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Cad. Saúde Pública vol.21 número5

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Academic year: 2018

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1609

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 21(5):1609-1611, set-out, 2005 CARTAS LETTERS

Infecção, soropositividade e doença: qual a diferença?

Infection, seropositivity, and disease: what is the difference?

Filipe Dantas-Torres 1

1Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz, Recife, Brasil.

Correspondência F. Dantas-Torres

Departamento de Imunologia, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz. Av. Moraes Rego s/n, Recife, PE

50670-420, Brasil. filipe.vet@globo.com fdt@cpqam.fiocruz.br

Senhor Editor,

O artigo Leishmaniose em Cães Domésticos: Aspectos Epidemiológicosde autoria de Silva et al. 1, publicado em Cadernos de Saúde Públicano volume 21, núme-ro 1, de janeinúme-ro-fevereinúme-ro do presente ano, trata de as-pectos importantes relacionados à leishmaniose vis-ceral canina, o que, por sua vez, diz respeito à histó-ria natural da leishmaniose visceral americana, uma vez que os cães são apontados como principais reser-vatórios domésticos da infecção por Leishmania

(Leishmania) chagasi(= L. infantum), o agente etio-lógico da doença.

O trabalho traz à tona a antiga questão dos méto-dos sorológicos (IFA e ELISA) que são utilizaméto-dos, a meu ver, erroneamente, como critério diagnóstico defini-tivo da infecção em cães, no Brasil. Do mesmo modo, os autores chamam atenção para a subestimação das taxas de infecções em cães, quando da utilização de tais técnicas sorológicas. Recomendam ainda, a utili-zação da técnica Western blot (WB) para detecção de antígenos específicos, tais como o peptídeo 68,5kDa, citado como parâmetro para eliminação de cães em áreas onde a leishmaniose visceral americana é en-dêmica.

Entretanto, alguns equívocos conceituais e meto-dológicos necessitam ser comentados para que os re-sultados desse trabalho, importante no âmbito do Programa de Controle da Leishmaniose Visceral, no Brasil, não sejam interpretados erroneamente.

Peguemos como exemplo um trecho do início da discussão, na página 326: “uma alta prevalência (25,0%) de cães infectados pela LVA”. Primeiramente, os 25,0% a que os autores se referem foi a soropositividade ob-tida por meio da IFA, e não a infecção, como está es-crito no trecho. Poderíamos predizer, pela presença de anticorpos anti-L.(L.)chagasi, que os referidos cães estariam infectados? Não necessariamente. A possibilidade de reações cruzadas, na IFA ou no ELISA, já é fato sobejamente demonstrado em nosso meio. Adicionalmente, anticorpos maternos podem ser transferidos para a prole, sem que a infecção o seja.

Logo, afirmar que os cães soropositivos na IFA este-jam, necessariamente, infectados é um erro corri-queiro que nós, pesquisadores, não podemos mais cometer, no Brasil.

No mesmo trecho, e em outro na mesma página, os autores afirmam: “infectados pela LVA”. Um erro conceitual. Quem se infecta, se infecta pela L. (L.)

chagasi, tornando-se, eventualmente, soropositivo e/ou doente. Esse conceito parece mais claro quando estamos nos referindo à AIDS, por exemplo. O indiví-duo se infecta com o vírus HIV (infecção), podendo ou não, desenvolver a AIDS (doença).

Não obstante aos pequenos erros conceituais, aqui exemplificados, os autores chegaram a conclu-sões precipitadas sobre alguns dos resultados, que careceriam de maiores detalhamentos estatísticos em se tratando da epidemiologia, uma ciência emi-nentemente quantitativa. Por exemplo, se fazem au-sentes no texto os cálculos da sensibilidade, especifi-cidade e, não menos importante, dos valores prediti-vos, necessários para avaliar o real desempenho das técnicas diagnósticas IFA e WB, utilizadas no estudo.

Registro ainda, a falta de discussão de alguns re-sultados importantes. Também na discussão, no últi-mo parágrafo da página 326, observeúlti-mos o trecho: “cães que no início têm títulos baixos e após algum tempo passam a apresentar títulos altos (160), em geral permanecendo assintomáticos”. Que os cães po-dem apresentar oscilações no título de anticorpos anti-L. (L.) chagasi, isso sabemos. Por outro lado, o fato de alguns animais assintomáticos apresentarem títulos ≥160, necessitaria de uma discussão mais aprofundada, pois tal fato não condiz com a literatu-ra. Em geral, títulos altos estão, quase sempre, asso-ciados à doença. Tal fato deve-se à exacerbação da resposta imune humoral, gerando a formação de grande quantidade de complexos imunes (antígeno-anticorpo) circulantes, que por sua vez irão resultar, em última instância, em lesões em vários órgãos e/ou sistemas.

De fato, tais equívocos não tiram o mérito cientí-fico do trabalho em questão. Entretanto, servem co-mo exemplo para futuras publicações sobre o tema, revelando não só a necessidade de definir claramente as variáveis a serem abordadas, respeitando os velhos paradigmas (ou então, propondo novos), mas tam-bém a importância de não desvincular, dos resulta-dos, a estatística; um dos eixos principais da epide-miologia moderna.

1. Silva AVM, Paula AA, Cabrera MAA, Carreira JCA. Leishmaniose em cães domésticos: aspectos epi-demiológicos. Cad Saúde Pública 2005; 21:324-8.

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