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DISCURSO E SUJEITO EM MOVIMENTO ARGUMENTATIVO: BRINCADEIRAS E ARTE EM PORTINARI

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Academic year: 2021

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

ANA CAROLINE DEL BEM CALDAS

DISCURSO E SUJEITO EM MOVIMENTO ARGUMENTATIVO:

BRINCADEIRAS E ARTE EM PORTINARI

Ribeirão Preto – SP

2021

(2)
(3)

ANA CAROLINE DEL BEM CALDAS

Discurso e sujeito em movimento argumentativo: brincadeiras e arte em Portinari

Versão Corrigida

Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Ciências.

Área: Educação.

Orientadora: Professora Doutora Soraya Maria Romano Pacífico.

Ribeirão Preto - SP

2021

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Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

Catalogação na publicação Serviço de Biblioteca e Documentação

Departamento de Educação, Informação e Comunicação

Caldas, Ana Caroline Del Bem

Discurso e sujeito em movimento argumentativo: brincadeiras e arte em Portinari, Ribeirão Preto. – 2021

165 p. : il. ; 30 cm

Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. Área de Concentração: Educação.

1. Argumentação. 2. Brincadeiras. 3. Discurso verbal e não verbal. 4.

Sujeito.

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Nome: Caldas, Ana Caroline Del Bem

Título: Discurso e sujeito em movimento argumentativo: brincadeiras e arte em Portinari

Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, para a obtenção do título de Mestre em Educação. Área: Educação.

Aprovado em: 21/06/2021

Banca Examinadora

Prof.ª Dr.ª ________________________________________________________________

Instituição: ________________________________________________________________

Julgamento: ________________________________________________________________

Assinatura: ________________________________________________________________

Prof.ª Dr.ª ________________________________________________________________

Instituição: ________________________________________________________________

Julgamento: ________________________________________________________________

Assinatura: ________________________________________________________________

Prof.ª Dr.ª ________________________________________________________________

Instituição: ________________________________________________________________

Julgamento: ________________________________________________________________

Assinatura: ________________________________________________________________

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais.

Ao meu esposo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pelo dom da vida, por me guiar e iluminar a cada dia que passa e proporcionar momentos de aprendizado e desenvolvimentos tão valiosos.

Aos meus pais por serem a base de tudo, que me proporcionaram educação, suporte, amor, carinho e compreensão em todos os momentos da minha vida, e em especial este momento.

À Soraya, que aceitou me orientar neste trabalho e pesquisa, por toda formação e dedicação, por proporcionar novas visões e sentidos e que me ajudou a construir um sólido degrau no conhecimento acadêmico.

Ao meu esposo Matheus, que foi meu porto seguro, me impulsionou e motivou todos os dias a fazer e concluir este trabalho, e que esteve ao meu lado desde o momento inicial desta pesquisa e até a conclusão dela.

Aos meus colegas do grupo de estudo por todos os momentos de compartilhamento de conhecimento, pesquisa e vivência.

Aos sujeitos-alunos desta pesquisa e aos professores e equipe pedagógica da escola que

permitiram momentos de grande riqueza acadêmica e possibilitaram um corpus de pesquisa tão

rico.

(8)

Ao contrário, as cem existem.

A criança é feita de cem.

A criança tem cem mãos, cem pensamentos, cem modos de pensar, de jogar e de falar.

Cem, sempre cem modos de escutar as maravilhas de amar.

Cem alegrias para cantar e compreender.

Cem mundos para descobrir.

Cem mundos para inventar.

Cem mundos para sonhar.

A criança tem cem linguagens (e depois, cem, cem, cem),

mas roubaram-lhe noventa e nove.

A escola e a cultura separam-lhe a cabeça do corpo.

Dizem-lhe: de pensar sem as mãos,

de fazer sem a cabeça, de escutar e de não falar, de compreender sem alegrias,

de amar e maravilhar-se só na Páscoa e no Natal.

Dizem-lhe: de descobrir o mundo que já existe e, de cem, roubaram-lhe noventa e nove.

Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho,

a realidade e a fantasia, a ciência e a imaginação, o céu e a terra, a razão e o sonho,

são coisas que não estão juntas.

Dizem-lhe: que as cem não existem.

A criança diz: ao contrário, as cem existem.

(MALAGUZZI, 1999)

(9)

RESUMO

CALDAS, Ana Caroline Del Bem. Discurso e sujeito em movimento argumentativo:

brincadeiras e arte em Portinari. 2021. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2021.

Ao reconhecer o brincar como atividade principal na infância (VIGOTSKI) e, também, que o direito de brincar tem sido excluído das rotinas escolares, esta pesquisa tem o objetivo de analisar o discurso produzido por sujeitos-alunos, na faixa etária entre 6 e 7 anos, após a interpretação das obras artísticas de Candido Portinari, que retratam o brincar, a fim de compreender como eles argumentam e constroem sentidos sobre o brincar e as brincadeiras na infância. A pesquisa tem como fundamentação teórica os conceitos da Análise do Discurso de Michel Pêcheux, para analisar os efeitos de sentidos produzidos pelos sujeitos, além também de considerar os estudos de Plantin para analisar a argumentação referente ao modo como os sujeitos falam de suas emoções, valorizando os afetos que podem ecoar nos argumentos sobre o direito ao brincar. O potencial e a força pedagógica da arte possibilitam a revisão dos sentidos para que os sujeitos-alunos sintam-se livres a discursivisar sobre o brincar, então o corpus foi constituído pelo discurso verbal oral e escrito dos sujeitos-alunos. Como metodologia, foram registrados, pela pesquisadora, os discursos produzidos pelos sujeitos-alunos durante uma pesquisa de campo feita nas salas de aula dos anos iniciais do Ensino Fundamental, em uma escola pública de Ribeirão Preto. Através dos diálogos, os sujeitos-alunos conseguiram realizar gestos de interpretação e argumentação sobre as obras artísticas e relacioná-las com os sentidos de brincar e brincadeira que perpassam suas vivências. Por meio dos discursos dos sujeitos foi possível interpretar a atualização da memória discursiva quando os sujeitos-alunos apresentam amplo repertório de brincadeiras que conhecem, além de identificar marcas da formação discursiva dominante, ao afirmarem que o brincar não é importante na escola.

Palavras-chave:  Argumentação. Brincadeiras. Discurso verbal e não verbal. Sujeito.

(10)

ABSTRACT

CALDAS, Ana Caroline Del Bem. Discourse and subject in argumentative movement: play and art in Portinari. 2021. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2021.

When recognize play as the main activity in childhood (VYGOTSKY) and, also, that the right to play has been excluded from school routines, this research aims to analyze the discourse produced by students-subjects, aged between 6 and 7 years, after the interpretation of Candido Portinari's artistic works, that portray the play, in order to understand how they argue and build meanings about play and playing in childhood. The research is based on the Discourse Analysis by Michel Pêcheux, and seek to analyze the effects of meanings produced by the subjects, and also considering Plantin's studies to analyze the argument regarding the way the subjects talk about their emotions, valuing the affections that can echo in the arguments about the right to play. The potential and pedagogical strength of art make it possible the review of the meanings so that students-subjects feel free to discourse on play, so the corpus was constituted by the oral and written verbal discourse of the students-subjects. As methodology, the speeches produced by the student-subjects were recorded by the researcher during a field research done in the classrooms of the early years of elementary school, in a public school in Ribeirão Preto.

Through the dialogues, the students-subjects were able to perform gestures of interpretation and argumentation about the works of art and to relate them with the senses of play and playing that permeate their experiences. Through the discourses of the students-subjects, it was possible to identify discursive memory, by presenting a wide repertoire of games they know, in addition to identifying marks of the dominant discursive formation, by stating that playing is not important at school.

Keywords: Argumentation. Play. Verbal and non-verbal discourse. Subject.

(11)

LISTA DE IMAGENS CAPITULARES

Capa – Meninos Brincando (PORTINARI, 1955). Recuperado em 25 de Julho de 2019 http://www.portinari.org.br/ ... 00

Introdução – Árvore da vida (PORTINARI, 1957). Recuperado em 25 de Julho de 2019 http://www.portinari.org.br/ ... 14

Capítulo 1 – Meninos com Carneiro (PORTINARI, 1959). Recuperado em 25 de Julho de 2019 http://www.portinari.org.br/ ... 22

Capítulo 2 – Plantando Bananeira (PORTINARI, 1956). Recuperado em 25 de Julho de 2019 http://www.portinari.org.br/ ... 42

Capítulo 3 – Meninos no balanço (PORTINARI, 1960). Recuperado em 25 de Julho de 2019 http://www.portinari.org.br/ ... 55

Capítulo 4 – Meninos na gangorra (PORTINARI, 1960). Recuperado em 25 de Julho de 2019 http://www.portinari.org.br/ ... 70

Considerações Finais – Meninos soltando pipas (PORTINARI, 1943). Recuperado em 25 de Julho de 2019 http://www.portinari.org.br/ ... 109

Referências – Crianças brincando (PORTINARI, 1960). Recuperado em 25 de Julho de 2019

http://www.portinari.org.br/ ... 114

(12)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AD Análise do Discurso (pecheuxtiana)

BNCC Base Nacional Comum Curricular

CP Condições de Produção

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

EF Ensino Fundamental

EMEF Escola Municipal de Ensino Fundamental

FFCLRP Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão

FD Formação Discursiva

FI Formação Ideológica

LDB Lei de Diretrizes e Bases

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

USP Universidade de São Paulo

(13)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 14

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA INFÂNCIA, DO BRINCAR E DA ARTE NA CULTURA ESCOLAR ... 22

1.1 A concepção de infância e do brincar

...

25

1.2 A (des)valorização do brincar no contexto escolar ... 30

1.3 A concepção de arte na/para infância e no contexto escolar ... 37

2 SOBRE UMA TEORIA QUE, ASSIM COMO A CRIANÇA, DÚVIDA DE TUDO...42

3 ACERCA DE UM DISPOSITIVO DE ANÁLISE QUE SE MOVIMENTA, TAL COMO A CRIANÇA QUER MOVIMENTAR-SE ... 55

3.1 Interpretação, argumentação e criatividade: sujeitos e sentidos em arte ... 65

4 ANÁLISES: SUJEITOS E DISCURSOS EM MOVIMENTO ... 70

4.1 Memórias de brincadeiras ... 74

4.2 “Mas algum engraçadinho ensinou a brincar na escola” ... 78

4.3 É possível ser criança sem brincadeira? ... 82

4.4 Arte e brincadeiras constituindo o sujeito-aluno e sujeito-criança ... 87

4.5 Brincadeira e vida: sentidos que se enlaçam ... 93

4.6 A contradição está na ordem do discurso... 102

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 109

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 114

ANEXOS... 120

ANEXO A - OBRAS DE PORTINARI UTILIZADAS NA PESQUISA ... 120

ANEXO B – TEXTO DOS ÁUDIOS GRAVADOS E TRANSCRITOS NA ÍNTEGRA ... 123

ANEXO C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) ... 163

ANEXO D – FOLHA DE ROSTO PARA PESQUISA ENVOLVENDO SERES

HUMANOS ... 165

(14)

INTRODUÇÃO

Árvore da vida (PORTINARI, 1957)

(15)

INTRODUÇÃO

“Que enigma é a vida, e o amor é um enigma dentro de um enigma.” (GOGH, 1883)

Uma palavra pode ter muitos sentidos e significados, de acordo com o contexto na qual é utilizada, por quem ela é enunciada e como ela é enunciada, ou seja, tudo irá depender do lugar, posição discursiva do sujeito que enuncia e da história do sujeito. Com essa reflexão inicial começaremos a apresentação desta pesquisa que não possui característica linear e uniforme, pesquisa esta que explora o movimento dos sentidos que serão analisados nos discursos dos sujeitos-alunos que frequentam os Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Trabalharemos com os sentidos em movimento e, por isso, vamos começar com algumas interpretações possíveis para a palavra enigma, presente na nossa primeira epígrafe. A palavra enigma também movimenta vários sentidos, pois de acordo com o significado do dicionário, enigma é algo difícil de entender, parte de um texto, frase ou discurso cujo sentido seja incompreensível ou ambíguo. Por metonímia poderia ser um indivíduo cujas atitudes e sentimentos são indecifráveis. Pela etimologia do latim “aínigma” seria fala obscura ou equívoca, com sentidos ocultos.

Então algo que não pode ser entendido e interpretado facilmente é considerado um enigma que precisa ser descoberto e retirado da obscuridade. Apresentados alguns sentidos da palavra enigma, existem ainda mais uma infinidade de sentidos que podem ser explorados, dependendo de como essa palavra é utilizada e como cada um a emprega em determinado contexto. A palavra enigma significa que algo está oculto/obscuro que nos leva ao desconforto e ao desconhecido, gerando questionamento, exploração e investigação que movem os múltiplos sentidos no discurso dos sujeitos, dado que as linguagens (oral, escrita, artística, musical, corporal) não são exatas e nem lineares, elas carregam ambiguidade, equivocidade, obscuridade e nebulosidade.

Com esse jogo de palavras, sentidos e significados, começamos a introdução deste trabalho que objetiva o questionamento, o movimento, a investigação e exploração dos sentidos nos discursos dos sujeitos em relação ao brincar.

Com oito anos de experiência nos Anos Iniciais da Educação Básica, acentuados pelo

contato com o desenvolvimento e aprendizagem de crianças, surgiu o interesse em analisar

como o brincar é interpretado pelos sujeitos-alunos, nos anos iniciais da escolarização. Nesses

anos de atuação junto à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental, foi possível observar como

os conteúdos ocupam o lugar principal na escola e o brincar sempre é ignorado ou tratado como

(16)

não importante no contexto escolar, desde as atividades do recreio até as de sala de aula. Dessa forma, a infância perde seu caráter principal, no qual, as brincadeiras possibilitam a aprendizagem que promove o desenvolvimento (VIGOTSKI, 2004).

No segundo ano da graduação em Pedagogia, pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto, tivemos contato, pela primeira vez, com a teoria de Análise do Discurso pecheuxtiana, abordada na disciplina “Escrita, Alfabetização e Letramento: Uma abordagem Histórica”, ministrada pela professora Soraya Maria Romano Pacífico. Com base nessa disciplina e nos autores nela estudados (Pêcheux, Orlandi, Tfouni, Gnerre, Bagno, dentre outros), aprendemos que a Análise do Discurso nos possibilita uma infinidade de interpretações e significações sobre os dizeres construídos em determinado contexto histórico.

Durante e após a graduação, foi possível participar dos grupos de estudos sobre Análise do Discurso, também com a professora Soraya, e essa vivência nos proporcionou um interesse maior em estudar mais sobre ensino, argumentação e discurso.

Nossa atuação nos Anos Iniciais da Educação Básica está sendo construída com a liberdade para planejar e inserir o brincar como atividade principal na infância. O envolvimento com o trabalho na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental nos presenteia com experiências muito significativas que se configuram na relação brincar-brincadeiras.

Surgiu, assim, o interesse em escrever um artigo

1

, para publicação em revista e jornais, sobre as brincadeiras na infância, no qual defendemos a importância do brincar para o desenvolvimento infantil.

Após a escrita do artigo e pelas participações no grupo de estudos sobre Análise do Discurso, surgiu um novo interesse em analisar como as brincadeiras estão presentes nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, no Brasil, entre 2018 e 2019. Este interesse foi mobilizado pelas discussões e reflexões decorrentes dos grupos de estudo com a professora Soraya.

Por este motivo, elegemos a fundamentação teórica da Análise do Discurso para dar suporte ao nosso objetivo de pesquisa, qual seja, analisar o discurso dos sujeitos-alunos na escola básica a fim de interpretar se eles consideram o brincar como direito da criança e se esse direito realmente está presente na escola. Sabemos que uma educação de qualidade deve considerar as diversidades presentes em sala de aula e atender aos princípios de uma aprendizagem significativa para proporcionar o desenvolvimento infantil.

1https://champagnat.colegiosmaristas.com.br/noticias/as-brincadeiras-no-cotidiano-escolar-2/ Acesso em 22/09/2019.

http://www.revistafatorbrasil.com.br/ver_noticia.php?not=359409 Acesso em 22/09/2019.

(17)

Se o direito ao brincar e às brincadeiras estivesse garantido aos alunos da Educação Básica, como está nos documentos oficiais sobre Educação Básica, tais como LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/1996, ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente 8.069/1990 e BNCC – Base Nacional Comum Curricular, veríamos as atividades lúdicas e as práticas de/com brincadeiras com mais frequência nas rotinas escolares. Contudo, com base em nossos estágios curriculares e em nossa docência, temos ciência de que, apesar de garantido no papel, o direito de brincar não é exercido do lado de dentro dos muros escolares.

Como citado na epígrafe, a vida é um enigma, assim como as linguagens presentes na vida dos sujeitos. Por este motivo, optamos pela escolha da Análise do Discurso, como base teórica desta pesquisa, e, da valorização da arte como linguagem sendo as pinturas, desenhos, imagens que, também, são uma forma de linguagem e possibilitam a interpretação. Dentre tantos pintores que apreciamos, a escolha do artista Candido Portinari (1903-1962) deve-se ao fato de, além de ser um artista da região de Ribeirão Preto, ele também é um artista reconhecido no Brasil inteiro, pois sua forma de representar a arte desperta a crítica social e afeta os sentimentos de muitos sujeitos. As pinturas de Portinari sempre destacam sentidos sociais, sempre há enigmas que envolvem a construção de cada obra, algo que possa ser interpretado e analisado, de acordo com cada contexto histórico vivido pelo pintor brasileiro. As obras de Portinari representaram as pessoas, seus sentimentos, a forma como elas viviam e o sofrimento do povo brasileiro. Em algumas obras, o pintor retratou situações que nos favorecem a reflexão crítica de como o povo brasileiro merece uma vida mais digna, mais valorizada, o que, obviamente, não é merecimento somente do povo brasileiro, mas de todo ser humano. O adjetivo brasileiro é usado aqui porque estamos nos referindo a um pintor que dedicou muito de sua obra a retratar seu povo. Portinari constitui-se como um sujeito-pintor que argumenta a favor da criança, ele produz uma obra vasta sobre brincadeiras na infância, cujas telas tecem uma forte argumentação a favor de que a criança tem que brincar na terra, ao ar livre, com outras crianças e tantas outras possibilidades de interpretações que podemos fazer a partir das pinturas dele.

Com base nessas considerações, nossa hipótese inicial era de que os sujeitos da pesquisa,

em contato com as obras artísticas de Portinari sobre o brincar, teriam condições de construir

sentidos sobre as pinturas e brincadeiras pelo viés da argumentação. Então, surgiram nossas

questões de pesquisa: 1) Como essas obras afetam os sujeitos-alunos na sociedade

contemporânea? 2) Quais os sentidos que essas obras despertam nos diferentes sujeitos, em

diferentes contextos, por meio das práticas discursivas de argumentação?

(18)

Os sentidos e significados que as brincadeiras e o brincar despertam em um sujeito não são os mesmos sentidos que despertam em outro sujeito, sendo que a construção dos sentidos é uma construção social, cada um vivencia as brincadeiras de formas diferentes, gerações da antiguidade vivenciaram as brincadeiras de uma forma, já as gerações da idade média e idade moderna tiveram outra relação com os sentidos de brincar, assim também ocorre com as gerações contemporâneas, que são perpassadas por outros tipos de relação com o brincar (ARIÈS, 1981).

Instigadas por essas questões, foi realizada a pesquisa de campo, em 2019, em uma escola pública municipal dos Anos Iniciais da Educação Básica, com o objetivo analisar os discursos produzidos pelos sujeitos-alunos sobre o brincar e as brincadeiras que vivenciaram na escola, a partir do contato, leitura e interpretação das obras de arte de Portinari, que possibilitaram o contato com a linguagem artística, a fim de compreender como eles argumentam e constroem sentidos sobre o brincar e as brincadeiras na infância, ou melhor, se eles argumentam sobre o direito da criança às brincadeiras, tendo a pintura como mote para a prática da argumentação, entendida aqui, como um direito (PACÍFICO, 2016).

Em várias partes deste texto será utilizada a formulação Educação Básica, pois ela inclui todos os níveis de educação obrigatória no Brasil. Engloba a Educação Infantil (0 a 5 anos); o Ensino Fundamental (6 a 14 anos); e o Ensino Médio (15 a 17 anos). Anos iniciais da Educação Básica contemplam, pois, os Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Desse modo, esta pesquisa tem o objetivo de analisar o discurso de sujeitos-alunos, na faixa etária entre 6 e 7 anos, sobre o brincar e as brincadeiras, a fim de interpretar como eles argumentam e constroem sentidos sobre o brincar e as brincadeiras na infância.

Os objetivos específicos são: 1) Levar os sujeitos-alunos a discursivizar sobre as obras de Portinari, que retratam o brincar e as brincadeiras, e investigar se elas despertam a atenção dos sujeitos-alunos que vivem na contemporaneidade, rodeados por brinquedos eletrônicos; 2) Analisar como os alunos argumentam sobre o brincar, dentro e fora dos muros escolares, observando se, para eles, as brincadeiras retratadas nos quadros de Candido Portinari são vivenciadas na escola.

Nesta pesquisa de campo foram registradas experiências de leituras e interpretações das obras artísticas que abordam a temática do brincar, nos quadros de Portinari, sendo eles:

“Meninos Brincando, 1955”; “Roda Infantil, 1932”; “Meninos Soltando Pipas, 1947”; “Menino

com Pião, 1947”; e, “Futebol, 1935” (ANEXO A). Essas pinturas artísticas sobre o brincar

de/em Portinari foram selecionadas, pois os quadros deste autor retratam a cultura do brincar

no Brasil e a história do artista, que nos apresenta diferentes linguagens, as quais favorecem

(19)

infinitas possibilidades de leituras e reflexões sobre as relações entre o verbal e o não verbal. A relevância de analisar o que as crianças dizem sobre o brincar a partir dos quadros de Portinari é para se construir um conhecimento acerca do desejo, da subjetividade e do imaginário sobre o brincar e as brincadeiras segundo os discursos das crianças.

Considerando tudo que vamos analisar e explorar durante esta pesquisa e que a cultura é uma construção social e se modifica ao longo do tempo, não podemos deixar de falar que os sentidos sobre a infância se modificaram, as formas do brincar, de brincadeiras e os locais em que elas acontecem também se transformaram, as brincadeiras vivenciadas nas décadas de 70, 80, 90 e dos anos 2.000 não são as mesmas que as crianças de hoje vivenciam, ainda mais com o avanço e mudanças frequentes da tecnologia (ARIÈS, 1981). A partir dessa problematização e de muitas outras, surgiu o interesse em saber como as crianças estão vivenciando as brincadeiras, no século XXI, especificamente os sujeitos-alunos que participam desta pesquisa.

Além disso, o tema desta pesquisa reforça a crítica que Leda Verdiani Tfouni (2006) faz à teoria da grande divisa, isto é, a autora critica a teoria que postula haver uma separação radical entre oralidade e escrita, em que a escrita ocupa lugar privilegiado e superior em relação às outras manifestações de linguagem. Ao trazer a oralidade, a pintura, a argumentação e os sentidos de brincar e brincadeira, esta pesquisa quer dar visibilidade e destaque às demais linguagens por meio das quais sujeito-aluno

2

e sujeito-criança

3

se constituem em seus dizeres sobre a temática.

Esta dissertação terá a seguinte estrutura: No primeiro capítulo, será feita uma contextualização sobre a concepção de infância, os direitos das crianças estabelecidos em documentos oficiais, uma breve apresentação da concepção do brincar relacionada com a arte e cultura escolar na sociedade atual.

No segundo capítulo, haverá todo o complexo da fundamentação teórica da Análise do Discurso, com base na teoria que foi construída por Michel Pêcheux, na França, nos anos de 1960, que tem os efeitos de sentidos do Discurso como objeto de estudo, além de explorar também as condições de produção discursivas. Utilizaremos, também, o aporte teórico de Eni Puccinelli Orlandi que se formou, em 1964, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara. Com o suporte pecheuxtiano, ela desenvolveu a Análise do Discurso no Brasil, dando continuidade à teoria criada por Pêcheux. Serão abordados também os conceitos

2 O termo sujeito-aluno refere-se à posição ocupada pelo sujeito na escola, frente às regras e subordinações às quais é submetido em relação ao brincar.

3 O termo sujeito-criança refere-se à posição ocupada pelo sujeito, considerado, neste trabalho, com idade entre 0 e 12 anos (ECA – 8.069/1990), que brinca tanto dentro da escola quanto fora dela.

(20)

desenvolvidos por Soraya Maria Romano Pacífico, orientadora desta pesquisa, com sua experiência na Análise do Discurso pecheuxtiana e nos estudos dos conceitos de autoria, argumentação, leitura, escrita e letramento.

Todos os conceitos apresentados nessa pesquisa são entrelaçados uns aos outros e, ao falar de um conceito, sempre será necessário retomar e relacionar com outros, também não será possível atingir a completude, haja vista que, para a Análise do Discurso, a língua é imperfeita, incompleta, ou seja, sempre quando dizemos algo de uma forma deixamos de dizer outras formas com infinitas possibilidades (PÊCHEUX, 2014).

No terceiro capítulo será abordado o dispositivo metodológico e as funções do analista de discurso ao entrar em contato com o seu objeto de estudo. A metodologia tem como base o dispositivo analítico da Análise do Discurso, para entender como a argumentação é praticada em um espaço institucional que valoriza a alfabetização tradicional e o contexto, por isso, as emoções, os afetos nem sempre são considerados. Então por meio do dispositivo analítico serão interpretados e explorados os efeitos de sentidos nos discursos argumentativos construídos pelos sujeitos da pesquisa.

Para analisar a argumentação, serão valorizados os afetos que podem ecoar nos sentidos argumentados, com base nos estudos de Plantin (2010) no tocante ao modo como os sujeitos- alunos falam de suas emoções, se, e como eles argumentam sobre o direito da criança às brincadeiras, tendo, conforme já antecipamos, a pintura como mote para a prática da argumentação, entendida aqui, como um direito (PACÍFICO, 2016).

O quarto capítulo contemplará as análises dos dados coletados e os resultados da pesquisa de campo com uma breve descrição do processo de coleta de dados. Espera-se, com os resultados, refletir sobre o dizer e a argumentação dos sujeitos-alunos, nessa etapa de escolarização, na qual, apesar de essencial, os afetos e as emoções que podem emergir pelo brincar e pelas brincadeiras nem sempre são considerados.

E no último capítulo estarão as considerações finais deste trabalho que, sem dúvida, não são definitivas, pois a linguagem e as interpretações estão sempre em movimento e mudanças.

Na seção de anexos serão apresentadas as obras artísticas de Portinari utilizadas nas rodas de

conversas para nortear as discussões e movimentar a argumentação dos alunos, estarão em

anexo também, o texto das transcrições dos áudios na íntegra, a partir das quais foram

organizados os recortes analisados neste trabalho. Segue, ainda, o termo de aprovação do

projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de

Ribeirão Preto – USP.

(21)

Seguimos para uma apresentação das abordagens contemporâneas sobre o brincar e

ressaltamos que o objetivo desta pesquisa não é ir contra o movimento escolar, mas questionar

o olhar fechado que, muitas vezes, não valoriza os interesses e direitos das crianças, bem como

proporcionar condições de produção discursivas para o sujeito-aluno argumentar sobre o direito

infantil de brincar.

(22)

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA INFÂNCIA, DO BRINCAR E DA ARTE NA CULTURA ESCOLAR

Meninos com Carneiro (PORTINARI, 1959)

(23)

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA INFÂNCIA, DO BRINCAR E DA ARTE NA CULTURA ESCOLAR

“Não tínhamos nenhum brinquedo comprado.

Fabricamos nossos papagaios, piões, diabolô. A noite de mãos livres e pés ligeiros era: pique, barra- manteiga, cruzado.”

(PORTINARI, 1964)

Neste capítulo será traçado um percurso teórico para contextualizar quais discursos circulam sobre a criança e o brincar, ou seja, quais os sentidos que circulam sobre infância e sobre brincadeiras para entendermos como esses discursos constituem a memória discursiva e o arquivo sobre a temática. Os sentidos são construídos sócio-histórico-ideologicamente e constituem as formações discursivas que circulam em determinado momento histórico.

Interessa-nos analisar as formações discursivas contemporâneas que vão determinar o que pode e deve ser dito sobre crianças, brincar e brincadeiras, principalmente, nos documentos oficiais.

Considerando que a língua nunca será exata e fechada em si mesma, que os sentidos se transformam de acordo com as circunstâncias em que são produzidos, não podemos ignorar as transformações e movimentos que envolvem esta pesquisa. Temos, assim, o primeiro apontamento para o deslizamento da classe gramatical da palavra brincar, que, de verbo passa a ser usada, também, como substantivo, devido a um processo de transformação ao longo da história. Com a função de verbo, brincar é visto como uma ação lúdica, mas com a função de substantivo, o brincar torna-se um conceito e sugere uma infinidade de significados que foram construídos ao longo do tempo por meio de estudos e descobertas sobre como o brincar é importante para o desenvolvimento da criança, na infância e no espaço escolar.

De acordo com o materialismo histórico, a infância e o brincar são uma construção social, as formas como esses conceitos são concebidos estão relacionadas com o contexto social e o modo de produção da sociedade. No entanto, o que abordaremos neste capítulo não será apenas para contar uma história cronológica da infância e do brincar, nossa intenção é mostrar o movimento histórico de construção desses sentidos, que ora vão se atualizando, ora sendo esquecidos, ora sendo silenciados, ora sendo retomados de uma outra maneira. Ressaltamos que é muito importante a valorização da memória discursiva para entender os discursos que circulam na sociedade, por meio dos sentidos que podem ser interpretados e analisados, para entender o significado cultural dos elementos e materiais analisados (FOUCAULT, 1997).

Assim como é de extrema relevância a consideração do interdiscurso que é um elemento

histórico institucionalizado, tudo que já foi dito por alguém em algum lugar, algo “esquecido”,

(24)

mas que pode estar no arquivo – campo de documentos pertinentes e disponíveis sobre dada questão (PÊCHEUX, 2010) –, e a memória como parte do interdiscurso que o sujeito retoma e apresenta em seu discurso. Interdiscurso e memória fazem parte da produção do discurso, ou seja, o que já foi dito afeta o presente contexto sócio-histórico e ideológico. (PÊCHEUX, 2014).

Os discursos só são produzidos porque existe algo que já foi falado antes (já-lá), em algum lugar. Estamos nos referindo à memória, que é tudo aquilo que já foi falado, anteriormente, pelos sujeitos da história. Segundo Pêcheux, o interdiscurso é um elemento histórico, tudo que já foi dito, já a memória é apenas uma parte do interdiscurso que o sujeito atualiza e apresenta em seu discurso, porém,

[...] uma memória não poderia ser concebida como uma esfera plena, cujas bordas seriam transcendentais históricos e cujo conteúdo seria um sentido homogêneo, acumulado ao modo de um reservatório: é necessariamente um espaço móvel de divisões, de disjunções, de deslocamentos e de retomadas, de conflitos de regularização. Um espaço de desdobramentos, réplicas, polêmicas e contra-discursos. (PÊCHEUX, 1999, p. 52).

Assim como, a memória não é homogênea, a linguagem também não é, e os sujeitos, para a Análise do Discurso, atualizam a memória discursiva, que vai constituindo o intradiscurso. Porém a memória é suscetível ao esquecimento, o esquecimento nº1 refere-se ao que já foi dito por alguém em algum lugar, o esquecimento nº2 significa que ao falar algo deixamos de dizer de outra forma. Pêcheux (2014) com base nos conceitos de Lacan elabora o conceito de memória e considera a memória como condição de produção do discurso.

Com base em alguns teóricos, tais como Ariès (1981), Postman (1999), Charlot (1979) e Vigotski (2004; 2009) e pelo acesso ao arquivo, faremos uma contextualização. Por meio de um diálogo entre os vários efeitos de sentidos nos discursos desses autores que teorizaram sobre a infância e o brincar no desenvolvimento infantil ao longo do tempo, podemos interpretar como essas teorias produzem significado hoje, ressaltando que essa não é uma escrita inaugural sobre o tema, mas uma escrita que pretende discursivizar a infância, o brincar e como isso constituiu o sujeito historicamente.

Uma concepção de infância possui significações sócio-histórico-ideológicas. Estas

significações dependem do tempo histórico e da forma como a sociedade está organizada

(CHARLOT, 1979). Nossa pesquisa será fundamentada na concepção de infância segundo o

materialismo histórico e com base na concepção do brincar para a teoria histórico-cultural

(VIGOTSKI, 2004), sendo que consideraremos como condição de produção o sujeito-aluno em

(25)

desenvolvimento por meio da interação e interlocução com os seus pares ao discursivizar sobre as obras de Portinari, que retratam o brincar e as brincadeiras.

1.1 A concepção de infância e do brincar

No contexto da Idade Média, Ariès (1981) define que o conceito de infância apareceu no século XIII, mas a infância não era valorizada enquanto fase de vida, visto que as crianças eram tratadas como pequenos adultos; o que diferia essa fase da fase adulta era a necessidade de auxílio para os cuidados e para aprendizagem da fala. Ariès (1981) cita, também, que essa era a idade dos brinquedos (pião, bonecas, cavalinho de pau).

Para Postman (2005), desde a antiguidade havia a ideia da necessidade de proteção e de cuidados com as crianças e que essa fase era distante da fase adulta; porém, no período da idade média ocorreu o desaparecimento da infância, assim como Ariès também registrou a não valorização desta fase da vida. Nesse período não havia escolas, os ensinamentos eram designados às famílias ou à igreja. Com o surgimento da filosofia iluminista, o olhar para a infância começou a mudar, pois surgiram várias filosofias que tratavam sobre diferentes concepções de infância a forma como educar as crianças. Com o advento da tipografia (1430 – Século XV), consequentemente com a escrita impressa, a comunicação e a informação passaram a ter maior alcance, ou seja, com a mudança de culturas mudam-se também a visão e os conceitos de infância, pois a infância, como qualquer outro conceito ou representação, é uma construção social.

Depois da prensa tipográfica, os jovens teriam de se tornar adultos e, para isso, teriam de aprender a ler, entrar no mundo da tipografia. E para realizar isso precisariam de educação. Portanto a civilização europeia reinventou as escolas. E ao fazê-lo, transformou a infância numa necessidade. (POSTMAN, 1999, p. 50).

Com o aparecimento do telégrafo (1837/1844) e, por consequência, o surgimento da televisão (1920), temos, novamente, o desaparecimento da infância. As crianças voltam a ser pequenos adultos que assistem à televisão e recebem informações da mesma forma que os adultos recebem; logo, a infância se modifica novamente. Desse modo, para Postman (1999), na modernidade a infância volta a desaparecer, pois as ações das crianças se assemelham às dos adultos.

Em meio à tecnologia dos eletrônicos, no século XXI, a infância também passa a ter

novos sentidos. A nosso ver, a infância contemporânea se assemelha à infância definida por

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Ariès (1981), na Idade Média e, por Postman (1999), na modernidade, em que a criança repete comportamentos de um adulto por utilizar aparelhos eletrônicos, como celulares, para utilizar redes sociais e consequentemente acessar os mesmos conteúdos que os adultos. Isso acontece de acordo com a posição social que a criança ocupa, conforme elucidaremos sobre uma infância que é influenciada e se identifica com a ideologia dominante e troca o brinquedo pela tecnologia dos eletrônicos. Esse, então, passa a ser um novo sentido de brincadeira, talvez o dominante, afirmamos isso pelo “fato de que há um já-dito que sustenta a possibilidade mesma de todo dizer, é fundamental para se compreender o funcionamento do discurso, a sua relação com os sujeitos e com a ideologia.” (ORLANDI, 2005, p. 32).

As significações dependem do tempo histórico e da forma como a sociedade está organizada (CHARLOT, 1979). Dialogando com Bernard Charlot (idem) em “A mistificação pedagógica” consideramos que a criança é um ser em desenvolvimento que depende do adulto, característica esta que se encontra em todas as classes sociais, mesmo que com relações diversas. Porém a criança não é um ser abstrato e homogêneo, além disso não há uma concepção universal de infância em um mundo em que existem desigualdades sociais, luta de classes, racismo, pobreza, tráfico de drogas, falta de saneamento, doenças crônicas, falta de alimentação básica, problemas familiares, diferentes valores em cada família e, consequentemente, diferentes infâncias.

A criança não tem, em si, um valor unívoco e não existe um tipo em si e universalmente ideal de relação entre a criança e o adulto. É simplesmente aberrante falar, no abstrato, da criança e de suas relações com o adulto, esquecendo que se trata ora desse ser que grita e corre por toda parte enquanto o trabalhador durma, à noite, ora desse ser cuja ingenuidade depende de uma concorrência financeira e comercial impiedosa. (CHARLOT, 1979, p. 134)

Esse discurso de Charlot (1979) sobre as diferentes relações entre adulto e criança na

sociedade nos direciona ao conceito de luta de classes definido por Pêcheux (2014), conceito

fundamental para a Análise do Discurso, que será mobilizado nesta pesquisa, juntamente com

o conceito de condições de produção, que constitui a instância verbal de produção do discurso,

e englobam o contexto sócio-histórico, os interlocutores, o lugar social que eles ocupam para

produzir o discurso, a imagem que fazem de si, do outro e do referente envolvidos na produção

do discurso. No caso desta pesquisa, buscamos compreender como os interlocutores

(pesquisadora e sujeitos-alunos da pesquisa) constroem sentidos sobre o brincar, a partir de um

dado lugar, qual seja, a escola, sendo que há um contexto mais amplo, constituído por uma luta

de classes (relações sociais competitivas), no qual essa instituição e os interlocutores se

inserem, e isso interfere no que pode e deve ser dito sobre o objeto discursivo, além de interferir

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no que não será dito e será ocultado pelos sujeitos. As relações de poder (lutas de classes) existem, pois na sociedade capitalista existe a ideologia autoritária e meritocrática, que dissemina que alguns grupos da sociedade são superiores a outros grupos, envolvendo disputa de poder financeiro e político, os grupos que possuem maior poder financeiro e político dominam os grupos que possuem menos, mesmo com direitos iguais garantidos por lei.

(ALTHUSSER, 1985)

Estas relações de poder em uma sociedade capitalista dividida em classes sociais diferentes, em que uma classe social domina outra, influenciam de forma sócio-histórico- ideológica a infância e define qual posição social que a criança ocupa na sociedade. A criança é um ser heterogêneo, assim como o conceito de infância, isso devido à multiplicidade de sentidos e à incompletude que não nos fornece um modelo pronto. “O estado incompleto da criança é, ao mesmo tempo, promessa de perfeição e imperfeição atual.”

(CHARLOT, 1979, p.

103)

. E nem queremos um modelo pronto, visto que, para a Análise do Discurso, a incompletude é constitutiva do sujeito e da linguagem, ambos são influenciados pela ideologia, sendo assim, a história da infância é constantemente ressignificada. “Por isso dizemos que a incompletude é a condição da linguagem: nem os sujeitos, nem os sentidos, logo, nem o discurso, já estão prontos e acabados.” (ORLANDI, 2005, p. 37).

Em meados do século XX, o Brasil passou por muitas transformações, dentre elas, a ampliação da educação para a população. Inicia-se nesse período a preocupação com a infância, pois com o avanço dos estudos sobre o desenvolvimento infantil surge a necessidade de uma instituição especializada com foco no desenvolvimento das aprendizagens. Estudos da área educacional, da filosofia e da psicologia contribuíram para esse avanço. Um exemplo são os estudos da psicóloga Helena Antipoff (2002), que, por meio de uma pesquisa sobre as preferências dos sujeitos na infância, constatou que a maioria mencionou algum brinquedo ou brincadeira. Sabendo do interesse maior dos sujeitos na infância, alguns pesquisadores passaram a estudar a questão e descobriram que a aprendizagem é mais eficiente quando valoriza os interesses dos sujeitos, seguiremos para algumas significações sobre o brincar.

Na origem do latim, a palavra brincar originou de “vinculum”, que significa laço ou algema, e é derivada do verbo em latim “vincire”, que significa prender, seduzir ou encantar.

Hoje a palavra brincar tem o sinônimo de divertir-se. Na origem do germânico, brincar originou

de “blinkan” que significa brilhar. Recorrer à matriz antiga da palavra nos leva a entender as

transformações dos sentidos das palavras e como esses sentidos foram constituídos socialmente,

pois a intenção aqui não é definir apenas um significado como correto e a existência de um

sentido único, mas a exploração dos diversos sentidos possíveis e como houve atualização ou

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apagamento de alguns sentidos ao longo da história.

Nesta pesquisa abordamos a concepção do brincar com base na teoria histórico-cultural (VIGOTSKI, 2004), sendo que consideramos como condição de produção o sujeito-aluno em desenvolvimento por meio da interação e interlocução com os seus pares na escola ao discursivizar sobre as obras de Portinari, que retratam o brincar e as brincadeiras.

Assim como na etimologia da palavra brincar há diversos sentidos, na visão dos teóricos que discursivizaram sobre o brincar, também não circula apenas um sentido único, ou seja, há um pluralismo conceitual sobre a temática. Muitos teóricos utilizaram o brincar como temática de suas pesquisas, porém neste trabalho recorremos às contribuições de Vigotski (2004) que, dadas as diferenças, assim como, Pêcheux (2014) concebe o sujeito como sócio-histórico.

No discurso da Psicologia Histórico-cultural, Vigotski (2004) estudou sobre o desenvolvimento humano inserido em um meio social e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Com base nos conceitos de Vigotski, por meio da interação entre os sujeitos é possível a mobilização de novas aprendizagens, ou seja, o brincar por possibilitar a interação e o contato com situações desafiadoras é uma atividade que possibilita o desenvolvimento das funções psicológicas superiores e, consequentemente, a aprendizagem.

Na brincadeira e diante de uma situação que promove a imaginação, a criança encontra-se em uma zona de desenvolvimento proximal, por meio das ações, durante a atividade, a criança pode chegar à zona de desenvolvimento real quando ela conquista saberes sobre a ação realizada.

Por meio da interação social, a criança também adquire experiências que, segundo Vigotski (2009), por meio delas e das memórias é que acontece o processo de criação e imaginação na infância, entendida por ele como atividade historicamente constitutiva do homem que se desenvolve no social. Em “A formação social da mente”, o autor russo analisa que a brincadeira é uma forma de expressar a imaginação e a criação, é quando a criança incorpora as práticas e os papéis dos adultos em suas posições sociais.

A brincadeira da criança não é uma simples recordação do que vivenciou, mas uma reelaboração criativa de impressões vivenciadas. É uma combinação dessas impressões e, baseadas nelas, a construção de uma realidade nova que responde às aspirações e aos anseios da criança. Assim como na brincadeira, o ímpeto da criança para criar é a imaginação em atividade. (VIGOTSKI, 2009, p. 17)

O cérebro da criança está em formação, pois a criança está no processo de

desenvolvimento, ou seja, no exercício constante do pensar, do criar, da curiosidade, do desejo

por alguma coisa e esse desejo pode ser demonstrado em uma brincadeira (faz-de-conta).

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Vigotski (2009) valoriza o caráter criativo da brincadeira no desenvolvimento infantil, por isso o seu papel fundamental para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores.

A brincadeira de faz-de-conta é uma situação imaginária, envolve regras específicas e

“o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal na criança. No brinquedo a criança comporta-se de forma mais avançada do que nas atividades da vida real e também aprende a separar objeto e significado.” (OLIVEIRA, 1997, p. 67)

Sendo assim, a promoção de atividades que favoreçam o envolvimento da criança em brincadeiras, principalmente aquelas que promovem, a criação de situações imaginárias, tem nítida função pedagógica. A escola e, particularmente, a pré-escola poderiam se utilizar deliberadamente desse tipo de situações para atuar no processo de desenvolvimento das crianças.

(OLIVEIRA, 1997, p. 67)

Visto o que foi exposto e como essa teoria contribuiu para a construção dos discursos sobre o desenvolvimento infantil e a importância do brincar nessa fase da vida, entendemos que é inquestionável o direito de brincar no desenvolvimento da criança, inclusive na escola;

todavia, esse direito ainda não é considerado como atividade pedagógica fundamental, sendo valorizadas apenas atividades tradicionais com foco na alfabetização, conforme observamos em nossas experiências no contexto escolar.

Nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, toda a trajetória escolar é marcada pelo cumprimento de conteúdos e provas, ficando a aula de educação física, uma vez por semana, o mais próximo do que estamos entendendo por brincar e que está na estrutura curricular para essa etapa. Os conteúdos das áreas do conhecimento ocupam o lugar principal na escola e o brincar sempre é ignorado ou tratado como não importante. Dessa forma, no contexto escolar na sociedade capitalista que vivemos, a criança vive a infância sendo privada de ter seu desenvolvimento por meio de brincadeiras e experiências que lhe possibilitem a aprendizagem e o amadurecimento do comportamento.

Por meio desta pesquisa foi possível analisar como o brincar está presente nos anos

iniciais da escolarização, pensar no espaço escolar, como este é configurado e se há espaços

livres para o brincar. Brincar este que possibilita, além do desenvolvimento, o contato com a

imaginação e criatividade, fundamentais para o sujeito trabalhar com a polissemia e os

múltiplos sentidos, conceitos estimados para a Análise do Discurso que valoriza a interpretação

e as significações em constante movimento. Analisamos também como o sujeito-aluno e

(30)

sujeito-criança envolvem-se com o brincar nos momentos vivenciados no contexto escolar e ao mesmo tempo em conflito com o ensino tradicional

4

de reprodução da paráfrase.

Afirmamos então, que a criança que possui a oportunidade de brincar tem condições de se colocar, mesmo que imaginariamente, em situações que fogem do cotidiano, movimentando a imaginação e a criatividade, consequentemente os múltiplos sentidos da linguagem.

Considerando que há situações nas quais sujeitos-crianças a depender de sua posição e classe social são impossibilitadas de vivenciar o brincar, visto que “a representação da criança é socialmente determinada, uma vez que exprime as aspirações e as recusas da sociedade e dos adultos que nela vivem. Mas a oposição entre os ideais e os tabus sociais é metamorfoseada em contradições inerentes à natureza da criança.” (CHARLOT, 1979, p. 134). A interação, interlocução e as vivências com seus pares podem ser tolhidas tanto no contexto social, familiar, quanto no contexto escolar.

Entramos agora na questão crítica de nossa pesquisa, ou seja, a (des)valorização do brincar no contexto escolar, que acontece principalmente pela falta de financiamento e recursos para a Educação. Sendo a infância uma construção social, uma fase da vida que é influenciada pelo contexto econômico, histórico e cultural, a escola também é uma construção social e o serviço prestado na escola precisa considerar a importância do desenvolvimento infantil, mas não é isso que acontece na realidade. Há um baixo investimento na educação pública no Brasil, pois este é um serviço que não é muito valorizado ainda, mas existe uma força de ativistas pela educação que lutam por melhoras, por isso é um processo de luta por direitos, por mudanças e conquistas, e, esperamos que nosso trabalho traga contribuições para essa luta.

1.2 A (des)valorização do brincar no contexto escolar

Haja vista que, a precariedade e a desigualdade marcam o percurso histórico no contexto escolar principalmente por causa das relações de poder da sociedade capitalista. Esse baixo investimento na educação pública tem impacto, sobretudo, na qualidade do atendimento prestado. Conforme análises realizadas por Rosemberg (2001) toda a precarização e falta de financiamento vão refletir na criança, no ensino e no desenvolvimento; além disso, as Políticas Públicas voltadas para educação não consideram as necessidades reais dos sujeitos que precisam desse serviço. Muitas vozes são silenciadas nesse processo, pois não são consideradas

4 Nossa definição de ensino tradicional é um ensino que impõe atividades escolares padronizadas, normalmente

em folhas impressas ou livros didáticos, que valorizam um sentido único que deve ser preenchido pelos alunos, para reproduzir a paráfrase, sem considerar o contexto, a interação e o letramento.

(31)

as reais necessidades das crianças, das famílias, dos professores e profissionais que estão envolvidos na prestação e utilização dos serviços da educação pública.

Nesse contexto, no Brasil, ainda há uma defesa de modelos educacionais de baixo custo para a educação e esses modelos são dominados pelas empresas, devido à luta de classes, como já mencionado anteriormente, os grupos que possuem maior poder financeiro e político em uma sociedade neoliberal capitalista dominam os grupos que possuem menos poder. O país deveria arcar com os custos totais em educação pública de qualidade, mas há a transferência desse dever para outras instâncias (Organismos financeiros multilaterais). Essa educação financiada por outras instâncias não favorecem as crianças, as famílias, os professores e os profissionais envolvidos na Educação Infantil. Devido às relações desiguais de poder essa lógica de mercado somente favorece a ideologia neoliberal capitalista. Os organismos financeiros multilaterais, como o Banco Mundial, e as agências multilaterais, como a Unesco defendem a lógica de mercado, com o baixo investimento em educação e, consequentemente, a precarização do ensino, que visa à formação de um sujeito produtivo para o mundo do mercado. No entanto, a educação vai além disso, ela é extremamente importante, não para fins de mercado, mas, para o desenvolvimento de um sujeito crítico de direitos e que argumente sobre seus direitos.

A teoria do capital social sustenta grande parte da atenção recente do Banco Mundial ao tema do bem-estar social: aumentar o capital social de uma pessoa, sua capacidade de vincular-se a redes sociais e compartilhar riscos levaria a maior competitividade e produtividade (IDS, 2000). As metáforas econômicas e tecnocráticas da teoria do capital social são usadas para explicar e justificar o interesse do Banco Mundial pelas crianças e pela infância. Para o Banco, o objetivo da infância é tornar-se um adulto plenamente produtivo, o “capital humano” do futuro. (PENN, 2002, p. 12-13)

Visto que o significado da infância muda de acordo com o sistema produtivo, os estudos de Helen Penn asseveram que a criança pequena, de acordo com a lógica de mercado, é considerada “como capital humano, muito distante de uma concepção da criança como sujeito de direitos.”

(PENN, 2002, p. 21)

Vemos que a falta de Políticas Públicas que garantem o direito a uma educação pública de qualidade somente amplia a desigualdade social. E o discurso meritocrático que circula na sociedade, reflexo das relações de poder, entrega a responsabilidade da educação para os sujeitos-crianças que são constituídos pela sociedade, pela família e pela escola.

Em um universo em que a educação é vista como um meio para formar sujeitos

produtivos para o mercado de trabalho e que a qualidade não é prioridade, esse modelo

capitalista que influencia os sistemas de ensino também visa a silenciar mais ainda os sujeitos-

(32)

escolares, com o medo de que sujeitos-alunos percebam o prejuízo que a precarização do ensino pode causar. Sendo assim, é mais cômodo para o país que a culpa caia sobre o sujeito-aluno, inculcando-se nele, pelo efeito da ideologia, a responsabilidade pelo seu desenvolvimento, deixando-se, dessa maneira, de ser dever do Estado garantir o direito à Educação por meio de uma educação pública de qualidade, omissão do poder público em propiciar as condições necessárias para isso.

Esse mau investimento na Educação Infantil pública no Brasil, reflete nos anos futuros e apenas intensifica os níveis de desigualdade do país, sempre investindo pouco nas camadas baixas e mais pobres, desconsiderando a real necessidade das crianças e famílias que precisam da escola pública, e, consequentemente, desvalorizando o professor.

Como não é nada fácil permanecer quatro horas nas salas de aulas sem dominar a ferramenta básica do ensino, “moscando” na solidão de quem já se sabe excluído, elas (as crianças) se juntam em grupos – como constituem a maioria, dominam o professor, a sala de aula, o pátio, a escola, o bairro e a cidade. O barato sai muito caro! (BELINTANE, 2018, p. 211)

Essa reflexão muito significante, pois o pouco investimento em educação pode causar muitos prejuízos, principalmente, para os sujeitos-crianças, que, por não terem garantido o mínimo necessário para desenvolver suas aprendizagens acabam excluídos do sistema de ensino e carregam consigo a culpa por não conseguirem acompanhar os estudos.

Consideramos que, se não existir investimento, valorização dos interesses das crianças, valorização das necessidades das famílias e valorização do professor não haverá educação de qualidade. Por isso é necessário desnaturalizar o discurso dominante sobre o financiamento da educação pública, no sentido de não aceitar o pouco investimento que é destinado para a educação e lutar por Políticas Públicas que valorizem a importância de um ensino público de qualidade para o desenvolvimento da infância.

Há também a necessidade de desnaturalizar o discurso dominante apoiado no ensino

tradicional que se baseia no controle dos movimentos das crianças na escola e na transmissão

de conteúdos prontos, que não valoriza o letramento, o pensamento reflexivo e novas formas

de atividades para desenvolver a aprendizagem e o acesso da criança ao conhecimento. No

entanto, com as mudanças na cultura escolar, como por exemplo, com o advento da tecnologia

no ensino, tanto por meio de aulas de informática nas escolas, como também com o uso de

eletrônicos no ambiente familiar é necessário modificar esse formato de ensino, valorizando-se

atividades que quebrem com estereótipos tradicionais e passem, portanto, a considerar e

promover o letramento e o pensamento reflexivo no processo de aprendizagem, como afirma

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Tfouni (2006) sobre a importância do letramento ao mencionar a teoria histórico-cultural de Vigotski que,

representa o coroamento de um processo histórico de transformação e diferenciação no uso de instrumentos mediadores. Representa também a causa da elaboração de formas mais sofisticadas do comportamento humano que são os chamados “processos mentais superiores”, tais como: raciocínio abstrato, memória ativa, resolução de problemas etc. (TFOUNI, 2006, p. 21)

Faz-se necessário repensar uma educação de qualidade que valorize o letramento, tendo o brincar presente no ambiente escolar, pois nossa concepção sobre o brincar, especialmente no contexto escolar, caminha na direção do desenvolvimento e é educativo na medida em que possibilita ao sujeito participar de atividades de interação, por meio da brincadeira de faz-de- conta, que envolve regras que possibilitam o desenvolvimento da imaginação e criatividade, pois na infância, a criança se constitui como sujeito por meio das múltiplas linguagens, como por exemplo, linguagem corporal, linguagem artística, linguagem oral, linguagem visual, linguagem facial, linguagem escrita, dentre outras.

A complexidade do pensamento infantil é expressa nas atividades produzidas pelas crianças, sempre muito valiosas e cheias de significados. Vale destacar que a aprendizagem ocorre permeada por diversas linguagens, concepção que, de acordo com a Análise do Discurso

“restitui ao fato de linguagem sua complexidade e sua multiplicidade (aceita a existência de diferentes linguagens) e busca explicitar os caracteres que o definem em sua especificidade, procurando entender o seu funcionamento.” (ORLANDI, 1995, p. 35)

Então os efeitos do verbal e do não verbal, conforme explicita Orlandi (1995), podem favorecer o trabalho por meio da polissemia, sendo que atividades que favorecem a interpretação dos múltiplos sentidos são atividades que favorecem o letramento. Assim como, atividades de brincadeiras e jogos com regras que possibilitam o desenvolvimento das crianças, sendo que o brincar está muito além do prazer,

[...] como uma iniciativa de procurar resolver, imediatamente, necessidades suas, o que nem sempre acontece, dado modo como se estrutura a própria atividade (...) É no jogo as relações da criança com os adultos e com as outras crianças, dado o lugar social que ocupa na rede cultural que a envolve, que emerge, evolui e se transforma a brincadeira infantil do faz-de-conta, dando lugar ao jogo com regras em que há a supremacia da palavra. (TUNES &

TUNES, 2001, p. 84-85).

No período que compreende os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a criança está em

pleno desenvolvimento da compreensão, aquisição de linguagem e do pensamento

(34)

generalizante (agrupamentos de ideias e conceitos). Nessa fase, as brincadeiras de faz-de-conta se fazem mais presentes, então, as crianças começam a entender o modo como os objetos funcionam e a relação dos adultos com os objetos e com as pessoas. Por isso, a importância das brincadeiras e suas regras, que amadurecem o comportamento, auxiliam no desenvolvimento da aprendizagem, por meio do pensamento e da linguagem. Oliveira afirma que,

[...] são justamente as regras da brincadeira que fazem com que a criança se comporte de forma mais avançada do que aquela habitual para a sua idade.

[...] Sendo assim, a promoção de atividades que favoreçam o envolvimento da criança em brincadeiras, principalmente aquelas que promovem a criação de situações imaginárias, tem nítida função pedagógica. A escola e, particularmente, a pré-escola poderiam se utilizar deliberadamente desse tipo de situações para atuar no processo de desenvolvimento das crianças.

(OLIVEIRA, 1997, p. 67)

Sendo assim, as atividades devem ser organizadas visando a favorecer brincadeiras com movimentos, que devem estar presentes nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, pois promovem a adequação das exigências e propostas às possibilidades psicomotoras das crianças:

o desenvolvimento da postura e atenção, da autonomia, e dos aspectos cognitivos e afetivos, de forma integrada. Jogos com movimentos e regras tornam-se mais complexos na infância, pois há a ampliação dos jogos simbólicos coletivos. Martins afirma que,

[...] esses jogos exercem grande influência em todas as facetas do desenvolvimento, pois, neles também se formam níveis mais elevados de percepção, memória, imaginação, processos psicomotores, processos verbais, elaboração de ideias e de sentimentos etc., auxiliando a passagem do pensamento empírico concreto para formas mais abstratos do pensamento, premissa básica da complexa aprendizagem sistematizada. Entende-se então que a escola precisa organizar atividades que favoreçam uma variedade de opções para que a criança possa escolher, sinta-se motivada e interessada a participar das atividades propostas. (MARTINS, 2007, p. 74)

Para isso, a organização do tempo e do espaço, e das situações de aprendizagem, contando com ambientes preparados com materiais diversos, jogos, brinquedos, de forma que a criança se sinta convidada a interagir e a brincar, são boas opções para favorecer a aprendizagem. Por meio de uma educação de qualidade promover interações sociais, atendendo às individualidades e contribuindo para o atendimento das crianças.

Vale ressaltar que uma educação de qualidade deve considerar as diversidades presentes

em sala de aula e atender aos princípios de uma aprendizagem significativa, para proporcionar

o desenvolvimento infantil. Porém, o aumento de um ano no Ensino Fundamental, de acordo

com a Lei 11.114 (BRASIL, 2005), modifica o funcionamento da escola, o que pode ocasionar

(35)

a retirada de atividades que envolvam brincadeiras e o aumento de atividades que envolvam conteúdos, pois aos seis anos a criança estaria no primeiro ano, que tem como foco a alfabetização.

Com a nova lei, o objetivo seria garantir aos alunos maior tempo na escola, mas será que esse tempo é utilizado da melhor maneira para o desenvolvimento dos alunos, considerando que nessa faixa etária a brincadeira é fundamental para o desenvolvimento da criança? Tendo essa questão como norteadora, neste trabalho analisamos os discursos dos sujeitos-alunos sobre como o brincar e as brincadeiras estão presentes, ou não, nos Anos Iniciais da Educação Básica.

Essa questão é relevante, pois conforme afirma Correa, que “os maiores desafios que se impõem neste momento dizem respeito ao direito das crianças de brincarem, mas, também, de aprenderem. É fundamental que se supere, pois, a oposição entre o brincar e o aprender nessa faixa etária.” (CORREA, 2010, p. 15).

O brincar é um direito garantido por lei; porém, não vemos esta atividade com tanta frequência nas rotinas escolares da Educação Básica, assim como está nos documentos oficiais (LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente e BNCC – Base Nacional Comum Curricular).

A LDB, lei que estabelece as diretrizes e bases para a educação – Lei 9.394 – garante o direito por uma educação de qualidade. Entende-se que uma educação de qualidade envolva os direitos básicos para a Educação Básica, o brincar como atividade presente na infância que precisa ser praticada com qualidade nos anos iniciais da Educação Básica. O direito ao brincar também é garantido pela Lei 8.069, ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, que é o direito de poder brincar, garantido no artigo 16, inciso IV.

Na proposta da BNCC – Base Nacional Comum Curricular (2017) a criança é considerada como um sujeito sócio-histórico de direitos, que por meio de suas relações interpessoais nas suas práticas cotidianas constrói sua identidade, brinca, aprende, imagina, experimenta, deseja, questiona e constrói sentidos sobre o meio social em que vive.

A BNCC do Ensino Fundamental – Anos Iniciais, ao valorizar as situações lúdicas de aprendizagem, aponta para a necessária articulação com as experiências vivenciadas na Educação Infantil. Tal articulação precisa prever tanto a progressiva sistematização dessas experiências quanto o desenvolvimento, pelos alunos, de novas formas de relação com o mundo, novas possibilidades de ler e formular hipóteses sobre os fenômenos, de testá- las, de refutá-las, de elaborar conclusões, em uma atitude ativa na construção de conhecimentos. Nesse período da vida, as crianças estão vivendo mudanças importantes em seu processo de desenvolvimento que repercutem em suas relações consigo mesmas, com os outros e com o mundo. (BNCC, 2017, p.

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Referências

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