• Nenhum resultado encontrado

Amor e sua relação com a generosidade : estudo com adolescentes sob a ótica da moralidade

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Amor e sua relação com a generosidade : estudo com adolescentes sob a ótica da moralidade"

Copied!
170
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

AMOR E SUA RELAÇÃO COM A GENEROSIDADE: ESTUDO COM

ADOLESCENTES SOB A ÓTICA DA MORALIDADE

Ariadne Dettmann Alves

VITÓRIA

2016

(2)

ARIADNE DETTMANN ALVES

AMOR E SUA RELAÇÃO COM A GENEROSIDADE: ESTUDO COM

ADOLESCENTES SOB A ÓTICA DA MORALIDADE

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Psicologia, sob a orientação da Profª. Drª. Heloisa Moulin de Alencar e coorientação do Prof. Dr. Antonio Carlos Ortega.

UFES

(3)
(4)

AMOR E SUA RELAÇÃO COM A GENEROSIDADE: ESTUDO COM ADOLESCENTES SOB A ÓTICA DA MORALIDADE

ARIADNE DETTMANN ALVES

Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Psicologia.

Aprovada em 17 de agosto de 2016, por:

_______________________________________________________ Profª. Drª. Heloisa Moulin de Alencar - Orientadora, UFES

_______________________________________________________ Profª. Drª. Luciana Souza Borges - UVV

_______________________________________________________ Profª. Drª. Simone Chabudee Pylro- UVV

_______________________________________________________ Profª. Drª. Cláudia Patrocinio Pedroza Canal - UFES

_______________________________________________________ Prof. Dr. Sávio Silveira de Queiroz – UFES

(5)

AGRADECIMENTOS

A Deus, pois sem Ele nada seria possível!

À minha família, em especial aos meus pais, por todo o apoio, incentivo e compreensão; e aos meus irmãos por me fazerem acreditar que eu conseguiria. Obrigada por estarem ao meu lado!

Ao meu esposo Fernando, por ter sido um verdadeiro companheiro, me dando apoio em todos os momentos, estando ao meu lado quando precisava de companhia e compreendendo quando estive ausente.

Aos amigos que sempre me incentivaram e me deram forças para seguir em frente. Agradeço em especial a Ana Claudia Borgo, Aline Bernardes e Wilka França que no momento de dúvidas me incentivaram a tentar a seleção do doutorado, e me deram forças nos momentos de dificuldade. Agradeço também a Mariana Costa, que com sua delicadeza me fez acreditar que eu conseguiria chegar ao final, e a Daniele Garioli, que sempre, sempre mesmo, esteve ao meu lado compartilhando alegrias e angústias. Obrigada por todo o carinho!

Aos meus alunos, pela torcida, pela força e por compreenderem os momentos de “atrapalhadas”!

À minha orientadora Heloisa Moulin de Alencar e ao meu coorientador Antonio Carlos Ortega. Obrigada por confiarem em mim e acreditarem na proposta da pesquisa. Obrigada por toda a atenção e carinho. Com vocês aprendi muito, conhecimento que levarei por toda a vida profissional e pessoal!

Aos colegas do Laboratório de Psicologia da Moralidade (Lapsim) pelas discussões teóricas e momentos de descontração. Agradeço em especial à Jussara Abílio Galvão e à Tais Peres Fonseca, que me auxiliaram diretamente na pesquisa, contribuindo principalmente na coleta de dados, categorização e escrita de artigos.

A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Psicologia (PPGP) pelas contribuições teóricas e por todo incentivo dado. Agradeço em especial ao Professor

(6)

Doutor Sávio Silveira de Queiroz e à Professora Doutora Claudia Broetto Rossetti pelo apoio e pelas valiosas contribuições no Exame de Qualificação.

À Doutora Liana Gama do Vale pela colaboração ainda durante minha graduação, além das importantes contribuições no Exame de Qualificação. Seus trabalhos foram inspiradores!

À Maria Lúcia Ribeiro Fajóli e ao Arin Bernardes Filho (PPGP), que sempre estiveram dispostos a ajudar nos assuntos acadêmicos, mesmo quando eu perguntava a mesma coisa inúmeras vezes, “só para ter certeza”!

Aos participantes da pesquisa, à direção, à coordenação pedagógica e aos professores da escola onde parte da coleta de dados foi realizada. Agradeço a disponibilidade e a confiança na seriedade desta pesquisa.

E a todos que de alguma maneira contribuíram para a realização deste trabalho. Obrigada!

(7)

SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ... 19 2. ESTUDO DA MORALIDADE ... 22 3. VIRTUDES MORAIS ... 31 3.1 Amor ... 33 3.2 Generosidade ... 47

3.3 Relação entre Amor e Generosidade ... 51

4. OBJETIVOS ... 54

4.1 Estudo 1: Conceito de amor ... 55

4.2 Estudo 2: Amor: generosidade x justiça para consigo ... 55

4.3 Estudo 3: Amor: generosidade e vínculos. ... 56

5. MÉTODO ... 58

5.1 Participantes ... 58

5.2 Instrumento ... 60

5.3 Procedimentos ... 63

5.4 Tratamento dos dados... 64

6. RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 66

6.1 ESTUDO 1 – Conceito de amor ... 66

6.1.1 Exemplos e concepção de amor ... 66

6.1.2 Possibilidade de amar adolescente do sexo oposto e mesmo sexo ... 74

6.1.3 Possibilidade de amar amigo, desconhecido e inimigo ... 81

6.2 ESTUDO 2 – Amor: generosidade X justiça para consigo ... 92

6.2.1 Escolha entre generosidade ou justiça para consigo ... 92

6.2.2 Presença do amor na generosidade ou na justiça para consigo ... 97

6.2.3 Escolha entre generosidade ou justiça para consigo para presença e ausência do amor ... 102

(8)

6.3 ESTUDO 3 – Amor: generosidade e vínculos ... 107

6.3.1 Possibilidade de ação generosa ... 107

6.3.2 Presença ou não do amor na generosidade ou na sua ausência ... 115

6.3.3 Escolha ou não da ação generosa na presença e ausência do amor ... 125

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 137

8. REFERÊNCIAS ... 145

APÊNDICES IMPRESSOS ... 155

Apêndice A. Carta de aprovação do Comitê de Ética em pesquisa ... 155

Apêndice B. Termo de Consentimento para a Instituição ... 159

Apêndice C. Termo de Consentimento para os responsáveis dos participantes ... 162

Apêndice D. Termo de Assentimento livre e esclarecido para participação em pesquisa ... 165

APENDICES DIGITALIZADOS ... 168 Apêndice DA. Dissertação “A gênese da concepção de amor: um estudo sob a ótica da moralidade”

Apêndice DB. Artigo “Amor e moralidade um estudo com participantes de 5 a 70 anos”.

Apêndice DC. Artigo “Moralidade e concepção de amor em crianças de 6 e 9 anos”. Apêndice DD. Artigo “Exemplos sobre a importância do amor: estudo com crianças no contexto da moralidade”.

Apêndice DE. Artigo “Possibilidade de amar menino e menina: um estudo sob a ótica de crianças”.

Apêndice DF. Artigo “O juízo de crianças sobre a possibilidade de amar um amigo, um inimigo e um desconhecido”.

Apêndice DG. Artigo “Estudo exploratório acerca da concepção do amor e possibilidade de amar para adolescentes”.

Apêndice DH. Protocolos das entrevistas.

Apêndice DI. Panorama detalhado e resumido por questão e justificativa. Apêndice DJ. Categorias de análise da tese

(9)

Apêndice DK. Tabelas dos resultados da pesquisa. Apêndice DL. Resumo dos resultados e discussão da tese Apêndice DM. Tese.

(10)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Distribuição dos participantes de acordo com a idade e o sexo. 58

Tabela 2. Exemplos e concepção de amor. 67

Tabela 3. Justificativas para os exemplos e concepção de amor. 72

Tabela 4. Justificativa sobre amar ou não adolescente do sexo oposto. 74

Tabela 5. Justificativa sobre amar ou não adolescente do mesmo sexo. 78

Tabela 6. Justificativa sobre amar ou não um amigo. 81

Tabela 7. Justificativa sobre amar ou não um desconhecido. 84

Tabela 8. Justificativa sobre amar ou não um inimigo. 87

Tabela 9. Justificativas para a ação de não ajudar. 93

Tabela 10. Justificativas para a ação de ajudar. 95

Tabela 11. Justificativas sobre a possibilidade ou não de amar, mencionadas pelos adolescentes que optaram por não ajudar.

100

Tabela 12. Justificativas para a ação de ajudar ou não, na ausência do amor. 103

(11)

Tabela 14. Justificativas para a ação de ajudar o desconhecido. 110

Tabela 15. Justificativas para a ação de ajudar o inimigo. 112

Tabela 16. Justificativas sobre a possibilidade ou não de amar, na situação de amizade.

116

Tabela 17. Justificativas sobre a possibilidade ou não de amar, na situação de desconhecidos.

118

Tabela 18. Justificativas sobre a possibilidade ou não de amar, mencionadas pelos adolescentes que optaram por ajudar um inimigo.

121

Tabela 19. Justificativas para a ação de ajudar ou não, na ausência do amor, sendo um amigo.

126

Tabela 20. Justificativas para a ação de ajudar ou não, na presença do amor, sendo um desconhecido.

131

Tabela 21. Justificativas para a ação de ajudar ou não, na presença do amor, sendo um inimigo.

(12)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Quadro demonstrativo do instrumento referente ao Estudo 1 61

Figura 2. Quadro demonstrativo do instrumento referente ao Estudo 2. 61

Figura 3. Quadro demonstrativo do instrumento referente ao Estudo 3. 62

Figura 4. Comparação entre as respostas sobre a ação escolhida e a presença

ou não do amor em função da idade (dados apresentados em número de respostas).

98

Figura 5. Comparação entre as respostas sobre a ação escolhida e a presença

ou não do amor na situação de inimizade.

(13)

LISTA DE SIGLAS

CCHN – Centro de Ciências Humanas e Naturais CEP – Comitê de Ética em Pesquisa

Lilacs – Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde Pepsic – Periódicos Eletrônicos de Psicologia

PPGP – Programa de Pós-Graduação em Psicologia Scielo – Scientific Eletronic Library On Line UFES – Universidade Federal do Espírito Santo

(14)

Alves, A. D. (2016). Amor e sua relação com a generosidade: estudo com adolescentes sob a ótica da moralidade. Tese de Doutorado não publicada. Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória- ES. 168 p.

RESUMO

Nosso objetivo foi investigar os juízos de adolescentes no que diz respeito ao conceito de amor e sua relação com a generosidade, em uma perspectiva psicogenética. Entrevistamos individualmente 40 adolescentes com 12 e 15 anos, igualmente divididos quanto à idade e ao sexo, a partir de um roteiro semiestruturado, com base no método clínico. Os dados foram apresentados em três Estudos. No Estudo 1 verificamos que a concepção de amor tende a ser menos focada na própria ação para ser direcionada no outro. Em relação a possibilidade de amar outra pessoa, não houve diferença relevante quanto ao sexo da pessoa a ser amada; no entanto, verificamos a influência do vínculo, pois foi mais frequente amar um amigo do que um inimigo ou desconhecido. No

Estudo 2, a maioria dos adolescentes optou por não ajudar o outro e fazer sua obrigação

escolar, devido à necessidade do cumprimento da referida obrigação. Mais da metade dos participantes, principalmente os de 12 anos, consideraram a presença do amor havendo ou não a generosidade. Ainda, quando os adolescentes foram questionados se a

ajuda ocorreria na presença ou na ausência do amor, a relação entre o amor e a generosidade foi mais acentuada. Esta relação entre as duas virtudes e a influência do vínculo também foi encontrada no Estudo 3, uma vez que a frequência dos adolescentes que optou por ajudar um amigo e um desconhecido foi maior do que em relação a um inimigo; a maioria dos participantes afirmou a presença do amor ao amigo, e poucos afirmaram em relação ao desconhecido e ao inimigo; quando foram questionados se a

ajuda ocorreria na presença ou na ausência do amor, a generosidade foi mais acentuada na presença do amor, havendo diferença em relação ao vínculo. Verificamos, portanto, a relação entre a presença ou ausência do amor na possibilidade de generosidade além da influência do vínculo. Tendo em vista a relação encontrada em nosso estudo entre o amor e a generosidade e sua importância no desenvolvimento moral, sugerimos a inclusão da relação entre essas virtudes em propostas de Educação em Valores Morais. Por fim, apesar de a virtude do amor, e sua relação com a generosidade, ser pouco

(15)

estudada na Psicologia da Moralidade reconhecemos sua relevância e esperamos que o nosso trabalho possa contribuir para o desenvolvimento de novas pesquisas sobre o tema e práticas de intervenção.

(16)

Alves, A. D. (2016). Love and its relationship with generosity: study with adolescents from the perspective of morality. Doctoral Thesis not published. Postgraduate Program in Psychology, Federal University of Espírito Santo, Vitória ES. 168 p.

ABSTRACT

Our objective was to investigate adolescent judgments concerning the concept of love and its relationship with generosity, in a psychogenetic perspective. We have interviewed individually 40 adolescents aged 12 and 15, also split on the age and sex, from a semi-structured script, based on the clinical method. The data were presented in three studies. In Study 1 we have found that the conception of love tends to be less focused on the action itself to be directed at the other. Regarding the possibility of

loving another person, there was no significant difference in the sex of the person to be loved; however, we have seen the influence of the bond, for it was more frequent loving a friend than an enemy or an unknown person. In Study 2, most teenagers chose not to help each other and do their school obligation, because of the need to comply with that obligation. Over half of the participants, especially those aged 12, considered the presence of love with or without generosity. Yet, when teenagers were asked whether the aid would take place in the presence or absence of love, the relationship between love and generosity was more pronounced. This relationship between the two virtues and the influence of the link was also found in Study 3, since the frequency of adolescents who chose to help a friend and a stranger was higher than in relation to an enemy; most participants stated the presence of love to a friend, and a few stated it regarding the unknown people and the enemy; when they were asked whether the aid would take place in the presence or absence of love, generosity was more pronounced in the presence of love, with some differences in relation to the bond. We found, however, the relationship between the presence or absence of love in the possibility of generosity beyond the influence of the bond. Given the relationship found in our study between love and generosity and its importance in moral development, we recommend including the relationship among these virtues in Education in Moral Values proposals. Finally, although the virtue of love, and its relationship with generosity being little studied in the

(17)

Psychology of Morality, we recognize its importance and we hope that our work will contribute to the development of new research on the subject and intervention practices.

(18)

Alves, A. D. (2016). L'amour et sa relation avec la générosité: étudier avec les adolescents du point de vue de la morale. Thèse de doctorat non publiée. Programme d’Études Supérieures en Psychologie, Université Fédérale de Espírito Santo, Vitória ES. 168 p.

RÉSUMÉ

Our objective was to investigate adolescent judgments concerning the concept of love and its relationship with generosity, in a psychogenetic perspective. We have interviewed individually 40 adolescents aged 12 and 15, also split on the age and sex,

from a semi-structured script, based on the clinical method. The data were presented in three studies. In Study 1 we have found that the conception of love tends to be less focused on the action itself to be directed at the other. Regarding the possibility of loving another person, there was no significant difference in the sex of the person to be loved; however, we have seen the influence of the bond, for it was more frequent loving a friend than an enemy or an unknown person. In Study 2, most teenagers chose not to help each other and do their school obligation, because of the need to comply with that obligation. Over half of the participants, especially those aged 12, considered the presence of love with or without generosity. Yet, when teenagers were asked whether the aid would take place in the presence or absence of love, the relationship between love and generosity was more pronounced. This relationship between the two virtues and the influence of the link was also found in Study 3, since the frequency of adolescents who chose to help a friend and a stranger was higher than in relation to an enemy; most participants stated the presence of love to a friend, and a few stated it regarding the unknown people and the enemy; when they were asked whether the aid would take place in the presence or absence of love, generosity was more pronounced in the presence of love, with some differences in relation to the bond. We found, however, the relationship between the presence or absence of love in the possibility of generosity beyond the influence of the bond. Given the relationship found in our study between love and generosity and its importance in moral development, we recommend including the relationship among these virtues in Education in Moral Values proposals. Finally, although the virtue of love, and its relationship with generosity being little studied in the

(19)

Psychology of Morality, we recognize its importance and we hope that our work will contribute to the development of new research on the subject and intervention practices.

(20)

“As pessoas que têm amor geralmente praticam o bem” (Marcos, 15 anos, participante da pesquisa – nome fictício)

(21)

1. INTRODUÇÃO

Eu sempre vejo que esse assunto ninguém entende, eu vejo que ninguém sabe o que é o amor, a gente tem o conceito que é tipo gostar de alguém, de uma pessoa ou gostar de uma coisa, mas eu nunca ouvi falar de um conceito de amor (Mauricio, 15 anos, participante da pesquisa – nome fictício).

Nas primeiras linhas de nossa tese pedimos licença para relatarmos as respostas para as diversas perguntas que nos foram feitas durante o doutorado. A primeira delas “o que vocês estudam?”, cuja resposta é a de que estudamos sobre o conceito de amor e sua relação com a moralidade. Durante o mestrado, nos dedicamos a analisar o conceito de amor em crianças (Alves, 2011; Alves, Alencar & Ortega, 2010, 2012, 2013, 2014a, 2014b1). Na presente tese nosso objetivo é investigar o conceito de amor para adolescentes e sua relação com a generosidade.

Outra pergunta que nos foi proposta: “Sobre o amor?! Por que estudar o amor? ” Para a resposta, apropriamo-nos das palavras de Comte-Sponville (2011) na afirmação de que “não só o amor é o tema mais interessante, para a maioria de nós, mas qualquer outro tema só tem interesse à medida do amor que temos por ele” (p. 11). Assim, mesmo quando a pessoa diz que não se preocupa com o amor, apenas com dinheiro, demonstra que ele ama o dinheiro. Ou ainda que a pessoa afirme “‘A mim, o que mais interessa não é o amor, não é o dinheiro, é minha profissão! Eu responderia: ‘Isso prova que você ama sua profissão! ’” (p. 11). Nesse sentido, tudo que nos dediquemos a fazer, fazemos de alguma forma por amor.

Além disso, o nosso trabalho versa sobre o amor na área da Psicologia da Moralidade. E conforme detalharemos posteriormente, o amor contribui para o início do desenvolvimento moral, a partir do amor que temos às figuras de autoridade (Piaget, 1932/1994). Este amor pode evoluir até alcançar níveis mais próximos de um ideal, no qual amaríamos a todos (amigos, inimigos, desconhecidos) indiscriminadamente,

1 A dissertação de mestrado e os artigos decorrentes estão disponibilizados, em CD, no Apêndice Digitalizado DA, DB, DC, DD, DE e DF.

(22)

buscando o bem do outro. Chegando a este patamar, não precisaríamos mais de regras para conduzir nossas ações: faríamos por amor, e não por coação (Comte-Sponville, 1999, 2011).

Com isso, dada a relevância do tema, nos foi questionado se já não existem muitos estudos sobre o amor. E há sim muitos trabalhos, mas não na área da Psicologia da Moralidade. Em nossa revisão de literatura verificamos que a maioria dos trabalhos encontrados se refere a outras áreas como Filosofia e Letras, sendo que quando observamos na Psicologia verificamos estudos especialmente na área da psicanálise, e com temas sobre relacionamento conjugal e sexualidade (dados também encontrados em Schlösser & Camargo, 2014). Ainda, quando analisamos os estudos em nossa área encontramos principalmente pesquisas sobre justiça e virtudes de uma forma geral.

Então, se não incluímos nosso trabalho na categoria de relacionamento conjugal e sexualidade, o que estamos chamando de amor? Em nossa pesquisa, buscamos a relação do amor com a moralidade considerando o próprio conceito que os adolescentes possuem, a partir de suas respostas e justificativas. No estudo com crianças (Alves, Alencar & Ortega, 2014a) analisamos que a concepção de amor foi ampla, incluiu desde o amor a pessoas próximas (familiares e amigos) até ações que beneficiam outros. Nesse sentido, será que as respostas dos adolescentes se aproximam às das crianças? Discutiremos com base nos dados de nossa pesquisa.

Ainda, continuando as indagações que nos foram realizadas, temos: “o amor relaciona-se à generosidade?”. Em nosso estudo com crianças (Alves, 2011; Alves, Alencar & Ortega, 2012, 2013, 2014a, 2014b) verificamos que as crianças incluíam ações que beneficiavam o outro como exemplo de amor. A partir disso, nos indagamos a respeito dessa relação. Buscando na literatura, Comte-Sponville (1999, 2011) afirma que quando não amamos outrem, podemos realizar uma ação bondosa devido à virtude e à generosidade. Assim, investigar esta possível relação é um dos objetivos de nosso estudo.

Por fim, devemos nos indagar em relação à relevância social deste estudo. Muito se discute se estamos vivendo uma carência de sentido, uma ‘cultura do tédio’, e a exaltação de uma ‘cultura da vaidade’, onde se busca ser um vencedor (La Taille,

(23)

2009b, p. 201) e o que pode ser feito a partir disto. Afirmamos a importância da família, como também da escola, na formação moral das crianças e adolescentes, podendo atuar no sentido contrário à exaltação dessas culturas (La Taille, 2009b). Com isso, esperamos que as discussões realizadas neste trabalho possam contribuir na elaboração de propostas de Educação em Valores Morais, propiciando o desenvolvimento de sujeitos autônomos (Piaget, 1930/1996), contribuindo para o sentido de valores de cada indivíduo e sua comunidade (Puig, 1998a). Para isso é necessário não apenas momentos de reflexão moral dentro das disciplinas escolares, mas que todo o convívio escolar esteja propício a influenciar na educação do juízo moral.

Vejamos agora o caminho que percorremos neste trabalho. No capítulo 2, Estudo da Moralidade, apresentaremos nosso referencial teórico partindo de Jean Piaget, articulando com Lawrence Kohlberg e Carol Gilligan, e ainda ressaltando a discussão sobre moral e ética com base em La Taille. Por sua vez, no capítulo seguinte (3 – Virtudes Morais), discutimos a relevância das virtudes no campo da moral, com ênfase no amor, na generosidade e na relação entre essas virtudes. Apresentamos nossos objetivos no capítulo 4, que embasaram nosso método (capítulo 5). Em seguida, capítulo 6, detalhamos os resultados e discussões realizadas, para então apresentarmos nossas considerações finais (capítulo 7).

(24)

2. ESTUDO DA MORALIDADE

Porque quando uma pessoa é boa, ela tem valores e ética, uma forma de ética e de moral. O próximo é uma das pessoas que ele precisa ajudar, ele não tem obrigação, mas como ele teme essa moral e essa ética, ele vai lá e vai ajudar. Porque ele acha que é a forma de melhorar a sociedade. Então ele usaria esses princípios para conseguir ou tentar ajudar a pessoa (Mateus, 15 anos, participante da pesquisa – nome fictício).

Neste capítulo evidenciaremos os principais fundamentos teóricos relevantes para nosso trabalho. Inicialmente, destacamos algumas contribuições do filósofo Kant (1785/1980), para posteriormente, fazermos considerações sobre reflexões da Psicologia da Moralidade, de acordo com o proposto por Piaget (1932/1994), Kohlberg (1992), Gilligan (1982) e em seguida, apresentarmos a discussão sobre a moral e a ética realizada por La Taille (2006b).

Destacamos que Kant (1724-1804) exerceu grande influência para a Psicologia da Moralidade. Segundo este autor, a moral é composta por imperativos categóricos, seguindo o fundamento “age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal” (1785/1980, p. 129), ou seja, devemos agir baseado em princípios universais, e não de acordo com regras circunstanciais.

Seguindo Freitas (2002), podemos fazer um paralelo desse autor com Piaget (1932/1994). Para Kant (1785/1980) todo ser humano é capaz de agir eticamente. Considerando Piaget (1932/1994), todo ser humano pode tornar-se capaz de ação moral, graças às trocas que estabelece com o meio. Este último autor desenvolve suas reflexões na obra O juízo moral na criança, publicada em 1932, que pode ser entendida como a primeira tentativa de submeter suas ideias sobre a moral a uma verificação empírica. Assim, o objetivo de Piaget (1932/1994) foi compreender a moralidade humana por meio do estudo da moralidade infantil, pois “a moral infantil esclarece, de certo modo, a do adulto. Portanto, nada é mais útil para formar os homens do que ensinar a conhecer as leis dessa formação” (p. 22).

(25)

Assim, por meio de jogos de regras e histórias com conteúdos morais, Piaget (1932/1994) investiga o desenvolvimento moral que é caracterizado pela evolução de uma tendência moral heterônoma para uma autônoma, sendo que o tipo de respeito que o sujeito estabelece para com os demais é o que fará a diferença. Segundo esse autor, até os quatro anos, aproximadamente, apesar de inserida em um universo de regras sociais, a criança não as sente como obrigatórias, desta forma não há normas propriamente ditas. Estas não são ainda associadas a valores como o bem e o mal, o certo e o errado. A este período, Piaget (1932/1994) denominou de anomia.

O ingresso no universo moral só ocorre com o desenvolvimento heterônomo. Piaget (1932/1994) considera esta fase como ‘realismo moral’, uma vez que a criança tende a pensar as regras como exteriores ao indivíduo, aceitando como correta toda regra imposta por uma figura de autoridade, não a compreendendo. Respeita as regras como imutáveis, tendendo a interpretá-las ao pé da letra. Além disso, julga a gravidade de uma falta pelo resultado do ato ou pelo seu caráter material e não em função da intenção do agente, ou seja, privilegia as consequências da ação, sem levar em conta a intenção que a motivou. O realismo moral é produzido pela conjunção do egocentrismo com a coação social. Nessa fase, predomina o respeito unilateral, a criança respeita os pais seguindo o binômio medo/amor. La Taille (2006b) destaca que o medo está relacionado a possíveis punições e a retirada de amor por partes dos pais (ou outra figura de autoridade) e por consequência a desproteção; o amor relaciona-se ao apego e à admiração a estas pessoas. Desta forma “é justamente pelo fato de os pais inspirarem, ao mesmo tempo, medo e amor, que eles inspiram respeito” (p. 109, grifos do autor). Sendo assim, a entrada no mundo da moral se dá por coação, desenvolvendo o sentimento de obrigatoriedade (Piaget, 1932/1994). Freitas (2002) destaca que, apesar de não ser suficiente, o respeito unilateral é condição necessária para a construção de outras formas de respeito.

Neste sentido, com a interação com outras crianças, pode-se desenvolver as relações de cooperação e de respeito mútuo. A criança pode, por conseguinte, por volta dos 10 anos, apresentar algumas características de autonomia, possibilitando-a agir por princípios de reciprocidade e igualdade. Uma das principais características desta fase é

(26)

compreender e interpretar as regras, permitindo-a fazer suas próprias avaliações morais, levando em conta a intenção do ato e não a sua consequência (Piaget, 1932/1994).

Vale ressaltar que nenhuma pessoa é totalmente heterônoma ou autônoma, é uma tendência na qual se pensa a moral, passando de um respeito unilateral (dever de obedecer ao outro por medo e amor) ao respeito mútuo, o que só será possível por meio das relações sociais vivenciadas (Piaget, 1932/1994). Desta forma, é o processo de socialização que pode tornar o sujeito autônomo e, portanto, capaz de seguir determinadas regras, não por medo de infringi-las, mas pela crença de que será o melhor para si e para a sociedade.

Não obstante, dentro de sua investigação, Piaget (1932/1994) se dedicou ao estudo da justiça para a compreensão do juízo moral da criança, afirmando ser a mais racional de todas as noções morais. A partir dos dados que encontrou, estabelece três grandes períodos. No primeiro, até mais ou menos os sete anos de idade, a justiça está subordinada à autoridade adulta, assim, a criança considera que é justo o que estiver de acordo com a autoridade. Estando em uma situação de escolha entre a obediência e a igualdade, optará em favor da obediência, deixando clara a primazia da autoridade sobre a justiça. Se a situação não envolver a autoridade, ela escolherá a igualdade. Do mesmo modo, ao optar por uma sanção que seja justa, ela escolherá a sanção expiatória, cujo conteúdo não possui relação com a natureza do delito.

Entre oito e onze anos, aproximadamente, desenvolve-se o segundo período, no qual a igualdade se sobrepõe à autoridade. Assim, o que é justo não depende da autoridade, mas relaciona-se com a igualdade. Além disso, a criança considera justa apenas a sanção por reciprocidade, na qual relaciona a natureza da falta e o conteúdo da punição e ainda uma proporcionalidade entre a gravidade daquela e o rigor desta. Finalmente, o terceiro período, que se inicia por volta dos onze anos, é caracterizado pelo sentimento de equidade, permitindo à criança analisar a igualdade, levando em conta as diferenças. Nas palavras de Piaget (1932/1994) “a criança não concebe mais os direitos iguais dos indivíduos, senão relativamente à situação particular de cada um” (p. 237), logo, não compreende a lei como igual a todos, mas reflete sobre as circunstâncias de cada pessoa. Sobre esse último período, o autor destaca que

(27)

Na moral, a reciprocidade implica um aperfeiçoamento dos comportamentos em sua orientação íntima, fazendo-os tender por etapas até a própria universalidade. Sem sair da reciprocidade, a generosidade – esta característica do nosso terceiro estágio – alia-se à simples justiça: deste modo, entre as formas refinadas da justiça, tais como a equidade e

o amor propriamente dito [grifos nossos], não há mais oposição real

(Piaget, 1932/1994, p. 242).

Acerca da relevância da justiça para o desenvolvimento moral, destacamos Kohlberg (1992) que elege essa virtude como sendo o eixo do universo moral (Menin, 1996). No entanto, para Kohlberg a busca pela autonomia se desenvolve em três níveis que são divididos em seis estágios. Vejamos os estágios propostos por este autor.

O primeiro é o nível pré-convencional, no qual o indivíduo não compreende as normas e regras de seu grupo. Este nível é dividido em dois estágios: no estágio 1 a moral relaciona-se a obediência à autoridade, considerando-se os fatos pelas consequências e não pela intenção, assim a obediência às normas sociais ocorre por medo do castigo que pode vir a receber; no estágio 2 as ações são definidas como moralmente certas ou erradas com base em interesses próprios, destaca-se o hedonismo, nesse sentido, as ações são escolhidas com base na satisfação de necessidades e interesses próprios.

Por sua vez, no nível convencional há a manutenção das regras sociais, sendo considerada correta a ação moral que esteja em conformidade com as regras estabelecidas pela autoridade ou instituições reconhecidas pela sociedade. Engloba o estágio 3 e estágio 4. No estágio 3, procura-se realizar ações de acordo com o que as pessoas esperam, com o objetivo de ser um bom filho, amigo, etc. Já no estágio 4, há a perspectiva de manutenção da ordem social e com isso colaborar com o funcionamento do sistema, seguindo as ordens do grupo, da instituição e da sociedade.

Por fim, há o nível pós-convencional, que compreende os estágios 5 e 6. Neste nível, as leis e os contratos são válidos se estiverem de acordo com os princípios morais universais, pautados pela reciprocidade e pela igualdade. Especificando, no estágio 5 a orientação está voltada para o contrato social-democrático, assim há a compreensão de

(28)

que o contrato é necessário para a preservação da ordem social, no entanto é possível modificá-lo com base nos valores universais como a vida e a liberdade. Por último, o estágio 6 é o mais evoluído, no qual as ações são regidas pelos princípios éticos universais, transcendendo os limites comunitários e sociais.

Assim, vemos que para Kohlberg e também para Piaget a justiça tem lugar de destaque no desenvolvimento moral, com uma diferença entre eles: “enquanto Piaget elegeu a justiça como objeto de pesquisa, mas sem afirmar que ela é a virtude maior da moral, Kohlberg fechou a questão: a justiça é a virtude moral por excelência, e não apenas uma entre outras” (La Taille, 2006b, p. 24, grifos do autor).

Devemos mencionar também a crítica feita por Gilligan (1982). Segundo esta autora, os estudos de Piaget e Kohlberg foram realizados com base na moral masculina e com isso foi dado destaque à virtude justiça, excluindo o pensamento feminino. Para a autora há duas orientações morais possíveis: a ética da justiça, relacionada aos juízos masculinos, considerando o sujeito submetido a deveres que decorre do direito do outro; e a ética do cuidado, presente nos juízos de mulheres, que se caracteriza por levar em consideração as necessidades específicas da pessoa, sua singularidade. Assim, não haveria hierarquia entre o desenvolvimento moral de homens e mulheres, apenas juízos diferentes. Acerca da ética do cuidado, podemos sugerir a relação com a generosidade (La Taille, 2001a, Vale, 2012). Discutiremos posteriormente a respeito das virtudes, mas é relevante destacar a importância das virtudes para o desenvolvimento moral.

Para complementar essa discussão sobre o desenvolvimento moral, será necessário diferenciarmos moral e ética. Comumente estes termos são tratados como sinônimos para designar regras de condutas obrigatórias. No entanto, vamos abordar uma possível distinção entre os termos, discutida por La Taille (2006b) com base em autores como Comte-Sponville e Ferry (1999), Ricoeur (1990) e Tugendhat (1996).

La Taille (2006b) afirma que a moral se refere às regras obrigatórias, com a finalidade de garantir a harmonia do convívio social. Relaciona-se a deveres, respondendo a pergunta ‘como devo agir?’. Por sua vez, a ética remete à busca de “uma vida que ‘vale a pena ser vivida’” (p. 30), elegendo outra pergunta ‘que vida quero viver?’, remetendo a projetos de vida. Assim, o plano ético engloba o moral, pois saber

(29)

‘como devo agir’ depende de ‘que vida quero viver’, ou seja, a dimensão afetiva da ação moral tem suas origens nas opções éticas dos indivíduos.

Para a compreensão da moralidade faz-se necessário “verificar se as motivações que levam um indivíduo a dar respostas à pergunta moral ‘como devo agir?’ não seriam, em parte, as mesmas que o levam a responder à outra: ‘que vida quero viver?’” (La Taille, 2006b, p. 25). Em outras palavras, La Taille (2006b) delimita que os comportamentos morais e o desenvolvimento moral serão mais bem compreendidos na medida em que se conheçam quais são os preceitos éticos assumidos pelas pessoas.

Assim, analisando o plano moral, La Taille (2006b) ressalta que a dimensão intelectual é condição necessária às ações reconhecidas como morais. Esse “saber fazer” está relacionado ao conhecimento das regras e dos princípios, além da consciência de quais são os nossos valores, sendo estes “o resultado de um investimento afetivo” (p. 74). Por conseguinte, para que este “saber fazer moral” se torne ação, é necessário o “querer fazer moral”, ou seja, a dimensão afetiva, a vontade de agir e a intenção com a qual se age.

Esta relação entre o “querer fazer” e o “saber fazer” está de acordo com Piaget (1962/2014), uma vez que ele afirma que a afetividade está relacionada com a cognição no que diz respeito ao desenvolvimento da criança. Nas palavras do autor

a afetividade desempenharia, então, o papel de uma fonte energética, da qual dependeria o funcionamento da inteligência, mas não suas estruturas; assim como o funcionamento de um automóvel depende do combustível, que aciona o motor, mas não modifica a estrutura da máquina (p. 43).

Nesse sentido, o afeto é condição necessária na constituição da inteligência (apesar de não ser suficiente) uma vez que permite o interesse, a necessidade e a motivação, que contribuem para a construção das estruturas cognitivas, ou seja, a afetividade pode acelerar ou retardar a formação destas estruturas.

(30)

Sendo assim, reconhecendo que os aspectos cognitivos não são suficientes para a ação moral, La Taille (2006b) evidencia seis sentimentos que inspiram um ‘querer agir moral’: medo, amor, confiança, simpatia, indignação e culpa; afirmando que o medo e o amor são indissociáveis para o sentimento de obrigatoriedade presente na ação moral. Com base em Piaget (1932/1994), La Taille (2006b) se refere ao medo das punições que a criança pode sofrer, ou medo pelo fato de o adulto ser maior e mais forte, além do medo da possível perda do amor pelo adulto. O amor, por sua vez, estaria relacionado ao apego e a admiração natural que a criança tem pelos pais. A relação entre medo e amor inspiraria o respeito, sendo “uma primeira forma de respeito, intimamente relacionada ao despertar do senso moral, ao despertar desse querer singular que é o dever” (La Taille, 2006b, p. 109).

Assim, além da tomada de consciência do dever, a formação de valores morais ou éticos depende de uma motivação interna para a ação: os sentimentos (Tognetta & Vinha, 2009). Estes apontam para o que é valorizado por nós, aquilo que há um investimento afetivo. Podemos valorizar a justiça, a generosidade, a honestidade, ou seja, valores morais. Mas, também, podemos enfatizar o sucesso, a beleza ou a riqueza, que correspondem a valores não morais.

Quanto a isso, La Taille (2009b) discute estarmos vivendo uma ‘cultura do tédio’, uma carência de sentido, um tédio existencial, no qual há busca por constantes prazeres sendo o objetivo primordial o divertimento. Ainda há exaltação da ‘cultura da vaidade’, na qual há a busca em ser o ‘vencedor’ e uma vergonha em ser considerado ‘perdedor’, ainda neste contexto o outro é invisível, sendo que “cada um fica centrado em seu pequeno ‘universo particular’, despreocupado ou inconsciente da presença de outrem e de seus anseios” (La Taille, 2009b, p. 201). Frente a isso, a educação deve contribuir com uma ‘cultura do sentido’ e do ‘respeito de si’, cultivando a verdade como valor, a memória, incentivando a cultura e as virtudes, uma cultura na qual o valor moral ocupe lugar central nas representações de si. Nesse sentido, “uma vez que a ação moral depende de dimensões intelectuais e afetivas, ambas devem ser trabalhadas pela educação, seja ela dada pelos pais, seja pelos professores” (La Taille, 2009b, p. 224). Assim, a família tem papel importante na formação moral das crianças e adolescentes. Mas isto não quer dizer que seja a única instituição responsável. Ela é uma instituição

(31)

privada e a moral deve valer também na esfera pública. Neste sentido, a transição da esfera privada (família) para a esfera pública (sociedade) pode ser representada pela escola, sendo esta “constituída de maneira a poder formar a criança para a vida em sociedade” (La Taille, 2009b, p. 232).

A partir disso, podemos falar em propostas de Educação em Valores Morais ou Educação Moral. Primeiramente, não confundemos educação moral com “educação moral e cívica” que foi empregada com perspectiva dogmática. A proposta, segundo Piaget (1930/1996), é que se possa contribuir no desenvolvimento de indivíduos autônomos, aptos à cooperação. Puig (1998a, 2007) destaca que a formação moral deve propiciar ao sujeito aprender a viver: aprender a ser, aprender a conviver, aprender a participar e aprender a habitar o mundo. Para ele, discutir problemas morais não deve significar trazer soluções definidas, é necessário analisar estes problemas, para entendê-los e propor uma solução. Este trabalho contribui para o sentido de valores de cada indivíduo e sua comunidade (Puig, 1998a). Além disso, para La Taille (2009b) a educação moral deve promover a valorização da busca da verdade, do pensar bem, da boa fé; preservar a memória, as referências ao passado; articular conhecimento e sentido e cuidar do mundo, das crianças e dos jovens, fazendo-os crescer e desenvolver a autonomia.

Para isso, há diversos procedimentos possíveis para se trabalhar a Educação em Valores Morais, como abordar temas em aulas de filosofia e ciências humanas (La Taille, 2009b); disciplina de Educação Moral (La Taille, 2009b); discussão de dilemas morais (Biaggio, 1997; Blatt & Kohlberg, 1995; Kohlberg, 1992); práticas morais de utilização de filmes (D’Aurea-Tardelli, 2007), como também por meio da transversalidade (Araújo, 2014; Parâmetros Curriculares Nacionais, 2000; Busquets, Cainzos, Fernández, Leal, Moreno & Sastre, 1998; La Taille 2009b; Puig, 1998b). Podemos mencionar ainda escola democrática ou democracia na escola (Singer, 2010; Puig, Martín, Escardíbul & Novella, 2000); comunidade justa (Biaggio, 1997, 2006); convívio escolar (Parâmetros Curriculares Nacionais, 2000; La Taille, 2009b; Togneta, 2003; Togneta & Vinha, 2007; Vinha, 2003); além do trabalho com virtudes (La Taille, 2009b). Acerca deste último, La Taille (2009b) destaca que

(32)

A educação moral – para além de suas empreitadas para levar os alunos para pensar sobre deveres – deve, por um lado, procurar garantir a expressão e o desabrochar de certos sentimentos morais (simpatia, confiança, etc.) e, por outro lado, fazer os alunos refletirem sobre o valor humano desses mesmos sentimentos e de outros, que, por alimentarem virtudes, são passíveis de participar da construção de uma personalidade ética. Digo bem refletir sobre o valor humano de certos sentimentos, não se debruçarem necessariamente sobre os próprios. (pp. 280-281).

Nesse sentido, proporcionar que o aluno analise sobre qualidades do ser, que são virtudes, segundo La Taille (2009b) também o levará a pensar as qualidades que ele mesmo pensa ter ou desejaria ter, refletindo assim, em sua própria representação de si e em seus sentimentos. Assim, o trabalho com virtudes pode propiciar aos jovens a pensarem suas próprias representações de si e sentimentos, possibilitando a construção de uma personalidade ética.

Esse autor destaca que algumas virtudes devam ser priorizadas, como a justiça, a generosidade e a dignidade. No entanto, destacaremos também a relevância da virtude do amor. Assim, passemos para o próximo capítulo no qual apresentaremos as discussões sobre virtudes.

(33)

3. VIRTUDES MORAIS

“Porque o ser humano tem várias limitações, várias dificuldades. Então, isso acaba atrapalhando porque o verdadeiro significado de ágape é o sacrifício e o amor incondicional. E o ser humano não tem mais isso” (Marcos, 15 anos, participante da pesquisa – nome fictício).

Vimos no capítulo anterior que apesar de não ter se dedicado ao estudo das virtudes, Piaget (1932/1994) faz menção a algumas delas como, por exemplo, o amor, a generosidade e a justiça. Analisamos também a ênfase à justiça na teoria de Kohlberg (1992) e a possível relação da generosidade na ética do cuidado de Gilligan (1982). Por sua vez, La Taille (2000, 2006b, 2009a) também destaca que as virtudes desempenham papel na construção da moralidade, sendo merecedoras de estudos psicológicos.

Mas o que estamos chamando de virtudes? Segundo Comte-Sponville (1999), uma possibilidade de definir virtude é considerá-la como “força que age ou que pode agir” (p. 7), sua excelência própria é o que lhe constitui valor, não dependendo do uso que se faz dela. Por exemplo, a virtude de uma faca é cortar, sendo que a faca não tem menos virtude na mão de um assassino do que na mão de um cozinheiro. Bastaria cumprir seu papel de cortar.

No entanto, Aristóteles (384-322 a.C./1992) destaca que a virtude de um homem é dirigida para a realização do bem, tendo caráter prático. Seguindo este autor, Comte-Sponville (1999) afirma que a virtude de um homem é a maneira de ser e de agir humanamente, nossa capacidade de agir bem. Assim, “a virtude ou, antes, as virtudes (pois há várias, visto que não se poderia reduzir todas elas a uma só, nem se contentar com uma delas) são nossos valores morais, se quiserem, mas encarnados, tanto quanto quisermos, mas vividos, mas em ato” (pp. 9-10). Por sua vez, para La Taille (2000) a definição de virtude refere-se à qualidade das pessoas (ou qualidades desejadas), um juízo de valor, ou seja, a representação de si. Assim, fazer uma análise de suas virtudes (ou do que deseja como virtude) possibilita uma leitura valorativa de si próprio e dos outros, relacionando-se ao valor desejável e admirável. Nesse sentido, refletir sobre a

(34)

própria identidade implica situar-se perante valores. A representação que as pessoas têm de si são, por sua vez, integrantes à sua moralidade.

La Taille (2000) afirma ainda que todas as virtudes são merecedoras de estudos psicológicos, uma vez que elas são fundamentais “para a alimentação da gênese da moral na criança” (p. 119), abrindo o leque dos valores “que inspiram suas respostas às perguntas ‘como viver? ’ E ‘quem eu quero ser? ’” (La Taille, 2006b, p. 95), remetendo a uma questão ética. Esse autor ressalta a importância de se estudar as virtudes altruístas (ou pró-sociais) como a generosidade e a gratidão e também a compaixão, a fidelidade, o amor, entre outras.

La Taille (2009a) analisa que hoje falamos mais de vícios do que de virtudes, muitos se queixam que o desrespeito, assédio sexual, violência, indisciplina, dentre outros, aumentaram. No entanto, há sinais de que o tema das virtudes talvez esteja renascendo, ou nunca morreu. Em uma pesquisa, La Taille (2009a) elaborou uma lista de 10 virtudes, sendo cinco consideradas morais (justiça, gratidão, fidelidade, generosidade e tolerância) e cinco outras não necessariamente morais (honra, coragem, polidez, prudência e humildade). Pediu para que jovens (idades de 15 a 18 anos) mencionassem quais delas consideravam mais importantes. As mais valorizadas foram humildade, justiça e fidelidade. Em relação à justiça, já vimos que ela se encontra na história da Psicologia da Moralidade. Mencionamos a importância dada a ela por Piaget e Kohlberg. Sobre a menção à humildade e à fidelidade, estas virtudes são apontadas como ausentes nas relações e aparecem como antídotos necessários para a “cultura da vaidade” (La Taille, 2009b, p. 163).

Vejamos as virtudes menos valorizadas pelos jovens. La Taille (2009a) destaca que o fato de serem consideradas menos importantes não significa serem desprezadas, apenas as demais possuem mais valor para esse público pesquisado. Assim, as escolhas foram para a polidez, tolerância e prudência. A polidez para Comte-Sponville (1999) é uma “pequena” virtude, é a primeira e talvez a origem das demais. Em relação à prudência, La Taille (2009a) discute que não traria vantagem especial para si próprio, nem para o convívio. A tolerância talvez esteja no sentido de aceitar toda e qualquer

(35)

diferença, o que não teria tanto valor para os jovens, principalmente se estiver contrariando a justiça, por exemplo, em casos de violência.

Podemos mencionar vários estudos na área da Psicologia da Moralidade que abordam as virtudes, principalmente sobre justiça (Menin, 2000; Müller, 2008; Müller & Alencar; 2012; Sales, 2000; Sampaio, Camino & Roazzi, 2007), generosidade (La Taille, 2006a; Lima, 2000; Pinheiro, 2009; Tognetta, 2006; Vale, 2006, 2012; Vale & Alencar, 2008a, 2008b, 2009), solidariedade (D´Aurea-Tardelli, 2008; Tognetta & Assis, 2006), gratidão (Pieta & Freitas, 2009; Freitas, Silveira & Pieta, 2009a; Freitas, Silveira & Pieta, 2009b), amor (Alves, 2011; Alves, Alencar & Ortega, 2010, 2012, 2013, 2014a, 2014b, 2015; Costa, 2007, 2008), polidez (La Taille, 2001a), virtudes de uma forma geral (La Taille, 2000, 2001b, 2009a; La Taille et al., 1998; Tognetta, 2007b).

Verificamos que diversas virtudes são estudadas. No entanto, para subsidiarmos nosso objetivo de pesquisa, vejamos algumas considerações acerca do amor e da generosidade. Comecemos pelo amor.

3.1 Amor

Primeiramente, buscamos na filosofia a relação do amor com a moralidade. Para Comte-Sponville (1999, 2011) o amor não pode ser um dever, assim, ele não está presente em uma ação por dever. Este autor narra um exemplo: a mãe não pode ordenar ao filho: “Ordeno que você goste de (ou ame) espinafre! É seu dever! ” (Comte-Sponville, 2011, p.14). Essa mãe pode até dar a ordem para que o filho coma o espinafre, mas não será possível obrigá-lo a amar o espinafre. Assim, o amor não é um dever. “O dever é uma coerção; a virtude, uma liberdade” (2011, p. 15). Quando temos o amor, não necessitamos da moral. Assim, o dever (ou a moral) é necessário uma vez que nos falta essa virtude.

Quando existe amor, ele basta: já não precisamos de moral nem precisamos nos preocupar com nossos deveres. Porém, na maioria das vezes, não existe amor; é aí que intervém a moral, que nos manda agir

(36)

como se amássemos. A moral é uma aparência de amor, dizia eu. Isso quer dizer que só precisamos de moral na ausência de amor, por falta de amor. É exatamente por isso que precisamos terrivelmente de moral! (Comte-Sponville, 2011, p. 20)

Nesse sentido, é devido à ausência do amor que temos necessidade da moral, das regras, das obrigações. A coerção nos obriga a fazer aquilo que, se tivéssemos amor, já teríamos realizado. Nesse sentido, a moral é um simulacro de amor, pois “agir moralmente é agir como se amássemos” (Comte-Sponville, 1999, p. 243), a moral imita esse amor que nos falta.

Não obstante, Comte-Sponville (1999) afirma que apenas somos capazes de moral devido ao “pouco de amor, ainda que a nós mesmos, que nos foi dado, que soubemos conservar, sonhar ou reencontrar” (p. 245). Para este autor, o amor é, portanto, anterior à moral. Poderíamos pensar em uma contradição: se o amor é anterior a moral, como podemos compreender que a moral só existe na falta dele? Comte-Sponville (1999) complementa que “o que a [moral] torna possível é também aquilo mesmo a que ela tende, e que a liberta” (p. 245). Sendo assim, só precisamos de normas, pois não possuímos o amor pleno, um amor ideal. Todavia, a moral só é possível pela existência do amor, sendo que o desenvolvimento moral tende ao amor ideal, momento no qual nos libertaríamos da necessidade de coerção. Desta forma, o amor permite a moral e a moral tende ao amor, entretanto o amor não é o mesmo do início ao fim, “o amor se transforma e nos transforma” (p. 245).

Podemos relacionar os conteúdos discutidos por Comte-Sponville com o desenvolvimento moral descrito por Piaget. Conforme descrito anteriormente, Piaget (1932/1994) afirma que a criança começa a respeitar as regras por medo das punições e pelo amor à figura de autoridade. Assim, a entrada no campo da moralidade (na fase da heteronomia) ocorre por um amor prévio que a criança tenha por aquela pessoa que representa uma figura de autoridade. Então para esse autor como também para Comte-Sponville (1999), o amor é anterior a moral, no sentido de condição necessária a seu desenvolvimento.

(37)

Além disso, Comte-Sponville (1999, 2011) reflete que com a apropriação da moral, chegaríamos a um amor ideal, nos libertando da coerção. Também de maneira semelhante, Piaget (1932/1994) afirma que na fase de autonomia não haveria distinção entre a equidade e o amor propriamente dito, formas mais refinadas da justiça. Podemos compreender esse “amor propriamente dito” como sendo em um nível superior ao amor na fase da heteronomia. Desta maneira, para os dois teóricos o amor aparece como condição à moral, e diante do desenvolvimento desta, o amor também se modificaria, alcançando níveis ideais.

Segundo Piaget (1932/1994), a moral está relacionada aos vínculos que se estabelecem entre as pessoas. Escreve ainda sobre “a noção do bem, que aparece em geral e particularmente na criança, após a noção do puro dever, constitui talvez a última tomada de consciência daquilo que é a condição primeira da vida moral: a necessidade de afeição recíproca” (p. 141). Relacionamos assim a necessidade de amar e ser amado para a existência da moral.

Nas declarações de Comte-Sponville (1999) percebe-se a análise do amor enquanto uma virtude moral, aquela que almejamos para não ficarmos “presos” à moral. No entanto, quando as pessoas afirmam amar o poder, ou quando cometem um ato doloso em “nome do amor”, falaríamos também de virtude? Ou seja, todo amor é virtuoso? Comte-Sponville (2011) responde “Nem todo amor, de fato. [...]. Nem todo amor é virtuoso, é bom lembrá-lo” (p. 12). Assim, podemos falar em formas de amor, algumas mais próximas ao campo das virtudes (ou podemos dizer essencialmente virtuosas) enquanto outras mais distantes (mais egoístas, longe de ter como proposta tornarmos melhores).

Mas, o que é o amor? Na tentativa desta definição, Comte-Sponville (1999, 2011) propõe três respostas: eros, philia e ágape. Ressaltamos que não pretendemos esgotar aqui as discussões acerca destes tipos de amor, faremos algumas considerações que são necessárias para o presente estudo. Assim, eros é a paixão amorosa, caracterizado pelo desejo do que falta, é sofrimento e carência. Comte-Sponville se baseia na obra de Platão, O Banquete, principalmente no discurso de Sócrates para sua definição. Para Sócrates o amor é desejo, e só desejamos aquilo que nos falta. Assim, os objetos do

(38)

desejo e do amor são: o que não temos, o que não somos e o que nos falta (Platão, 1983). O amor está sempre fadado à carência e a incompletude, à infelicidade.

Como afirma Borges (2004), esse amor é o presente em histórias como Tristão e Isolda, Romeu e Julieta e Os sofrimentos do jovem Werther, nas quais o sofrimento faz parte do amor, uma vez que não imaginaríamos esses personagens felizes para sempre, pois “quão tediosa seria a vida conjugal de Romeu e Julieta, ou de uma possível Senhora Tristão, ou de uma Charlotte preparando o jantar para seu marido Werther!” (p. 9).

Comte-Sponville (2011) afirma que “qualquer adolescente de quinze ou dezesseis anos é capaz disso, pode até se apaixonar por um cantor ou uma estrela do cinema com quem nunca se encontrou. Estar apaixonado, amar quem não temos é facílimo” (p. 55). O autor faz uma ressalva, uma vez que na verdade não temos (ou possuímos) ninguém, mas amar aquele cuja vida compartilhamos, ou seja, aquele que não nos falta, é muito mais difícil. Destacamos que embora associemos o amor eros à adolescência ou vida adulta, Piaget e Inhelder (1955/1970) destacam que este amor faz parte também da vida das crianças, assim em suas palavras: “Não se poderia, por exemplo, afirmar que o aparecimento do amor seja próprio da adolescência: há crianças que se apaixonam” (p. 299).

Ainda, segundo Comte-Sponville (2011) para que a paixão dure, deve-se permanecer no sofrimento, pois eros é o desejo pelo que falta. Quando a falta for suprida, não existirá mais eros. No entanto, nem todo amor é falta. Pensando no relacionamento amoroso, alguns casais aprendem juntos a se regozijar com o que existe: quando já não há falta, resta-lhes a plenitude do real, como que aquecido pela existência do outro, pela presença do outro, pelo amor que fazem e tornam a fazer, que constroem e habitam, que gozam e com que se regozijam. Resta-lhes a alegria de amar e ser amados (Comte-Sponville, 2011, p. 80).

Essa alegria pela presença do outro (não mais pela ausência), pelo fato de o outro existir é o amor philia. Este é o amor da amizade. É vontade de fazer o bem um ao outro; é desejar o bem aos amigos por amor a eles. Philia é “o amor que fazemos ou damos, é ação” (Comte-Sponville, 1999, p. 265). Entretanto, nunca é totalmente

(39)

desinteressada e gratuita, uma vez que o interesse de nossos amigos também é o nosso. Sobre esse amor, devemos mencionar Aristóteles (384-322 a.C.) que afirma que a amizade é condição da felicidade.

Em sua obra Ética a Nicômacos, livros VIII e IX, Aristóteles (384-322 a.C./1992) ressalta que a amizade é extremamente necessária, pois ninguém desejaria viver sem amigos. Segundo este autor, podemos nos referir a três espécies de amizade: pelo desejo de partilhar a companhia do outro pelo útil, pelo prazer ou pela virtude. As pessoas que amam por interesse ou pelo prazer, amam o que é bom para si próprio. Por sua vez, a amizade pela virtude é a vontade de fazer o bem ao amigo, porque são amigos e não por um interesse ou prazer próprio. Assim, “as pessoas que querem bem aos seus amigos, por causa deles, são amigas no sentido mais amplo, pois querem bem por causa da própria natureza dos amigos e não por acidente” (Aristóteles, 384-322 a.C./1992, p. 156). Nesse sentido, Godbout (1999) afirma que a amizade, philia, repousa sobre a capacidade de dar e retribuir, sobre a reciprocidade. Exige generosidade e espontaneidade.

Para Comte-Sponville (2011) eros e philia possivelmente fazem parte de nossas experiências como humanos. Mas há outro amor, ágape, que talvez não passe de um ideal. Ágape é o amor divino, a caridade, universal, desinteressado e gratuito, ou seja, é amar a todos, inclusive os inimigos e desconhecidos. É renunciar seu prazer em função do amor ao outro (Comte-Sponville, 1999, 2011).

Ainda, não podemos considerar eros, philia e ágape como essências separadas ou mundos estranhos, nossas experiências amorosas se situam quase sempre entre um ou outro tipo de amor. Nós nascemos em eros, depois aprendemos a dar primeiramente aos que nos são queridos (philia), para, eventualmente, amar ao próximo (ágape), ou seja, há uma evolução do amor (Comte-Sponville, 2011).

Devemos mencionar também Keleman (1996) que, em seu discurso a respeito do amor, salienta a importância da família, pois conforme o autor é no seio familiar que aprendemos ou não o que é o amor. Entretanto, a forma como amamos não é uma mera repetição do modo como fomos amados ou ensinados a amar. Nós elaboramos nossas próprias estratégias para amar. Esse autor faz uma crítica ao afirmar que, muitas vezes,

(40)

as pessoas apenas baseiam seu conceito de amor com base em jornais, novelas e filmes, ou pela experiência de outrem, podendo gerar uma visão abstrata e distorcida do amor.

Por sua vez, Macedo (2010) remete ao apresentado por Keleman (1996) e afirma que amor já está em nós, mas para descobrirmos necessitamos do outro, do que fazemos para eles ou em nome deles. Esse autor destaca que o desenvolvimento da cooperação envolve autonomia, respeito mútuo, reciprocidade, responsabilidade, sendo justificada e influenciada pelo amor que atribuímos ao que se realiza em conjunto. Menciona ainda que a cooperação tem como princípio o amor, entretanto, é o trabalho em conjunto, a ética, a paciência, o esforço e a concentração que nos possibilitam compreender o que chamamos de amar.

Marimon e Vilarrasa (2014), por sua vez, destacam que o amor não pode ser compreendido como um sentimento isolado, mas como um “complexo de sentimentos inserido em um contexto afetivo emocional e social” (p. 21), pois cada sensação amorosa está unida a outras, como ternura, sentimento de proteção, prazer, podendo ainda se relacionar a inveja, rivalidade, ciúme dentre outros. O amor é, portanto, um complexo de sentimentos uma vez que “nunca ocorre sem outros sentimentos associados” (p. 22). Desta forma, podemos falar em variadas formas de amor: amor ao pai, ao amigo, ao cachorro e à música, por exemplo.

A grande quantidade de acepções do termo ‘amor’ evidencia o amplo leque de significados que podemos lhe dar e a grande variedade de sentimentos que ele encerra, se considerarmos do ponto de vista da pessoa a quem se direciona. (p. 22)

Existem, portanto, muitos tipos de amor, por exemplo, o amor erótico, amor fraterno, amor materno, sendo que “cada um desses encerra em si mesmo outros muitos sentimentos e nos desperta emoções às quais está inevitavelmente unido” (Marimon & Vilarrasa, 2014, p. 32).

A partir da influência da biologia, história, sociologia, antropologia e psicologia, Marimon e Vilarrasa (2014) defendem que se não houvesse cooperação, a vida não teria ultrapassado o estado bacteriano e não teria evoluído para níveis tão complexos como

(41)

podemos observar. Assim, temos necessidade de cooperação e de amor, este entendido como algo mais amplo que sentimento. Junto com a inteligência, o amor torna possível que a vida se mantenha, evolua, se desenvolva e progrida.

Por sua vez, Bauman (2004) também menciona variados conceitos para definir o amor. Para este autor o amor está relacionado à vontade de cuidar (proteger, alimentar, abrigar), ao afeto (carícia e afago), como também a ações relacionadas ao ciúme (guardar, encarcerar). E ainda, pode relacionar à renúncia, sacrifício. No entanto, atualmente, as pessoas tendem denominar como “amor” várias de suas experiências de vida, assim “o conjunto de experiências às quais nos referimos com a palavra amor expandiu-se muito” (p. 19). Ele faz uma crítica de que se investe em uma relação contando com o lucro da segurança, ou seja, o apoio quando precisa, o socorro na aflição, a companhia, o consolo, o aplauso, enfim, espera-se que o relacionamento lhe dê uma consequência positiva. Pensando desta forma, o relacionamento seria um investimento como qualquer outro, podendo ser comparado ao mercado de ações. Os acionistas têm que estar sempre atentos para saber quando é momento de permanecer com as ações ou se desfazer delas. Ele considera, portanto, a existência da fragilidade dos vínculos humanos.

Considerando o “líquido cenário da vida moderna” e, por conseguinte, o predomínio das relações virtuais, estas possibilitam que as conexões (e não relacionamentos, as conexões são muito mais fáceis de serem rompidas) ocorram de forma rápida, sendo o apaixonar-se ou desapaixonar-se de forma fácil. Além disso, Bauman (2004) afirma que “o casamento ao estilo antigo, ‘até que a morte nos separe’, já desestabilizado pela coabitação ‘vamos ver como funciona’, reconhecidamente temporária, é substituído pelo ‘ficar juntos’, de horário parcial ou flexível” (p. 54).

Pensar em fragilidade dos vínculos nos remete a possibilidade do divórcio. Para Ferry (2012, 2013) o divórcio foi uma consequência da invenção do casamento por amor. Na Idade Média o casamento nunca se originava da paixão amorosa. Poderia até haver o amor, mas era coisa rara. O casamento era por conveniência, arranjado pelas famílias. O casamento por amor começa a se difundir na Revolução Industrial, tornando-se com o passar do tempo “o único princípio da família” (Ferry, 2013, p. 79).

(42)

Hoje, “é o amor, até mesmo o amor-paixão, o único a dar fundamento à família” (Ferry, 2013, p. 78).

A partir deste ponto “determinar o amor como origem do casamento é cometer não apenas um erro, mas uma terrível falta” (Ferry, 2012, p. 81) A união deve ser duradoura e indissolúvel e é certamente fadada ao insucesso se está apoiada na paixão amorosa que é variável, volátil e efêmera. Desta forma, se o casamento ocorre por amor (principalmente a paixão), quanto este acaba, não há motivos para permanecer na união e uma opção é o divórcio. Mas este fato não pode ser considerado apenas como fracasso, ainda assim é um avanço, uma vez que ninguém, possivelmente, gostaria de voltar ao casamento arranjado (Ferry, 2013).

Também podemos citar Godbout (1999) que discorre a respeito da existência de amor nos vínculos de relacionamento. Reflete sobre o conceito de dádiva, definindo-a como o ato de dar espontaneamente algo sem garantia de retorno, mas a retribuição pode existir mesmo não sendo desejada. Para este autor, a família seria o lugar básico para a dádiva, na qual ela pode ser vivida com mais intensidade. Por sua vez, na relação com amigos, as estruturas da amizade são mais livres, pois nós que os escolhemos. Apesar de existir a reciprocidade, esta não é necessariamente imediata. Discute ainda sobre a dádiva a desconhecidos, afirmando que religiões encorajam este tipo de dádiva, o ‘amar ao próximo’, mas ressalta que o próximo deve se referir à humanidade inteira. Em contraste com esta menção ao amor a desconhecidos, Cortella e La Taille (2009) salientam que hoje temos medo do que (ou de quem) não conhecemos. Para exemplificar essa ideia, Cortella discute que se caminhássemos por uma rua escura e deserta na década de 70, o medo existente era de assombração. Hoje, se estivermos na mesma rua, em situação idêntica, o medo não é mais de fantasmas, mas sim do outro que possa se aproximar de nós. Desta forma, temos medo prévio de quem não conhecemos.

A partir destas discussões, vejamos o que tem sido estudado sobre o tema amor, por meio de pesquisas empíricas. Schlösser e Camargo (2014) fizeram um levantamento das pesquisas brasileiras sobre o amor e relacionamentos amorosos, nos anos de 2002 a 2012. Foram encontrados 114 artigos, consultados nas bases de dados SciELO, LILACS

Referências

Documentos relacionados

Para se poder constatar as diferenças no comportamento dos elementos metálicos estruturais, sujeitos ao carregamento cíclico, foram incorporados níveis de esforço axial constantes

225 - meio ambiente ecologicamente equilibrado, neste incluso o do Trabalho (VIII, Art 200)  colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do

Caso seja verificado que o número de votantes não corresponde ao número de cédulas oficiais, e esta diferença resulte, comprovadamente, de fraude, a urna será lacrada e será

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

Não existe nenhuma “Realidade Quântica” concreta, os objetos e suas propriedades não têm valores definidos (não existem!) antes de serem medidos. • O ato de medir cria

Não se trata naturalmente de considerar que as obras musicais compostas antes de Beethoven não são obras musicais; ou talvez mais exactamente, que essas composições não são

Os pacientes tratados com risanquizumabe não devem receber vacinas vivas durante o tratamento e por pelo menos 21 semanas após o tratamento.. Excipientes com efeito conhecido:

É importante ressaltar que a via tireoidiana- psíquica é bidirecional, portanto, tanto alterações tireoidianas podem provocar sintomas depressivos ou exacerbar uma