA FOTÓGRAFO William James Warren COLEÇÃO Encyclopedia

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A “contracultura” se caracteriza pelo espírito crítico, questionador e desobediente em relação a tudo aquilo que é visto como vigente em um determinado contexto sócio-histórico.

A contracultura, por sua vez, oferece alternativas para interpretar o mundo e mais, para defender o mundo que acredita possível. Essas visões alternativas são expressas nas artes visuais, na literatura e nas idéias, tendo fomentado uma série de movimentos de contestação em nossa história recente, como: os Hippies, os Beats, os Punks e o Anarquismo.

Por vezes, movimentos de contestação, na forma da contracultura, conseguiram vitórias significativas na mobilização das massas para provocar as mudanças que

defendiam. É o caso de John Lennon e Yoko Ono, que deitados na cama de sua casa ofereceram uma das mais graves resistências à Guerra do Vietnã, defendendo que se fizesse amor, não a guerra. A opinião pública teve, nesse caso, uma importância fundamental no conjunto de pressões culminou na derrota política dos EUA nesse desigual enfrentamento.

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-franklarosa.com/vinyl/BigImg/beats.jpg em: franklarosa.com/vinyl/

Closeup J.Lennon W/Bride Y. Ono In Bed

Título original: 3/25/69-Amsterdam, Holland: Beatle John Lennon and his bride of five days, Yoko Ono, pose in the Presidential Suite of the Amsterdam Hilton Hotel, March 25th. Lennon declared they would "conceive a baby in Amsterdam" during press conference. Yoko nodded in agreement. They said they intend to stay in bed for seven days.

IMAGEM: © Bettmann/CORBIS

DATA DA FOTOGRAFIA 25 de março de 1969 LOCAL Amsterdam, Holland

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Aculturação

Dentre os processos externos de transformação cultural, o mais significativo é o da aculturação, decorrente do contato entre duas culturas distintas que, fundidas, dão origem a uma terceira cultura. Refere-se também a relações assimétricas em que uma cultura passa a exercer sobre outra um papel de dominação, culminando na absorção da cultura dominada. Uma questão a se pensar é se no processo, ainda que assimétrico, a cultura dominante não assumiria traços da cultura dominada. Em verdade, as correntes mais recentes da Antropologia e das Ciências Humanas e Sociais (como no caso da corrente crítica pós-colonial), verificam que contatos culturais, ainda que assimétricos e vetorizados por relações de força e poder, não se restringem a meras relações de assédio e resistência; mas resultam em trocas, negociações e mútuas transformações.

Sincretismo

O fenômeno do sincretismo se refere a uma fusão de doutrinas de diversas origens, tanto religiosas quanto filosóficas.

O termo é utilizado com maior fluência para se referir ao fenômeno da absorção de traços de uma religião por outra, culminando então numa forma sincrética. Sendo assim, o conceito é dotado de significados conciliadores entre distintos repertórios culturais, que passam a complementar-se e a serem compreendidos por meio de correspondências simbólicas.

Candomblé Beads and Catholic Symbols, originally uploaded by Sabrina Gledhill.

321 x 500 194k jpg -farm3.static.flickr.com/2161/2260212853_61093... Veja abaixo a imagem em: mrquerino.blogspot.com/2008/07/smbolos-religi..

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Ainda sobre o tema “o problema da cultura”, indico os textos abaixo, disponíveis na internet, a título de leitura complementar:

JOBIM, Sonia; “O que é cultura?”; site Orixás, disponível no link:

http://orixas.com.br/afrodesc/index.php?option=com_content&task=view&id=25&Itemid=6 3.

KONDER, Leandro; “O que é a cultura?; site Fundação Lauro Campos, disponível no link:

http://www.socialismo.org.br/portal/filosofia/155-artigo/404-o-que-e-a-cultura.

SANTOS, José Luis; “O que é cultura?”; site Shvoong, disponível no link:

http://pt.shvoong.com/books/1771319-que-é-cultura/. Indico ainda os filmes:

Dersu Uzala; dir.: Akira Kurosawa, Japão / URSS, drama, colorido, 1975. A Missão; dir.:Roland Joffé, Inglaterra, drama, colorido, 1986.

Koyaanisqatsi; dir.: Godfrey Reggio; EUA, documentário, 1983.

Baraka: Um Mundo Além das Palavras; dir.: Ron Fricke; 24 países, documentário, 1992. Crianças invisíveis; dir.: Mehdi Charef, Kátia Lund, John Woo, Emir Kusturica, Spike Lee, Jordan Scott, Ridley Scott e Stefano Veneruso; Itália, documentário, 2005.

Na internet, indico os conteúdos:

VídeoLog: “Uma só palavra: o que é cultura?”; disponível no link:

http://videolog.uol.com.br/video.php?id=274548.

Material Complementar

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BENEDICT, Ruth. 1934. Padrões de cultura. Lisboa: Livros do Brasil, s.d.

BOAS, Franz. Antropologia Cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.

CHILDE, V. Gordon. A evolução cultural do homem. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1966. KUPER, Adam. Cultura: a visão dos antropólogos. Bauru, Edusc, 2002.

MALINOWSKI, Bronislaw. Argonautas do Pacífico Ocidental. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril, 1977.

MALTHUS, Thomas Robert. Princípios de economia política: e considerações sobre sua aplicação prática; Ensaio sobre a população. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

MARGARIDA MARIA MOURA. Nascimento da Antropologia Cultural: A Obra de Franz Boas. São Paulo: Hucitec, 2004.

MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. Petrópolis: Vozes, 1997.

MEIRA PENNA, J. O. de; “Malthus e o princípio de população”; Digesto Econômico, Novembro-Dezembro - 1994.

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Anotações

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Referências

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