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O Monumento 9 de Alcalar

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Academic year: 2021

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CENTRO DE ARQUEOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

5.º Congresso

do Neolítico

Peninsular

VICTOR S. GONÇALVES

MARIANA DINIZ

ANA CATARINA SOUSA

eds.

estudos &

memórias

8

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5.º Congresso

do Neolítico

Peninsular

Actas

Faculdade de Letras

da Universidade de Lisboa

Casa das Histórias Paula Rego

7-9 Abril 2011

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5.º Congresso

do Neolítico

Peninsular

Actas

Faculdade de Letras

da Universidade de Lisboa

Casa das Histórias Paula Rego

7-9 Abril 2011

VICTOR S. GONÇALVES

MARIANA DINIZ

(6)

estudos & memórias

Série de publicações da UNIARQ

(Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa) Direcção e orientação gráfica: Victor S. Gonçalves 8.

GONÇALVES, V.S.; DINIZ, M.; SOUSA, A. C., eds. (2015), 684 p.

5.º Congresso do Neolítico Peninsular. Actas. Lisboa:

UNIARQ.

Capa, concepção e fotos de Victor S. Gonçalves. Pormenor de uma placa de xisto gravada da Anta Grande da Comenda da Igreja (Montemor o Novo). MNA 2006.24.1. Museu Nacional de Arqueologia, Lisboa. Paginação e Artes finais: TVM designers

Impressão: Europress, Lisboa, 2015, 400 exemplares ISBN: 978-989-99146-1-2

Depósito Legal: 400 321/15 Copyright ©, os autores.

Toda e qualquer reprodução de texto e imagem é interdita, sem a expressa autorização do(s) autor(es), nos termos da lei vigente, nomeadamente o DL 63/85, de 14 de Março, com as alterações subsequentes. Em powerpoints de carácter científico (e não comercial) a reprodução de imagens ou texto é permitida, com a condição de a origem e autoria do texto ou imagem ser expressamente indicada no diapositivo onde é feita a reprodução.

Lisboa, 2015.

Volumes anteriores de esta série: 1.

LEISNER, G. e LEISNER, V. (1985) – Antas do Concelho

de Reguengos de Monsaraz. estudos e memórias, 1.

Lisboa: Uniarch. 2.

GONÇALVES, V. S. (1989) – Megalitismo e Metalurgia

no Alto Algarve Oriental. Uma aproximação integrada.

2 Volumes. estudos e memórias, 2. Lisboa: CAH/Uniarch/INIC.

3.

VIEGAS, C. (2011) – A ocupação romana do Algarve.

Estudo do povoamento e economia do Algarve central e oriental no período romano. estudos e memórias 3.

Lisboa: UNIARQ. 4.

QUARESMA, J. C. (2012) – Economia antiga a partir

de um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?). estudos e memórias 4. Lisboa: UNIARQ.

5.

ARRUDA, A. M. ed. (2013) – Fenícios e púnicos, por terra

e mar, I. Actas do VI Congresso Internacional de Estudos

Fenícios e Púnicos, estudos e memórias 5. Lisboa: UNIARQ. 6.

ARRUDA, A. M. ed. (2014) – Fenícios e púnicos, por terra

e mar, 2. Actas do VI Congresso Internacional de Estudos

Fenícios e Púnicos, estudos e memórias 6. Lisboa: UNIARQ 7.

SOUSA, E. (2014) – A ocupação pré-romana da foz do

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5.º CONGRESSO DO NEOLÍTICO PENINSULAR 532

A ocupação humana da Baía de Lagos no 3.º milénio ane

O território de Alcalar é delimitado pelas elevações montanhosas da Serra de Monchique, ao norte, e pela orla costeira da Baía de Lagos, ao sul. Nesta desaguam três sistemas hidrográficos: Bensafrim; Odiáxere/Arão; Farelo/Torre. No 3.º milénio a.n.e., o mar penetrava no interior da orla costeira em braços ‑de ‑mar que reco‑ lhiam o caudal dos diferentes sistemas fluviais. A zona intermédia, conhecida como barrocal, corresponde a veigas férteis e terrenos ondulados de baixa altitude cobertos de mato mediterrânico. A diversidade geográ‑ fica, a variedade de recursos implícita e o facto, compro‑ vado por pesquisas geoarqueológicas, de que o caudal dos rios permitia o seu uso como vias de transporte para o interior, justifica per se a intensa ocupação desta região no 3.º milenio a.n.e.

As evidências arqueológicas mais antigas da ocupação humana neste território, desde a estabilização da Ria Flandriana (Hoffmann, 1987, p. 26 ‑27) há cerca de 6500 anos atrás, são os restos de habitat com horizontes de ocupação atribuídos às comunidades do Neolítico antigo, alguns destes associados a menires (Gomes, 1997; Calado & Rocha, 2007) e que alguns autores admi‑ tem poder remontar a etapas anteriores, com formações sociais de recolectores sedentarizados (Calado et al., 2004; Nocete et al., 2004).

Por baixo do túmulo do monumento de Alcalar 7, um

tholos datado em meados do 3.º milenio a.n.e., foram

identificadas estruturas negativas de uma ocupação anterior, vestígios de um habitat destruído pela constru‑ ção do edifício calcolítico: uma pequena fossa (cujo enchimento incluía conchas de amêijoas) e duas estru‑ turas de combustão em covacho (Díaz ‑Guardamino, 2004; Carrión, 2004, p. 161 ‑162; Carrión, 2005, p. 254‑ ‑257). As datações por radiocarbono efectuadas pelos laboratórios Beta e ITN (Morán & Parreira, 2004, p. 117; Soares, 2004, p. 117 ‑118) sobre amostras de carvão vege‑ tal (Quercus) recolhidas no interior das fogueiras e sobre as conchas de amêijoa (Venerupis decussata), confirmam uma ocupação do sítio na primeira metade do 5.º milé‑ nio a.n.e. A este horizonte pertencem provavelmente também as duas estelas e o pequeno menir que foram posteriormente incorporados no dispositivo litúrgico do tholos, no 3.º milénio a.n.e.; os bivalves e os fragmentos de dormentes e moventes de mós (em sienito regional, da Serra de Monchique) reutilizados como acumulado‑ res de calor nas fogueiras, demonstram que o sítio esteve frequentado e/ou habitado por uma comunidade que praticava a agricultura cerealífera e o marisqueio (Morán, 2008, p. 141).

Do outro lado do vale da Ribeira da Torre, a quase 3 km a nordeste de Alcalar, escavou ‑se no ano 2005, no Castelo Belinho (Carvalho, 2008, p. 259; Gomes, 2009), um conjunto de estruturas negativas correspondentes a um habitat: numerosos buracos de poste interpreta‑ dos pelo seu escavador, Mário Varela Gomes, como evi‑ dência de casas rectangulares, comparáveis às casas neolíticas centro europeias, e um conjunto de fossas‑

O Monumento 9 de Alcalar

ELENA MORÁN

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R E S U M O Num local com uma ocupação do 5.º milénio a.n.e. foram construídos, no 3.º milénio a.n.e., dois edifícios monumentais megalíticos, incorporando elementos arqui‑ tectónicos anteriores. Ambos os edifícios tumulares, com planta centralizada, de fachada rectilínea voltada a nascente e recinto cerimonial rebaixado no subsolo, foram deliberada‑ mente condenados com estruturas construídas em xisto.

Palavras ‑Chave: Megalitismo, tholos, recinto cerimonial.

A B S T R A C T At a place previously occupied in the Fifth millennium b.c.e., were built in the Third millennium b.c.e. two megalithic monuments, incorporating previously existing architectural elements. Both buildings, with centralized plan, a rectilinear facade facing east, and associated ceremonial areas semiexcavated in the ground, were deliberately sealed with slate stone structures.

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5.º CONGRESSO DO NEOLÍTICO PENINSULAR 533 O MONUMENTO 9 DE ALCALAR  ELENA MORÁN  P. 532-539

‑silo, algumas delas com inumações em posição flexio‑ nada, num dos casos acompanhada por 22 braceletes de concha de Glycimeris. As datações de radiocarbono confirmaram a ocupação deste sítio ao longo da pri‑ meira metade do 5.º milénio a.n.e., estando presentes, no que restava dos níveis de ocupação, objectos de pedra, cerâmica e ecofactos que indiciam uma econo‑ mia de subsistência de amplo espectro.

A, aparentemente escassa, informação sobre as etapas posteriores do Neolítico no território de Alcalar não auto‑ riza qualquer sistematização até à segunda metade do 4.º milénio a.n.e. É nesta altura que começa a consolidar‑ ‑se no sítio de Alcalar uma ocupação do espaço que está na origem de arquitecturas funerárias diversificadas.

Desde finais do 4.º e ao longo do 3.º milénio a.n.e. desenvolveu ‑se aí uma necrópole megalítica monumen‑ tal (Veiga, 1886; 1889; Morán & Parreira, 2007, com a bibliografia anterior) cujo horizonte mais antigo está representado pelo monumento de Alcalar 1, um dólmen de câmara poligonal e corredor alargado construído com lajes de arenito vermelho regional, envolvido por um túmulo de pedras soltas (cairn) de calcário local (Leisner & Leisner, 1943). A antiguidade deste túmulo está indi‑ cada pela presença da placa de xisto decorada, cujos paralelos permitem uma datação na segunda metade do 4.º milénio a.n.e ou inícios do 3.º milénio a.n.e.

A este mesmo horizonte cronológico pertence uma necrópole de hipogeus localizada em Monte Canelas (Silva, 1996; Silva & Cunha, 1999; Morán et al., 2005; Morán & Parreira, 2007, p. 77 ‑87; Parreira, 2010; Silva & Parreira, 2010), a uns 2 km para norte de Alcalar. Até ao momento foram ali identificadas quatro estruturas fune‑ rárias escavadas na rocha, tendo sido parcialmente explorados os hipogeus MC1 e MC3. As datações de radiocarbono, efectuadas sobre enterramentos em posi‑ ção primária depositados na base das criptas de MC1 (Silva & Parreira, 2010), apontam para um primeiro hori‑ zonte de uso destas criptas entre a segunda metade do 4.º milénio a.n.e e os inícios do 3.º milénio a.n.e (Morán & Parreira, 2004). Para sul de Alcalar, a necrópole de Torre corresponde igualmente a inumações em hipogeu onde ocorre placa de xisto gravada (Sá, 1904). Pela sua discrição, estas criptas funerárias contrastam desde logo com a monumentalidade do túmulo de Alcalar 1, que lhes é coevo. Assinala ‑se ainda a possibilidade de, neste contexto cronológico, ter havido um uso funerário das cavidades naturais do Serro do Algarve (caverna da Mulher Morta) e de Poio.

Ao longo do tempo, esta diferença de posição/monu‑ mentalidade irá acentuar ‑se: a situação algo «segregada» de Monte Canelas durante a fase calcolítica da necrópole hipogeica (com depósitos funerários estratigraficamente diferenciados no hipogeu MC1 associados a cerâmica simbólica), contrasta com o progressivo desenvolvi‑ mento da necrópole tumular monumental, que se con‑ centra na vizinhança imediata daquele que é o principal povoado calcolítico do território envolvente da Baía de

Lagos e que se instala, a partir dos inícios do 3.º milénio a.n.e., sobre um planalto que sobressai sobre os vales cir‑ cundantes (Morán, 2001; 2008), assumindo uma posição hegemónica no território e polarizando a anterior rede de estabelecimentos neolíticos.

É a partir de 2800 a.n.e. ‑ e enquanto alguns ambientes funerários eram «segregados» para a periferia do centro de poder (como os edifícios tumulares de Monte Velho, um núcleo funerário com três sepulcros de tholos, o pro‑ vável tholos de Poio ou a fase tardia de uso dos hipogeus em Monte Canelas ‑ que, na envolvente imediata do cen‑ tro de poder, se organiza um conjunto monumental de edifícios tumulares e áreas cerimoniais conexas, com diferentes agrupamentos localizados sobre as colinas que delimitam o habitat pelo lado norte: em Vidigal Velho (= Monumentos 12 e 13), Alcalar Oeste (= Monu‑ mentos 8, 11, 14, 15 e 16), Alcalar Centro (= Monumen‑ tos 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 10) e Alcalar Este (= Monumentos 7 e 9) (Morán & Parreira, 2007; Parreira & Morán, 2008, com a bibliografia anterior).

O agrupamento oriental de templos funerários da necrópole de Alcalar

O agrupamento oriental da necrópole monumental de Alcalar levanta ‑se num local habitado e/ou frequentado no 5.º milénio a.n.e. Constituído por dois edifícios monu‑ mentais – Alcalar 7 e Alcalar 9 –, que incorporaram ele‑ mentos arquitectónicos anteriores, apresentam fachada recta, recinto cerimonial semiescavado na rocha, orien‑ tação para nascente, e foram deliberadamente condena‑ dos com estruturas construídas em xisto. As datações obtidas no recinto cerimonial do monumento de Alcalar 7 demonstram que o uso da área que o envolve se pro‑ longou entre a segunda metade do 3.º milénio (lareira

Fig. 1 Vista sobre o monumento Alcalar 9, com Alcalar 7 e Povoado ao fundo.

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5.º CONGRESSO DO NEOLÍTICO PENINSULAR 534

O MONUMENTO 9 DE ALCALAR  ELENA MORÁN  P. 532-539

realizada contra a fachada, antes do seu fecho/«con‑ denação») e a segunda metade do 2.º milénio a.n.e. (res‑ tos de combustão identificados nos níveis de abandono do recinto cerimonial).

No que se refere ao monumento Alcalar 9, a sua cripta e corredor foram pela primeira vez objecto de escavações arqueológicas em Dezembro de 1900, em trabalhos diri‑ gidos por Joaquim Pereira Jardim e promovidos pela Sociedade Arqueológica da Figueira da Foz, sendo o monumento dado a conhecer à comunidade científica por seu cunhado, António dos Santos Rocha (Rocha, 1904). Após essas escavações, que consistiram essencial‑ mente numa trincheira que depois se encheria parcial‑ mente com blocos calcários, o monumento foi progres‑ sivamente arruinando ‑se durante todo o século XX, ficando aos poucos oculto entre um denso matagal de carrasco e sob entulhos recentes. Só em 1979, no decor‑ rer dos trabalhos de campo efectuados na necrópole por José Arnaud e Teresa Gamito, o monumento viria a ser de novo localizado com precisão.

A documentação antiga mostrava um edifício funerá‑ rio semienterrado no subsolo, com a entrada enqua‑ drada por um pequeno átrio intratumular em forma de caixa rectangular com 0,65 m de comprimento, com chão ligeiramente inclinado para dentro, delimitado lateralmente por dois monólitos de calcário e uma entrada com couceira de laje transversal e degrau. Dois batentes, ou ombreiras, de arenito, «sobre os topos dos quais pousava a verga» do mesmo material, marcam uma porta que dá passagem estrangulada ao corredor. Este, com paredes em alvenaria de xisto com cerca de 1 m de altura e coberto por quatro tampas monolíticas, apresenta ‑se segmentado em três tramos por portas for‑ madas, «como a primeira, de pilares e verga de arenito». Tal como na entrada para o átrio, a primeira das portas intermédias apresenta, embora aqui deslocada, a respec‑ tiva couceira. Uma tampa cobria o primeiro tramo, de 1,10 m de comprimento, duas tampas o segundo, com 1,55 m de comprido, enquanto o último dos tramos, com 0,85 m de comprimento, se apresenta coberto por uma tampa única, ainda in situ no momento da escavação. Este último tramo é antecâmara da cripta e está dela separado por uma couceira em cutelo, que forma degrau. A uma cota ligeiramente inferior, a cripta, com planta cir‑ cular de 3 m de diâmetro e pavimentada com lajes de arenito, está construída em alvenaria de xisto, encur‑ vando desde a base numa falsa cúpula a que já falta o fecho. No seu interior alguns blocos de calcário grossei‑ ramente trabalhados foram interpretados como indício de pilares. À época, o conteúdo deste monumento pare‑ ceu a Santos Rocha revolvido mas integrando ainda ossos humanos e de animais, algumas contas e fragmen‑ tos de cerâmica. Ele descreve com pormenor uma estru‑ tura de condenação, que bloqueava todo o átrio e o inte‑ rior do corredor, mas nada relatou acerca da estrutura da mamoa envolvente, embora o esboço do caderno de campo mostre um aglomerado de blocos pétreos de

grandes dimensões envolvendo o círculo, vazio, da cripta, aparentemente indiciando tratar ‑se de um cairn que não parecia atingir sequer 15 m de diâmetro.

O Monumento 9: concepção, processo construtivo, utilização e abandono

Foi neste edifício tumular já parcialmente explorado que realizámos seis campanhas de trabalhos arqueoló‑ gicos, desenterrando um tholos de corredor segmentado por portas com degraus, ombreiras e vergas (um minús‑ culo átrio intratumular e três tramos cobertos) e de cripta circular provida de dois nichos laterais em lados opostos (norte e sul). Construída desde a base em alvenaria de placas de xisto, incorporando lajes de calcário arenítico nas molduras dos vãos e blocos de vidraço nas tampas do corredor e dos nichos, a estrutura interna é envolvida por um cairn com planta centralizada, construído com pedras calcárias colocadas à mão e ligadas por terra argi‑ losa. Esse túmulo é contido por um kerb com cerca de 12 m de diâmetro, constituído por monólitos calcários, e com uma fachada rectilínea voltada a nascente, no cen‑ tro da qual se abre o acesso ao interior do edifício. Diante dessa fachada desenvolve ‑se um vasto átrio, escavado no substrato geológico de margas calcárias e pavimentado com lajetas de xisto, que apresenta evidências de um uso litúrgico, integrando lareiras estruturadas e não estrutu‑ radas, cerâmicas e artefactos líticos. Após um uso ceri‑ monial e funerário (conservavam ‑se os restos de duas crianças, um jovem, dois adultos do sexo feminino e um adulto maduro masculino, este último depositado em ossário no tramo do corredor junto à cripta), o túmulo foi «condenado» mediante a colocação de um talude que envolve toda a estrutura tumular e constituído por lajes de xisto arrumadas à mão, ligadas por argila de cor ver‑ melha (esta parece também ter ficado a cobrir a totali‑ dade do túmulo após a «condenação»). O átrio foi igual‑ mente «condenado» com um empedrado regular ‑ de calcários, grauvaques e xistos ‑, que preencheu e terra‑ planou toda a depressão escavada na rocha e cobriu as lareiras. O espaço veio a ser usado em época histórica, horizonte de que ficou testemunho numa fossa aberta a nordeste da fachada.

O tumulus

A mamoa está contida por um kerb formado por gran‑ des blocos de pedra calcária, cuja dimensão oscila entre menos de 0,5 m e 1,0 m. Grandes blocos de calcário colo‑ cados circularmente rematam o topo da superfície do

cairn, cumprindo ao mesmo tempo, provavelmente, a

função de contraforte da estrutura interna do edifício e permitindo, assim, a descarga da tampa, ou tampas, da cripta – das quais não observámos qualquer resto. Entre o kerb e o topo do túmulo ainda foi colocado um outro

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círculo de pedras de calcário de tamanho médio, que devem ter servido de suporte ao enchimento do túmulo com pedras de pequenas dimensões, colocadas à mão. O túmulo foi travado com terra argilosa, apresentando uma estrutura solidamente construída e que permane‑ ceu quase inalterada até aos nossos dias.

A cripta do tholos

A cripta apresenta uma planta quase circular, com um diâmetro de 2,64 m (tomando como referência a largura no eixo N ‑S), com as paredes de alvenaria de xisto apoiando ‑se sobre um pavimento formado por lajes de arenito, justapostas de nível na horizontal aproximada‑ mente em z 57,45, e cujas juntas foram tratadas por pequenas esquírolas de xisto e arenito e regularizadas com argila. Actualmente, as lajes de pavimento apresentam ‑se partidas e com desníveis originados cer‑ tamente pelas mesmas deslocações do assentamento que provocaram também o desmoronamento da estru‑ tura interna, cuja ruína pressionou as áreas periféricas do chão, que se apresentam agora afundadas no substrato geológico, ao mesmo tempo que se mostram levantadas na área central da cripta. Por isso, as cotas actuais do laje‑ ado oscilam entre z 57,42 junto do corredor e z 57,51 na proximidade da parede oeste da cripta.

A altura conservada da alvenaria do muro circular da cripta é de cerca de 1,20 m, alcançando a cota z 58,87,

embora a face da parede apenas se apresente íntegra até uma altura inferior a 0,50 m sobre o lajeado de arenito.

Verificámos que, sobre esse chão e junto à parede oeste da cripta, se conservavam ainda em posição primária restos da ruína da parede. Julgamos que o estado de des‑ truição que apresenta a estrutura interna da cripta se relaciona com o próprio sistema construtivo, em que, nos assentamentos superiores do muro circular do

tho-los, o «mestre construtor» pré ‑histórico terá alternado

fiadas de alvenaria de xisto com fiadas de pedra miúda de calcário, acabando por criar uma estrutura pouco sólida e que cedo conduziu ao colapso da cripta.

Sobre o chão da cripta sobrepunham ‑se duas camadas de lajetas de xisto, colocadas na horizontal e calcadas com argila amarelada.

Os nichos norte e sul do tholos

A cripta apresenta dois nichos, colocados em posição geometricamente oposta, aproximadamente alinhada em x 17,40, que se abrem um na parede norte, outro na parede sul da cripta. Ambos apresentam a soleira lajeada e cada um deles está coberto com duas pedras encosta‑ das, sendo que, em ambos os nichos, as duas primeiras se apresentavam deslocadas para o interior da cripta.

A tampa do nicho sul apresentava ‑se derrubada no interior da cripta, mas enquanto o seu tardoz se apoiava ainda no que resta da parede sul, a sua frente afocinhara

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5.º CONGRESSO DO NEOLÍTICO PENINSULAR 536

O MONUMENTO 9 DE ALCALAR  ELENA MORÁN  P. 532-539

sobre os restos colapsados da parede e do próprio nicho, que repousavam quer sobre o chão de arenito da cripta, quer sobre restos de um nível que embalava restos ósseos, o que previamente induziu a augurar podermos encon‑ trar ainda parte do recheio original do nicho. O interior apresentava a derrocada das paredes e ainda intrusões do

cairn, como consequência da deslocação de um dos lin‑

téis para o interior da cripta. A presença de escassos frag‑ mentos ósseos aponta para o eventual uso funerário deste nicho. A base do nicho foi construída com lajes de xisto e uma laje de arenito, colocada em oposição ao lintel de calcário, inserido na parede da cripta. A meio do nicho, faltava a laje que encostava à laje de arenito. Seguramente era em xisto, e deve ter ficado muito danificada pela der‑ rocada das paredes e pelo embate do lintel e correspon‑ dente arrastamento, provocando a fissuração desta laje, cujos fragmentos foram removidos por nós.

No lado oposto, o nicho norte apresentava ‑se melhor conservado, uma vez que uma das suas tampas assen‑ tava horizontalmente sobre as paredes internas, perfei‑ tamente alinhadas. No entanto, após a remoção do lintel, o interior apresentava ‑se completamente entulhado pelo colapso das paredes do nicho. Os escombros sobrepu‑ nham a soleira, constituída por duas lajes de arenito, sendo que o remate nordeste do solo foi completado por uma laje de calcário.

Ambos os nichos são exíguos, com cerca de 0,70 m de largura máxima e cerca de 1,20 m de comprimento. Não estão simetricamente colocados com respeito ao eixo do corredor e também não foram dispostos à mesma altura. Assim, o nicho sul apresenta a soleira descaída para o interior da cripta. No fundo do nicho a altura é de z 58,32 m e de z 57,93 m na boca. O nicho norte mostra também a soleira ligeiramente descaída para o interior da cripta, mas com uma diferença de altura inferior à referida no nicho sul, já que no fundo do nicho a soleira foi colocada a z 58,11 m e a boca a z 58,01 m.

O corredor do tholos

O corredor do tholos está segmentado em três tramos, demarcados por três portas com jambas e soleiras de are‑ nito, e é antecedido no exterior por um átrio intratumu‑ lar definido por duas grandes pedras de calcário de cerca de 0,8 m de altura. Carece de todas as tampas que o cobriam, à excepção do lintel na interface com a cripta, que embora descaído sobre o terceiro tramo do corredor assentava sobre os restos colapsados da alvenaria de xisto das paredes laterais. Confirmámos que, também neste tholos, o corredor se vai estreitando do exterior para o interior.

O colapso das paredes, aparentemente ocorrido já em época pré ‑histórica, e a violenta actuação de Pereira Jar‑ dim, que no final do século XIX ali abriu uma trincheira longitudinal, deixou ‑nos um corredor alterado, com ele‑ mentos arquitectónicos deslocados e partidos.

Com a desobstrução do corredor, foi possível observar a toda a largura e comprimento o tramo intermédio e o mais próximo da cripta, e analisar tanto a sua construção como o seu estado de conservação. Verificámos deste modo que o corredor foi pavimentado com lajes de are‑ nito de 0,40 m, colocadas transversalmente ao eixo da galeria e travadas entre si com ligante argiloso e lascas de xisto. O início e o fim de cada tramo foram, cada qual, demarcados por um degrau tanchado, no qual topejam as lajes do chão. Entre as portas extremas, o corredor apresenta um desnível de cota entre z 57,61 e 57,51, o que mostra que desce em direcção à cripta, onde o chão se situa por volta de z 57,45.

Parece ‑nos que a estrutura do corredor, «tipo muro» (de acordo com o esboço tipológico proposto por V. S. Gonçal‑ ves) consiste em duas paredes paralelas com cerca de 1 m de largura, construídas com lajes de xisto ligadas por argila. No entanto, o «miolo» desta estrutura apresenta ‑se alterado, talvez devido a essa peculiar forma de constru‑ ção dos assentamentos superiores da alvenaria que parece alternar fiadas de xisto com camadas de pedra calcária, ou mesmo devido a que a parede do lado norte tenha sido parcialmente preenchida por terra sem pedras — hipótese a não descartar, dado não termos podido confirmar se a descontinuidade na alvenaria aí observada se terá devido a uma cova aí aberta em data posterior à ruína do túmulo. Tudo sugere que, tal como observámos na estrutura da cripta, o corredor não apresente uma construção sólida: o que terá contribuído para o seu colapso.

A cobertura da cripta

Observando as paredes da estrutura interna da cripta e apesar do estado de destruição que apresentam, com‑ provámos aquilo que já Santos Rocha constatara: que, à face da parede circular da cripta, o diâmetro da circunfe‑ rência das fiadas de assentamento da alvenaria vai dimi‑ nuindo logo desde a base. Pode intuir ‑se o fecho da cripta, com elevação ao modo que conhecemos como falsa cúpula, coroado por uma ou duas lajes de pedra apoiadas no topo do muro circular, sobre a última fiada da alvenaria, vencendo o diâmetro da abertura, ali já muito reduzido pela sucessiva aproximação das fiadas.

Os contrafortes da cripta e do corredor

Não pudemos observar o tardoz dos muros da estru‑ tura interna do tholos, nem na cripta, nem no corredor, por, deliberadamente, não termos desmontado o cairn. Supomos porém que o contraforte do muro da cripta pode ter sido substituído pelas grandes pedras de calcá‑ rio colocadas em redor e que suportam a descarga da estrutura interna do tholos. No corredor, será talvez o próprio subsolo em que o muro foi implantado que deve suportar a descarga.

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5.º CONGRESSO DO NEOLÍTICO PENINSULAR 537 O MONUMENTO 9 DE ALCALAR  ELENA MORÁN  P. 532-539

A fachada do edifício tumular

A fachada está constituída por um alinhamento de blo‑ cos de calcário e alvenaria de arenito e xisto, com cerca de 10 m de comprimento, cuja orientação SO ‑NE é demarcada pelos dois monólitos que assinalam o átrio intratumular. A fachada constitui uma linha tangente à circunferência do kerb.

O muro da fachada foi assente directamente no sub‑ solo. O seu alçado, apesar de ter sido parcialmente des‑ montado durante a condenação do edifício, apresenta‑ ‑se ainda conservado com 0.8 m de altura máxima, até cerca de z 58,30 a 58,50 m. Entre y 77,20 e y 82,20, os dois monólitos que enquadram o átrio intratumular apresen‑ tam uma patologia acentuada em sentido nascente e norte, estando ligeiramente balançados para a frente, sobrepondo as lajetas do chão do átrio e algumas das pedras do embasamento da estrutura de condenação, indiciando assim que o balanço que originou este des‑ caimento estrutural – possivelmente provocado por um sismo – teve lugar após a clausura do edifício tumular.

A área envolvente — uma praceta cerimonial com inclusão de elementos de culto?

Frente à fachada, o chão de base apresenta ‑se esca‑ vado até definir um recinto elipsóide, que foi aplanado sobre a rocha e cujo chão foi parcialmente revestido com um lajeado de xisto. Suspeitamos, assim, que o projecto de construção de um novo edifício litúrgico funerário, implicou simultaneamente um outro projecto de

arqui-tectura da paisagem, o que parece prognosticar o inte‑

resse social por manter uma continuidade do uso do espaço exterior, acessível ao público em geral, para além de um uso restrito do interior, limitado a deposições pre‑ estabelecidas e a um acesso interdito a uma parte signi‑ ficativa da população.

Sabíamos desde as escavações no vizinho monumento Alcalar 7, que cada um dos edifícios passa por projecto conjunto de arquitectura megalítica associado a arqui‑ tectura da paisagem, mas agora podemos comprovar que cada monumento implica o desenvolvimento de um pro‑ jecto integrado e que a coexistência de vários edifícios, neste caso Alcalar 7 e Alcalar 9, implicaram a coordena‑ ção de ambos os projectos, permitindo a conservação identitária de cada um deles, sem os justapor.

Uso funerário e litúrgico do monumento

A presença dos dois nichos laterais na cripta parece evidenciar uma intenção de, em cada um deles, colocar um indivíduo post -mortem. A existência de ossos huma‑

nos dispersos sobre o chão da cripta e de um enterra‑ mento secundário no corredor comprova tanto um uso funerário como cultual daquele espaço, tendo sido recu‑

perado material osteológico humano correspondente a um número mínimo de seis indivíduos, dos quais três são adultos (um do sexo masculino e dois do feminino), duas crianças e um adolescente (Ferreira & Silva, 2007).

Verificámos que sobre o chão da base da cripta foi colocado um revestimento ou chão construído com laje‑ tas de xisto, resultante da colocação, num primeiro momento, de alguns ossos e adornos, tais como contas de calcáreo e de «calaíte», directamente sobre o chão da cripta, após o que foi clausurado com um chão de lajetas de xisto. Num momento posterior, por cima desta pri‑ meira camada de xisto, houve mais deposições de ossos e contas.

No corredor, verificámos que, tal como na cripta, exis‑ tiam duas camadas de lajetas de xisto colocadas na hori‑ zontal. Sobre a primeira camada, e clausurada pela segunda, foi colocado um ossário, arrumado no interior de uma taça em calote, por sua vez colocada numa outra da mesma forma mas de maior tamanho. Corresponde à inumação secundária de um indivíduo, trasladado de um outro local, tendo sido transportados não só os ossos mais relevantes, como o crânio ou ossos mais compridos, mas igualmente os ossos menores. Para mais, o ossário assentava sobre uma camada de lajetas de xisto corres‑ pondente a uma primeira sedimentação de uso sobre o chão original do corredor.

No interior da cripta, junto à parede do lado nascente, na proximidade do acesso ao corredor, foi recolhido um vaso incompleto com perfil sinuoso.

No corredor, foram recolhidos dois fragmentos ajustá‑ veis, correspondentes à parte superior, de um ídolo cilín‑ drico decorado do «tipo Moncarapacho», sendo que o troço decorado estava localizado no terceiro tramo do corredor.

No segundo tramo do corredor foi depositada uma falange de Equus Hydruntinus, com marcas de corte mas sem decoração. É possível que este artefacto e os poucos ossos humanos recolhidos no mesmo nível estivessem em posição secundária, alterada por processos pós depo‑ sicionais.

A estrutura de «condenação»

Desde a Sanja S até à Sanja W e em todo o Sector SW foi identificado um horizonte de encobrimento

intencio-nal do edifício tumular. Todo o edifício, incluindo a parte

posterior do túmulo, parece ter sido fechado com uma couraça pétrea de xisto e argila tão sólida como a do pró‑ prio túmulo, um compacto empedrado em coroa com cerca de 1,50 m de largura que rodeia e sobrepõe parcial‑ mente todo o perímetro exterior do túmulo e que terá funcionado como um interdito de longa duração (uma expressão usada por S. O. Jorge, 2002, p. 156, a propósito do Castelo Velho de Freixo de Numão), sendo por vezes, na área escavada, sobreposto pelo derrube do muro de alvenaria que rematava o topo do kerb.

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5.º CONGRESSO DO NEOLÍTICO PENINSULAR 538

O MONUMENTO 9 DE ALCALAR  ELENA MORÁN  P. 532-539

Como se pôde observar nos perfis em y 80, x 16 e x 18, esta estrutura pétrea de «condenação» colocada contra a face do kerb, está constituída por lajetas de xisto fixas com barro amassado muito compacto, que assentavam directamente sobre uma camada de barro integralmente compacto, com entre 0,10 m e 0,20 m (junto ao kerb). A construção desta estrutura apresenta ‑se muito elabo‑ rada, pois pudemos comprovar que as lajetas de xisto se distribuíam em toda a área em tramos contrapostos para o interior e para o exterior de forma alternadamente regular. Assim, o arranque desta construção parte de um primeiro tramo de cerca de 0,30 m adossado á face interna do kerb, que é seguido por uma nova camada de cerca de 0,50 m disposta contrariamente à primeira, para o exterior, e a seguir volta ‑se a dispor uma nova camada de cerca de 0,70 m encostada a esta última, e com orien‑ tação para o interior.

Parece ‑nos que a construção desta estrutura de clau‑ sura do monumento, para além de representar uma nova fase construtiva do edifício tumular, marcando a impor‑ tância do seu uso exterior e selando para a posteridade o seu uso interior — e talvez iniciando uma nova etapa no uso do espaço litúrgico —, veio representar uma nova fase, dada a dimensão e visibilidade que alcançou o pró‑ prio edifício, que assim ganhou magnitude e monumen‑ talidade, com um túmulo de cerca de 14 m de diâmetro, quando o projecto inicial pouco passava dos 11 m. Ade‑ mais, parece ‑nos relevante a acentuação dicotómica do seu cromatismo, marcado pelo uso diferenciado dos materiais locais, quer dizer, do uso do branco da pedra calcárea e do cinzento ‑azulado característico do xisto.

A estrutura de «condenação» na área fronteira do edifí‑ cio tumular apresenta características singulares, bem visí‑ veis nos cortes em y 76.00 e em y 82.00 e que apontam para uma deliberada desmontagem parcial da fachada e a construção de uma estrutura compacta e sólida que selou com um propósito bem determinado o edifício funerário.

Corresponde a uma cunha de 2,50 m de comprimento e cerca de 0,80 m de altura junto da fachada e 0,10 m no ponto mais afastado da fachada. A condenação sobrepõe

a linha da fachada e está constituída por um embasa‑ mento de pedras de calcário e arenito. As pedras deste embasamento foram, com probabilidade, fincadas na vertical com argila e serviram para suportar as pedras de xisto que se dispuseram, seguramente, em sentido hori‑ zontal.

As pedras de arenito do embasamento da estrutura de condenação apresentam uma inclinação para nascente, o que terá ocasionado o afundamento do xisto. Este movi‑ mento pode ter resultado de fenómenos sísmicos, ocorri‑ dos posteriormente ao encerramento do edifício tumular.

Violação/uso do espaço envolvente

Em época histórica, foi aberta uma fossa de cerca de 2,60 m por 2 m, entre as coordenadas x 23.60 a 26.20 e y 84 a 86, que apesar de ter lacerado parcialmente o adro não provocou a destruição da fachada do edifício no extremo NE. A sedimentação que preenchia esta fossa, com cerca de 0,15 m, apenas continha um diminuto frag‑ mento de cerâmica, cujas características impedem uma precisão cronológica mais além da sua atribuição, duvi‑ dosa, à Época Romana, assim como não permitem uma explicação coerente para a abertura da fossa.

Integração

A cartografia arqueológica do território envolvente da Baía de Lagos e a análise da topografia histórica do con‑ junto habitacional e funerário de Alcalar (Parreira & Morán, 2008), mostra que ao longo de uns oito séculos, quase até finais do 3.º milénio a.n.e., Alcalar constitui o aglomerado populacional mais importante do Ocidente do Algarve, uma macro ‑aldeia que, ao longo do 3.º milé‑ nio a.n.e., consolidou a sua situação de centro de poder

num território habitado por diversas comunidades, dis‑ persas, em pequenos habitats nas margens da Ria de Alvor, no barrocal e nas vertentes meridionais da Serra de

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5.º CONGRESSO DO NEOLÍTICO PENINSULAR 539 O MONUMENTO 9 DE ALCALAR  ELENA MORÁN  P. 532-539

Monchique. Essa paisagem cultural, que se estendia pelo

hinterland da orla marítima, era marcada pela antiga ria

flandriana do Alvor, então um profundo braço ‑de ‑mar entalhado na orla costeira da Baía de Lagos.

O estudo geoarqueológico deste território tem eviden‑ ciado um processo histórico de transformação das for‑ mações económico ‑sociais, que autoriza fazer remontar ao 3.º milénio a.n.e. a formação prístina do estado neste extremo Sudoeste do espaço atlântico ‑mediterrânico. Embora numa posição periférica relativamente aos cen‑ tros de poder calcolíticos do Sul e Oeste peninsulares, as elites de Alcalar mantinham com eles relações políticas, promovendo ‑se socialmente através da segregação das áreas de vivenda e de armazenagem da produção, da monumentalização dos recintos do habitat, da ostenta‑ ção de objectos sumptuários e de armas e da manipula‑ ção de «produtos ideológicos», bem como da construção de templos funerários monumentais com dispositivos de sacralização e de interdição no espaço litúrgico.

1 Uniarq. E ‑mail: moran.elena@gmail.com

A G R A D E C I M E N T O S

À Direção Regional de Cultura do Algarve, entidade promotora das campanhas de trabalhos arqueológicos no monumento Alcalar 9, e em especial a Jair Gonçalves pelo tratamento vectorial dos desenhos de plantas. Ao Museu de Portimão, em particular ao seu Director, José Gameiro, e à conservadora ‑restauradora Andreia Machado, pela integração em depósito e conservação/restauro dos materiais recolhidos. À Associação Arqueológica do Algarve, em especial a Jenny Compton, Michèlle Carron e Júlia Thomas, pelo auxílio desinteressado nos trabalhos arqueológicos de campo. A Teresa Ferreira, pelo estudo do material antropológico.

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Imagem

Fig. 1  Vista sobre o monumento Alcalar 9, com Alcalar 7 e Povoado ao  fundo.
Fig. 2  Planta do monumento Alcalar 9.
Fig. 3  Pormenor do corte em y 76, na estrutura de fecho do edifício.

Referências

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