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RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE REVISÃO FUNDAMENTOS

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 07S055

Relator: SOUSA GRANDÃO Sessão: 31 Outubro 2007 Número: SJ2007103100554 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: AGRAVO Decisão: NEGADO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE REVISÃO FUNDAMENTOS

INDEFERIMENTO LIMINAR ASSISTENTE

DEPOIMENTO DE PARTE FORÇA PROBATÓRIA

CONFISSÃO JUDICIAL

Sumário

I - Enquanto a interposição de um recurso ordinário, qualquer que ele seja, se destina a evitar o trânsito em julgado de uma decisão desfavorável, o recurso extraordinário de revisão visa a alteração de uma sentença já transitada.

II - Constitui motivo de indeferimento liminar do pedido de revisão o facto de o fundamento invocado pelo recorrente não se enquadrar em nenhum dos que corporizam a enunciação legal prevista no art. 771.º do CPC.

III - No caso do fundamento previsto na alínea b) do art. 771.º do CPC, está em causa a própria falsidade de algum dos meios probatórios ali previstos, seja de documento, de acto judicial, de depoimento (testemunhal ou de parte) ou das declarações dos peritos.

IV - Em relação ao fundamento previsto na alínea c) do mesmo preceito legal, exige-se como requisito do documento a sua “novidade” - o que significa que o documento não foi apresentado no processo onde se proferiu a decisão a

rever, seja porque ainda não existia, seja porque, existindo, a parte não pode socorrer-se dele - e a sua “suficiência” - no sentido de que este implique uma modificação da decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

V - Quando o documento integre declarações atribuídas a algumas das partes, a “suficiência” do mesmo só existe se incorporar uma declaração confessória

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judicial com força probatória plena (art. 358.º do CC).

VI - O depoimento de parte constitui um meio processual que a lei adjectiva coloca ao serviço do direito probatório material para promover a confissão judicial (art. 356.º do CC).

VII- A confissão judicial produzida num processo não tem força probatória plena noutro processo em que aquela é invocada, submetendo-se à livre apreciação do julgador.

VIII - As declarações prestadas pelo assistente, em audiência de julgamento de um processo criminal, estão sujeitas à livre apreciação do julgador, carecendo de qualquer força probatória especial.

IX - Daí que a certidão de um processo criminal onde o assistente, legal representante da autora numa acção emergente de contrato individual de trabalho, afirma ter dado ordens para que os réus nesta acção fossem

impedidos de continuar a prestar a actividade na autora durante o período de pré-aviso de rescisão do contrato, consubstancia um documento cuja força probatória está circunscrita à livre apreciação do julgador civil e laboral, carecendo de força probatória para modificar a prova na referida acção

laboral (em que os rés haviam sido condenados em indemnização por falta de cumprimento do aviso prévio nas respectivas rescisões dos contratos de trabalho), não constituindo, por isso, fundamento, para o recurso

extraordinário de revisão.

Texto Integral

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1-RELATÓRIO

1-1

Por apenso à acção que lhes foi movida, no Tribunal do Trabalho da Maia, por

“AA – Comércio de Tintas e Produtos Similares Lda.” vieram os ali Réus BB, CC e DD interpor recurso extraordinário de revisão, “nos termos dos artigos 771º e seguintes do C.P.C.”, do Acórdão proferido nesses autos pelo Tribunal da Relação do Porto, aduzindo, para o efeito e em síntese, que:

- a referida demandante, representada legalmente pelo seu sócio-gerente EE, conforme procuração junta aos autos, alegou, no petitório inicial da acção, que os Réus, ora recorrentes, não asseguraram o exercício da sua actividade

laboral, enquanto trabalhadores da Autora, durante o período de aviso prévio

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a que estavam obrigados;

- e pede, em consequência disso, que os Réus sejam condenados a indemnizá- la por essa omissão, ascendendo o valor global do pedido a € 46.880,35;

- sucede que o mencionado EE, em data posterior à sentença da 1ª instância e quando o processo pendia, em recurso, no Tribunal da Relação do Porto,

referiu expressamente, em depoimento prestado a 30/6/05 no processo-crime nº 167/02.3, que tinha sido ele próprio quem despedira os Réus durante o referenciado período do pré-aviso;

-esse depoimento contraria frontalmente a alegação produzida na presente acção e implica a necessária alteração das respostas dadas aos quesitos correspondentes, bem como das decisões lavradas pelas instâncias, devendo ainda a demandante “AA” ser condenada como litigante de má fé.

1-2

Em sede liminar, o Exm.º Relator do processo, que ainda corria termos no Tribunal da Relação, indeferiu a pretensão dos recorrentes, por entender que o fundamento aduzido não tinha a virtualidade de integrar o elenco taxativo enunciado no aludido art. 771º.

Sob reclamação dos recorrentes, a conferência confirmou o despacho do Exm.º Relator.

1-3

Irresignados com a decisão, os recorrentes dela agravaram para este Supremo Tribunal, rematando a sua minuta alegatória com o seguinte núcleo

conclusivo:

1 – o documento – fundamento do recurso de revisão refere-se a factos ocorridos no dia 9/11/01, exactamente a data a que diz respeito a decisão a rever;

2 – a p.i. e restantes peças processuais da ora recorrida foram subscritas pelo seu mandatário, segundo as instruções do mandante, o representante legal daquela recorrida, EE, conforme procuração junta com aquele articulado;

3 – ou seja, no processo cuja decisão se pretende rever, o Tribunal conheceu a versão dos factos daquele representante legal, por intermédio do seu

mandatário;

4 – diferentemente, no documento-fundamento, o Tribunal conheceu a versão dos mesmos factos directamente pela boca do dito representante legal;

5 – O que significa, contrariamente ao que diz o Acórdão recorrido, que aquele documento é suficiente, só por si e sem necessidade de mais, para modificar a decisão a rever, uma vez que integra um depoimento que versa directamente sobre a verdade dos factos, sendo, por isso, melhor e mais forte a sua força probatória;

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6 – As declarações do representante legal da recorrida foram prestadas

perante um magistrado judicial, na qualidade de assistente, estando sujeito ao dever de verdade e à consequente responsabilidade final pela sua violação – art.ºs 346º nº 2 e 145º nº2 do Código de Processo Penal;

7 – e estão em contradição com o declarado pela ora recorrida na sua P.I. e com os depoimentos das suas testemunhas, bem como com a matéria dada como provada e com a sentença a rever;

8 – não estando as declarações, prestadas pelo representante legal da

recorrida, em conformidade com as prestadas indirectamente na P.I., os factos vertidos neste articulado são inexistentes, não podendo já sequer sobre os mesmos ser produzida prova, uma vez que esta é posterior àquela;

9 – ainda que assim não fosse entendido, as testemunhas inquiridas, que são funcionários da ora recorrida e cujos depoimentos foram decisivos para a convicção que formou o Tribunal da 1ª instância, não podiam saber tanto ou mais que a própria entidade patronal sobre factos que lhe são pessoais;

10 – se a recorrida tivesse contado a verdade na P.I., tal como fez no processo- crime, a decisão a rever teria sido totalmente diferente, uma vez que nunca resultaria provado que os recorrentes não cumpriram o aviso prévio e, consequentemente, nunca os mesmos teriam sido condenados a pagar à recorrida as quantias arbitradas;

11 – o documento fundamento é um documento novo, porque posterior às decisões a rever, como também é suficiente, só por si, para modificar essas decisões: se nele se documenta que a entidade patronal despediu os

recorrentes, esse facto é inconciliável com o incumprimento do período de aviso prévio, sendo também inconciliável com o facto de as decisões em causa referirem que não houve má fé da recorrida;

12 – o presente recurso tem por fundamento, quer a alínea B), quer a al. C) do art.º 771º do C.P.C., cujos comandos foram violados;

13 – como também foi violado o art. 774º nº 2 do mesmo Código, visto que o indeferimento liminar só pode basear-se em razões que se prendem com a sua viabilidade formal, o que não parece ter sido aqui o caso;

14 – deve o presente recurso ser julgado procedente revogando-se o Acórdão impugnado, como único acto que pode ajudar a alterar uma sentença que, neste momento, se encontra intoleravelmente injusta.

1-4

Não foram apresentadas contra-alegações.

1-5

O Exm.º Procurador-Geral Adjunto, a cujo douto Parecer não foi apreciada resposta, sustenta a procedência do recurso.

(5)

1-6

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

***

2- FACTOS

Releva a seguinte factualidade:

1 – “AA – Comércio de Tintas e Produtos Similiares Lda., intentou acção de condenação contra BB, CC e DD, pedindo que os Réus sejam condenados a pagar-lhe os montantes indemnizatórios que discrimina, quer por terem rescindido os respectivos contratos laborais sem cumprirem integralmente o aviso prévio que lhes impunha observar, quer pelos prejuízos que causaram à Autora por terem desviado parte da sua clientela para a empresa para onde foram trabalhar;

2 – os demandados impugnaram a versão da P.I. e, em sede reconvencional, pediram que a Autora fosse condenada a pagar-lhes a respectiva indemnização de antiguidade e diversas prestações remuneratórias, a par da sua

condenação como litigante de má fé;

3 – a 1ª instância julgou a acção e a reconvenção parcialmente procedentes:

no que aqui releva, os Réus foram condenados a pagar à Autora, a título de indemnização por incumprimento de aviso prévio, respectivamente, as quantias de €401,53, €1.454,83 e € 669,22;

4 – na apelação interposta pelos Réus, o Tribunal da Relação do Porto alterou para € 669,22 a indemnização a pagar pelo 2º Réu;

5 – continuando irresignados os Réus pediram revista, que não foi admitida pelo Exm.º Desembargador-Relator e cuja decisão, sob reclamação dos recorrentes, veio a ser confirmada pelo Exm.º Presidente deste Supremo Tribunal;

6 – a 1ª instância motivou do seguinte modo a matéria de facto fixada na acção:

“Foram decisivos para formar a convicção do Tribunal os depoimentos das testemunhas ..., que tem conhecimento dos factos por ter sido funcionária da Autora, ..., ...., ... e ..., que têm conhecimento dos factos por terem sido

funcionários da Autora, que têm conhecimento dos factos por terem sido

sócios-gerentes da Autora, conjugados com os documentos de fls. 44 a 82, 95 a 124, 135 a 140, 188, 215-217 e 224. Os referidos depoimentos, pela razão de ciência revelada e pela seriedade com que foram prestados, convenceram, nessa parte, dos factos ora considerados provados, não tendo, porém, revelado grau de conhecimento para, com a necessária segurança, dar como assentes os restantes”;

7º- em 22/6/04, no âmbito dos autos de Processo Comum (Tribunal Singular) nº 167/02.3, ao tempo pendentes no Tribunal Judicial de Comarca da Maia, o

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ali arguido BB foi pronunciado pela prática de um crime de dano, previsto e punido pelo art. 212º nº1 do Código Penal, sendo ofendida e assistente a supra identificada “ AA”;

8º - em 30/6/05, o legal representante da assistente “AA”, EE, prestou, nesse processo-crime, as declarações que se mostram reproduzidas na certidão de fls. 17 a 69;

9º – a procuração forense, outorgada pela Autora “AA” na acção referida em 1-, foi subscrita pelo seu legal representante EE.

São estes os factos.

***

3 – DIREITO 3-1 -

Tendo em atenção o núcleo conclusivo das alegações vertidas pelos

agravantes, verifica-se que o objecto do presente recurso pressupõe a análise das seguintes questões:

1º-fundamento genérico do recurso extraordinário de revisão;

2º - âmbito do seu indeferimento liminar;

3º - enquadramento legal dos fundamentos invocados.

3-2

O recurso extraordinário de revisão foi criado pelo Código de Processo Civil de 1939 que, assim, substituiu a “acção anulatória de caso julgado”, de que

cuidava o art. 148º do Código de 1876.

Este recurso veio admitir, em situações taxativamente indicadas na lei, a impugnação de decisões judiciais já cobertas pela autoridade do caso julgado, pretendendo assegurar-se com ele o primado da justiça sobre a segurança.

Enquanto a interposição de um recurso ordinário, qualquer que ele seja, se destina a evitar o trânsito em julgado de uma decisão desfavorável, o aludido recurso extraordinário visa a alteração de uma sentença já transitada.

Excepcionalmente, a lei abre a rediscussão de uma matéria já definitivamente resolvida: entre o interesse da certeza na declaração judiciária do direito accionado e a exigência de um direito justo, que ainda pode vir a ser produzido, a lei opta por este, permitindo a reabertura do debate.

Fá-lo porém, em situações-limites, de tal modo graves que abalam clamorosamente o princípio da desejada justiça material.

É que o prestígio de um Estado de Direito impor que a reapreciação de uma decisão transitada só possa ser feita quando seja fundadamente de crer que a sua formação se acobertou em vícios graves, que adjectivam uma realidade patentemente desconforme com o direito recto e justo que se pretende alcançar.

Citado por Alberto dos Reis (in “Código de Processo Civil Anotado, vol. VI,

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pág. 337), já Mortara escrevia:

“Quanto mais evolui a consciência jurídica dum povo culto, mais se difunde a convicção de que é legítimo corrigir erros, cobertos embora pelo prestígio do caso julgado, mas que não devem subsistir, porque a sua irrevogabilidade corresponderia a um dano social maior, do que a limitação feita ao mítico princípio da intangibilidade do caso julgado”.

Tudo ponderado, compreende-se que a admissibilidade do recurso em análise esteja reservada a situações especialíssimas – mais concretamente, aquelas (e só aquelas) – que se mostram elencadas no art.º 771º do Cod. Proc. Civil (a cujo diploma pertencem os demais preceitos a citar sem menção de origem.

3-3

O recurso de revisão tem uma tramitação própria, toda ela processada no Tribunal onde estiver o processo em que foi lavrada a decisão a rever – art.ºs 772º a 776º - sem embargo de as decisões proferidas no processo de revisão admitirem os recursos ordinários a que estariam originariamente sujeitas no decurso da acção em foi proferida a sentença revidenda – nº 4 do citado art.º 772º.

Assim, é certo que o pedido de rescisão está necessariamente sujeito à apreciação liminar do Juiz da causa, a fim de que este:

1 – o rejeite “…quando não vier deduzido ou instruído nos termos do artigo anterior e também quando se reconheça logo que não há motivo para revisão – nº2 do art. 774º (sublinhado nosso) – e ainda quando ele for intempestivo ou se constate a falta de pressupostos processuais específicos dos recursos ordinários – remissão daquele nº2 para o art. 687º nº3-;

2 – mande notificar a parte contrária quando “o recurso for admitido” - nº3 do mesmo artigo 774º.

Como se vê, um dos casos de indeferimento liminar reconduz-se, justamente, à constatação de que “não há motivo para revisão”.

Impunha-se este esclarecimento, pois os recorrentes adiantam nas suas alegações (cfr. Conclusões 13ª) “… que o indeferimento liminar só pode basear-se em razões que se prendem com a sua viabilidade formal…”.

Não é assim.

O mencionado juízo conclusivo pressupõe o necessário confronto entre o fundamento invocado e aqueles que corporizam a enunciação legal.

Assim, nada impedia que o Tribunal “a quo” tivesse rejeitado o recurso por desenquadramento normativo do fundamento eleito pelos recorrentes.

3-4-1

Sustentam os recorrentes que as declarações, prestadas em audiência de julgamento de um processo-crime, pelo legal representante da ora recorrida

“Relator”, contrariando frontalmente a versão que a mesma recorrida, como

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Autora, sustentou na acção cível apensa e que veio a ser sufragada pelas instâncias, constituem fundamento bastante para que se opere a revisão da decisão final que ali veio a ser proferida.

Mais adiantam que esse fundamento se integra, cumulativamente, na previsão das alíneas b) e c), do falado art. 771º.

Este preceito, na parte útil, dispõe como segue:

“A decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão nos seguintes casos:

b) Quando se verifique a falsidade do documento ou acto judicial, de depoimento ou das declarações de peritos, que possam, em qualquer dos casos, ter determinado a decisão a rever. A falsidade de documento ou acto judicial não é, todavia, fundamento de revisão se a matéria tiver sido discutida no processo em que foi proferida a decisão a rever;

c) Quando se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

…”.

Ainda que se reportem ambos à “formação do material instrutório”, os fundamentos plasmados nas alíneas transcritas não se confundem entre si:

No caso da alínea b), elege-se a própria falsidade de algum dos meios

probatórios ali previstos, seja de documento, de acto judicial, de depoimento (testemunhal ou de parte) ou das declarações de peritos.

O D.L. nº 38/2003, de 8 de Março, que conferiu nova redacção à alínea em análise, veio dispensar que a apontada falsidade se mostre confirmada através de sentença transitada em julgado: tal prova pode agora ser feita na fase

rescindente do recurso de revisão – art.ºs 774º nº3 e 775º nº2.

Como quer que seja, torna-se de todo evidente que os recorrentes não

invocam a falsidade de qualquer dos meios probatórios em que se ancorou a decisão a rever, sendo que o fundamento em apreço exige que o vício se reporte, em concreto, a algum ou alguns desses meios probatórios.

A questão circunscreve-se, tão somente, à relevância probatória que deve ser conferida ao documento apresentado pelos recorrentes.

E disso só cuida, como já sabemos, a previsão da mencionada alínea c).

3-4-2

De acordo com essa alínea, o documento atendível terá de preencher dois requisitos:

- o Requisito da “novidade” e o Requisito da “suficiência”.

A “novidade” significa que o documento não foi apresentado no processo onde

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se proferiu a decisão a rever, seja porque ainda não existia, seja porque, existindo, a parte não pôde socorrer-se dele.

Quanto à “suficiência”, o Código de 1939 exigia que o documento tivesse a virtualidade de “destruir” a prova em que a sentença se havia fundado.

O Código de 1961, e as alterações ulteriores, vieram “aligeirar” esse requisito:

- não se exige já que o documento altere radicalmente a situação de facto em que assentou a sentença revidenda, basta que ele implique uma modificação dessa decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

Vejamos o concreto dos autos.

O documento apresentado constitui uma certidão judicial, onde se mostram exaradas as declarações do representante legal da assistente (autora e

recorrida na acção apensa), prestadas em audiência de julgamento, no âmbito de um processo criminal em que a referida assistente imputa ao aí arguido BB (um dos Réus na aludida acção) a prática de um crime de dano.

Na dita acção – recordemo-la – os Réus, ora recorrentes, foram condenados a indemnizar o seu empregador pela inobservância do prazo legal de aviso

prévio que antecede a operatividade da rescisão contratual a que procederam.

As referidas declarações, por seu turno, contém diversos extractos onde o representante legal da assistente afirma ter dado ordens para que os Réus fossem impedidos de continuar a prestar a sua actividade na empresa, o que sucedeu durante o período do pré-aviso.

Não se questiona a “superveniência” do documento, ou seja, que os ora

recorrentes não tivessem podido fazer uso dele no processo em que foi lavrada a decisão a rever: esse documento é posterior às decisões das instâncias.

Apenas se coloca a questão da sua “suficiência” para produzir os reclamados efeitos revidendos.

Para tal, torna-se necessário confrontar o documento apresentado com os demais elementos probatórios produzidos em juízo, por forma a saber se ele tem, ou não, a virtualidade de implicar a modificação da decisão em sentido mais favorável à parte que dele se socorre.

E que requisitos se exigem para o efeito?

3.4.3.

Quando o documento integra declarações atribuídas a alguma das partes – como aqui acontece – aquela virtualidade só existe se o documento incorporar uma declaração confessória judicial com força probatória plena – art. 358º do Cód. Civil.

Cingindo-nos, por ora, ao domínio do processo civil comum, o Regime do

“depoimento de parte” está, todo ele, inserido na secção subordinada à epígrafe “Prova por confissão das partes”.

A lei substantiva define a “confissão” como “… o reconhecimento que a parte

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faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorável à parte contrária” – art. 352º do Cód. Civil.

Assim, o depoimento de parte constitui um meio processual que a lei adjectiva coloca ao serviço do direito probatório material para promover a confissão judicial – art. 356º do mesmo Código.

Bem se compreende, por isso, que tal depoimento só possa ser exigido quando esteja em causa o reconhecimento, pelo depoente, de factos “… cujas

consequências jurídicas lhe são prejudiciais e cuja prova competiria, portanto, à parte contrária, nos termos do artigo 342º do Código Civil” (Manual de Andrade in “Noções Elementares de Processo Civil”, 1976, pág. 240).

Trata-se de um testemunho qualificado pelo objecto: por isso, a lei

circunscreve o âmbito do depoimento aos factos susceptíveis de confissão e ademais, exige a prévia indicação da respectiva factualidade (art.ºs 552º e 554º), o que só se justificará para permitir ao Tribunal o efectivo controlo dos requisitos substantivos da prova por confissão.

Neste contexto – isto é, com tantas reservas – facilmente se entende que a lei atribua força probatória plena à “confissão judicial”.

Mas quando é que estamos perante uma “confissão judicial”?

O art. 355º do Cód. Civil, depois de aludir, no seu nº1, às modalidades da confissão – pode ser judicial ou extrajudicial – e de precisar, no seu nº2, que a confissão judicial é a feita em juízo, estabelece, no seu nº3, que “a confissão feita num processo só vale como judicial nesse processo; a realizada em qualquer procedimento preliminar ou incidental só vale como confissão judicial na acção correspondente” (sublinhado nosso).

Este preceito articula-se, no domínio adjectivo, com o art. 522º nº1: “Os depoimentos e arbitramentos produzidos num processo com audiência

contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no nº3 do artigo 355º do Código Civil…”

(sublinhado nosso).

É dizer, em suma, que a confissão invocada num processo, mas produzida noutro, deixa de ter a força probatória plena, que ali se confere, para se submeter, aqui, à livre apreciação do julgador.

3.4.4

Cuidámos, até aqui, de apreciar o Regime conferido a “depoimento de parte”

pela lei adjectiva comum.

Porém, atenta a diferente natureza dos processos em confronto (civil e criminal), é altura de aludir às declarações do assistente, prestadas em audiência de julgamento no processo penal.

Segundo o preceituado no art. 145º do Código de Processo Penal, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 1º do D.L. nº 320-c/2000, de 15 de Dezembro, em

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vigor à data em que foram produzidas as declarações em análise – 30 de Junho de 2005:

“1 – Ao assistente e às partes civis podem ser tomadas declarações a requerimento seu ou do arguido ou sempre que a autoridade judiciária o entender conveniente.

2 – O assistente e as partes civis ficam sujeitos ao dever de verdade e a responsabilidade penal pela sua violação.

3 – A prestação de declarações pelo assistente e pelas partes civis fica sujeita ao regime de prestação da pena testemunhal, salvo no que lhe for

manifestamente inaplicável e no que a lei dispuser diferentemente.

4 – A prestação de declarações pelo assistente e pelas partes não é precedida de juramento.

5 – Para o efeito de serem notificados, o assistente ou as partes civis indicarão a sua residência, o local de trabalho ou outro domicílio à sua escolha.

6 – A indicação de local para efeitos de notificação, nos termos do número anterior, é acompanhada da advertência do assistente ou às partes civis de que a mudança de morada indicada deve ser comunicada através da entrega de requerimento ou a sua remessa por via postal registada à secretaria onde os autos se encontram a correr nesse momento”

Este preceito é aplicável à prestação de declarações em audiência de julgamento por virtude do que dispõe o art. 346º do C.P.P..

Embora a violação do dever de verdade, pelo assistente, implique

responsabilidade criminal (cfr. Art.º 359º nº2 do Código Penal), as suas declarações prestadas em audiência – não precedidas de juramento – estão sujeitas à livre apreciação do julgador, carecendo de qualquer força

probatória especial: é o que resulta do princípio geral enunciado no art. 127º do C.P.P., de acordo com cujo comando, “Salvo quando a lei dispuser

diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”.

No domínio da lei adjectiva penal, como se vê, as declarações do assistente, mesmo no âmbito do processo em que são prestadas, não têm um valor probatório superior aos demais meios de prova, de aí produzidos, o que bem se compreende, atenta a específica posição processual que aí ocupa o

assistente, manifestamente diversa da posição da parte no foro Civil.

Compaginados os dois regimes adjectivos atendíveis, verifica-se que a certidão do processo criminal, em que os recorrentes fundam o seu pedido de revisão, consubstancia um documento cuja força probatória está circunscrita à livre apreciação do julgador civil e laboral, carecendo de força bastante para modificar a prova em que se fundou a sentença revidenda.

Sendo consequentemente inadmissível o recurso de revisão, devemos concluir

(12)

que nenhuma censura nos merece o Acórdão agravado.

xxx

4 -DECISÃO

Em face do exposto, decide-se negar provimento ao agravo e confirmar o Acórdão recorrido.

Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 31 de Outubro de 2007 Sousa Grandão(relator)

Pinto Hespanhol Vasques Dinis

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