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Análise econômica do direito processual consumerista

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IV Congresso Anual da Associação Mineira de Direito e Economia

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ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO DO CONSUMIDOR: O CÓDIGO

DE DEFESA DO CONSUMIDOR COMO NORMA CORRETIVA NO

ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Luis Eduardo Brito Scoton1

1

Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, Av. Bandeirantes, 3900 – Monte Alegre, Ribeirão Preto-SP – CEP 14040-906, E-mail: luis.scoton@usp.br

Resumo

O presente artigo introduz o tema da análise econômica do direito do consumidor. Buscou-se descrever, com baBuscou-se nos panoramas legal e institucional atualmente vigentes, alguns dos efeitos distorcivos causados pela interpretação exclusivamente paternalista das normas consumeristas brasileiras, de forma a demonstrar que a inclusão do enfoque institucional-econômico como parâmetro interpretativo é indispensável à eficácia do Código de Defesa do Consumidor e ao seu alcance como uma das normas corretivas do ordenamento jurídico brasileiro.

Palavras-chave: análise econômica do direito; direito do consumidor; normas distorcivas; normas corretivas.

Abstract

This article introduces the topic of the economic analysis of consumer law. We sought to describe, based on legal and institutional panoramas currently in effect, some of the distorting effects caused by the purely partenalistic interpretation of the brazilian consumer law. It intend to demonstrate that the inclusion of the institutional-economic approach as a parameter to the juridical interpretation of the consumer law is essential to the effectiveness of the Code of Consumer Protection and their scope as a corrective rule on the Brazilian legal system.

Key-words: economic analisys of law; consumer law; distorcive rules; corrective rules.

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1.

A Análise Econômica Do Direito: Breves Notas

o longo do século XX, os estudos nas áreas de economia e direito enfrentaram novos e grandes desafios. Assim se deu, por exemplo, com os embates ocorridos no campo do direito a partir do surgimento do positivismo jurídico, que agitaram todo o início daquele século - e que atingem a Teoria Geral do Direito até hoje -. Assim também ocorreu no período entre guerras, quando as avassaladoras crises econômicas provocaram uma releitura do liberalismo econômico, provocando alvoroço entre os economistas neoclássicos.

Não obstante a efervescência científica das primeiras décadas, a segunda metade do século, em especial, representou verdadeira quebra de paradigma frente à antiga epistemologia adotada pelos doutrinadores de ambas as ciências. Esta quebra foi motivada pelos estudos realizados por doutrinadores adeptos à escola da análise econômica do direito.

Esses estudos demonstraram a necessidade de se construir uma relação interdisciplinar entre os campos econômico e jurídico, comprovando não haver mais espaço para análises que excluam os resultados econômicos, das decisões jurídicas, e vice-versa. Essa teoria, mais conhecida como análise econômica do direito, subdivide-se em várias vertentes, distinguindo- se, a princípio, duas escolas principais.2

A Escola de Chicago - também denominada Law & Economics -, de viés utilitarista, busca aplicar as teorias econômicas neoclássicas ao direito. Procura descrever, ou prever, como as normas legais influenciam a alocação dos recursos e os resultados econômicos. Para tanto, toma a premissa de que o comportamento humano se baseia na maximização de bem-estar.

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Para essa corrente, o jurista deve atuar de forma eficiente (melhor custo-benefício), de modo a maximizar satisfações (maximizar riquezas) através de contratos, leis ou decisões judiciais. A melhor decisão seria aquela que reduzisse ao máximo as incertezas do mercado e gerasse maior satisfação econômica. O melhor arranjo contratual seria aquele que definisse claramente os direitos de propriedade e que prescrevesse soluções baratas, rápidas e eficazes para os impasses surgidos. Nesta escola, destacam-se os trabalhos de Richard Posner.

De acordo com Pinheiro e Saddi,

“Ao sobrepor à superestrutura legal as suposições tradicionais da análise econômica, a escola de Direito & Economia é capaz de utilizar o ferramental econômico não apenas para teorizar e analisar o impacto do direito sobre a economia, mas também para avaliar a própria qualidade dos instrumentos

legais, de acordo com métricas econômicas predefinidas.” 3

Já a Escola da Nova Economia Institucional (NEI), promove uma pequena quebra com relação aos economistas neoclássicos, construindo a Teoria dos Custos de Transação. Para os autores da NEI, tanto as macroinstituições (as instituições criadas pela sociedade ou as instituições de Estado), quanto as microinstituições (as pequenas instituições existentes no interior das firmas e organizações) importam para as análises econômicas.4

2

Além das escolas abordadas, pode-se citar a Escola da Escolha Pública (Public Choice), a Escola Institucionalista, o Movimento dos Estudos Críticos, entre outras. Embora divirjam na abordagem e interpretação, o instrumental abordado por estas escolas é um só, qual seja, a intrínseca relação entre direito e economia.

3

PINHEIRO, Armando Castelar; SADDI, Jairo. Direito, economia e mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p.83.

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O direito interfere na economia, e é influenciado por esta, na medida em que atua como regulador e indutor destas instituições. Ao jurista caberá observar os efeitos econômicos de determinado instituto jurídico, dado o arranjo institucional presente. Destacam-se as obras de Oliver Williamson e Douglas North.

As duas escolas tiveram como base os trabalhos de Ronald Coase, catedrático da Universidade de Chicago, e ganhador do Prêmio Nobel em Economia de 1992. Em 1937, ao publicar “The nature of the firm”, seu trabalho precursor, Coase lançou um novo conceito para a firma, que veio a revolucionar o modo como os juristas e economistas viam o instituto até então.

A partir dos estudos do autor, a firma deixou de ser considerada um simples fator de produção para se tornar um “feixe de contratos” que estabelecem direitos de propriedade entre agentes econômicos. Ele complementa que essa ampla gama de contratos comportam relações presentes e futuras, formais ou informais, entre os agentes, reduzindo o custo envolvido na realização das atividades econômicas.5

Já em 1960, ao lançar “The problem of social cost“, Coase estabeleceu as bases do que posteriormente chamou-se de “Teorema de Coase”. Em linhas gerais, o autor prelecionou que - diferentemente da previsão neoclássica de que a economia era capaz de organizar-se organizar-sem custos ou influências externas - o mundo real apreorganizar-senta fricções causadas por assimetrias de informação. Estas fricções, denominadas “custos de transação”, impedem que os direitos de propriedade sejam negociados a custo zero, o que influi, como conseqüência, na alocação dos recursos econômicos, na teoria dos direitos de propriedade e

ZYLBERSTAJN, D.; STAJN, R. (Orgs.). Direito e economia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p 1-15.

5

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na organização dos mercados.6

Na prática, a “descoberta” dos custos de transação ocasionou a quebra do pressuposto da economia neoclássica segundo o qual os agentes poderiam negociar direitos, independentemente da sua distribuição inicial, a nenhum custo, de modo a sempre se chegar à sua alocação eficiente.7 Conforme Pinheiro e Saddi: “Quando direitos de propriedade são bem definidos e o custo de transação é igual a zero, a solução final do processo de negociação entre as partes será eficiente, independentemente da parte a que se assinalam os direitos de propriedade”.8

Entretanto, as inovações não pararam por aí. Desde os trabalhos precursores de Coase, baseados no estudo da firma e dos custos de transação, até o surgimento e desenvolvimento das diferentes escolas doutrinárias, a análise econômica do direito adentrou os mais variados campos científicos. Os acréscimos mais inovadores ficaram a cargo dos autores da NEI.

Williamson foi o responsável pela criação da Teoria dos Custos de Transação. Além de defender que as instituições influenciam na intensidade destes tipos custos, o autor acrescenta que existem problemas potenciais nos contratos firmados pelas firmas. Tais problemas são causados pelo comportamento oportunista dos contratantes, que não olvidam em aproveitar brechas contratuais para maximizar lucros. Por isto, os contratos devem ser bem construídos, prevendo graves sanções em caso de inadimplemento (enforcement).

6

COASE, Ronald. The problem of social cost. Journal of Law and Economics, n.3,outubro, 1960.

7

Op. Cit. Nota 4 supra.

8

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Além disso, o doutrinador inovou ao incorporar as organizações (microinstituições) como objeto das análises. Também foi pioneiro ao introduzir a Teoria da Racionalidade Limitada, de Herbert Simon (segundo a qual o ser humano é dotado de racionalidade limitada, sendo portanto incapaz de prever todos os arranjos econômicos e custos de transação), como pressuposto teórico-epistemológico das análises.9

North, a seu turno, investigou a origem e a evolução das instituições, desde as trocas locais, em vilarejos, até a especialização internacional e a divisão do trabalho. O autor define as instituições como mecanismos ou restrições formais (constituições, leis, direitos de propriedade, etc.) e informais (sanções sociais, tabus, costumes, tradições e códigos de conduta) previamente criados pelo homem para estruturar as relações políticas, econômicas e sociais.10

Para o autor, as normas jurídicas, que compõem a ciência do direito, são espécies de instituições criadas para estruturar as relações políticas e sociais. Ressalte-se que as leis garantem ao Estado – outra espécie de instituição – o estabelecimento do convívio entre os cidadãos e a manutenção da paz social.

Já no campo econômico, as instituições atuam de modo a reduzir incertezas nas trocas, e a minorar custos de transação e produção. Através desse novo enfoque, os estudos de North consolidaram o entendimento de que as instituições realmente importam à economia. Para o autor, o mercado é análogo a um jogo. As instituições representariam as regras desse jogo.

9 WILLIAMSON, Oliver. The New Institutional Economics: Taking Stock, Looking Ahead in Journal of

Economic Literature, Vol. 38, No. 3. (Sep., 2000), p. 595-613.

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2. Normas Corretivas E Normas Distorcivas

a partir dos distintos conceitos desenvolvidos pelas correntes doutrinárias anteriormente expostas que surge a análise econômica do direito (AED). De modo geral, a AED busca aplicar o arcabouço teórico da economia para investigar os efeitos e a eficácia das leis e decisões judiciais.

De acordo com Ivo Gico Júnior:

“A Análise Econômica do Direito nada mais é que a aplicação do

instrumental analítico e empírico da economia, em especial da

microeconomia e da economia do bem-estar social, para se tentar

compreender, explicar e prever as implicações fáticas do ordenamento

jurídico, bem como da lógica (racionalidade) do próprio ordenamento

jurídico. Em outras palavras, a AED é a utilização da abordagem econômica

para tentar compreender o direito no mundo e o mundo no direito.”11

A grande justificativa para a utilização da abordagem econômica-institucional é a de que a economia, por constituir-se como uma das ciências cuja essência é o próprio comportamento humano, poderá fornecer ao direito uma metodologia capaz de prever quais os efeitos que determinada norma irradiará sobre o comportamento dos agentes sociais.

Todavia, economia e direito nem sempre são ciências compatíveis entre si. Enquanto a economia é uma ciência ontológica (voltada para o conhecimento da realidade, para o que “é”), constituída por regras positivas (disposições objetivas, descritivas da realidade), o direito

11

GICO JÚNIOR, Ivo. Metodologia e epistemologia da análise econômica do direito. Disponível em: <

http://www.iders.org/textos/Ivo_Gicco_Metodologia_Epistemologia_da_AED.pdf>. Acesso em: 23.mai.2011.

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é uma ciência deontológica (voltada para o dever-ser, para o alcance do ideal), composta por regras normativas (disposições prescritivas e sancionatórias).1213

Dessa forma, caberá ao legislador - no momento de confecção da lei – e ao jurista – no momento de interpretação da lei e aplicação da AED – ter sempre em mente esta dicotomia. Se por um lado as normas jurídicas devem ser programáticas e valorativas - não sendo compostas meramente por disposições descritivas, mantenedoras do status-quo -, por outro lado as normas que fugirem demasiadamente da realidade do mundo - e que dispensarem as forças do comportamento humano esperado - estarão desde já predestinadas ao fracasso.

Utilizando-se da classificação construída por Persio Arida14, incumbirá ao legislador, pois, a confecção de normas corretivas, ou seja, de normas que, lastreadas nas regras reais do jogo econômico e no comportamento esperado dos agentes, atuem para sanar e corrigir as falhas do mercado. É nesse sentido que deverá caminhar toda interpretação realizada pelo jurista.

Não deve o legislador editar normas distorcivas, que fujam do alcance da realidade, e que não levem em conta as regras básicas de economia, como a livre concorrência, o ótimo de pareto, os elementos demanda e oferta, entre outros.

Em verdade, grande parte das normas distorcivas são resultado da ignorância de noções básicas de economia por parte do seu autor. De fato, muitas vezes o legislador, apesar de bem intencionado, ao atuar para corrigir uma falha do mercado, acaba criando entraves

12

MANKIW, N. Gregory. Introdução à economia. Tradução de Allan Vidigal Hastings. São Paulo: Thomson Learning Edições, 2006.

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ao desenvolvimento econômico e social, atingindo efeitos diversos do inicialmente pretendido, incorrendo na grave prática da causalidade reversa.

3. A Análise Econômica Do Direito Do Consumidor

s preceitos básicos desenvolvidos pelos teóricos das distintas correntes da análise econômica do direito suscitaram novos estudos que ocasionaram mudanças de abordagem e interpretação em vários campos jurídicos. No direito privado, a abordagem econômica passou a ser indispensável, sobretudo quando tratadas matérias relacionadas ao direito dos contratos e aos direitos de propriedade.

No direito penal, a seu turno, os estudos sobre as motivações econômicas do homo delicti promoveram importantes modificações na teoria do delito. No direito público, por fim, a racionalidade econômica passou a ser indispensável sob vários aspectos: à regulação dos serviços públicos, à teoria do interesse público, às leis de concorrência, entre outros.

Com o direito do consumidor não é diferente. Embora existam poucas análises econômicas incidentes sobre o tema - sobretudo no Brasil-, as análises institucionais-econômicas têm muito a contribuir para a melhoria das relações de consumo. Destaque-se que a perspectiva econômica do direito do consumidor assume cada vez maior valor, principalmente em tempos de comércio eletrônico, globalização econômica e integração de mercados.

Não estranha o fato de, no Brasil, a defesa do consumidor ter sido elevada pela

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ARIDA, Pérsio. Direito e economia in Revista Direito GV, v.1, n.1, (mai.2005), p. 11-22.

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Constituição Federal a princípio da ordem econômica (artigo 170, inciso V). O constituinte entendeu a importância socioeconômica da formulação de Políticas de Proteção ao Consumidor. Concluiu que estas deveriam ser nacionais, e garantidas pelo Estado, e por isso estabeleceu também no artigo 5º, inciso XXXII, que o Estado promoverá, na forma da lei, a proteção do consumidor.

Ademais, o constituinte procurou ampliar a proteção do consumidor a partir da legislação ordinária: do artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias prescreveu a ordem dirigente que resultou no Código Brasileiro de Defesa do Consumidor (CDC). De fato, a Lei 8.078/90, que instituiu o CDC brasileiro, é o grande marco institucional da proteção do consumidor no Brasil. Cabe, aqui, descrever as vantagens de se interpretar o instituto sob a ótica da análise econômica do direito e, mais precisamente, da nova economia institucional.

Uma das pioneiras a tratar da análise econômica do direito do consumidor foi a professora estadunidense Brooke Overby. Em seu artigo intitulado “An Institutional Analysis of Consumer Law”, a autora discute os pontos negativos e positivos da derrogação, pela legislação dos estados membros da federação, de grande parte da legislação federal atinente às relações de consumo, editada ao longo das décadas de 1960-70 pelo Congresso dos EUA. Nesse contexto, Overby também analisa as pressões institucionais exercidas por alguns órgãos pelo tratamento da relação de consumo a partir da uniformização das leis comerciais estadunidenses.15

Para a autora,

15

OVERBY, A. Brooke. An institutional analysis of consumer Law. Disponível em: < Erro! A referência de

hiperlink não é válida..edu /publications/journal-of-transnational-law/archives/volume-35-number-1/download.

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155 “Consumer law has acquired an increasing transnational and international dimension as a result of economic integration and technological developments such as e-commerce. This suggests that the traditional roles played by legal organizations in consumer lawmaking perhaps ought to be questioned in light of increasing globalization. The impact of globalization on domestic U.S. contract law is often overlooked or de-emphasized.

(…)

Consumer law in the future most likely will play out on a field vastly different from that which showcased the liberal, rights-oriented consumer debate decades ago(…) the reordering of federal and state priorities in the United States, increasing internalization, and the potential transformation of consumer issues from matters of local concerns to matters of some global import all indicate that a radical reinterpretation of consumer law may eventually emerge. In the United States, this reinterpretation will raise broad issues regarding the state uniform laws process, consumer rights, and economic justice – which provide the source for much of the argument to date- but also much more subtle questions of institutional design, organizational competence, federalism, law and technology, and the global economy.”

Podemos dizer que, de certo modo, as questões centrais que motivam mudanças na legislação sobre consumo nos EUA são semelhantes às que demandam novas interpretações dos juristas brasileiros. São exemplos: a globalização econômica e o surgimento de novas tecnologias. Estas interpretações demandarão análises inovadoras, baseadas no panorama institucional específico do Brasil.

Como Douglas North demonstrou, modelos legais não devem ser importados ou copiados de outros países. Deverão os juristas brasileiros, pois, encontrar soluções pontuais para as controvérsias surgidas, com base no sistema institucional brasileiro. A título de exemplo, não caberá a adaptação para o Brasil do sistema consumerista estadunidense, pois este é amplamente baseado em fatores atinentes ao modelo federalista norte-americano, à

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cultura da liberdade negocial, à relativa paridade econômica existente entre os cidadãos, entre outras características peculiares ao ambiente institucional dos EUA.

Para Overby, de modo geral, as novas análises teóricas que incidem sobre o direito do consumidor tendem a recair em três categorias gerais: a) a criação de políticas contra as falhas de mercado, ou seja, fomentadoras de mercados eficientes para o consumo de bens e serviços; b) o avanço ético; c) a proteção paternalista do consumidor.16

De acordo com os que defendem a proteção do mercado, o governo deveria intervir nas transações privadas apenas quando existirem falhas de mercado, e quando os benefícios desta intervenção legal excederem os custos (intervenção de máxima eficiência). Para os defensores da corrente ética, a lei deveria se basear em teorias de justiça - tais como a justiça distributiva, os valores sociais, a autonomia individual, a dignidade e o respeito - que justifiquem a intervenção nas relações de consumo.

Já os paternalistas, por sua vez, pregam que o Estado intervenha para impossibilitar a contratação do consumidor em qualquer situação de disparidade entre este e o fornecedor. A autora salienta que esta última posição não coaduna com a tradição liberal ocidental, pois sugere a anulação da preferência individual do consumidor pela imposição do Estado.

Tem razão a autora quando aponta para os perigos da interpretação exclusivamente paternalista do direito do consumidor. Há alguns sérios exemplos na jurisprudência brasileira de decisões de caráter paternalista que implicaram em efeitos danosos para o próprio consumidor, causando a distorção da tutela protetiva conferida pelo CDC e apontado para efeitos da perigosa causalidade reversa, anteriormente citada.

16

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Um desses exemplos é a questão da etiquetagem unitária dos produtos expostos em

prateleiras e gôndolas. Anteriormente à Lei 10.962, de 11 de outubro de 2004, que pacificou a questão, eram comuns as decisões judiciais no sentido de obrigar o comerciante a etiquetar os produtos expostos, um a um, de modo a - de certa forma - facilitar o acesso à informação do preço pelo consumidor.

Os magistrados baseavam essas decisões nos artigos 6º e 31 do CDC, porém não analisavam, todavia, que havia um custo na operação de etiquetagem, e que, por regra positiva, todo esse custo era automaticamente repassado ao consumidor, a partir do aumento do preço da própria mercadoria. Atente-se ao seguinte trecho do voto proferido pelo Ministro Garcia Vieira, relator do MS 5986, julgado pela 1a Seção do STJ em 13/10/99:

“EMENTA – MANDADO DE SEGURANÇA – DIREITO DO CONSUMIDOR – FIXAÇÃO DE PREÇO EM MERCADORIA – LEGALIDADE.

1.Para atender o estabelecido pelo CDC, além do código de barras e do preço nas gôndolas, os estabelecimentos comerciais devem fixar os preços diretamente nas mercadorias. Precedentes do STJ.

2.Remessa necessária e apelação providas.

No Brasil ainda existe uma porcentagem muito grande de pessoas humildes, analfabetas ou semi-analfabetizadas para as quais ainda é muito difícil ou mesmo impossível a consulta rápida e eficiente a um terminal de computador para verificar o preço do produto, no código de barras. Estas pessoas ficam impedidas de verificar o preço do produto que está adquirindo na hora de pagá-los, no caixa. Como se trata de várias mercadorias, no caixa, o consumidor não vai lembrar o preço de todas elas e não terá como verificar os preços pelos quais estão os produtos sendo registrados. É muito comum nos supermercados o registro da mercadoria por preço superior ao que consta das prateleiras, das gôndolas.”17

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Em outro caso recente, a terceira turma da segunda seção do STJ, ao decidir pela impossibilidade do repasse ao consumidor, pelo comerciante, das taxas de serviços cobradas pelas operadoras das máquinas de cartões de débito e crédito, acabou emitindo uma decisão que tolheu a liberdade de contratar.

Ao impossibilitar o repasse do custo de transação do cartão, pelo comerciante, o consumidor ficou impossibilitado de negociar o desconto ou o abatimento da respectiva taxa nas compras com pagamento à vista. Mais uma vez, o que era um ato que visava a proteção paternalista do consumidor, acabou por afetar o indivíduo na liberdade e nos bolsos, restringindo também o mercado.18

Outro exemplo de atuação paternalista negativa na proteção do consumidor é a interpretação restritiva do inciso VIII, do artigo 51 do CDC. Tal interpretação leva muitos juízes a declarar de ofício a nulidade de qualquer cláusula de arbitragem nos contratos de consumo, antes mesmo de qualquer análise quanto à conveniência das partes em celebrar tal cláusula. De outro lado,há consenso entre os estudiosos do direito arbitral quanto à validade da cláusula arbitral, desde que expressamente aceita pelo consumidor. Assim, a decretação da nulidade de cláusula arbitral sem a anterior análise de mérito trata-se, sem dúvida, de um retrocesso ao princípio da liberdade de contratar, e de um claro óbice à economia processual.

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4. Considerações Finais: O Código De Defesa Do Consumidor (CDC) Como

Norma Corretiva No Ordenamento Jurídico Brasileiro

pesar das interpretações negativas, que causam distorção na aplicação do CDC, há de se ressaltar a importância da proteção que o Código confere tanto aos consumidores, quanto aos fornecedores e à relação de consumo. O fato é que a edição do CDC representou verdadeiro avanço para a economia, vez que o regramento diminuiu a desigualdade que havia entre consumidores e fornecedores, o que trouxe maior fluidez ao comércio e uma maior segurança aos contratantes. Nesse sentido, o CDC constitui-se como verdadeira norma corretiva no ordenamento jurídico brasileiro.

Destaque-se o papel do princípio da informação, elencado no artigo 6º, inciso III do CDC, e a aplicação do código no combate à assimetria de informações do mercado. As regras econômicas indicam que a disponibilidade de informações contribui para a diminuição dos custos de transação, o que é bom para o mercado, para consumidor (que obtém a redução nos preços) e para o fornecedor (que tem o cliente satisfeito, e à certeza dos fatores que motivaram a compra).

A uniformização dos padrões dos produtos e serviços, conseqüência da edição do CDC, é outro fator de destaque, pois permitiu aos fornecedores brasileiros o desenvolvimento da competitividade necessária para o acesso a mercados externos, mercados estes fundamentais para o seu crescimento econômico.

Por fim, a ampliação do acesso à justiça, promovida pelo julgamento das causas de consumo pelos Juizados Especiais e iniciada pelo CDC, e a inversão do ônus da prova, foram fatores importantes no combate ao que a doutrina denomina de “dano eficiente”. Esse seria aquele dano sobre o qual o consumidor não pleiteia reparação, mas que é contabilizado

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como um ativo para a empresa, tendo-se em vista que esta não gastou para a sua restituição, repassando os custos do vício do produto.

Com a inversão do ônus da prova o consumidor se viu muito mais incentivado a pleitear na justiça qualquer direito decorrente de dano provocado por produto ou serviço oriundo de acidente de consumo. Dessa forma, os fornecedores se viram obrigados a aumentar o controle de qualidade de seus produtos e serviços, ampliando-se a boa-fé e combatendo-se a fraude. Aqui, mais que disposição econômica positiva, o CDC ganha valor como regra normativa deontológica.

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5. BIBLIOGRAFIA

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Referências

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