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O TRABALHO COM OS PAIS NA ANÁLISE DE CRIANÇAS

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSO

PSICANÁLISE E LINGUAGEM: UMA OUTRA PSICOPATOLOGIA

O TRABALHO COM OS PAIS NA ANÁLISE DE CRIANÇAS

ISABEL PARREIRAS HORTA NAPOLITANI

Orientadora: BEATRIZ OLIVEIRA

Monografia apresentada como parte dos requisitos para o certificado de Especialização

(2)

RESUMO:

Isabel Parreiras Horta Napolitani: O trabalho com os Pais na análise de crianças.2008 Orientadora: Beatriz Oliveira

Palavras chaves: Laço entre pais e filhos, a escuta analítica, entrevistas preliminares, Retificação Subjetiva.

O objetivo deste trabalho foi circunscrever o que há no laço entre pais e filhos no âmbito analítico e, a partir desta limitação, pensar sobre a função do trabalho realizado com os pais de uma criança em análise.

Parto do princípio de que existe um trabalho a ser realizado com os pais e levanto a questão sobre qual a função deste trabalho, já que os pais não se apresentam como pacientes; não solicitam análise. Assim, eu me pergunto se é possível correlacionarmos o trabalho com os pais ao trabalho inicial de qualquer tratamento analitico.

Desta forma o trabalho está dividido em duas grandes partes: numa primeira, encontra-se a delimitação do que há na relação entre pais e filhos; na segunda, ocorre a caracterização do que Freud chamava de tratamento de ensaio e Lacan chamava de entrevistas preliminares.

(3)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 01

Capitulo I – A Cena Inicial

04

a) Criança / infantil/ sujeito 05

b) Sobre a constituição do sujeito 10

c) Os pais e o sintoma da criança 14

Capítulo II- O Encontro com a fala dos pais

18

Capítulo III- A Posição dos Pais

24

Capítulo IV– Sobre o inicio do Tratamento na obra Freudiana

29

CapítuloV- Primeiras entrevistas em Lacan e a questão da

transferência

34

a) Entrevistas preliminares 36

b)Transferência em Lacan 43

CONCLUSÃO 47

(4)

Agradecimentos:

Gostaria de agradecer a Sandra Dias pelo grande prazer que foi fazer esse curso e pela escuta valiosa das supervisões .

A Bia Oliveira, pelo acolhimento e delicadeza e principalmente pela transmissão da psicanálise que foi feita no percorrer destes dois anos de convivência.

Ao meu marido, que sempre me acompanhou nas minhas apostas e nas mudanças da minha vida.

E a todos os meus “companheiros’ que de uma forma ou de outra estiveram presentes neste meu caminhar .

A Rita e a Equipe da triagem do Lugar de Vida.

E a minha família e a todas as famílias e pacientes que viabilizaram a construção deste saber.

(5)

INTRODUÇÃO:

Este trabalho tem o objetivo de circunscrever o trabalho inicial de um analista na análise de crianças. Parto da hipótese de uma especificidade neste campo. A psicanálise com crianças já foi e é muito debatida no meio analítico, principalmente no que diz respeito ao trabalho com os pais, mas não pretendo abordar neste trabalho os impasses discutidos nesta clínica, e, sim, partir das especificidades que este trabalho impõe ao analista.

Em minha experiência na análise com crianças, sempre me deparei inicialmente com a fala dos pais. Já que as crianças não chegam ao consultório sózinhas, são seus pais que a apresentam, principalmente através de suas queixas.Assim, a primeira questão que se apresentava para mim era o que fazer com essa fala inicial dos pais e como articulá-la ao tratamento dessa criança.

Desta forma, me deparava com uma variedade e um enorme numero de queixas a respeito da criança e um pedido dos pais para que todos esses “problemas” desaparecessem. Neste pedido de tratamento para seus filhos, os pais trazem o pedido de supressão do sintoma.

Para a psicanálise, o sintoma aponta para o desejo inconsciente, para o sujeito. O sintoma representa o ponto de impasse e de insistência do sujeito do inconsciente. A psicanálise lacaniana irá operar a partir do conceito de sujeito do inconsciente. Há um sujeito em jogo. Aqui, algumas perguntas se apresentam: o que essas queixas revelam? Quem está sofrendo? Será que essas queixas são sintomas? O que é isso de que os pais se queixam? O que está em jogo no laço entre pais e filhos?

(6)

começar a construção de todo o seu arcabouço teórico. Assim, a célula elementar da psicanálise se constituiu através de um sujeito que se dirigia a outro para falar das suas dores, dos seus sintomas.

No caso da análise com crianças, são os pais que trazem suas queixas em relação aos filhos e solicitam análise para esses. Portanto, inicialmente temos (teoricamente), neste primeiro tempo, os seguintes componentes: os pais, a criança, as queixas, o sintoma e os sujeitos em jogo. Como operar e correlacionar todos esses elementos? E, principalmente, qual é a função da escuta dos pais na análise de uma criança?

Em uma análise, o que se revela é a estrutura do inconsciente, isto é, como o Outro está constituído para o sujeito. Portanto como a escuta dos pais podem interferir na análise do filho? E, ainda, como explicar o que ocorre quando escutamos os pais e constatamos os efeitos terapêuticos que este trabalho produze na criança?

Assim, acho fundamental que esses elementos possam ser discriminados e principalmente relacionados, para que só assim o analista possa dirigir seu trabalho nesta clínica. Em relação a escuta da fala dos pais, me pergunto se o trabalho com eles tem a mesma forma do que Lacan chamou de entrevistas preliminares , já que parto de hipótese de que há um trabalho a ser realizado com esses.

Freud alerta, no seu texto Novas conferências introdutórias sobre a Psicanálise (1932-36), para o papel e a importância dos pais no tratamento de crianças, principalmente no que se refere às resistências em jogo. “(...) Quando os pais são substrato da resistência, podem pôr em perigo a análise e inclusive o desenvolvimento da mesma, pelo qual, às vezes, faz-se necessário relacionar à análise da criança certa influência analítica dos pais (...)” (Freud,1932,pág 181)

(7)

Portanto, pretendo neste trabalho discutir e circunscrever: 1- A fala dos pais e o que elas revelam.

2- A posição dos pais e da criança: o que há nesse laço?

(8)

C

APITULO

I

A

C

ENA

I

NICIAL

Ao pensarmos na análise de crianças, necessariamente partimos da especificidade que este trabalho impõe ao analista, isto é, o encontro com os pais. Estes, geralmente, chegam ao consultório do analista trazendo seu filho e solicitando ajuda para ele. Neste trabalho iniciamos sempre por meio “da real dependência do sujeito infantil em relação aos adultos” (Oliveira, 1999, p. 01). Essa criança aparece através de sua condição estrutural, isto é, submetida aos pais. Ela vem, porque os pais querem, porque ela está no foco desta queixa inicial.

Dentro do meio psicanalítico, a questão de escutar e, assim, incluir ou não os pais no tratamento analítico dos filhos, já foi muito discutida. Principalmente no embate entre Anna Freud e Melanie Klein sobre a análise de crianças. A primeira, defendia que, no tempo da infância, a criança se encontraria num estado de total dependência desses pais. Ela encontraria-se num tempo de constituição do aparelho psíquico e isto impossibilitava a existência da transferência e do trabalho analítico. Já Melanie Klein partia do ponto oposto, e afirmava que em crianças bem pequenas, a estrutura do inconsciente já estaria colocada. O trabalho, portanto, só se referiria às fantasias da criança e o contato com os pais deveria ser realizado o mínimo possível.

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Ao retornar à obra freudiana, Lacan irá resgatar toda a estrutura e o funcionamento do inconsciente. E, assim, irá resgatar o material de análise.A partir deste regate ele irá circunscrever melhor o que nomeou de campo simbólico.

Ao partirmos deste ponto, é necessário nos perguntarmos então sobre o que há no laço entre pais e filhos (1) e, assim, podermos responder nossa pergunta inicial sobre que trabalho é este a ser realizado junto aos pais.

Sauret afirma:

Acho que devemos deixar o lugar para a insondável decisão do ser, pois a resposta do sujeito

não é a resposta à psicologia de seu pai ou de sua mãe, mas ao tipo de Outro com o qual ele se

confronta, o que é induzido como Outro, independente da atenção ou dos esforços pedagógicos

de seus pais. (pag 51, 1998)

Para podermos responder esta primeira questão, é necessário que possamos estabelecer e circunscrever as diferenças entre os conceitos Criança, Infantil e Sujeito, pois na clinica estamos diante dos três; mas a psicanálise irá operar apenas a partir do conceito de sujeito e do infantil.

a)

Criança / infantil / sujeito

(10)

Sobre o sujeito, Sauret afirma que Freud propõe uma ruptura entre organismo e o sujeito. Há de um lado um corpo como imaginário, tecido por representações e do outro, a pulsão. O conceito de sujeito será usado “para explicar a ligação nova entre organismo, corpo e o sujeito; a necessidade se transmuta em pulsão (pág. 15, 1998). O que está presente nesta estrutura teórica é uma ruptura, na qual o que aparece é o organismo banhado na estrutura da linguagem. E será a partir deste (des)encontro que e o sujeito irá se constituir. “Não há sujeito fora da linguagem” (pág. 16). Sauret afirma que é preciso que à necessidade venha juntar-se a demanda, para que surja o sujeito. “O sujeito não se desenvolve. Ele não tem idade” (pág 17, 1998). Ele sintetiza o conceito de sujeito como sendo uma resposta do real ao significante. “Aí se introduz a dialética do sujeito e do Outro: simbolização primordial, desdobramento da cadeia significante, metáfora paterna, etc” (pag 16, 1998).

O infantil, ele o define como “os traços do gozo do Outro” (pág. 21, 1998) e, mais adiante, revela que são esses traços que Freud designará com o termo de fixação. E conclui: “o termo pueril (enfantin) designa o que do indivíduo se desenvolve; o termo sujeito designa a resposta do real ao encontro do significante; e o termo infantil designa expressamente o que da criança não se desenvolve(...) (Sauret,1998,pág 22)

(11)

O organismo humano é, a principio, incapaz de promover essa ação específica. Ela se efetua

por ajuda alheia, quando a atenção de uma pessoa experiente é voltada para um estado infantil

por descarga através da via de alteração interna. Essa via de descarga adquire, assim, a

importantíssima função secundaria da comunicação, e o desamparo inicial dos seres humanos é

a fonte primordial de todos os motivos morais (Freud, pág 431, 1950 [1895]).

Desta forma, Freud refere-se às primeiras marcas no aparelho psíquico através desta ajuda alheia. Há um outro que viabiliza a “saída” deste desamparo inicial dos seres humanos. Este outro ser humano mais experiente introduz e auxilia nesta ação específica, isto é, uma descarga que proporciona uma alteração interna. Portanto, há uma passagem a ser feita que é sustentada por “uma pessoa mais experiente”.

Lacan retorna à obra de Freud a partir deste ponto, há uma experiência de satisfação a partir da qual ocorre a constituição do Outro, e estabelece a diferença entre a necessidade e a demanda. Há uma inscrição primordial com a entrada na linguagem e o seu efeito é o desejo. Lacan irá trabalhar com o conceito de Outro; ele propõe ir além a do semelhante que Freud se refere.

Nomine, no seu artigo o Autista: Um escravo da Linguagem, escreve:

O que é o Outro na teoria lacaniana?

1. É uma instancia simbólica, lugar do código significante.

2. É o parceiro do sujeito, uma vez que esse sujeito aliena seu ser nos significantes desse Outro.

3. É uma alteridade, ou seja, uma entidade que escapa à mestria do sujeito, é um parceiro

caprichoso, enigmático e, a partir disso, pode-se supor-lhe um desejo.

4. O Outro é inconsistente ou, dito de outra forma, ele não pode responder a tudo nem responder

de todo.

(12)

Deste modo, estamos diante do conceito de Outro, que irá sendo tomado de formas diferentes, conforme os períodos da obra lacaniana, assim como a maioria dos seus conceitos.

Sauret irá fazer a leitura do sujeito a partir da:

experiência inaugural de insatisfação, a primeira provocação da fome – que o sujeito não

pode identificar como tal, por falta de significante. É o Outro que transforma o grito da

necessidade em apelo e que articula a uma demanda que ele aluga ao sujeito que ele supõe:

Gritas? Tens fome? Queres o seio ou a mamadeira? (pág. 19, 1998)

Desta forma, o que Lacan aponta é para a entrada do sujeito na linguagem, numa estrutura que antecede o sujeito e os movimentos deste diante desta “escolha forçada”. O Outro, para o sujeito, irá se constituir a partir deste (des)encontro. Isto irá ampliar a noção que Freud nos apresenta do outro presente na cena do desamparo inicial.

Nomine , afirma:

A inscrição significante só é possível sob a condição de que exista Outro, quer dizer, não

tanto o lugar do significante (esse lugar jamais falta), mas um parceiro que o encarne e que

troque objetos com o sujeito. Esse é o principio do que é considerado a entrada no discurso do

Outro pelo viés de suas demandas”. E, mais adiante, ele afirma: “O significante precede o

sujeito, mas o Outro não”. (pág. 14, 2001)

Petri afirma:

A entrada no mundo humano, ou seja, o mundo falado, é realizada por um agente de

linguagem, um Outro primordial perfazendo a transmissão da própria linguagem, leito a partir

do qual o sujeito pode nascer. Essa entrada na linguagem é, então, flagrantemente traumática

(13)

Assim, encontramos na obra lacaniana o sujeito e Outro. O sujeito está situado a partir da estrutura da linguagem e a constituição do sujeito marca a entrada deste nesta estrutura. Lacan afirma que esta inserção sempre é feita a partir de uma falta. Ao entrar na linguagem, o sujeito se depara com uma falta que o constitui, pois o sujeito nunca é representado pela sua totalidade. O sujeito do inconsciente para Lacan é um sujeito dividido. Ele se apresenta através de uma irrupção no discurso.Ele é efêmero.

Dor escreve:

No discurso,o Eu (je) é o lugar onde o sujeito se produz como aquele que fala. Vimos que

esta particularidade tópica devia-se ao próprio status do sujeito: o sujeito só advém no discurso

e pelo discurso, para, aliás, de imediato eclipsar-se. Este fading do sujeito provém da relação do

sujeito com o próprio discurso, tal como Lacan precisou sua ocorrência no fato “que um

significante é o que representa um sujeito para outro significante”. (pág 155, 1989)

O sujeito é um operador conceitual fundamental e será trabalhado de diversas maneiras, dependendo do período da obra lacaniana. Num primeiro período, Lacan irá fazer essa articulação através do esquema L, no qual ele irá articular a relação do Je e do Outro ao discurso. Neste período, Lacan irá reler a obra freudiana através da lingüística, da Antropologia, da Filosofia e de outras ciências de sua época e, assim, irá construir sua teoria do significante. Nela, estão presentes as cadeias de significantes, suas formas de funcionamento: metáfora e metonímia e a presença do sujeito do inconsciente, que impulsiona a cadeia.

(14)

significantes é constituída por pelo menos dois significantes, e nesta operação existe sempre uma perda (objeto a) e a presença do sujeito do inconsciente.

Lacan continuará articulando a constituição do sujeito, através de várias formas como: Estádio do Espelho, os três tempos do Édipo, a Metáfora Paterna, o grafo do desejo, a Alienação e Separação, até chegar às suas últimas formulações. Não pretendo neste trabalho me deter neste ponto, porém, me parece fundamental discriminar esse vetor sujeito e Outro, a constituição do sujeito e o papel dos pais. Pois o que está em questão para a psicanálise lacaniana é a relação do sujeito com o Outro; portanto, como o Outro está constituído para o sujeito e, principalmente, como o sujeito se constitui.Há uma operação a ser efetuada, pois o sujeito não está presente desde o início da vida no ser humano, ele se constitui.

b) Sobre a constituição do sujeito

Lacan, no seminário IV, nos adverte para a questão da falta de objeto correlacionado ao laço da mãe e de seu bebê. Como Freud já assinalava nos seus textos, no ser humano o objeto está para sempre perdido, porém é eternamente procurado. Lacan irá partir da falta de objeto para poder situar a constituição do sujeito na relação com o Outro.

A dolorosa dialética do objeto, ao mesmo tempo ali e nunca ali, em que ela se exercita, nos é

simbolizada neste exercício genialmente captado por Freud em estado puro, na sua forma

isolada. Esta é a base da relação do sujeito com o par presença – ausência, relação com a

presença sobre o fundo de ausência, e com a ausência na medida que esta constitui a presença.

A criança aniquila, na satisfação, a insaciedade fundamental dessa relação. Ela adormece o jogo

na captação fundamental dessa relação. Ela adormece o jogo na captação oral. Sufoca aquilo

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O ser humano está exposto desde o seu nascimento ao jogo da falta de objeto. Para Lacan, o que existe é uma relação ternária, na medida que a criança está colocada como objeto, a mãe como agente e o falo como causa. No seminário IV, ele irá nomear e explicitar toda a dinâmica da inscrição e instauração da falta simbólica no aparelho psíquico, isto é, como o falo se inscreve no aparelho e assim como ele será tomado como significante. Acho fundamental demarcar e lembrar que, inicialmente (primeiro tempo do Édipo), o sujeito se constitui a partir da posição de objeto do Outro. É deste lugar que o sujeito irá se oferecer a fim de ocupar um lugar no desejo do Outro. Será a partir do segundo tempo do Édipo, e de todos os seus tempos, que irá se constituir um lugar de onde será possível se instaurar a pergunta sobre o desejo do Outro, Che Vuoi? Assim, para Lacan, temos no final do Édipo a inscrição da falta simbólica.

Romildo do Rego Barros, num artigo da Revista Fort-Da Um Corpo De Criança, afirma:

Já se tornou uma idéia corrente, a de que a criança, ou o sujeito, começa o seu percurso

como objeto. Objeto do Outro, da sua demanda, como Freud apontou quando citou “os cuidados

maternos” como uma forma primitiva de sedução. . (pág 64, 1991)

(...)

Desta forma, são as interpretações do Outro, do Outro materno em particular, que vão no

começo situar para a criança o seu desejo”. (...) O que permite também que o objeto, condição

primeira do sujeito, como eu disse antes, possa aparecer como fálico, como imaginário, como o

que falta à mãe e vai sempre faltar, e não como objeto real, como aquilo que a mãe perdeu de

(16)

Romildo aqui faz uma crítica à posição freudiana na qual para a mãe, o bebê ocupa apenas uma resposta ao Penisneid da mulher.Para ele o que aparece é o jogo das faltas e não das compensações.

Portanto, Lacan irá começar a construir e a descrever, como já foi explicitado a cima, a constituição do sujeito através das inscrições da falta no aparelho, porém será apenas no seminário V que ele irá nomear e formular os três tempos do Édipo. O Édipo para Lacan é constituído por três tempos lógicos nos quais há a inscrição simbólica da falta.

No primeiro tempo, o filho é tomado como falo, a mãe tem o falo e o pai está velado. A criança se identifica ao que supõe ser o objeto de desejo da mãe. E a mãe, por sua vez, posiciona a criança neste lugar. Existe uma falta que é tamponada por esta dupla.

No segundo tempo, esta unidade é abalada, há algo além no desejo da mãe que a criança não consegue abarcar. O pai aqui está revelado. O pai media do lado da mãe a perda do falo e, do lado da criança, a perda do objeto. Essa mediatização vem através da lei contra o incesto, a dupla proibição, “não integrará teu produto e não deitarás com a tua mãe”. No discurso materno há uma lei que a interdita. A criança é destituída do lugar fálico.

No terceiro tempo, o pai está como doador, o pai tem o falo e pode oferecê-lo a criança. Se trata de um pai potente. O falo circula na estrutura. A falta se inscreve. O pai oferece os significantes paternos. A metáfora paterna se instaura, e o falo pode ser articulado como significante. Aqui existe a passagem da posição de ser o falo para ter o falo. O falo aqui assume um estatuto de objeto simbólico.

(17)

como um ordenador desta e a questão do desejo do Outro se presentifica. Portanto, o Édipo irá revelar a instauração da ordem simbólica, da falta simbólica no âmago do ser.

No final do seminário V e no seminário VI, ele irá articular a constituição do sujeito a toda engrenagem da cadeia significante. Ele fará isto através do Grafo do desejo. A célula elementar do grafo aponta exatamente para a entrada do ser na linguagem. Aqui, ele irá partir da primeira experiência de satisfação, nela se inscreve a passagem da necessidade à demanda, na qual o desejo se constitui. Lacan, desta maneira, retoma o ponto da constituição do sujeito, através da entrada do sujeito na linguagem, ocorrendo aí uma substituição, na qual o grito se transforma em chamado, “onde ocorre a substituição das necessidades pelo significante”. Estamos no primeiro tempo do Édipo.

No texto A Direção do Tratamento, ele escreve:

Ora, convém lembrar que é na demanda mais antiga que se produz a identificação primaria,

aquela que se efetua pela onipotência materna, ou seja, a que não apenas torna dependente do

aparelho significante a satisfação das necessidades, mas que fragmenta, as filtra e as molda nos

desfilamentos da estrutura do significante. (pág 624)

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Porém, sobre a entrada do sujeito na linguagem, Lacan irá apontar a inscrição na estrutura da linguagem e o que se presentifica são as funções que operam ou não no aparelho e isto irá responder ao trajeto particular de cada um na constituição do aparelho psíquico.

c) Os pais e o sintoma da criança

Lacan marca a posição do sintoma da criança na sua famosa carta à Jenny Aubry. Ele inicia o texto pontuando a função da família conjugal como resíduo e manutenção do que há de irredutibilidade de uma transmissão. Há uma transmissão, e esta transmissão se efetua no campo, na ordem da constituição subjetiva, no âmbito familiar. A transmissão aqui se refere aos elementos necessários para que haja sujeito, e nela o que opera é um desejo que não seja anônimo.

Lacan nomeia as funções que estão presentes nesta transmissão: a função da mãe através dos “cuidados que têm a marca de um interesse particularizado, ainda que seja por intermédio das suas próprias faltas” e a função do pai “na medida em que seu nome é o vetor de uma encarnação da Lei no desejo” (pág. 13, 1969).Portanto, essa transmissão terá como base tanto um desejo, que não seja anônimo, como uma lei, uma ordenação.

Para Lacan:

o sintoma da criança acha-se em condição de responder ao que existe de sintomático na

estrutura familiar. E afirma que este “sintoma pode representar a verdade do casal familiar. Esse é o

caso mais complexo mas também o mais acessível a nossas intervenções. (pág. 13, 1969).

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o tamponamento da verdade, verdade que aponta para a não existência da relação sexual. Isto é, não existe o par, a completude; a castração sempre está presente .

Ele esclarece que na psicanálise, “o sintoma define-se como representante da verdade”do sujeito.

Há também um outro “tipo de sintoma”, que diz respeito a subjetividade da mãe, isto é, correlata a uma fantasia que a criança estaria implicada. Aqui, a criança se apresenta, se torna “objeto” da mãe, pois não ocorreu a distância, a mediação, operada pela função paterna, entre a identificação com o ideal do eu e o desejo da mãe, na qual “deixa a criança aberta as capturas fantasmáticas”.

Lacan escreve:

a criança realiza a presença do que Jacques Lacan designa como objeto a na fantasia”. A

criança, ao substituir esse objeto satura, tampona a modalidade de falta “em que se especifica,o desejo

(da mãe). (Lacan,pág. 13, 1969)

Desta forma, a criança aliena em si qualquer acesso possível da mãe a sua própria verdade, dando-lhe corpo, existência e até a exigência de ser protegida. (Lacan,pág. 13, 1969)

Ele ainda afirma que o sintoma somático oferece garantia a esse desconhecimento e “é usado, conforme o caso a atestar a culpa, servir de fetiche ou encarnar a recusa primordial”. E termina afirmando que, nestes casos, “na relação dual com a mãe, a criança lhe dá, imediatamente acessível, aquilo que lhe falta ao sujeito masculino; o próprio objeto de sua existência, aparecendo no real”.

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ao tomar o filho na posição de objeto. Essa mulher está cindida nestas duas posições, e é desta divisão que se trata no laço da mãe com o filho.

Já no caso do sintoma somático, a criança se posiciona como o próprio objeto, aparecendo no real, tamponando desta forma qualquer acesso possível da mãe a sua própria verdade.

Miller, no texto A criança entre a mulher e a mãe (1998) refere-se ao seminário IV de Lacan, através do tema central da função da castração e principalmente da relação mãe/criança. Sobre esta ele afirma:

É preciso, ainda, que a criança não sature, para a mãe, a falta em que se apóia o seu desejo.

O que isso quer dizer? Que a mãe só é suficientemente boa se não o é em demasia, se os

cuidados que ela dispensa a criança não há desviam de desejar enquanto mulher.

(...) a função do pai não é suficiente; é preciso, ainda, que a mãe não esteja dissuadida de

encontrar o significante de seu desejo no corpo de um homem. (pág 32, 1998)

Portanto, diante de um filho, o que se apresenta é a função paterna, materna e as respectivas divisões homem e mulher.

Miller formula:

(...) o objeto criança não somente preenche, como também divide,e digamos que é isso que

o titulo deste colóquio ressalta. É essencial que ele divida.Como já se assinalou,é fundamental

que a mãe deseje outras coisas alem dele.Se o objeto criança não divide, ou ele sucumbe como

dejeto do par genitor,ou,então,entra,com a mãe numa relação dual que o alicia- para empregar o

termo de Lacan- o alicia com fantasia paterna. (pág,32,1998)

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questão que se apresenta é o lugar que ocupa a criança para sua mãe e, principalmente, como esta se posiciona diante desta divisão que se instala. Ele ainda adverte para o fato de que, se esse lugar que a criança ocupa, numa neurose, for de tamponamento, iremos encontrar a mãe angustiada, já que a angústia se revela com a falta da falta. “A mãe angustiada é, inicialmente, aquela que não deseja, ou deseja pouco ,ou mal, enquanto mulher”.

Sauret afirma:

O que se trata aqui é do lugar que ocupa a criança para sua mãe. Mas a criança pode

subjetivar a sua relação com a mãe de maneira completamente diferente. Se não fosse assim,

não se faria psicanálise, porque não se poderia mudar nada da posição da criança. Mas no que

concerne a sua estrutura é um outro problema (pág. 91, 1997).

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Capítulo II - O Encontro com a fala dos pais.

Para podermos pensar sobre este encontro com a fala dos pais e da criança é possível partir do texto Intervenções Sobre a Transferência: “Numa psicanálise, com efeito, o sujeito propriamente dito constitui-se por um discurso em que a simples presença do psicanalista introduz, antes de qualquer intervenção, a dimensão do diálogo” (Lacan, 1951). Lacan faz essa afirmação, nesta época da sua obra, para se referir e retificar o curso no qual a psicanálise se orienta, isto é, a questão da verdade do sujeito. Verdade esta que se faz presente através da fala do paciente.

(23)

Ele define o simbólico como:

É de fato assim que devemos entender o simbólico de que se trata na troca analítica. Quer se

trate de sintomas reais ou atos falhos, ou o que quer que seja que se inscreva no que

encontramos e reencontramos incessantemente, e que Freud manifestou como sendo sua

realidade essencial, trata-se ainda e sempre de símbolos, e de símbolos organizados na

linguagem, portanto funcionando a partir da articulação do significante e do significado, que é o

equivalente da própria estrutura da linguagem. (Lacan, pág.23, 1953).

Mais a frente, sobre a ordem imaginária, ele afirma;

É preciso, em qualquer noção analítica coerente e organizada do eu, distinguir

absolutamente a função imaginária do eu como unidade do sujeito alienado em relação a si

mesmo. O eu é isso em que o sujeito só pode se reconhecer inicialmente alienando-se”. (Lacan,

pág. 30, 1953)

No seminário II, no capítulo Introdução ao grande Outro, Lacan chama atenção para o fato de que não há imagem de identidade, de reflexividade, e sim que, o que há é uma relação de alteridade fundamental. E afirma que há de se distinguir dois outros, um outro com A maiúsculo e um outro com a minúsculo (eu-moi). É do Outro que se trata na função da fala na psicanálise.

Em seguida, Lacan irá apresentar o esquema L. Neste, ele afirma que é importante esclarecer os problemas levantados pelo eu e o outro, pela linguagem e a fala.

Se a fala se fundamenta na existência do Outro, o verdadeiro, a linguagem é feita para

remetermos de volta ao outro objetivado, ao outro com o qual podemos fazer tudo o que quisermos,

inclusive pensar que é um objeto, ou seja, que ele não sabe o que diz. Quando fazemos uso da

(24)

linguagem serve tanto para nos fundamentar no Outro como para nos impedi-lo de entendê-lo. E é

justamente disto que se trata na experiência analítica. (pág. 308, 1954-1955)

Lacan esclarece que é com os semelhantes que o sujeito se identifica imaginariamente. E continua propondo a distinção entre o registro imaginário e o simbólico. Porém, ele afirma que é o grande Outro que o sujeito visa quando fala, o que ele chamou de uma fala verdadeira, mas o sujeito sempre a alcança por reflexão. “O sujeito está separado do Outro pelo muro da linguagem.” Estamos no campo simbólico.

Lacan retoma a cena analítica afirmando que

O que dizemos, não o sabemos, porém o endereçamos a alguém. Temos a ilusão que a fala

vem do próprio eu. Porém, se o analista acreditar que deva responder daqui, (à), ele ratifica a

função do eu, que é justamente aquela por intermédio da qual o sujeito se acha desapossado de

si mesmo. (1954-55, pág. 309)

Assim, ao falar a um outro, o que a escuta analítica vai privilegiar é esse endereçamento do sujeito ao grande Outro. Portanto, a relação com o semelhante está totalmente atravessada pelo Outro. O conceito do grande Outro, neste momento do seminário dois, está atrelado a idéia do tesouro dos significantes.

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O analista ao apontar para a posição de cada um diante do filho, possibilita, já no inicio, que os pais possam aparecer como sujeitos.Desta forma ele opera uma primeira separação na qual viabiliza com que cada um possa ser implicado no sintoma do filho e assim possa suportar as mudanças na posição do filho durante o processo de análise deste.

Rego Barros afirma:

Os pais nessa posição de sujeito permitem também que a mensagem da criança chegue a seu

destinatário, o lugar do Outro.Deste lugar do Outro, que aí aparece falho, a mensagem pode

finalmente retornar tanto para os pais como para a criança, permitindo a ela se posicionar frente

a esse discurso e a esse desejo que a constitui como sujeito,se implicando na demanda que

assume como sua. (pág. 04, 1995)

Numa entrevista dada a revista Registros, Guy Trobas (2002) afirma a importância de verificarmos que lugar ocupa o sintoma da criança no discurso dos pais, para assim poder ler a posição do filho no desejo deles. Ele ressalta a importância da existência de um primeiro tempo de escuta dos pais, onde será possível ter uma orientação do trabalho a ser efetuado, pois não há um plano definido previamente. Ele levanta questões que podem nortear cada caso como: há quanto tempo este sintoma existe e porque estão pedindo ajuda neste momento? O que desencadeou essa demanda? Quem sofre mais com este sintoma, o filho, os pais ou a escola?

(26)

importante também nos perguntarmos o que essas queixas sobre o filho falam da forma como cada um desta família se organiza diante da castração.

Acho importante apontarmos para a diferença entre a queixa que os pais trazem e o sintoma do filho. Em alguns momentos dentro da prática analítica já presenciei o desaparecimento da queixa inicial dos pais diante de algumas intervenções do analista. Por que isto ocorre? Entendo este efeito como resultado da escuta analítica dos pais, a qual opera a partir do endereçamento ao Outro e possibilita uma primeira intervenção terapêutica.Esta aponta para o tipo de demanda que os pais fazem ao filho.

Assim, quando os pais podem se reconhecer neste tipo de demanda, é possível um pequeno deslocamento que acaba por libertar a criança desta posição fixa que esta se encontrava. Portanto, a queixa muitas vezes aponta para o tipo de demanda que é feita a criança e esta acaba por responder deste lugar demandado, já que o que está em jogo para a criança é o lugar de ser amada pelos seus pais,isto é a possibilidade de corresponder à demanda do Outro.

Já o sintoma analítico se refere a uma resposta do sujeito a sua fantasia fundamental. Para que este possa ser mexido, é necessário todo o trabalho de uma análise, o qual irá revelar a posição do sujeito diante da castração e suas formas de tamponamento. Não pretendo neste trabalho apontar que trabalho é este na análise com crianças, porém, isto não deixa de ser um ponto importante a ser pensado e articulado, pois é possível presenciar, em muitos casos de análise com crianças, o término do tratamento analítico diante de uma pequena melhora no sintoma da criança.

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que seja localizado pelos pais na criança” (1998). Isto é, o pedido de análise para a criança geralmente é um efeito dos pontos de angústia dos pais, pois há algo que os pais localizam na criança que os angustiam. Muitas vezes, as crianças apresentam sintomas importantes que não angustiam os pais e, em função disto, eles nunca chegam a um consultório de um analista.

O sintoma de um sujeito é aquele através do qual aquele sujeito em particular se representa,

e ele só pode ser tomado enquanto tal no discurso daquele sujeito em particular. É preciso

portanto escutar a criança da mesma forma como se escuta qualquer sujeito em análise,pois se a

criança é o sujeito em questão,sua via de entrada para análise será também a de seu

sintoma,daquele que ela puder nomear.(Faria, pág. 81, 1998)

Assim como na análise com adultos, esta nomeação inicial do próprio sintoma também aponta para um trabalho preliminar a entrada em análise. Esta manobra diz respeito à mudança de posição do sujeito no inicio de uma análise, para que haja a entrada efetiva, isto é, deve haver uma implicação do sujeito no processo analítico, sem o qual não há como sustentar um processo analítico.Lacan nomeia este momento na sua obra, como retificação subjetiva

Ainda Faria; “O sintoma é então o sintoma de um sujeito,diz respeito ao desejo particular daquele sujeito,e a única forma de se ter acesso a esse desejo inconsciente é por seu discurso, através

do trabalho analítico”. (Faria,pág 84, 1998)

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CAPÍTULO III - A POSIÇÃO DOS PAIS

Ao articularmos o papel dos pais e a constituição do sujeito através da noção de funções, lugares, e não pessoas, é possível lermos a cena inicial, na qual um adulto cuida de uma criança, através da idéia de que este adulto está ali sustentando o que Lacan chamou de lugar do Outro. Este “oferece” um campo de linguagem e a transmite através de funções. Estas funções serão operadas a partir da falta estrutural de cada sujeito envolvido na cena. Assim, o que se transmite é a falta que está colocada na estrutura.

Sobre essas funções, é importante ressaltar que elas, principalmente a materna, não se apresentam desencarnadas. Faria irá fazer esta articulação no seu livro, Introdução à Psicanálise de crianças: O lugar dos pais e principalmente irá distinguir sujeitos, funções e lugares.

Nesse sentido, as relações que podemos estabelecer seriam: Dos sujeitos, homem e mulher

que são os pais, com as funções, que lhe cabem exercer,paterna e materna. Isso porque é

enquanto sujeitos desejantes, enquanto ”assujeitados” a seu inconsciente numa ordem de desejo

absolutamente particular, que eles poderão ocupar (ou não), para a criança ,determinadas

funções. É somente a partir de sua posição desejante que eles poderão encarnar as funções que

lhe cabe exercer. (Faria, pág. 73, 1998)

(...)

Existe ainda a relação entre o sujeito que é a criança e o lugar que ela ocupa,que depende

principalmente da subjetividade desses outros sujeitos em que são o pai e a mãe, ainda que não

se possa estabelecer uma relação causa-efeito entre o lugar que ela ocupa na estrutura familiar e

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Assim, os pais exercem funções e oferecem lugares a esta criança que acaba de nascer e estão constituídos como sujeitos. A criança, por sua vez, irá se posicionar diante desta oferta podendo se constituir como sujeito.

A criança, ao nascer, irá se situar num lugar, num lugar fálico. Este lugar responde a falta que opera nos próprios pais. Conseqüentemente, este lugar será sustentado a partir do investimento narcísico dos pais. E será a partir desta estrutura que a criança poderá encontrar um lugar, um lugar no desejo do Outro.

Este lugar que é oferecido diz respeito à posição do sujeito do inconsciente de cada um dos pais. Assim, cada um dos pais se posiciona diante da criança através de suas próprias posições subjetivas. Desta maneira, as queixas em relação a criança irão revelar as posições, tanto da mãe como do pai e, principalmente, a forma como esses pais e a própria criança se utilizam do sintoma. Num primeiro momento o que se apresenta é o equivoco, no qual a criança estaria completamente atrelada a seus pais.

Faria afirma:

Isso significa desvincular o lugar que ela ocupa para os pais (ou seja, no discurso deles) do

lugar em que ela mesma possa se colocar a partir desse discurso, o que consideramos ser a

grande vantagem dessa proposta. Elimina-se o risco de confundir a criança em análise com

aquela que falam os pais. (pág 91, 2003)

Desta forma me pergunto se neste trabalho é importante que possamos delimitar que lugar há para essa criança no discurso desses pais, quais os seus efeitos e, principalmente, a forma como a criança tem respondido a este lugar.

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sustentar a procura do tratamento, pois há um sofrimento em jogo. E este sofrimento irá receber vários nomes. Do que esses pais sofrem? O que angústia essa criança? Estamos diante de uma produção do inconsciente que pede por ser escutada.

Sergio Prestes afirma (2003) que os pais ao se dirigirem a um analista pedem que este elimine o sintoma de seu filho, isto é pedem a realização de um ideal que visa burlar a castração, uma realização impossível. Porém, é este mesmo investimento narcísico que está na base da relação dos pais com seus filhos. Ele pergunta: “Como recusar aos pais a realização de seus ideais, se devemos a eles a nossa existência? Como a criança pode constituir sua própria demanda, dissociada da demanda dos pais? A resposta é o sintoma da criança”.

Assim, o discurso dos pais é constituído pelo lugar que a criança ocupa para estes. E a criança por sua vez, é chamada a responder a estas demandas, e irá respondê-las a partir de suas próprias versões, a fim de tamponar a falta que se apresenta na demanda dos pais, ao mesmo tempo, que precisa “inscrever-se no discurso familiar e poderíamos mesmo dizer, ao seu modo de se fazer existir.O sintoma da criança advém como um meio de protege-la desta alienação no ideal dos pais(...)” (Prestes, 2003).

Para Petri:

A função dessa primeira inclusão dos pais é fornecer material significante para que o

analista faça uma leitura da resposta que a criança formula a essa determinada estrutura

discursiva, assim como precisar qual o lugar que a criança ocupa na fantasmática parental, ou

seja, produto de qual “não relação sexual” ela é.

Nas entrevistas com a criança, pode-se averiguar qual a sua leitura sobre a demanda

parental abrindo espaço para a construção de sua demanda, aquela que só ela pode formular,

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Portanto, há uma primeira escuta a ser realizada, na qual me parece necessário que o analista possa diferenciar o lugar que esta criança ocupa para seus pais, para cada um, e como cada criança irá responder a demanda dos pais. A questão sobre o que os pais demandam, ou não, de seus filhos, permeia todo este primeiro tempo de trabalho junto aos pais.

Rosário do Rego Barros, no seu texto A Resistência na Psicanálise com Crianças, afirma que, no trabalho com os pais, há a necessidade de se operar uma separação entre eles e o lugar que estes ocupam para a criança na cadeia de transmissão, lugar do Outro. Este trabalho está circunscrito, não apenas, mas principalmente, num tempo preliminar da análise de crianças.

Então, se nos dispomos a acolher a queixa dos pais e, a partir da demanda que eles fazem

para a sua criança, os convidamos a falar, o tempo que for necessário para retomar o trabalho

interrompido pela perplexidade desencadeada pelo sintoma da criança, veremos aparecer

certos efeitos desejados a este tempo que podemos chamar de preliminar à análise, que daí se

engajará, seja com a criança ou com um dos pais. Esses efeitos do lado dos pais vão no sentido

de descolá-los do lugar do Outro, de onde eles só podem sentir-se culpados com o que ocorre

com a criança, para permitir que eles apareçam como sujeitos divididos e, como tais, passiveis

de estarem implicados no sintoma da criança da qual se queixam (pág. 04, 1995).

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Capítulo IV –Sobre o inicio do Tratamento na obra Freudiana

A partir da obra freudiana, constatamos a existência de dois tempos numa análise, um primeiro no qual Freud denomina de tratamento de ensaio e um segundo no qual aconteceria o próprio tratamento.

Freud destaca, no seu texto Sobre o Início do Tratamento (1913), as suas orientações para este tempo anterior a análise. Aqui, a tarefa do analista é fazer a leitura da possibilidade do trabalho analítico com este novo paciente, uma seleção, já que, para Freud, é fundamental a possibilidade da existência da transferência e do manejo da análise através da interpretação. Para que isso ocorra, ele destaca a importância do diagnóstico diferencial pois para este, só é possível a análise no campo das neuroses transferenciais.

Este primeiro tempo possui as mesmas regras do tratamento propriamente dito, no qual o paciente é convocado a falar sobre seu sofrimento, porém, pede do analista um manejo específico, no qual viabiliza ou não a entrada no tratamento propriamente dito.

Freud esclarece:

Este experimento preliminar, contudo, é, ele próprio, o inicio de uma psicanálise e deve

conformar-se às regras desta. Pode-se talvez fazer a distinção de que, nele, deixa-se o paciente

falar quase o tempo todo e não se explica nada mais do que absolutamente necessário para

fazê-lo prosseguir no que está dizendo. (1913, pág.165)

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paciente escolha por onde quer começar a falar , geralmente ele inicia pela sua história, pela história da sua doença ou pelos seus sintomas.

Freud continua no texto apontando para a questão do diagnóstico. Ele relata que com muita freqüência, os pacientes chegam apresentando sintomas histéricos, obsessivos recentes ou com características que não são tão marcantes e que, aparentemente, teriam a indicação para o tratamento psicanalítico. Porém, ele alerta para um possível estádio preliminar do que é conhecido por demência precoce (esquizofrenia). Para Freud, fazer esta diferenciação não é uma tarefa fácil e um equívoco como este, pode impossibilitar qualquer “promessa de cura”, além de ocasionar prejuízos financeiros para o paciente.

Num tratamento experimental de algumas semanas, ele amiúde observaria sinais suspeitos

que possam determiná-lo a não levar além a tentativa. Infelizmente, não posso asseverar que

uma tentativa deste tipo sempre nos capacite a chegar à decisão certa: trata-se apenas de uma

sábia precaução a mais. (Freud, 1913, Pag. 166).

Outro ponto fundamental diz respeito a questão do estabelecimento da transferência. Ele relata a existência de um crescimento e um desenvolvimento da transferência.

Permanece sendo o primeiro objetivo do tratamento ligar o paciente a ele e à pessoa do

médico. Para isso nada precisa ser feito, exceto conceder-lhe tempo.

(...) O paciente por si próprio fará essa ligação e vinculará o médico a uma das imagos das

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No texto a Conferência XXVII - Transferência (1916-17), Freud descreve a transferência como o investimento inicialmente amoroso na figura do médico, que está sempre presente nos tratamentos e tem um papel importante na entrada no dispositivo analítico .

Ele afirma: “A transferência pode aparecer como uma apaixonada exigência de amor, ou sob formas mais moderadas;em lugar de um desejo de ser amada (...)” (pág. 515).

Em seguida: “Devo começar por esclarecer que uma transferência está presente no paciente desde o começo do tratamento e, por algum tempo, é o mais poderoso móvel de seu progresso”. (pág. 516).

Assim, neste texto Freud esclarece aos seus ouvintes a existência da transferência, na qual a figura do médico é investida tanto de amor, como de ódio. Freud afirma que a transferência nos revela a mobilidade e a atuação da dinâmica libidinal no sujeito, no inconsciente.

Temos acompanhado essa nova edição do distúrbio antigo desde seu início, temos observado

sua origem e seu crescimento e estamos especialmente aptos a nos situar dentro dele, de vez

que, por sermos seu objeto, estamos colocados em seu próprio centro. Todos os sintomas do

paciente abandonam seu significado original e assumem um novo sentido que se refere à

transferência. (Freud, 1916-17, pág 517)

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interpretações. Pois qualquer intervenção prematura poderá causar o fim da possibilidade do tratamento. Neste tempo inicial, não há a interpretação.

É importante ressaltar que esta ligação que se constrói no decorrer das primeiras entrevistas precisa ser manejada. Assim, temos aqui, o tempo da instalação da transferência. Neste momento existe o levantamento de questões que irão sustentar a passagem para um tratamento. Encontramos neste tempo a instalação da neurose de transferência.

Para Freud, inicialmente, a transferência se situa atrelada aos afetos e à repetição. Mais tarde, Lacan irá discriminar e analisar os vários registros em que a transferência se apresenta. Esta a que Freud se refere, Lacan irá denominar de transferência imaginária.Mais tarde, na sua obra, Lacan irá pensar a entrada no dispositivo analítico, através do que chamou de pivô da transferência, isto é, o Sujeito Suposto Saber. Aqui estamos no âmbito do registro simbólico.

Me pergunto se na análise de crianças podemos pensar o trabalho com os pais, a partir da estrutura deste primeiro tempo de uma análise. Assim, a transferência em relação aos pais teria a função de estabelecer a ligação e, principalmente, a viabilização e sustentação do tratamento da criança.

E em relação ao diagnóstico, no caso da análise de crianças, é importante que o analista possa suspender a questão de para quem é o diagnóstico no início da análise da criança, mesmo que o pedido inicial seja para a criança em questão. Pois, através desta primeiras escutas, é possível que a queixa que os pais apresentem sobre o filho seja a penas uma via de entrada de um dos pais no tratamento.

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Capítulo V - Primeiras entrevistas em Lacan e a questão da

transferência

É possível correlacionar o que Freud chama de tratamento experimental, de ensaio, ao que Lacan chama de Entrevistas Preliminares.

É interessante marcar que Lacan não apresenta nenhum texto específico sobre essa temática; ela aparece dentro dos seus textos e de suas falas, atrelada a outros pontos, principalmente à questão da transferência.

As entrevistas preliminares constituem um primeiro tempo de uma análise, o qual solicita um manejo específico por parte do analista. A Intervenção do analista está no campo das retificações subjetivas e todo o trabalho parte da queixa inicial que o paciente apresenta. Neste tempo não há interpretação. Este é um tempo anterior a entrada em análise propriamente dita.

Para Lacan, a entrada em análise também é constituída pela questão do diagnóstico da estrutura clinica do paciente, já que no trabalho do analista não está circunscrito apenas a neurose. Há trabalho e manejos diferentes na direção do tratamento na psicose, na perversão e na neurose.

Lacan nomeia alguns passos que constituem a entrada em análise, no seu texto A direção do tratamento (1958):

Digo que é numa direção do tratamento que se ordena, como acabo de demonstrar, segundo

um processo que vai da retificação das relações do sujeito com o real, ao desenvolvimento da

transferência,e depois à interpretação, que se situa o horizonte em que a Freud se revelaram as

descobertas fundamentais que até hoje experimentamos, no tocante à dinâmica e à estrutura da

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Neste recorte, é possível apontar para o objetivo central das entrevistas preliminares,“a retificação das relações do sujeito com o real e a questão da transferência” (pág 604) pois será a partir deste trabalho inicial de retificação das relações do sujeito com o real, real aqui sendo a realidade, e a ligação inicial do analisando ao analista, que o campo da análise poderá ser constituído e as interpretações poderão ocorrer.

E, mais adiante:

“É que, ademais essa retificação em Freud é dialética e parte dos dizeres do sujeito para voltar a

eles, o que significa que uma interpretação só pode ser exata se for... uma interpretação” (pág

607).

Portanto, o que aparece é a ênfase na primeira fala deste sujeito e todos os seus desmembramentos. Geralmente este trabalho parte, como em qualquer tratamento, de uma queixa. Esta queixa inicial irá abrir trilhas para outros pontos importantes. Neste tempo, ocorre o trabalho de retificação subjetiva que visa abrir perguntas e que aponta para a implicação do sujeito ou dos sujeitos nesta queixa inicial. A retificação subjetiva consiste na possibilidade, na construção do paciente se incluir e produzir uma questão sobre a sua posição diante de sua queixa na “cena relatada” ao analista. Desta forma a fala parte do sujeito para voltar a ele.

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A retificação freudiana consiste em fazê-la perceber que ela própria se coloca assediada, tal

postura responde a seu desejo. Então, é o mesmo fazê-la perceber sua responsabilidade e fazê-la

perceber o seu desejo, que ela não conhece. Era fazê-la perceber a situação na qual se

encontrava, e que somente seria conhecida a partir de seus ditos, nos quais se apresentava como

vitima do desejo do Outro paterno. A retificação subjetiva consistiu em fazer surgir que o lugar

de agente em sua vida era dela; ela quem agenciava a história. (Miller, 1996, pág. 266)

a) Entrevistas Preliminares

Jacques-Alan-Miller, em Lacan Elucidado, refere-se a entrada em análise a partir de três níveis, são eles: A avaliação clínica, a localização subjetiva e a introdução ao inconsciente. Sobre a entrada em análise, ele a apresenta como um trabalho que deve ser efetuado, construído para que o sujeito possa entrar no trabalho analítico.

Em relação à Avaliação Clínica, as entrevistas preliminares devem responder a pergunta sobre a estrutura que está presente no analisando. Trata-se de uma neurose, uma psicose ou uma perversão? Pois a direção do tratamento irá partir desta primeira avaliação. “As entrevistas preliminares se colocam para o analista como meio de se fazer o diagnóstico” (1987, pág. 255)

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“Dizer que o sujeito na clínica não é sujeito de fato, mas de direito, equivale a afirmar que não se pode separar a clínica analítica da ética da psicanálise, que constitui na experiência o sujeito”.

(Miller, 1987, Pág. 235)

Miller chama atenção para a importância das entrevistas preliminares em relação ao diagnóstico da estrutura do paciente, pois, no caso das psicoses,“não desencadeadas”, existe o risco do sujeito deflagrar um surto. Uma análise pode produzir este efeito.

É fundamental para o analista que ele saiba reconhecer o pré-psicótico, o psicótico, cuja

psicose ainda não foi deflagrada. Há uma regra, segundo a qual devemos recusar a demanda de

análise do paciente pré-psicótico. Se isso não ocorrer, é necessário ter o máximo de cuidado

para não desencadear a psicose, através de qualquer palavra. (Miller, 1987, pág. 226)

Miller afirma que o analista, em caso de dúvida, deve se pautar na existência ou não dos fenômenos elementares. Estes “são fenômenos psicóticos que podem anteceder o delírio e o desencadeamento de uma psicose” (1987, Pág. 227). Esta pode ser a “assinatura clínica” do paciente. Os fenômenos elementares são constituídos pelos fenômenos de automatismo mental, de automatismo corporal e fenômenos concernentes ao sentido e à verdade.

Ele segue o texto afirmando a posição da psicanálise lacaniana diante do diagnóstico e da necessidade do analista de saber operar com o saber clínico. Aqui, o conceito de Sujeito aparece como peça fundamental para a psicanálise lacaniana.

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paciente. Porém, com o desenvolvimento da sua obra, irá se afastar cada vez mais do fato para entrar na dimensão do dito. Mas o autor revela que esta passagem por si só não é suficiente na psicanálise lacaniana; é necessário que o paciente questione e tome uma posição quanto aos próprios ditos.

”Desta maneira, ir dos fatos aos ditos não é suficiente; um segundo passo essencial é questionar

a posição tomada por quem fala quanto aos próprios ditos; e a partir dos ditos localizar o dizer

do sujeito, retomar a enunciação (...)” (Miller, 1986, Pág. 236)

Miller afirma que a modalização do dito também localiza a posição do sujeito. Assim, a Localização Subjetiva diz respeito a esta posição que o efeito sujeito se apresenta no dito do paciente. Existe uma diferença entre o dito e a “posição frente a ele, que é o próprio sujeito” (Miller, 1986, Pág. 238). Aqui, Miller volta a firmar a necessidade de se distinguir enunciado de enunciação e, paralelamente, o dito do dizer.

“A posição subjetiva de um histérico frente às alucinações é muito diferente da de um psicótico,

para quem, mesmo não lhe conhecendo todos os detalhes, a alucinação é um ponto de certeza.

(Miller, 1986, Pág. 243)

Outro ponto importante nas entrevistas preliminares é a função essencial do mal entendido, o qual abre para a pergunta: que você quer dizer com isso? Esta pergunta é a entrada na associação livre e esta apoiada na idéia de que quem não se entende é o próprio sujeito; há algo que precisa ser construído.

“Assim, localizar o sujeito consiste em fazer aparecer a caixa vazia onde se inscrevem as

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ele perceba que toma diferentes posições modalizadas para com o seu dito”. (Miller, 1986, Pág.

247)

Mais adiante:

Como tentei mostrar, o analista, separando enunciado e enunciação ao reformular a demanda

e introduzir o mal-entendido, guia o sujeito para o encontro do inconsciente: leva-o ao

questionamento de seu desejo e do que pretende dizer quando fala, fazendo-o assim perceber

que há sempre uma boca mal-entendida. (Miller,1986,pág 250)

Desta forma, Miller afirma que a entrada numa análise é constituída por um processo que deve ser manejado pelo analista e que não se reduz a uma simples avaliação da adequação do caso para a psicanálise. Neste tempo inicial, é necessário uma mudança efetiva da posição do sujeito. O analisante, ao final do processo, pode se referir ao que diz a partir de uma certa distancia do dito. Este efeito é o que chamamos de retificações subjetivas.

“A que é conduzido o sujeito com a primeira localização? A aceitar a associação livre, a falar sem censurar o que diz, buscando-lhe o sentido, a abandonar a posição de mestre”. (Miller, 1986, Pág. 250)

É importante marcar que, numa analise, estamos diante do Sujeito e a abertura para um espaço analítico se constitui no encontro com este.

(...) O sujeito é a própria perda, amais contável em seu próprio lugar, ao nível físico,ao nível

da objetividade. Nesse nível ele não existe, e é responsabilidade do analista produzi-lo num

outro, que lhe seja apropriado. (Miller, 1986, Pág. 253)

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consiste em abrir espaços para que exista as variações na posição subjetiva e assim possa apontar para o fato de que o sujeito sempre toma uma posição diante do seu dito; e é desta mobilidade que a psicanálise põe em jogo no tratamento.

Assim, nas entrevistas preliminares, temos o sujeito se havendo com uma posição, na qual se abre ao questionamento do próprio desejo. O que aparece como efeito é uma mudança efetiva de sua posição diante de sua queixa inicial. É aqui que se presentifica a falta-a-ser, o inconsciente, a castração. Desta maneira, as entrevistas preliminares tem como objetivo abrir um espaço de fala sobre a queixa inicial, para que, a partir desta, o sujeito possa se localizar diante dela e assim produzir inversões dialéticas que a conduza a uma questão na qual possa se abrir a pergunta sobre o saber do Outro.

Sobre a retificação subjetiva, Miller afirma que, neste tempo, o ato analítico consiste em implicar o sujeito no seu queixume, em seu próprio motivo de queixar-se. A retificação subjetiva está atrelada ao fato do sujeito apreender sua responsabilidade essencial no que ocorre. Aqui, ele afirma que estamos diante de um paradoxo, no qual o lugar da responsabilidade do sujeito é o mesmo do inconsciente. A Psicanálise irá operar a partir deste ponto.

O autor chama atenção para o fato de Lacan, no final da sua obra, não se referir mais a retificação subjetiva e sim a histerização do sujeito.

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1991, Pág. 16). Para Lacan, a única demanda de uma análise é a demanda de se desvencilhar de um sintoma.

Assim, o que está colocado nestas entrevistas preliminares é possibilidade de trabalho com o sintoma. Esta “analisabilidade” do sintoma deverá ser construída através destas experiências dialéticas que o sujeito deverá experiênciar neste primeiro tempo. É este o trabalho que o analista deverá fazer operar, no qual a queixa que o sujeito apresenta deverá se transmutar num sintoma analítico.

Para isto, é necessário que a queixa se transforme numa demanda endereçada ao analista e que “o sintoma passe do estatuto de resposta ao estatuto de questão”( Quinet, 1991, Pág. 16) e, desta forma, possa ser endereçada a um analista. Isto significa que é necessário que o sujeito seja implicado na análise e que se instale o Sujeito Suposto Saber, conceito lacaniano.

Neste ponto, é necessário retornar ao conceito de transferência simbólica, pois é isto que se instala quando ocorre esta demanda ao analista: o analista está colocado no lugar do Outro. E é deste lugar que o sujeito é solicitado a decifrar seu sintoma. Este momento em que “o sintoma se transforma num enigma, é um momento de histerização” (Quinet, 1996, Pág. 17).

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A função diagnóstica também está presente, pois, para a psicanálise, é na relação transferêncial que se instaura o analista como Outro e é para esta estrutura que o diagnóstico aponta, isto é, para a estrutura em que o sujeito se apresenta. A modalidade da relação do sujeito com o Outro é o que se estabelece no diagnóstico psicanalítico, pois este serve para a psicanálise como ponto de orientação para a condução da análise. Quinet afirma que é apenas a partir do simbólico que o diagnóstico é colocado, isto significa diagnóstico estrutural é lido por meio dos três modos de negação do Édipo. “Cada modo de negação é concomitante a um tipo de retorno do que é negado”. (Quinet, 1991, Pág. 19)

Ainda há a função transferencial, sobre a qual Quinet afirma que “o surgimento do sujeito sob transferência é o que dá sinal de entrada em análise, e esse sujeito é vinculado ao saber“ (Quinet, 1991, Pág. 25). Será em torno deste saber que a análise irá se desenrolar. Existe um saber em jogo no sintoma. O paciente já traz no inicio dos encontros com o analista uma “teoria” sobre seu sintoma. No transcorrer das entrevistas preliminares, esta “teoria” será revista afim de que se possa ser transformada numa questão, e assim ocorrer a implicação do sujeito. Desta forma, o analista possibilita o trabalho com a engrenagem inconsciente.

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b) Transferência em Lacan

Jacques-Alan-Miller, em Percurso de Lacan, apresenta as várias facetas que o conceito da transferência aparece na obra lacaniana. No início, ela era tomada como um fenômeno imaginário e, no final, ela foi articulada ao registro simbólico e real.

Ele afirma: “Em 54, Lacan dizia que o fenômeno de carga imaginaria cumpre, na transferência, um papel pivô. Dez anos depois atribuirá esse papel de pivô ao sujeito suposto saber, exatamente nos mesmos termos”. (Miller, 1994, Pág. 76)

Ciaccia, no seu texto O início do tratamento em Freud e em Lacan, apontará para a passagem que Lacan faz ao sair do impasse Freudiano sobre a transferência. Para este, Freud conceitualiza a transferência através dos afetos erótico ou hostis e Lacan promove um giro da transferência para a questão do saber.

O autor recorre a “Proposição de 9 de outubro”, a divide em sete partes e foca-se na foca-segunda parte, na qual Lacan afirma: “No início da psicanálifoca-se está a transferência”. Ele retoma a metáfora que Freud faz em relação ao jogo de Xadrez para se referir ao começo e o fim da análise. E define, assim como Freud, que a transferência se estabelece devido à presença do analisando. Ele ressalta o quanto a transferência vem apontar para o analista a inexistência da intersubjetividade; ela a refuta.

A inexistência da relação intersubjetiva está colocada o tempo todo no trabalho de discriminação que Lacan fez no decorrer de sua obra, principalmente sobre o conceito de pequeno e grande Outro e dos registros imaginário, simbólico e real.

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suposto saber é, para nós, o pivô a partir do qual se articula tudo o que acontece com a transferência”. (Lacan, 1967, Pág. 253)

Assim, Lacan inaugura a entrada da cadeia de significantes nesta “nova” cena, onde há uma suposição de saber, na qual o sujeito não supõe nada, mas é suposto; suposto pelo significante que o representa para outro significante. Aqui será possível lermos a transferência no registro simbólico. Lacan explicita esta engrenagem da transferência através do matema da transferência. Neste está colocado o estabelecimento da transferência significante.

No matema está contido “a articulação do significante da transferência com o significante qualquer do analista ‘escolhido’ pelo analisante e esta articulação tem como efeito a produção do sujeito”. (Lacan, 1967, Pág. 253) Aqui, Lacan ressalta a entrada na engrenagem significante e chama atenção para a ligação analisante/analista através de um significante.

Vemos que, embora a psicanálise consista na manutenção de uma situação combinada entre

dois parceiros, que nela se colocam como psicanalisante e o psicanalista, ela só pode

desenvolver-se ao preço do constituinte ternário, que é o significante introduzido no discurso

que se instaura,aquele que tem nome:o sujeito suposto saber, esta é uma formação de artifício,

mas de inspiração, como destacada do psicanalisante. (Lacan, 1969, Pág. 254)

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lacaniana já é possível estabelecer a transferência a partir dos três registros imaginário, real e o simbólico.

No texto A transferência é amor, Silvestre afirma que “a demanda de análise é a demanda de ajuda, de alivio, mas é sobretudo uma demanda – uma pergunta-dirigida ao analista em função desse saber suposto ao inconsciente”. (1987, Pág. 95). Na cena analítica, o que aparece é a posição constitutiva do sujeito, na qual é o Outro quem sabe. “O que o sujeito não sabe sobre si mesmo – desde que exista tal saber – é preciso deduzir que quem sabe é o Outro. Um Outro que, do lugar do inconsciente, pode responder a quem interroga”. (1987, Pág. 96)

No simbólico, a transferência aparece como o amor que se dirige ao saber. No imaginário, a transferência está colocada como repetição em que os significantes da demanda são endereçados ao outro do amor como resistência. E, por último, ela se apresenta no Real a partir do objeto a, no qual confere a transferência seu aspecto de real do sexo.

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Assim, o analista ao convidar o outro a falar se depara inicialmente com uma demanda, uma demanda intransitiva, demanda de amor, e, a partir dela, iremos nos deparar com os significantes do sujeito, já que a partir da demanda iremos apontar para o desejo.

Por intermédio da demanda, todo o passado se entreabre, até recônditos da primeira infância. Demandar: o sujeito nunca fez outra coisa, só pôde viver por isso, e nós entramos na seqüência. (Lacan, 1958, Pág. 623)

No trabalho junto aos pais, me questiono se podemos tomar a transferência, como a transferência imaginaria e, a partir dela, sustentar e viabilizar o trabalho junto a criança. Assim, a intervenção do analista visaria manter minimamente esta ligação inicial dos pais com o analista e, junto com isto, instaurar um lugar de endereçamento das questões que possam surgir com a análise da criança. Pois sabemos que o movimento da criança produz efeitos nas posições dos pais e será sobre esse eixo que o trabalho do analista deve operar.

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Conclusão:

Agora é possível retornar a cena inicial na qual surgiram as questões deste trabalho, isto é, o encontro do analista com os pais que trazem um pedido de análise, de cura para o filho. Como o analista deve estar orientado neste trabalho com os pais? Para esta resposta, foi necessário percorrer um fio teórico, no qual parti do que há no laço entre pais e filhos até chegar ao manejo do analista nas entrevistas com os pais.

O que fazer com a fala inicial dos pais e como articulá-la ao tratamento desta criança? Essa foi a primeira pergunta. Para responder isso, foi preciso estabelecer o objeto de trabalho do analista, isto é, o Sujeito, e assim diferenciá-lo da criança e do infantil. Ao partir do Sujeito, me deparei com toda a estrutura do inconsciente e seu funcionamento. E, assim foi possível estabelecer o eixo central de toda a engrenagem inconsciente, isto é, a falta; em termos freudianos, a castração. Será a partir da falta que a estrutura do inconsciente irá se estabelecer e se organizar, no caso das neuroses.

Desta forma, o que aparece no laço entre pais e filhos e, principalmente, o que se transmite, no caso de uma neurose é a falta. Assim, o que se revela é como cada um dessa constelação familiar irá lidar ou melhor velar, a falta a seu modo. Portanto, o analista deve estar advertido exatamente para este jogo de velamento e desvelamento. Desta maneira, partimos de uma unidade familiar imaginária para a pergunta sobre cada unidade, sujeito, desta família.

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queixa norteia este tempo. Aqui, é possível estabelecermos um paralelo entre o trabalho de escuta com os pais de uma criança em análise e o trabalho do analista nas entrevistas preliminares.

As entrevistas preliminares são constituídas através do estabelecimento do laço transferencial, pela fixação de um diagnóstico e pelo trabalho com a queixa inicial. O trabalho com a queixa é efetuado através da intervenção analítica chamada retificação subjetiva. Através da retificação subjetiva, ocorre a transformação de uma queixa em uma pergunta na qual o sujeito possa se incluir e, a partir daí, iniciar um processo analítico propriamente dito.

Penso que o trabalho com os pais também está pautado neste três pontos norteadores. Em relação a transferência, é fundamental que ela se estabeleça, pois só a partir deste laço é possível que os pais possam autorizar o analista a trabalhar com o filho e, muitas vezes, será a partir deste laço que o tratamento poderá ser sustentado.

Junto aos pais, compreendo as intervenções do analista através das Retificações Subjetivas, pois essas apontam para a posição e a implicação de cada um no trabalho junto ao analista. Acho importante ressaltar que estamos no âmbito terapêutico e não analítico, já que não tomamos os pais em análise e sim operamos através de uma escuta analítica. Isto não significa que, diante deste trabalho junto aos pais, não apareçam questões destes. Porém, acho importante que o analista possa estar atento, advertido, para que este trabalho com os pais possa, se for necessário,estar orientado a um espaço individual para cada sujeito

Referências

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