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2.14. Bioenergética de Peixes

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2.14. Bioenergética de Peixes

Michele de Faveri Gimenes Evanilde Benedito-Cecílio

Introdução

A popularidade de modelos bioenergéticos nos últimos anos tem aumentado a importância de se determinar a densidade calórica de peixes (Bryan, 1996), para um maior entendimento do fluxo de energia nos ecossistemas. Segundo Calow, (1985) estes modelos têm sido usados para responder questões específicas de manejo e de funcionamento do ecossistema.

Neste último caso, o estudo do balanço energético de um organismo possibilita uma maior compreensão da sua ecologia, pois este expressa qual proporção da energia consumida é direcionada para os vários processos vitais e como esta alocação pode flutuar durante o ciclo de vida da espécie (Phan et al., 1993). Toda a energia adquirida através da ingestão de alimentos é ultimamente perdida como fezes ou por produtos de excreção, manutenção do metabolismo e/ou depositada para a construção de novos tecidos (crescimento somático e reprodutivo) (Jobling, 1994; Calow, 1985).

Existe uma estreita relação entre as variações no status fisiológico do peixe e a composição do seu corpo, sendo que muitos autores tem usado as mudanças no conteúdo energético de tecidos como indicadores de mudanças fisiológicas sazonais nos peixes (Dawson & Grimm, 1980; Hoss, 1974). Desse modo, mudanças sazonais no crescimento e ciclo reprodutivos dos peixes, normalmente relacionadas a alterações dos fatores bióticos e abióticos, podem provocar alterações no conteúdo calórico de tecidos (Encina L. & Granado-Lorencio, 1997). Assim a alocação da energia assimilada do alimento tem profundas implicações na sobrevivência e sucesso reprodutivo da espécie (Calow, 1985). Pianka (1982) relata que a energia armazenada corresponde ao resultado preciso das limitações e interações entre os custos e benefícios de uma determinada situação ecológica.

Segundo Philips o requerimento energético dos peixes dependem da espécie estudada, temperatura da água, tamanho do indivíduo, tipo de alimento, atividades fisiológicas (como reprodução) e fatores ambientais. As variações sazonais na densidade energética são geralmente associadas com os ciclos reprodutivos e alimentares do peixe (Pedersen & Hislop, 2001), com tendência de maiores valores da densidade energética para organismos maiores e maduros (Hislop et al., 1991). Variações nos valores calóricos refletem a incorporação de diferentes materiais nos tecidos e as mudanças fisiológicas durante a vida dos peixes, portanto, tais variações podem invalidar o uso de valores de energia fixos para modelos bioenergéticos (Meakins, 1976).

Muitos autores tem utilizado modelos predador-presa para avaliar a transferência de energia ao longo da cadeias alimentares (Bryan, 1996). Entretanto o conhecimento de variações energéticas interespecíficas são de extrema importância.

Dentre as espécies de peixes de expressiva contribuição e consideradas topo de cadeia, para a planície de inundação do alto rio Paraná, destaca-se Serrasalmus marginatus, pertencente a ordem Characiformes (Família Serrasalmidae) e popularmente conhecida como piranha. É uma espécie

solitária, com cuidado parental, que estabelece territórios alimentares de cerca de 3 a 4 m2(Agostinho et

al, 2000) in agostinho A espécie tornou-se abundante na planície de inundação do alto rio Paraná após a construção da barragem de Itaipu, 150 Km a jusante do salto de Sete Quedas, a qual resultou no afogamento da barreira geográfica natural. S. marginatus, uma espécie restrita ao segmento montante, invadiu o alto rio Paraná. Segundo Agostinho (2003) a perseverança de S. marginatus no cuidado com a desova (prole) e a agressividade no estabelecimento do território alimentar pode ser o fator determinante no sucesso da colonização do alto rio Paraná.

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Considerando que vários autores destacam que os efeitos ambientais no padrão de alocação de energia devem ser examinados dentro de um contexto de padrões ontogenéticos (Brett et. al, 1969; Cui & Wooton, 1988), e de bioecologia das espécies (Jonsson, 1997; Pedersen, 2001) o objetivo do trabalho foi o de avaliar a variação no conteúdo calórico de piranhas conforme o ambiente, tamanho do indivíduo, sexo, e estádio de maturação gonadal, tomando como hipótese nula que a energia contida nos músculos de S. marginatus é influenciada pelas variáveis ambiente, tamanho do indivíduo, sexo e comportamento reprodutivo.

Material e Métodos

A área de estudo compreendeu a planície de inundação do alto rio Paraná (22º40’-22º50’S; 53º10’-53º40’W) que se estende desde a foz do rio Paranapanema até o início do reservatório de Itaipu. As coletas foram realizadas trimestralmente, durante os períodos de setembro de 2004 a setembro de 2005. A amostragem se deu em nove estações, pertencentes a três subsistemas: Ivinheima (rio Ivinheima, lagoa Ventura e lagoa dos Patos), Baia (rio Baia, lagoa Fechada e lagoa do Guaraná) e Paraná (rio Paraná, ressaco do Pau Veio e lagoa das Garças) (Figura 1).

Dentre as lagoas citadas acima, somente a lagoa ventura e lagoa fechada foram caracterizadas como lagoas fechadas (ambientes lênticos que não possuem contato direto com o rio), sendo as demais lagoas abertas, (ambientes lênticos, mas com conexão constante com o rio), incluindo o ressaco.

53 15’o 53 30’o 53 30’o PORTO RICO PARANÁ SÃO PAULO

MATO GROSSO DO SUL

23 00’o 23 00’o 22 45’o Rio B aía Rio Rio P aranap anem a Rio Direção de fluxo

Base avançada do NUPELIA

Legenda Escala Estações de coletas Paraná Paran á Canal Curutuba 0 2,5 5,0 7,5km Rio Ivinheima Ilha F lorest a Ilha M utum Ilha d o Óleo Cru Ilha Japone sa AMÉRICA DO SUL BR A SIL Paran á R. 4 5 6 9 8 7 3 2 1

Figura 1: Área de estudo com a localização dos pontos de coleta na planície de inundação do alto rio Paraná (1: lagoa Ventura, 2: lagoa dos Patos, 3: rio Ivinheima, 4: lagoa do Guaraná, 5: lagoa Fechada, 6: rio Baia, 7: lagoa das Garças, 8: rio Paraná, 9: ressaco do Pau Veio).

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Redes de diferentes malhagens (variando de 2,4 a 16 cm entre nós adjacentes), com esforço padronizado para cada tipo de rede, foram expostas por 24 horas em cada local, com revistas a cada 8 horas. Após a captura, os peixes foram transportados para o laboratório da UEM em Porto Rico (Pr), onde foram identificados e tomados dados como comprimento total (Lt), comprimento padrão (Ls), e peso total (Wt). Uma incisão ventral foi feita para a exposição das gônadas para determinação macroscópica do sexo e estágio de desenvolvimento gonadal segundo Vazzoler (1996) os quais foram imaturo (imt); início de maturação (ini); maturação (mat); semi-esgotado (ses); esgotado (esg); repouso (rep); e recuperação (rec). Durante o período de coleta não foram amostrados indivíduos machos em recuperação e fêmeas esgotadas.

Foram extraídas amostras da musculatura de S. marginatus, da região próxima a inserção da nadadeira

dorsal (cerca de 3 cm2). As amostras foram acondicionadas em papel alumínio, etiquetadas e

congeladas. Após, foram secas em estufa de ventilação, a 60ºC por 48 horas, e maceradas com auxílio de moinho de esferas para obtenção de um pó fino e homogêneo. A quilocaloria por grama de peso seco foi determinada em bomba calorimétrica (modelo Parr 1261) a qual mede o valor energético dos materiais biológicos através da liberação de calor durante o processo de combustão.

Como os pressupostos da análise de variância (homocedasticidade e normalidade) foram atingidos (p > 0,05), as diferenças nas médias do conteúdo calórico da espécie entre sexo, estádio de maturação e locais diferentes foram verificadas, depois de uma análise gráfica, através de uma ANOVA unifatorial, no programa Statistica 6.1, sendo os resultados inferidos ao nível de 5% de significância. Na análise da variação calórica em função do comprimento padrão foram adotadas classes de comprimento padrão variando de 2,5 em 2,5 cm, tendo a última classe uma variação de 3,9 cm devido ao baixo número amostral nas classes maiores. Além da análise de variância, as classes de comprimento e a caloria foram avaliadas através do coeficiente de correlação de Pearson.

Resultados

Foram amostrados 171 indivíduos, dos quais 105 eram fêmeas e 66 machos, distribuídos em diferentes estádios de maturação gonadal e ambientes da planície de inundação do alto rio Paraná. As médias no conteúdo calórico de músculos para S. marginatus variaram de 4,531 Kcal/g a 5,835 Kcal/g de peso seco.

Os valores calóricos para a referida espécie nos diferentes ambientes amostrados (rio, lagoa aberta e lagoa fechada) foram significativamente diferentes (ANOVA: G.L.= 2; F = 4,832; p = 0,009), sendo o Rio, o ambiente que apresentou as maiores médias calóricas, seguido de lagoas abertas (Figura 2).

RIO LAB LFE

Ambiente 4.84 4.86 4.88 4.90 4.92 4.94 4.96 4.98 5.00 5.02 5.04 5.06 5.08 C o n te ú d o c a ló ri c o ( k c a l/ g P S )

Figura 2: Média (□) do conteúdo calórico (Kcal/g de peso seco) e erro padrão (barras verticais) para S.

marginatus nos diferentes ambientes da planície de inundação do alto rio Paraná (RIO =Rio; LAB

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Considerando os subsistemas amostrados, foram encontradas médias calóricas significantemente diferentes entre os subsistemas Ivinheíma, Baia e Paraná (ANOVA: G.L. = 2; F = 4,699; p = 0,01), tendo o Ivinheima as menores médias, e o Paraná a maior variabilidade. Para os locais também foram registradas diferenças significativas (ANOVA: G.L. = 8; F = 2,737; p = 0,007). Verificou-se que Lagoa das Garças (pertencente ao subsistema Paraná) e o rio Baía apresentaram as maiores médias no conteúdo calórico (5,183 Kcal/g e 5,051 Kcal/g respectivamente) (Figura 4).

Em relação ao sexo, foram verificadas diferenças significativas entre as médias calóricas de machos e fêmeas (ANOVA: G.L. = 1; F = 11,49, p = 0,001). Observou-se que as médias do conteúdo calórico para a referida espécie foi maior para fêmeas (5,029 Kcal/g) do que para machos (4,924 Kcal/g) (Figura 5).

IVI BAIA PAR

Subsistemas 4.90 4.92 4.94 4.96 4.98 5.00 5.02 5.04 5.06 5.08 C o n te ú d o c a ló ri c o ( K c a l/ g P S )

rivi lpat lven rbai lfec lgua rpar lgar lpve

Local 4.8 4.9 5.0 5.1 5.2 5.3 5.4 C o n te ú d o c a ló ri c o ( K c a l/ g P S )

Figura 3: Media (□) do conteúdo calórico (Kcal/g de peso seco) e erro padrão (barras verticais) para S.

marginatus nos diferentes subsistemas (IVI = Ivinheima; BAIA = Baia; PAR = Paraná) e locais

(rivi = rio Ivinheima; lpat = lagoa dos Patos; lven = lagoa Ventura; rbai = rio Baía; lfec = lagoa Fechada; lgua = lagoa do Guaraná; rpar = rio Paraná; lgar = lagoa das Garças; lpve= ressaco do Pau Veio).

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f m Sexo 4.88 4.90 4.92 4.94 4.96 4.98 5.00 5.02 5.04 5.06 C o n te ú d o c a ló ri c o ( K c a l/ g P S )

Figura 5: Média (□) do conteúdo calórico (Kcal/g de peso seco) e erro padrão (barras verticais) para fêmeas (F) e machos (M) de S. marginatus da planície de inundação do alto rio Paraná.

As médias do conteúdo calórico de S. marginatus nos diferentes estádios de maturação gonadal foram diferentes significativamente para machos (ANOVA: G.L. = 5; F = 4,787; p = 0,001), ao

contrário das fêmeas (ANOVA: G.L. = 5; F = 0,596, p = 0,703)(Figura 6).

Observou-se que para fêmeas, as maiores médias foram para os estádios INI (inicio de maturação) e REC (recuperação) e para machos INI (início de maturação) e REP (repouso). Também se observou tanto para machos quanto para fêmeas que o estádio imaturo apresentou as menores médias.

Em relação ao comprimento padrão do peixe, foram encontradas diferenças significativas (G.L. = 5; F = 1,33; p = 0,000). Observou-se que os maiores tamanhos possuem um valor calórico maior (Figura 7). Estádios de maturação C o n te ú d o c a ló ri c o ( k c a l/ g d e p e s o s e c o )

imt ini mat ses rec rep

4.75 4.85 4.95 5.05 5.15 5.25 Estádios de Maturação C o n te ú d o c a ló ri c o ( K c a l/ g d e p e s o s e c o )

imt ini mat ses esg rep

4.65 4.75 4.85 4.95 5.05 5.15

Figura 6: Média (□) do conteúdo calórico (Kcal/g de peso seco) e erro padrão (barras verticais) para fêmeas (A) e machos (B) de S. marginatus em diferentes estádios de maturação gonadal (imt = imaturo; ini = início de maturação; mat = maturação; ses = semi-esgotado; esg = esgotado; rep = repouso; e rec = recuperação).

B A

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Classes de tamanho (cm) C o n te ú d o c a ló ri c o ( k c a l/ g d e p e s o s e c o ) 7,0 - 9,5 9,5 - 12,0 12,0 - 14,5 14,5 - 17,0 17,0 - 19,5 19,5 - 23,4 4.75 4.85 4.95 5.05 5.15 5.25 5.35

Figura 7: Média(□) do conteúdo calórico (Kcal/g de peso seco) e erro padrão (barras verticais) para diferentes classes de tamanhos de S. marginatus.

Em relação a variação sazonal observou-se diferenças significativas do conteúdo calórico entre os meses de coleta apenas para machos (DF = 4; F = 2,79; p = 0,03), ao contrário das fêmeas (DF = 4; F = 1,38; p = 0,24). Para os machos as menores médias foram constatadas para o mês de dezembro de 2004.

Mês C o n te ú d o c a ló ri c o ( K c a l/ g d e p e s o s e c o )

Setembro 2004 Dezembro 2004 Março 2005 Junho 2005 Setembro 2005 4.85 4.90 4.95 5.00 5.05 5.10 5.15 5.20 5.25 Mês C o n te ú d o c a ló ri c o ( K c a l/ g d e p e s o s e c o )

Setembro 2004 Dezembro 2004 Março 2005 Junho 2005 setembro 2005 4.80 4.84 4.88 4.92 4.96 5.00 5.04 5.08

Figura 08 Média (□) do conteúdo calórico (Kcal/g de peso seco) e erro padrão (barras verticais) para S.

marginatus nos diferentes meses de coleta para fêmeas (A) e machos (B). Discussão

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Muitas espécies de peixes apresentam ciclos sazonais de condição, nutrição e estocagem de energia, o qual usualmente são relatados com variações nos fatores ambientais, sugerindo que a estocagem de energia está relacionada com mudanças ambientais e com o ciclo reprodutivo (Cui e Wootton 1988). Assim, estudos de efeitos de fatores como ambiente, reprodução e variação ontogênica na composição do corpo e no conteúdo energético de peixes são necessários para apontar tais mudanças.

A influência do ambiente (rio, lagoa aberta e lagoa fechada) no conteúdo calórico de S. marginatus foi significativa, destacando-se que para os rios a média no conteúdo calórico dos músculos foi maior. Sabe-se que a atividade reprodutiva de S.marginatus no rio é muito intensa e a atividade de sua competidora S. spilopleura é nula (Agostinho 2003). A alta intensidade reprodutiva de S. marginatus em todos os ambientes, especialmente lóticos, conferem a esta espécie uma vantagem competitiva adicional. A sua adaptação nesses ambientes possibilitou a ocupação de novos ambientes, e resultou numa maior disponibilidade de habitats, tornando possível um maior investimento reprodutivo, o que reflete numa maior alocação de energia nesses ambientes.

Santos (2005) avaliando a influência do ambiente na alocação de energia para S. marginatus na área de influência do reservatório de Manso, observou que não existiam diferenças significativas entre os ambientes amostrados (baía, o reservatório e tributários), mas os maiores valores foram encontrados para os tributários, os quais são ambientes lóticos.

Segundo Bryan (1996) a densidade calórica de peixes pode variar geograficamente entre populações, ou seja, espacialmente. Sendo assim, a análise da variação espacial sobre o conteúdo calórico foi significativa e destacou-se que o rio Baia e lagoa das Garças foram os locais onde se encontraram indivíduos com maior média no conteúdo calórico dos músculos. A baixa amostragem na lagoa das Garças e predominância de indivíduos maduros devem ter contribuído para a alta média encontrada. As diferenças significativas para os diferentes locais de amostragem refletiram em diferenças entre os subsistemas, apresentando o Ivinheima as menores médias. Isto se deve ao fato do subsistema Ivinheima apresentar uma maior quantidade de indivíduos imaturos, os quais se destacaram por apresentar médias calóricas baixas. A definição de padrões para o conteúdo calórico dos músculos em relação a variação espacial é difícil, tendo em conta que trabalhos publicados sobre a variabilidade espacial no conteúdo calórico de peixes ainda são escassos. Sabe-se que fatores abióticos podem influenciar a alocação de energia nos peixes, portanto disponibilidade de alimentos, heterogeneidade ambiental, abundância de presas, locais de forrageamento e desova, temperatura da água dentre outras variáveis podem estar influenciando as médias calóricas encontradas (Phillips, xxxx).

Entre os sexos da espécie analisada, observou-se que as fêmeas obtiveram as maiores médias de densidade calórica, a qual foi diferente significativamente da média de machos. As fêmeas produzirem gametas maiores do que os machos, e isto reflete em um maior tamanho das gônadas para as fêmeas no período que antecede a desova. Este fato exige um armazenamento de maior quantidade de energia para o processo de maturação gonadal (Vazzoler, 1996, Wootton, 1990) e consequentemente um maior investimento reprodutivo. Jonsson et al. (1997) também encontrou que o conteúdo energético de tecidos somáticos para fêmeas de Salmo salar foi maior do que dos machos.

Segundo o mesmo autor, a energia usada durante o desenvolvimento reprodutivo é frequentemente mobilizada de estoques em tecidos somáticos e visceral. Mas a reprodução usualmente requer mais do que somente a produção dos gametas (Miller, 1979). Segundo Wooton (1985), o custo energético para reprodução dependem dos produtos sexuais primários (gametas), produtos sexuais secundários (coloração, características morfológicas) e do comportamento reprodutivo. Assim, em adição, ao custo de desenvolvimento gonadal, existe um custo energético adicional associado com a migração, competição por territórios de desovas, construção de ninhos, defesa de áreas de alimentação, preparação para reprodução e cuidado parental (Jobling 1994). Para a espécie Oncorhynchus nerka (salmão), cerca de 80% de sua energia total foi gasta durante a migração e desova (Brett, 1986). Para algumas espécies, como o salmão do Atlântico, a sobrevivência de indivíduos após a desova varia entre populações, devido ao alto custo energético para a reprodução. (Jonsson et al., 1991).

Diferenças significativas foram encontradas para os diferentes estádios de maturação gonadal somente em machos, resultado encontrado também no trabalho de Santos (2005) para a mesma espécie no reservatório de Manso. Os menores valores energéticos, em ambos os sexos, foram encontrados para

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indivíduos imaturos. Peixes maduros tipicamente tem um valor calórico mais alto do que peixes imaturos por causa do tamanho do corpo, composição, e desenvolvimento das gônadas (Meakins, 1976, Craig, 1977). Diferenças entre indivíduos imaturos e adultos foram também registradas por Bryan 1996, para três espécies de peixes predadores (Stizostedion vitreum, Oncorhynchus tschawytscha, e

Oncorhynchus mykiss).

Os estádios de maturação gonadal que apresentaram as maiores médias de densidade calórica, para fêmeas foram para os estádios INI (inicio de maturação) e REC (recuperação) e para machos INI (início de maturação) e REP (repouso). Após o período de reprodução que os indivíduos iniciam o processo de recuperação e armazenamento de energia nos músculos. Grupos ou cistos de espermatogônias e ovogônias organizam-se para reiniciar o período de maturação gonadal (Benedito, 1989), sendo possível que, pela intensificação desse processo, ocorra maior exigência no acúmulo de energia para posterior mobilização para as gônadas com o avanço da maturação gonadal. Então o período que antecede o processo reprodutivo e a desova é um período de estocagem de energia (Foltz &Norden, 1977; Rand et al., 1994).

Com recursos limitados para uso no metabolismo, a alocação de energia para formação dos gametas está no gasto da energia de manutenção dos processos e estruturas somáticos (Calow, 1985). Os recursos que são desviados da manutenção somática para reprodução de acordo com uma série de prioridades fisiológicas, podem ter efeito na sobrevivência dos adultos. Portanto crescimento e reprodução são ambos processos de produção que sempre vão competir pelos mesmos recursos limitados.

Para o presente estudo foram constatadas diferenças significativas entre as médias do conteúdo calórico para as diferentes classes de tamanho. Peixes pequenos tem uma taxa metabólica maior, consomem mais oxigênio, do que peixes grandes (Jobling, 1993), o que faz com que ele gaste mais energia para manutenção do metabolismo, sendo pouca energia estocada nos músculos.

Sogard (2004) encontrou um aumento na alocação do estoque de lipídios assim que ele aumenta o tamanho corporal. Padrões similares foram encontrados em diversas espécies, onde um aumento no tamanho do corpo acompanhou um aumento na densidade calórica (Weatherley e Grill 1983). Segundo Meakins (1976) conforme os peixes crescem, decrescem os gastos metabólicos e aumentam os custos associados com a reprodução.

Pedersen, 2001 relata que o tamanho do peixe não é um bom preditor da densidade energética devido a sobreposição da influencia das estações e consequentemente do ciclo reprodutivo. Para a tilápia do Nilo, o tamanho do corpo não teve um significante efeito no conteúdo energético, provavelmente causada por um declínio na ingestão de alimento em tilapias maiores como resultado da maturação sexual (Xie et al. 1997). Neste estudo, os maiores indivíduos tiveram uma maior variabilidade quando comparadas as classes de menor tamanho, devido ao fato daquelas sofrerem uma maior influência dos processos reprodutivos. Estes fatos justificam o baixo valor encontrado para o coeficiente de correlação entre as variáveis conteúdo calórico e comprimento padrão.

Além da influência to tamanho na alocação de energia, muitas investigações tem mostrado diferenças sazonais no conteúdo calórico de materiais biológicos (Tyler, 1973). As mudanças sazonais na densidade energética não são relacionadas somente com o ciclo reprodutivo, eles podem também estar relacionados com mudanças no consumo alimentar e dieta. (Pedersen, 2001). Para espécies de peixes de clima temperado, variações sazonais são comuns, com estocagem de lipídios no início do inverno (Booth e keast, 1986; Henderson et al, 1988). Foltz & Norden (1977) encontraram para a espécie

Osmerus mordax que a utilização da energia estocada durante o inverno tem como evidencia a redução

no consumo de alimento.

Bryan (1996) destaca que mudanças sazonais na densidade calórica de peixes não somente indica mudanças sazonais na condição corpórea, mas também pode estar relacionado a mudanças na biomassa da comunidade, densidade alimentar e mudanças climáticas.

As diferenças significativas nas médias calóricas dos machos nos meses de coletas, apontaram a maior média para os meses de março e junho de 2005 e a menor para o mês de dezembro. Sabe-se que a espécie estudada possui desova parcelada, que se estende de setembro a março (Nakatani et al., 2001).

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O baixo valor calórico encontrado para dezembro reflete a influência do processo de desova, portanto energia está sendo alocada dos músculos para maturação das gônadas e desova, pertencendo a maioria dos indivíduos amostrados neste mês aos estádios mat e ses. Já para os meses de março e junho, os peixes encontram-se em recuperação ou repouso, já iniciando o processo de maturação, portanto estocando energia para um novo ciclo reprodutivo.

Já para fêmeas, não foram encontradas diferenças significativas assim como para os estádios de maturação gonadal. No ínicio de 2005 houve uma cheia significativa para a planície de inundação do alto rio Paraná. Modificações fisiológicas podem estar associadas ao pulso de inundação que exerce grande influência sobre o ciclo de vida dos organismos, possibilitando que os peixes aproveitem as condições favoráveis disponibilizadas nos períodos de águas altas, podendo garantir a sobrevivência da progênie e resultando, portanto, em um sincronismo generalizado da reprodução com a subida do nível das águas (Moreira, 2004). No período de enchente na planície de inundação, ocorre uma expansão das áreas alagadas e de biótopos, fornecendo, além de alimento, abrigo aos juvenis. As cheias determinam a disponibilidade de alimento, de abrigo, reprodução, crescimento (Agostinho et al, 2001).

Embora machos e fêmeas tenham similares tomadas de alimento, existe um investimento reprodutivo mais aparente em fêmeas do que em machos. A flexibilidade na alocação de energia, para o presente trabalho, é dependente da reprodução e do tamanho do corpo sendo modificada também por um complexo associado a condições ambientais diferentes.

Portanto, este estudo mostrou que ambiente, reprodução e tamanho do corpo, contribuem para a variabilidade no conteúdo energético de S. marginatus da planície de inundação do alto rio Paraná, e que estágios da história de vida e estação devem ser considerados em estudos de energética de peixes. A Bioenergética é uma ferramenta que pode ser aplicável dentro da aqüicultura, pois fornece uma avaliação da importância relativa da influencia de vários fatores ambientais no crescimento do peixe. A maioria dos estudos disponíveis com informações bioenergéticas tem sido obtidas de estudos laboratoriais conduzidos ou com espécies de fácil captura ou aquelas de grande importância comercial, portanto mais estudos devem ser conduzidos neste ramo da Ecologia.

Trabalhos adicionais também são necessários para determinar padrões de alocação de energia de peixes presentes nos rios e especialmente daqueles já represados para esclarecer e levantar novas questões acerca da ecologia e biologia das espécies. O estudo com S. marginatus, por se tratar de uma espécie predadora, com altas densidades populacionais, merece ter esclarecidas suas relações ecológicas a fim de que medidas de manejo possam contemplar numa visão geral, as vias de energia que garatam a sustentabilidade da espécie nestes ambientes.

Referências

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