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A necessidade do status de militar como condição de prosseguibilidade na ação penal de deserção das praças sem estabilidade

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Academic year: 2021

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AUGUSTO ANTÔNIO OLDRA

A NECESSIDADE DO STATUS DE MILITAR COMO CONDIÇÃO DE PROSSEGUIBILIDADE NA AÇÃO PENAL DE DESERÇÃO DAS PRAÇAS SEM

ESTABILIDADE

Palhoça 2017

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AUGUSTO ANTÔNIO OLDRA

A NECESSIDADE DO STATUS DE MILITAR COMO CONDIÇÃO DE PROSSEGUIBILIDADE NA AÇÃO PENAL DE DESERÇÃO DAS PRAÇAS SEM

ESTABILIDADE

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Paulo Calgaro de Carvalho, Msc.

Palhoça 2017

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

A NECESSIDADE DO STATUS DE MILITAR COMO CONDIÇÃO DE PROSSEGUIBILIDADE NA AÇÃO PENAL DE DESERÇÃO DAS PRAÇAS SEM

ESTABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Palhoça, 19 de junho de 2017.

_____________________________________

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Dedico este trabalho a meu avô Deoclides, por ter acompanhado minha trajetória na formação jurídica, de uma visão privilegiada, acima das estrelas, perto de Deus.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Dirceu e Estela, por me ensinarem o valor e a importância do conhecimento.

Ao Professor Paulo Calgaro de Carvalho, por ser referência como docente e militar, por ter sido um dos pioneiros no ensino do direito penal na minha formação jurídica e por ter aceitado a arduosa tarefa de orientação do projeto que, hoje, se torna uma monografia.

À minha companheira Ana Luisa, pelo incentivo diário e por ser meu refúgio de todos os sentimentos ruins.

Agradeço, também, todo o apoio dos meus Comandantes do 63º Batalhão de Infantaria nestes 5 anos que vivencio a veste da farda militar e pela confiança depositada em mim para atuar como Chefe da Assessoria de Apoio para Assuntos Jurídicos no biênio 2015-2016.

Ao meu amigo Robson da Rosa da Silva, pela partilha de conhecimento, experiências diária e amizade sincera.

Aos tenentes de hoje, ontem e sempre pelo companheirismo.

E, por fim, à biblioteca Capitão Osmar Romão da Silva, da Polícia Militar de Santa Catarina, por disponibilizar uma doutrina relacionada ao direito militar, atualizada e de altíssima qualidade.

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RESUMO

Este trabalho monográfico tem por finalidade verificar a necessidade de o desertor permanecer com o status de militar durante a instrução da ação penal de deserção. Para isso, em um primeiro momento, deve-se conhecer a especificidade do Direito Penal Militar, a definição dos crimes propriamente militares e o crime de deserção, estatuído no artigo 187 da legislação penal castrense. O crime de deserção tem finalidade de tutelar o dever e o serviço militar, e é fundamental para a proteção dos valores e compromisso militares. Sendo assim, o tema é abordado de maneira dedutiva, de natureza qualitativa, procedimento monográfico e técnica de pesquisa bibliográfica. Por fim, verifica-se que a condição de militar deve ser considerada apenas condição de procedibilidade e não condição de prosseguibilidade da instrução do processo crime.

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LISTA DE SIGLAS

CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CPM – Código Penal Militar

CPPM – Código de Processo Penal Militar RDE – Regulamento Disciplinar do Exército STM – Supremo Tribunal Militar

STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 O DIREITO PENAL MILITAR ... 11

2.1 HISTÓRIA DO DIREITO MILITAR ... 11

2.2 BENS JURÍDICOS TUTELADOS PELA LEGISLAÇÃO CASTRENSE ... 12

2.4 TRANSGRESSÕES DISCIPLINARES E CRIMES MILITARES ... 17

2.5 DEFINIÇÃO DE MILITAR PARA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA 18 2.6 CRIMES MILITARES... 19

2.6.1 Crimes impropriamente militares ... 19

2.6.2 Crimes propriamente militares ... 20

3 O CRIME DE DESERÇÃO ... 23

3.1 DEFINIÇÃO ... 23

3.2 OBJETIVIDADE JURÍDICA ... 25

3.3 PRESCRIÇÃO ... 26

3.4 SITUAÇÃO DE AUSÊNCIA ... 28

3.5 CONTAGEM DO PRAZO DE GRAÇA ... 28

3.6 TERMO DE DESERÇÃO ... 30

4 A NECESSIDADE DO STATUS DE MILITAR PARA A PROSSEGUIBILIDADE DA AÇÃO PENAL DE DESERÇÃO ... 34

4.1 DA ESTABILIDADE DO MILITAR ... 34

4.2 EXCLUSÃO DA PRAÇA DESERTORA SEM ESTABILIDADE DAS FILEIRAS DO EXÉRCITO ... 34

4.3 REINCLUSÃO DO DESERTOR À ORGANIZAÇÃO MILITAR ... 36

4.4 CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE DA AÇÃO CRIMINAL DE DESERÇÃO ... 37

4.5 A NECESSIDADE DO STATUS DE MILITAR PARA A PROSSEGUIBILIDADE DA AÇÃO PENAL DE DESERÇÃO ... 39

4.6 LOCAL DO CUMPRIMENTO DA PENA DO CIVIL CONDENADO PELA JUSTIÇA MILITAR ... 44

5 CONCLUSÃO ... 46

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1 INTRODUÇÃO

O crime de deserção é uma ofensa grave aos princípios elementares dos militares: hierarquia e disciplina, e atenta diretamente contra o dever e o serviço militar. Ocorre que aqueles que o cometem continuam fazendo parte da Força, cumprindo suas atribuições funcionais e portando armas até que o processo criminal termine, uma vez que o entendimento dominante dos tribunais é de que o status de militar é condição de procedibilidade e prosseguibilidade da ação penal em questão. Tal percepção acaba por trazer problemas às Organizações Militares, que têm de manter a disciplina em alguém que, na maioria dos casos, já demonstrou o interesse de não mais permanecer no meio castrense.

Dessa forma, formula-se o seguinte problema de pesquisa: é necessário que o desertor permaneça com o status de militar após o recebimento da denúncia para a continuidade da ação penal?

Tais respostas só serão obtidas a partir da verificação da necessidade de o desertor permanecer com a condição de militar durante a instrução da ação penal de deserção, ou seja, se essa condição da praça desertora é requisito de prosseguibilidade do processo crime do artigo 187, do Código Penal Militar.

A temática possui relevância, uma vez que os militares desertores geram custos aos cofres públicos e problemas de caráter disciplinar, que causam sensação de impunidade aos pares e subordinados, vindo a afetar a disciplina militar, um dos pilares das Forças Armadas e objeto de proteção da legislação específica castrense. Entender a necessidade da qualidade de militar como sendo apenas premissa de procedibilidade faz com que não seja necessário que o militar continue na ativa durante a fase da instrução penal.

Sendo assim, o método de abordagem é de pensamento dedutivo, pois parte da definição do direito penal militar até o aspecto específico sobre a necessidade do status de militar para a instrução penal de deserção, de natureza qualitativa, procedimento monográfico e técnica de pesquisa bibliográfica por meio de ordenamento jurídico pátrio, jurisprudências, artigos e doutrinas.

Nesse sentido, a verificação do objeto de estudo demandará etapas que se iniciam a partir do conhecimento do Direito Penal Militar e da definição dos crimes propriamente militares, distinguindo-se daqueles crimes militares previstos no código especial, que civis podem cometer; da compreensão dos aspectos gerais

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relacionados ao crime de deserção; e da verificação da necessidade do status de militar do desertor como condição de prosseguibilidade da ação penal de deserção.

Desse modo, será possível colaborar com as Forças Armadas e com a Justiça Militar para que continue a prevalência da hierarquia e disciplina nas atividades funcionais, características que o meio militar carrega desde o Império Romano até os dias atuais, e que são pilares fundamentais dessa Instituição pública e permanente.

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2 O DIREITO PENAL MILITAR

O Direito Penal Militar acompanha a evolução e expansão dos povos desde a antiguidade e relaciona-se com a própria formação e organização das sociedades e territórios da atualidade.

2.1 HISTÓRIA DO DIREITO MILITAR

Cícero Robson Coimbra Neves e Marcello Streifinger (2012, p. 35) afirmam que um dos fatos decisivos que marcam o desenvolvimento da legislação castrense “foram o surgimento das Cidades-Estados e, com elas, a criação dos Exércitos permanentes”.

A filosofia de expansão territorial da época exigia que em cada povo da antiguidade houvesse uma tropa bélica pronta para atacar ou defender territórios. No mesmo sentido, Univaldo Corrêa (apud NEVES; STREIFINGER, 2012, p. 36) ensina que a Justiça Militar deu os primeiros passos “quando o homem entrou na faixa das conquistas e das defesas para seu povo”, porque “sentiu necessidade de contar, a qualquer hora e em qualquer situação, com um corpo de soldados disciplinados, sob um regime férreo e com sanções graves de aplicação imediata”.

Herrera e Sucato (apud LOUREIRO NETO, 2010, p. 3) afirmam que alguns povos da antiguidade, como os que ocupavam a Índia, Atenas, Pérsia, Macedônia e Cartago, já conheciam a existência de delitos castrenses, sendo seus agentes julgados por tal crime. Todavia, foi em Roma que o Direito Penal Militar ganhou autonomia como instituição jurídica própria (LOUREIRO NETO, 2010, p. 3).

Especificamente na época do Império Romano:

Desta mistura de elementos [Cidades-Estados, Exércitos permanentes, expansionismo e disciplina], concatena-se o raciocínio de que uma sanha expansionista-imperialista [do Império Romano] leva a uma circunstância de perene prontidão dos Exércitos, transformando-os em instituições permanentes, formados e estruturados sob rígida disciplina. Todo cidadão era, por conseguinte, um soldado. Natural, portanto, que houvesse a idealização de delitos próprios da atividade bélica, o que, sem sombra de dúvida, impulsionou a relevância do Direito Penal Militar. (NEVES; STREIFINGER, 2012, p. 37).

Célio Lobão (1999, p. 39) converge na mesma direção de pensamento em relação à autonomia do direito castrense como forma de manutenção do binômio da

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hierarquia e disciplina, ao afirmar: “o crime militar não era desconhecido do Direito Romano, onde a violação do dever militar alcançou noção jurídica perfeita e científica, o que explica porque Roma conquistou o mundo com o vigor da disciplina militar”.

As penas, naquela época, eram essencialmente de caráter punitivo ao agente e serviam de exemplos aos demais militares. João Vieira de Araújo (apud LOUREIRO NETO, 2010, p. 3) descreve o rigor das penas romanas da época: “Para faltas graves da disciplina, diz Dalloz, o tribuno convocava o conselho de guerra, julgava o delinquente e o condenava a bastonadas. Esta pena era infligida com tal rigor que acarretava a perda da vida”.

Foi somente com a Revolução Francesa, de acordo com José Luiz Dias Campos Junior (2000, p. 99), que a legislação militar passou a estabelecer restrição de foro em razão das pessoas e das matérias. E esses novos assentamentos legais foram trazidos por Portugal ao Brasil, sua colônia na época. Afirma ainda que o ordenamento castrense sofreu várias alterações até chegar no Código atual.

Sendo assim, é evidente a importância de um ordenamento jurídico disciplinar militar para o resguardo da hierarquia e disciplina de um exército ao longo da história, essencial para a manutenção da tropa e defesa de uma nação. E é na proteção do bem jurídico essencialmente militar que repousa a sua importância e diferença da legislação castrense da substantiva.

2.2 BENS JURÍDICOS TUTELADOS PELA LEGISLAÇÃO CASTRENSE

Toda a evolução histórica deu-se com a finalidade de proteger os pilares fundamentais do exército: hierarquia e disciplina. Para isso foi criada a legislação penal castrense, específica, diferente da comum, como modo de proteger juridicamente as características constitucionais das corporações militares.

Francisco de Assis Toledo (apud NEVES; STREIFINGER, 2012, p. 48) ensina a conceituação elementar do bem jurídico-penal que, em uma conceituação ampla de bem, pode ser entendido como “tudo o que se nos apresenta como digno, útil, necessário, valioso”. Além disso, “seleciona o direito [dentre a gama imensa de bens afetos a cada individuo] àqueles que reputa ‘dignos de proteção’ e os estabelece como ‘bens jurídicos’”.

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O objeto da ciência do Direito Penal, tanto o comum como o militar, é a proteção dos bens ou interesses juridicamente relevantes. Por isso, é necessário valorar esses bens e interesses verificando-se aqueles que mereçam maior proteção e protegê-los com sanções cominadas às condutas que os ofendam. (LOUREIRO NETO, 2010, p. 7).

Entretanto, é evidente que o bem jurídico penal militar tutelado é diferente daquele tutelado pela legislação comum. Enquanto este se preocupa primariamente com a relação e atividades humanas, aquele visa, em um primeiro plano, preservar a hierarquia e disciplina. Guilherme de Souza Nucci descreve as diferenças:

[...] o Código Penal (Decreto-lei 2.848/40) tutela inúmeros bens jurídicos, dentre os quais a vida, o patrimônio, a dignidade sexual, a fé pública, a administração da justiça etc. O Código Penal Militar tutela, igualmente, variados bens jurídicos, porém, sempre mantendo escalas: num primeiro plano, por se tratar de um ramo específico de direito penal, tem por bem jurídico constante, presente em todas as figuras típicas, de modo principal ou secundário, o binômio hierarquia e disciplina, bases organizacionais das Forças Armadas (art. 142, caput, CF); num segundo plano, não menos relevante, os demais, como vida, integridade física, honra, patrimônio etc. A constatação dos valores de hierarquia e disciplina, como regentes da carreira militar, confere legitimidade à existência do direito penal militar e da Justiça Militar (arts. 122 e 124, CF). (NUCCI, 2013, p. 17).

Cícero Robson Coimbra Neves e Streifinger (2012, p. 58) ratificam o entendimento ao pontuar que no Direito Penal Militar sempre haverá a tutela da regularidade das instituições militares, que, por sua vez, vai resultar em tipos penais com mais de um bem jurídico protegido, como é o caso do homicídio (artigo 205 do Código Penal Militar), que tem por finalidade a proteção da vida humana, mas não afasta a manutenção da estrutura militar.

Na mesma linha de pensamento, Cienfuegos e Donoso (2010, p. 84) entendem que é necessária uma normativa especial que esteja em harmonia com a estrutura, atribuições e funções das Forças Armadas, para satisfazer os fins constitucionais dos militares. Entendem ainda que os tradicionais ramos de direito público não conseguem atingir a finalidade de regular a conduta dos militares, sendo, para isso, necessário o ordenamento jurídico específico.

Torna-se evidente, portanto, que a proteção e a preservação da hierarquia e disciplina, espectros base das forças militares, são os fatores que justificam e objetivam a legislação castrense, cabendo esclarecer as suas respectivas definições.

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2.3 HIERARQUIA E DISCIPLINA NO SEIO MILITAR

A hierarquia e disciplina são fatores essenciais para a organização das forças armadas. São as bases da estrutura, dos valores, dos deveres e da ética militar.

São princípios tão importantes que estão estatuídos no artigo 42 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), quando se refere às Polícias Militares e aos Corpos de Bombeiros Militares, forças auxiliares, e também no artigo 142, quando se refere às Forças Armadas:

Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. (BRASIL, 1988, grifo nosso).

Jorge Luiz Nogueira de Abreu ressalta a importância do binômio militar: hierarquia e disciplina, ao citar os diversos diplomas legais que objetivam a custódia desses fundamentos:

A disciplina e a hierarquia, institutos interdependentes entre si, são indispensáveis à organização e ao sucesso das instituições militares. Não é por outro motivo que o legislador pátrio tem conferido proteção especial à disciplina e hierarquia castrense, tutelando-as, juridicamente, por meio de uma plêiade de normas esparsas, a exemplo da Constituição Federal, dos Estatutos dos Militares Federais e Estaduais, do Código Penal Militar, do Código de Processo Penal Militar, dos Códigos de Ética, Regulamentos Disciplinares, dentre outras. Essas normas, que interagem entre si, formam um célere e eficaz sistema de defesa e blindagem da disciplina e da hierarquia militar, dotado de mecanismos de dissuasão (preventivo) e de repressão (coerção). (ABREU, 2015, p. 53).

Coube à legislação infraconstitucional especificar os referidos conceitos para a seara militar, por meio da Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares:

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Art. 14. A hierarquia e a disciplina são a base institucional das Forças Armadas. A autoridade e a responsabilidade crescem com o grau hierárquico.

§ 1º A hierarquia militar é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da estrutura das Forças Armadas. A ordenação se faz por postos ou graduações; dentro de um mesmo posto ou graduação se faz pela antigüidade no posto ou na graduação. O respeito à hierarquia é consubstanciado no espírito de acatamento à seqüência de autoridade. § 2º Disciplina é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento regular e harmônico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes desse organismo. (BRASIL, 1980, grifo nosso).

Nesse contexto, de acordo com Assis (2013, p. 124), a característica peculiar das forças armadas prevista na constituição – baseada na hierarquia e disciplina – pressupõe a existência do dever de obediência e a obrigação que tem o subordinado de obedecer ao seu superior, salvo quando a ordem deste for manifestamente ilegal. Cita, ainda, diversos artigos do Estatuto dos Militares que materializa as obrigações e deveres que devem pairar na sociedade militar e ratificam a obediência do militar aos preceitos da profissão e à hierarquia:

Da Ética Militar

Art. 28. O sentimento do dever, o pundonor militar e o decoro da classe impõem, a cada um dos integrantes das Forças Armadas, conduta moral e profissional irrepreensíveis, com a observância dos seguintes preceitos de ética militar: [...] IV - cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades competentes; [...] VI - zelar pelo preparo próprio, moral, intelectual e físico e, também, pelo dos subordinados, tendo em vista o cumprimento da missão comum; [...] XIX - zelar pelo bom nome das Forças Armadas e de cada um de seus integrantes, obedecendo e fazendo obedecer aos preceitos da ética militar. [...]

Dos Deveres Militares

Art. 31. Os deveres militares emanam de um conjunto de vínculos racionais, bem como morais, que ligam o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem, essencialmente:

I - a dedicação e a fidelidade à Pátria, cuja honra, integridade e instituições devem ser defendidas mesmo com o sacrifício da própria vida; [...] IV - a disciplina e o respeito à hierarquia; [...] VI - a obrigação de tratar o subordinado dignamente e com urbanidade.

[...]

Do Compromisso Militar

Art. 32. Todo cidadão, após ingressar em uma das Forças Armadas mediante incorporação, matrícula ou nomeação, prestará compromisso de honra, no qual afirmará a sua aceitação consciente das obrigações e dos deveres militares e manifestará a sua firme disposição de bem cumpri-los. [...]

Do Comando e da Subordinação

Art. 34. Comando é a soma de autoridade, deveres e responsabilidades de que o militar é investido legalmente quando conduz homens ou dirige uma organização militar. O comando é vinculado ao grau hierárquico e constitui

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uma prerrogativa impessoal, em cujo exercício o militar se define e se caracteriza como chefe.

[...]

Art. 35. A subordinação não afeta, de modo algum, a dignidade pessoal do militar e decorre, exclusivamente, da estrutura hierarquizada das Forças Armadas. (BRASIL, 1980, grifo nosso).

Todavia, conforme assinala Laurentino de Andrade Filocre (apud ASSIS, 2013, p. 105), o cumprimento da ordem, vinculado à hierarquia, está condicionado à sua legalidade, tendo em vista que os preceitos regulamentares e normas legais são os guardiões das instituições castrenses, não devendo ser contrariados. Desse modo, apesar da presunção de legitimidade da ordem do superior hierárquico, caso haja dúvida, a ordem poderá ser questionada quanto à sua legalidade.

O artigo 9º, do Decreto nº 4.346, de 26 de agosto de 2002, que aprova o Regulamento Disciplinar do Exército, ressalta a importância do cumprimento das ordens ao esclarecer diversos aspectos relativos ao seu cumprimento:

Art. 9º As ordens devem ser prontamente cumpridas.

§ 1º Cabe ao militar a inteira responsabilidade pelas ordens que der e pelas conseqüências [sic] que delas advierem.

§ 2º Cabe ao subordinado, ao receber uma ordem, solicitar os esclarecimentos necessários ao seu total entendimento e compreensão. § 3º Quando a ordem contrariar preceito regulamentar ou legal, o executante poderá solicitar a sua confirmação por escrito, cumprindo à autoridade que a emitiu atender à solicitação.

§ 4º Cabe ao executante, que exorbitou no cumprimento de ordem recebida, a responsabilidade pelos excessos e abusos que tenha cometido. (BRASIL, 2002).

Não obstante, própria manifestação do princípio da hierarquia está dentro do espectro da disciplina, conforme o mesmo Regulamento:

Art. 8º A disciplina militar é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes do organismo militar.

§ 1º São manifestações essenciais de disciplina: I - a correção de atitudes;

II - a obediência pronta às ordens dos superiores hierárquicos; III - a dedicação integral ao serviço; e

IV - a colaboração espontânea para a disciplina coletiva e a eficiência das Forças Armadas.

§ 2º A disciplina e o respeito à hierarquia devem ser mantidos permanentemente pelos militares na ativa e na inatividade. (BRASIL, 2002, grifo nosso).

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[...] consiste na rigorosa observância e acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que regem a vida castrense. Materializa-se por meio do perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos membros das Forças Armadas. (ABREU, 2015, p. 311).

Sendo assim, viu-se a necessidade da criação de uma legislação específica para a proteção do binômio constitucional de hierarquia e disciplina. Legislou-se, então, o Código Penal Militar, que prevê condutas típicas e antijurídicas militares.

2.4 TRANSGRESSÕES DISCIPLINARES E CRIMES MILITARES

Antes de entender os crimes militares é necessário distinguir a transgressão disciplinar do crime militar, que, muitas vezes, pode resultar a partir de uma única conduta.

Como ensina Hely Lopes Meireless (apud ABREU, 2015, p. 187), o poder disciplinar da Administração é diferente do poder punitivo do Estado, realizado por meio da Justiça Penal. Enquanto aquele é uma faculdade punitiva interna da administração e, por isso, só atinge as infrações relacionadas ao serviço, este possui finalidade social, visando à repressão de crimes definidos na lei, fatos típicos e antijurídicos e são realizados pelo Poder Judiciário, fora da administração.

E, por isso, conclui-se que se pode aplicar a punição administrativa e penal, sem que ocorra bis in idem:

A punição disciplinar e a criminal possuem fundamentos diversos e distinta é a natureza das penas. A diferença não é de grau, mas de substância. Dessa substancial diversidade resulta a possibilidade da aplicação conjunta das duas penalidades sem que ocorra bis in idem. Em outras palavras, a mesma infração pode ensejar a punição administrativa (disciplinar) e a punição penal (criminal), porque aquela é sempre um minus em relação a esta. Por isso, toda condenação criminal por delito funcional acarreta a punição disciplinar, mas nem toda falta administrativa exige sanção penal. (MEIRELESS, 1997, p. 109, apud ABREU, 2015, p. 187).

Entretanto, essa lição não é inteiramente aplicável na legislação castrense, uma vez que a transgressão disciplinar e o crime militar têm idêntico fundamento: a violação das obrigações ou dos deveres militares. É o que estatui o artigo 42 do Estatuto dos Militares:

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Art. 42. A violação das obrigações ou dos deveres militares constituirá crime, contravenção ou transgressão disciplinar, conforme dispuser a legislação ou regulamentação específicas.

[...]

§ 2° No concurso de crime militar e de contravenção ou transgressão disciplinar, quando forem da mesma natureza, será aplicada somente a pena relativa ao crime. (BRASIL, 1980).

Abreu (2015, p. 188) explica que a diferença entre a transgressão e o crime é de grau e não de substância, principal ponto de divergência da legislação comum, tendo em vista que os bens jurídicos protegidos são os mesmos. Desse modo, é possível a desclassificação de crime militar para transgressão em alguns casos expressamente previstos no Código Penal Militar.

Caso a conduta esteja exclusivamente prevista no Regulamento Disciplinar da respectiva Força, não sendo tipificada pelo Código Penal Militar, Abelardo Júlio da Rocha (2011, p. 425) ensina que “a responsabilização deve cingir-se exclusivamente à esfera administrativa militar”.

Posto isso, no caso de concurso, a partir de uma única conduta, entre a transgressão e o crime, o crime militar e seu julgamento na instância penal absorverá a transgressão militar. Todavia, em alguns casos previstos em lei, o juiz poderá desclassificar o crime para a esfera administrativa militar. E, por isso, no meio castrense, na conduta do militar, são aplicadas as normas penais e administrativas simultaneamente, sendo possível a substituição da sanção penal pela administrativa, quando há mínima ofensividade aos preceitos militares e à disciplina.

É certo, pois, que tanto na esfera administrativa quanto na penal, a condição de militar é pressuposto essencial, cuja definição é fundamental.

2.5 DEFINIÇÃO DE MILITAR PARA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA

A legislação penal castrense é clara:

Art. 22. É considerada militar, para efeito da aplicação dêste [sic] Código, qualquer pessoa que, em tempo de paz ou de guerra, seja incorporada às fôrças [sic] armadas, para nelas servir em pôsto [sic], graduação, ou sujeição à disciplina militar. (BRASIL, 1969).

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Entretanto, Rossetto considera desatualizada a definição do diploma legal, tendo em vista que não engloba todas as hipóteses constitucionais:

A incorporação às Forças Armadas é o marco legal caracterizador da condição de militar, para efeitos de aplicação do Código Penal Militar. Mostra-se, no entanto, desatualizada essa definição, que considera militar apenas a pessoa que, em tempo de paz ou de guerra, é incorporada às Forças Armadas, para nelas servir em posto, graduação, ou sujeição à disciplina militar, porque a Constituição Federal, em capítulos distintos, define as categorias de militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios – os “membros das Polícias Militares e Corpos Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina” (art. 42, com redação dada pela EC 18, de 05.02.1998) – e os militares das Forças Armadas – “constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina” (art. 142). (ROSSETTO, 2015, p. 142).

Saber caracterizar se o agente é militar ou não é imprescindível para a aplicação de crimes militares em que o sujeito ativo precisa ostentar o status de militar. Daí a importância da definição de crimes militares, pois irá determinar a incidência ou não da legislação penal militar e até mesmo a aplicação dos regulamentos administrativos militares.

2.6 CRIMES MILITARES

Os crimes militares previstos no Código Penal Militar podem ser divididos em crimes propriamente militares e crimes impropriamente militares.

2.6.1 Crimes impropriamente militares

Os crimes impropriamente militares são crimes que também estão previstos na legislação penal substantiva, mas que adotam o caráter especial do Código Penal Militar e sua consequente aplicação, por terem características específicas definidas na própria legislação militar:

É o que prevê o art. 9º do Código Penal Militar:

Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: [...]

II - os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados:

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a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma situação ou assemelhado;

b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;

c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil;

d) por militar durante o período de manobras ou exercício, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;

e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar;

[...]

III - os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos: a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar;

b) em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado, ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo;

c) contra militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação, exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras;

d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquêle [sic] fim, ou em obediência a determinação legal superior. (BRASIL, 1969, grifo nosso).

Na mesma linha de raciocínio, Enio Luiz Rossetto (2015, p. 104) comenta: “os crimes impropriamente militares são intrinsecamente comuns, que se tornam militares pelo caráter militar do agente, pela natureza militar do local, pela anormalidade da época ou do tempo em que são cometidos”.

Guilherme de Souza Nucci complementa:

Denominam-se crimes militares impróprios os que possuem dupla previsão, vale dizer, tanto no Código Penal Militar quanto no Código Penal comum, ou legislação similar, com ou sem divergência de definição. Ou também o delito previsto somente na legislação militar, que pode ter o civil por sujeito ativo (NUCCI, 2013, p. 42).

Dessa maneira, é importante conhecer qual a definição de militar para a aplicação da legislação penal adequada (comum ou militar). Em alguns casos torna-se relevante que esteja claro a definição dessa condição.

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Esmeraldino Bandeira (1919, p. 24-26, apud ROSSETTO, 2015, p. 103) afirma que os crimes propriamente militares são infrações específicas e funcionais e reúnem a qualidade militar do ato e militar do agente. É aquele crime que alguém comete como militar, ou seja, um crime funcional, uma infração do dever militar, por exemplo, a deserção, a desobediência e a insubordinação.

Célio Lobão e Jorge César Assis (apud NEVES; STREIFINGER, 2012, p. 92) convergem no mesmo pensamento ao ensinar que os “crimes propriamente militares seriam os que só poderiam ser cometidos por militares, pois consistem em violação de deveres que lhes são próprios”.

O magistrado da Justiça Militar federal, Frederico Magno de Melo Veras, recorre ao Império Romano para argumentar seu pensamento:

[...] uma abordagem atual da distinção entre crime militar próprio e crime militar impróprio é interessante manter a definição romana no sentido de que o crime próprio tem como agente único o militar, pois diz respeito a condutas delitivas só imputáveis ao agente que detenha essa qualidade. (VERAS apud LOBÃO, 2011, p. 183).

Logo são crimes em que o agente precisa ter a condição de militar para sua aplicação, diferentemente dos crimes impropriamente militares, em que não há a necessidade dessa condição.

Nucci (2013, p. 42) harmoniza com os outros autores e traz a caracterização de o crime próprio militar ser autenticamente militar:

[...] consideram-se delitos militares próprios (autenticamente militares) os que possuem previsão única e tão somente no Código Penal Militar, sem correspondência em qualquer outra lei, particularmente no Código Penal, destinado à sociedade civil. Além disso, somente podem ser cometidos por militares - jamais por civis. Denominam-se crimes militares impróprios os que possuem dupla previsão, vale dizer, tanto no Código Penal Militar quanto no Código Penal comum, ou legislação similar, com ou sem divergência de definição. Ou também o delito previsto somente na legislação militar, que pode ter o civil por sujeito ativo. (NUCCI, 2013, p. 42, grifo nosso).

Extrai-se, a partir dos argumentos dos doutrinadores supramencionados, que é necessário que haja 2 (duas) qualidades para considerar o crime militar próprio: 1) ser o tipo penal exclusivamente previsto no Código Penal específico; e 2) ser praticado por militar.

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A exceção à regra seria o crime de Insubmissão que, segundo Célio Lobão (2011, p. 390), é o único crime militar cujo agente do delito é, exclusivamente, o civil. Todavia, ao ser capturado, o civil passará pelo processo de incorporação às Forças militares e adquirirá o status de militar, sendo, este, condição de procedibilidade da instrução penal.

Resta-se cristalino, portanto, o entendimento de que, para aplicação dos crimes próprios militares, é necessário que o militar esteja incorporado ao seio militar, na situação de militar da ativa. São esses os únicos possíveis agentes do crime de deserção, que é propriamente militar, e será estudado no capítulo na sequência.

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3 O CRIME DE DESERÇÃO

Dentro dos crimes propriamente militares está o crime de deserção, um dos crimes contra o serviço e dever militar, previsto no artigo 187, na parte especial do Código Penal Militar (CPM), que trata dos crimes militares em tempo de paz.

É um crime tão antigo quanto a própria história do CPM, tendo uma de suas primeiras aparições no Império Romano, no Livro VII do Código Theodosiano, 7.1.16:

Se vieres a saber que alguns soldados perambulam pelas províncias, depois de haverem abandonado os seus corpos de tropa, faze com que sejam presos e custodiados até que chegue a notícia deles aos ouvidos de nossa clemência, e decidamos o que se deva fazer; e assim se qualquer soldado for encontrado na província afastado de seu corpo de tropa ser-nos-á comunicado que fugiu, seja punido severissimamente com a perda dos bens e com risco de todo o serviço prestado. (apud ROSSETTO, 2015, p. 592).

E, portanto, fundamental para a preservação da hierarquia e disciplina das Forças Militares.

3.1 DEFINIÇÃO

Nada mais positivista do que começar pela própria redação do crime de deserção (BRASIL, 1969): “Art. 187: Ausentar-se o militar, sem licença, da unidade em que serve, ou do lugar em que deve permanecer, por mais de oito dias”.

Diante da legislação pura, colhe-se o seguinte esclarecimento acerca do verbo “ausentar-se”:

O verbo ausentar-se significa abandonar, afastar-se da unidade em que serve ou do lugar em que deve permanecer. O lugar é o local de trabalho do militar. Além da unidade militar, o local de trabalho pode ser o bairro, a praça, a cidade ou a região da cidade que deve o militar permanecer patrulhando, trabalhando etc. (ROSETTO, 2015, p. 594).

Célio Lobão exibe uma definição um pouco menos literal:

[...] o crime de deserção no Código Penal Militar brasileiro consiste no fato de o militar ausentar-se, sem autorização, da unidade em que serve ou do local onde deveria permanecer, por tempo superior a oito dias, ou estando legalmente ausente, deixa de apresentar-se, nesse mesmo prazo, depois de

(25)

cessado o motivo do afastamento e, ainda, não se faz presente no momento da partida ou do descolamento da unidade em que serve” (LOBÃO apud PEREIRA, 2013, p. 16).

Na mesma linha de pensamento, Jorge Luiz Nogueira de Abreu simplifica:

É a ausência não autorizada ou o abandono clandestino e voluntário de um militar do corpo ou da unidade a que pertence, com o firme propósito de não mais retomar. O militar é considerado desertor quando a ausência se perdura por mais de oito dias”. (ABREU, 2015, p. 480).

Portanto, da interpretação das doutrinas supracitadas depreende-se, em um primeiro momento, que é necessária a ausência do agente, que, segundo Guilherme de Souza Nucci (2013, p. 253), significa “retirar-se de determinado local; o objeto da conduta é o local onde o militar deve permanecer por força de sua atividade e designação”. Outrossim, complementa que o título do crime “desertar” também traz o sentido de abandonar determinado cargo ou função.

Silvio Martins Teixeira complementa:

[...] desertar é abandonar definitivamente esse serviço [militar] enquanto está ainda obrigado, ou fugir ao cumprimento dele por prazo que a lei presume o abandono [8 dias], ou ainda não se apresentar para prestá-lo dentro de tal prazo, ou finalmente agir fraudulentamente para se isentar do cumprimento dos deveres decorrentes do mesmo serviço. (TEIXEIRA apud LOUREIRO NETO, 2010, p.144).

Neves e Streifinger (2012, p. 881) harmonizam com a mesma linha de pensamento: “a conduta nuclear é ausentar-se, que significa afastar-se, furtar-se de estar no lugar em que devia por imposição do dever e do serviço militar, obrigação constituída sob a forma de escala ou sob forma de ordem específica”.

Entretanto, Célio Lobão (1999, p. 235) alerta que a vontade livre e a consciência de ausentar-se além do prazo legal do local onde deveria estar são elementos subjetivos da deserção. Portanto, caso esteja sob ordem (relacionada a afastamento ou ausência) de alguma autoridade competente ou sob coação física ou material irresistível, inexistirá crime, conforme artigo 40 do Código Penal castrense (BRASIL, 1969): “Art. 40. Nos crimes em que há violação do dever militar, o agente não pode invocar coação irresistível senão quando física ou material”.

(26)

APELAÇÃO. DESERÇÃO. RECURSO DEFENSIVO. AUTORIA E MATERIALIDADE. COMPROVAÇÃO. CULPABILIDADE. CONFIRMAÇÃO. CONDUTA TÍPICA E ANTIJURÍDICA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. ESTADO DE NECESSIDADE. CONDIÇÃO DE ARRIMO DE FAMÍLIA. INOCORRÊNCIA. SÚMULA Nº 3 DO STM. UNANIMIDADE. O crime descrito no art. 187 do CPM é de mera conduta, consumando-se com a ausência injustificada e sem a devida autorização da Organização castrense, quando ultrapassado o prazo de graça definido pelo tipo penal incriminador. Inexiste nos autos qualquer indicação de ter o apelante requerido sua desincorporação em razão da sua alegada condição de arrimo de família. Inquestionável a presença do elemento subjetivo do delito em tela, o qual somente admite a modalidade dolosa e que se caracteriza pela vontade livre, consciente e intencional do agente de furtar-se ao serviço militar, faltando com o respectivo dever. Recurso conhecido e não provido. Decisão unânime. (BRASIL, Supremo Tribunal Militar, 2017, grifo nosso).

É o mesmo entendimento de Rossetto:

Constitui elemento normativo do tipo sem licença, de maneira que, se a ausência foi autorizada pelo superior, não há crime. Licença é a dispensa por prazo determinado dos serviços, que é dada pela autoridade militar competente, de acordo com a legislação ou as prescrições administrativas. (ROSETTO, 2015, p. 594).

Tão importante quanto caracterizar os elementos do crime é definir o sujeito ativo do mesmo. Nesse sentido, o próprio termo “militar” da letra da lei já especifica que o agente de delito necessita da qualidade de militar da ativa. Portanto, é crime propriamente militar, já previamente explanado, por tratar-se de infração penal específica e funcional necessitando a condição de militar.

A necessidade do liame entre o agente e a instituição castrense é defendida por Célio Lobão (apud NEVES; STREIFINGER, 2012, p. 880), ao afirmar que: “o marco que habilita a pessoa a cometer deserção, portanto, é o ato de incorporação à Força Militar, ou ato equiparado, que inicie o vínculo de ligação com a Instituição Militar [...]”.

Sendo assim, todas essas considerações doutrinárias por trás da redação do artigo 187 têm por finalidade melhor clarificar o tipo penal que busca a tutela do serviço e dever militar.

(27)

A objetividade jurídica é o que justifica a razão de existir do tipo penal, impondo deveres ao agente que ostenta a condição de militar para a proteção de bens jurídicos considerados importantes pelo legislador.

Do ponto de vista de Neves e Streifinger (2012, p. 879), o crime de deserção protege: “o dever militar, o comprometimento, a vinculação do homem aos valores éticos e funcionais da caserna e de sua profissão”.

Célio Lobão utiliza-se da seguinte argumentação:

Objeto da tutela penal é o serviço militar diante da conduta do militar que o abandona, apesar do dever legal de cumpri-lo até sua desvinculação na forma estabelecida em lei. A norma penal tem, ainda, em vista o interesse da instituição castrense em contar com o efetivo estabelecido em lei, o que não acontece, se ficar a critério do militar ausentar-se da corporação, em desacordo com o preceito legal que trata da cessação do serviço militar. (LOBÃO, 1999, p. 229).

No mesmo sentido, Ronaldo João Roth (2004, p. 57) afirma que o artigo 187 do CPM impõe aos militares o dever de comparecer rotineiramente ou de permanecer no local que tem obrigação funcional de estar em virtude de cumprir o expediente ou uma missão qualquer a que esteja obrigado.

Tem-se assim definida a finalidade da pretensão punitiva do tipo penal supracitado. Pretensão essa que possui um prazo prescricional específico em virtude das peculiaridades do tipo penal.

3.3 PRESCRIÇÃO

Tendo em vista tamanha afronta que o crime de deserção significa para as instituições armadas, a lei específica (Código Penal Militar) (BRASIL, 1969) regulou a própria prescrição: “Art. 132. No crime de deserção, embora decorrido o prazo da prescrição, esta só extingue a punibilidade quando o desertor atinge a idade de quarenta e cinco anos e, se oficial, a de sessenta”.

Rossetto justifica que foi necessária a elaboração de norma específica para regrar a prescrição desse crime propriamente militar, uma vez que não se aplica a regra do artigo 125, § 2º, ‘c’, do Código Penal Militar, pois somente a morte, a captura ou apresentação do agente cessaria a permanência na condição de militar:

(28)

Não obstante o entendimento de ser a deserção crime formal, predomina na doutrina o posicionamento de ser a deserção crime permanente, com precedentes neste sentido do STF fundados, sobretudo, no argumento de que o delito sujeita o desertor à prisão cautelar (art. 452 do CPPM). Por ser crime permanente, o momento consumativo prolonga-se no tempo, cessando a permanência com a apresentação voluntária do desertor ou com a sua captura. A tentativa é impossível (ROSSETO, 2015. p. 595). Art. 125. [...]

§ 2º A prescrição da ação penal começa a correr: [...]

c) nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência; [...] (BRASIL, 1969).

A idade da prescrição de 45 anos não veio ao acaso, é a idade prevista no artigo 5º da Lei do Serviço Militar (BRASIL, 1964), em que o cidadão tem obrigação com o Serviço Militar: “Art 5º A obrigação para com o Serviço Militar, em tempo de paz, começa no 1º dia de janeiro do ano em que o cidadão completar 18 (dezoito) anos de idade e subsistirá até 31 de dezembro do ano em que completar 45 (quarenta e cinco) anos”.

Sendo assim, Célio Lobão (2011, p. 426) conclui que existem apenas 2 (duas) hipóteses de prescrição para o crime permanente de deserção: 1) o desertor que se apresenta voluntariamente ou é capturado (apreendido), em que há o início da ação penal, sendo assim, aplica-se a regra do artigo 125 e a alínea ‘c’ do § 2º do Código Penal Militar (CPM , uma vez que cessou a permanência na condição de desertor); 2) militar que permanece na condição de desertor, sem se apresentar ou for capturado, até atingir a idade de 45 (quarenta cinco anos) e incide na hipótese prevista no artigo 132 do CPM.

Art. 125. A prescrição da ação penal, salvo o disposto no § 1º dêste [sic] artigo, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:

I - em trinta anos, se a pena é de morte;

II - em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;

III - em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito e não excede a doze;

IV - em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro e não excede a oito;

V - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois e não excede a quatro;

VI - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;

VII - em dois anos, se o máximo da pena é inferior a um ano. (BRASIL, 1969).

(29)

Porém, antes de entrar na discussão intrínseca ao crime, há de se conhecer o exato momento da consumação do delito. Para isso, é necessário conhecer a situação de ausência a que o militar se submete antes de cometer o crime de deserção.

3.4 SITUAÇÃO DE AUSÊNCIA

O Estatuto dos Militares cuidou da definição do militar ausente em seu artigo 89:

Art. 89. É considerado ausente o militar que, por mais de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas:

I - deixar de comparecer à sua organização militar sem comunicar qualquer motivo de impedimento; e

II - ausentar-se, sem licença, da organização militar onde serve ou local onde deve permanecer. (BRASIL, 1980).

Da literalidade da redação desse artigo pode-se concluir que o militar não se torna ausente no dia de sua falta à sua organização militar ou do local onde deve permanecer, mas sim no dia seguinte. É importante que haja clareza do momento de início dessa situação para a contagem do octídio que caracteriza o tipo penal de deserção.

Loureiro Neto (2010, p. 144) ressalta a diferença entre o emansor, que é o ausente, e o desertor. Ambos estão ausentes, todavia aquele ainda não consubstanciou o prazo de 8 (oito) dias previsto para o tipo penal.

Logo, todo militar na condição de deserção é um ausente, mas nem todo ausente é um desertor, tendo em vista que é necessário o transcurso temporal de 8 dias de ausência para consumação do crime.

Cresce a valia de entender a contagem do prazo de graça, que diferenciará um militar ausente, que sofrerá sanção disciplinar, do desertor, que responderá penalmente.

(30)

A partir do momento da falta de um militar à atividade ou local que deveria comparecer, inicia-se o processo de contagem dos dias de ausência, até a consumação da deserção.

Temos a redação do artigo 451 do Código de Processo Penal Militar (CPPM):

Art. 451 [...]

§ 1º A contagem dos dias de ausência, para efeito da lavratura do termo de deserção, iniciar-se-á a zero hora do dia seguinte àquele em que for verificada a falta injustificada do militar. (BRASIL, 1969).

Ou seja, o marco de início da contagem dos 8 dias previstos no tipo legal é a ausência do militar, que é caracterizada às 00:00h do dia posterior à falta não justificada.

Para Coimbra Neves e Streifinger (2012, p. 882), o agente torna-se ausente às 00:00h do dia seguinte ao findo do serviço/atividade que deveria comparecer. Ou seja, se a atividade começa no dia 10 e termina no dia 11, deve-se esperar o término da atividade no dia 11 para, somente então, às 00:00h do dia 12, ostentar a qualidade de ausente. A partir de então entra-se na contagem dos 8 (oito) dias de ausência, também conhecido como prazo de graça, previstos no crime de deserção.

Célio Lobão (1999, p. 231) ensina “[o prazo de graça] é o divisor entre o ausente (emansor) e o desertor. Antes do transcurso desse prazo não há deserção, não há desertor, mas ausente, condição essa que sujeita o militar apenas a sanção disciplinar”.

Neves e Streifinger (2012, p. 881) estão consoantes ao supracitado: “o militar que se encontra no octídio precedente à deserção é chamado de ausente ou de emansor [...] o militar não estará em prática delitiva, mas apenas em conduta caracterizadora de transgressão disciplinar”.

A referida sanção disciplinar está estatuída no número 28 do Anexo I do Regulamento Disciplinar do Exército (RDE) (BRASIL, 2002): “28. Ausentar-se, sem a devida autorização, da sede da organização militar onde serve, do local do serviço ou de outro qualquer em que deva encontrar-se por força de disposição legal ou ordem”.

(31)

Jorge Luiz Nogueira de Abreu (2015, p. 481) ressalta que a incorreta contagem do prazo pode resultar em reflexos na área penal das praças sem estabilidade assegurada. Por exemplo, caso a administração venha a excluir a praça, supostamente desertora, antes do transcurso dos 8 dias de ausência para consumação do tipo penal, a praça perderá a condição jurídica de “militar”, elementar no presente crime. Logo, não poderá ser imputada a pratica do delito, uma vez que sua exclusão veio antes da consecução do crime.

É o entendimento que se colhe na seguinte jurisprudência do Superior Tribunal Militar:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. MPM. ERRO NA LAVRATURA DO TERMO DE DESERÇÃO. RETIFICAÇÃO EXTEMPORÂNEA. CONDUTA ATÍPICA. 1. Não se consuma o crime de deserção quando o militar é excluído da sua Organização Militar no período de graça. 2. A correção de ato de exclusão da Força deve ocorrer antes da prisão ou apresentação voluntária do militar que praticou o crime de deserção, agindo acertadamente o Juízo a quo ao não receber a Denúncia, por atipicidade, quando tal correção se dá após a reinclusão do militar ao serviço ativo. Recurso conhecido e não provido. Decisão unânime. (BRASIL, Supremo Tribunal Militar, 2015, grifo nosso).

Nesse sentido, Rossetto contextualiza a situação fática a que se sujeita um militar desertor:

A contagem dos dias de ausência inicia-se à zero hora do dia seguinte àquele em que foi verificada a falta injustificada do militar (art. 451, § 1.º, do CPPM). Se o militar faltou ao serviço que se encerrava às 18 horas do dia 9, inicia-se a contagem dos oito dias de ausência a partir da zero hora do dia 10, verificando-se a deserção no primeiro instante após a zero hora do dia 18. Por mais de oito dias, portanto, é a primeira fração de tempo posterior à contagem de oito dias na qual o militar adquire a condição de desertor". (ROSSETTO, 2015, p. 595).

Desse modo, tendo-se passado o período de graça e consumado a deserção, deve-se proceder à lavratura do Termo de Deserção, documento jurídico que legaliza a prisão do militar desertor.

3.6 TERMO DE DESERÇÃO

Após a passagem do octídio temporal de ausência, deve-se lavrar o Termo de Deserção para revestir de legalidade e tornar possível a prisão do desertor. É a redação do artigo 451 do Código de Processo Penal Militar:

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Art. 451. Consumado o crime de deserção, nos casos previsto na lei penal militar, o comandante da unidade, ou autoridade correspondente, ou ainda autoridade superior, fará lavrar o respectivo termo, imediatamente, que poderá ser impresso ou datilografado, sendo por ele assinado e por duas testemunhas idôneas, além do militar incumbido da lavratura. (BRASIL, 1969, grifo nosso).

Célio Lobão escreve sobre essa peça processual:

Considerando as peculiaridades do crime de deserção e a necessidade de imprimir celeridade à ação penal militar, o legislador substituiu o auto de prisão em flagrante pelo termo de deserção, lavrado por determinação do comandante ou autoridade militar correspondente, ao se consumar o delito, portanto, antecipando-se à prisão em flagrante do desertor [...]. (LOBÃO, 2011, p. 393, grifo nosso).

É o que se obtém da leitura do Código de Processo Penal Militar (CPPM) (BRASIL, 1969): “Art. 452. O termo de deserção tem o caráter de instrução provisória e destina-se a fornecer os elementos necessários à propositura da ação penal, sujeitando, desde logo, o desertor à prisão”.

Célio Lobão (2011, p. 396) afirma ainda: “[...] [o termo de deserção] tem o caráter de instrução provisória, destina-se a fornecer os elementos necessários à propositura da ação penal”.

Frederico Marques (apud LOBÃO, 2011, p. 396) confirma ao afirmar que a lavratura do termo de deserção é um procedimento preliminar de investigação e serve como instrumento preparatório para a ação penal.

O Supremo Tribunal Militar compatibiliza com esse pensamento:

TERMO DE DESERÇÃO. INSTRUÇÃO PROVISORIA (EQUIVALÊNCIA). INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIAS REQUERIDAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR PELO JUÍZO 'A QUO'. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CABIVEL. 1. O TERMO DE DESERÇÃO E O IPM EQUIVALEM A 'INSTRUÇÃO PROVISORIA', UMA VEZ QUE AMBOS TEM [sic] POR FINALIDADE FORNECER OS ELEMENTOS NECESSARIOS A PROPOSITURA DA AÇÃO PENAL. ASSIM SENDO, DA DECISÃO QUE INDEFERIR PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE AUTOS DE PROCESSO DE DESERÇÃO A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, CABE RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (ART. 516, 'B', DO CPPM). 2. DENTRE AS VARIAS FUNÇÕES INSTITUCIONAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO, INCLUI-SE A DE REQUISITAR DILIGENCIAS INVESTIGATORIAS, UMA VEZ QUE E DE SUA COMPETENCIA EXCLUSIVA A PROMOÇÃO DA AÇÃO PENAL PÚBLICA, CUJO JUÍZO DE OPORTUNIDADE E CONVENIENCIA E PRIVATIVO DO ORGÃO MINISTERIAL. PROVIDO O RECURSO DO MPM PARA, CASSANDO A DECISÃO HOSTILIZADA, DETERMINAR O PROSSEGUIMENTO DO FEITO. DECISÃO MAJORITARIA. (BRASIL, Supremo Tribunal Militar, 1993, grifo nosso).

(33)

O artigo 457 do CPPM regula o curso do termo de deserção até a instauração do processo penal:

Art. 457. Recebidos do comandante da unidade, ou da autoridade competente, o termo de deserção e a cópia do boletim, ou documento equivalente que o publicou, acompanhados dos demais atos lavrados e dos assentamentos, o Juiz-Auditor mandará autuá-los e dar vista do processo, por cinco dias, ao procurador, que requererá o que for de direito, aguardando-se a captura ou apresentação voluntária do desertor, se nenhuma formalidade tiver sido omitida, ou após o cumprimento das diligências requeridas. (BRASIL, 1969).

Sendo instrumento processual, poderá haver falhas em sua elaboração, por isso, a doutrina apresenta algumas hipóteses de nulidade:

[...] a) nulidade absoluta – porque o termo de deserção é a instrução provisória que não pode ser renovável; b) nulidade relativa – que não será declarada se não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa; c) mera irregularidade administrativa – o termo de deserção constata o fato que não pode deixar de existir por falhas na elaboração do documento oficial. (ROSSETTO, 2015, p. 596).

Tal termo de deserção é precedido pelos seguintes atos administrativos, previstos no Capítulo III do Título II do Código de Processo Penal Militar (CPPM), de que trata do processo de deserção das praças:

Art. 456. Vinte e quatro horas depois de iniciada a contagem dos dias de ausência de uma praça, o comandante da respectiva subunidade, ou autoridade competente, encaminhará parte de ausência ao comandante ou chefe da respectiva organização, que mandará inventariar o material permanente da Fazenda Nacional, deixado ou extraviado pelo ausente, com a assistência de duas testemunhas idôneas.

§ 2º Decorrido o prazo para se configurar a deserção, o comandante da subunidade, ou autoridade correspondente, encaminhará ao comandante, ou chefe competente, uma parte acompanhada do inventário. (BRASIL, 1969).

Ou seja, ao verificar a consumação do tipo penal, o § 2º do artigo 456 do CPPM (BRASIL, 1969) configura a obrigação do comandante da subunidade (uma fração da tropa), do qual o militar faz parte, de encaminhar ao comandante do Batalhão, ou a superior competente, um documento informando o ocorrido.

Ao receber a parte, o comandante do batalhão ou autoridade correspondente irá proceder à lavratura do termo:

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§ 3º Recebida a parte de que trata o parágrafo anterior, fará o comandante, ou autoridade correspondente, lavrar o termo de deserção, onde se mencionarão todas as circunstâncias do fato. Esse termo poderá ser lavrado por uma praça, especial ou graduada, e será assinado pelo comandante e por duas testemunhas idôneas, de preferência oficiais. (BRASIL, 1969).

Sendo assim, o termo de deserção dá legalidade à prisão do militar que se encontra na situação de desertor e serve de instrução provisória para a propositura da ação penal de deserção por parte do Ministério Público Militar. A compreensão dos detalhes do delito é importante, uma vez que, consubstanciado o crime com todas as formalidades processuais fielmente cumpridas, procede-se para as demais etapas administrativas que envolvem a exclusão do militar, sem estabilidade, do efetivo ativo do Batalhão em que serve.

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4 A NECESSIDADE DO STATUS DE MILITAR PARA A PROSSEGUIBILIDADE DA AÇÃO PENAL DE DESERÇÃO

Após configurado o crime de deserção, iniciam-se as etapas administrativas que modificam a situação do militar. Caso o desertor não tenha estabilidade, será excluído das fileiras militares da ativa até o início da ação penal na justiça militar. Enquanto estável, será agregado.

Tal diferença de tratamento decorre de previsão legal, o que reflete na prosseguibilidade da ação penal de deserção.

4.1 DA ESTABILIDADE DO MILITAR

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 condicionou a estabilidade do militar à lei infraconstitucional, conforme §1º do artigo 42, cumulado com o artigo 142, parágrafo 3º, X, do mesmo diploma legal.

Nesse contexto, o Estatuto dos Militares doutrina a questão:

Art. 50. São direitos dos militares: [...]

IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas:

a) a estabilidade, quando praça com 10 (dez) ou mais anos de tempo de efetivo serviço. (BRASIL, 1980).

A situação de estabilidade do militar gera tratamentos distintos por parte do ordenamento jurídico castrense. E, por isso, no presente trabalho monográfico, será analisada a situação da praça que não possui estabilidade, uma vez que é excluída das corporações militares e somente reincluída quando voluntariamente se apresenta ao serviço ou quando capturada, para a procedibilidade da ação penal.

4.2 EXCLUSÃO DA PRAÇA DESERTORA SEM ESTABILIDADE DAS FILEIRAS DO EXÉRCITO

O artigo 457, § 4º, do Código de Processo Penal Militar (CPPM) informa que a praça sem estabilidade será excluída do serviço ativo, enquanto a estável e os oficiais serão agregados:

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Consumada a deserção de praça especial ou praça sem estabilidade, será ela imediatamente excluída do serviço ativo. Se praça estável, será agregada, fazendo-se, em ambos os casos, publicação, em boletim ou documento equivalente, do termo de deserção e remetendo-se, em seguida, os autos à auditoria competente. (BRASIL, 1969, grifo nosso).

É o que, também, está estatuído na Lei nº 6.8880/1980:

Art. 128. A deserção do militar acarreta interrupção do serviço militar, com a conseqüente [sic] demissão ex officio para o oficial, ou a exclusão do serviço ativo, para a praça.

[...]

§ 2º A praça sem estabilidade assegurada será automaticamente excluída após oficialmente declarada desertora. (BRASIL, 1980)

Após a leitura dos referidos artigos socorre-se ao Decreto nº 57.654, de 20 de janeiro de 1966, que regulamenta a Lei do Serviço Militar para diferenciar a exclusão do licenciamento:

Art. 3° Para os efeitos dêste [sic] Regulamento são estabelecidos os seguintes conceitos e definições:

[...]

18) exclusão - Ato pelo qual a praça deixa de integrar uma Organização Militar.

[...]

24) Licenciamento - Ato de exclusão da praça do serviço ativo de uma Fôrça [sic] Armada, após o término do tempo de Serviço Militar inicial, com a sua inclusão na reserva. (BRASIL, 1966).

Ou seja, a exclusão que o § 4º do artigo 457 do CPPM menciona é referente à Organização Militar em que serve, e não ao licenciamento das Forças Armadas.

É o entendimento da jurisprudência:

Correição Parcial. É prescindível a presença do advogado para sustentar todo requerimento por escrito por ele protocolado diante do Conselho, sendo lícito, desde que fundamente por escrito a decisão e presentes os seus membros, analisar e julgar os requerimentos elaborados pelas partes sem que estes sejam intimados para a sessão, como ocorre no juízo criminal comum. A exclusão do militar ausente injustificadamente por mais de oito dias não implica em licenciamento da Força, mas sujeita-o à prisão e a processo por deserção, tudo em conformidade com a norma constitucional vigente. Estando em curso o processo de deserção e incorrendo o militar em nova ausência delituosa, o feito ficará suspenso até que o acusado venha a ser reincluído. Precedentes. Indeferida a Correição Parcial. Unânime. (BRASIL, Supremo Tribunal Militar, 2012, grifo nosso).

(37)

Estando na situação de desertor, só haverá novas etapas administrativas que influenciam na situação do agente a partir do momento da apresentação ou captura do agente, ocasião em que será procedida sua reinclusão à Organização Militar.

4.3 REINCLUSÃO DO DESERTOR À ORGANIZAÇÃO MILITAR

Ao se apresentar ou ser capturado, o agente condiciona-se à inspeção de saúde, e, caso esteja apto para o serviço militar, será reincluído, enquanto as praças com estabilidade serão revertidas; é o que prevê o Código de Processo Penal Militar.

Art. 457 [...]

§ 1º O desertor sem estabilidade que se apresentar ou for capturado deverá ser submetido à inspeção de saúde e, quando julgado apto para o serviço militar, será reincluído

[...]

§ 3º Reincluída que [sic] a praça especial ou a praça sem estabilidade, ou procedida à reversão da praça estável, o comandante da unidade providenciará, com urgência, sob pena de responsabilidade, a remessa à auditoria, de cópia do ato de reinclusão ou do ato de reversão. O Juiz-Auditor determinará sua juntada aos autos e deles dará vista, por cinco dias, ao procurador que requererá o arquivamento, ou o que for de direito, ou oferecerá denúncia, se nenhuma formalidade tiver sido omitida, ou após o cumprimento das diligências requeridas. (BRASIL, 1969, grifo nosso).

Percebe-se, na leitura do item número 36, do artigo 3º, do Regulamento da Lei do Serviço Militar (BRASIL, 1966), que o ato administrativo de reinclusão é exatamente oposto ao de exclusão: “reinclusão - Ato pelo qual o reservista ou desertor passa a reintegrar uma Organização Militar”.

A importância da inspeção de saúde repousa no § 2º do mesmo artigo 457 do CPPM (BRASIL, 1969), ao estatuir que nos casos em que o desertor estiver com uma incapacidade definitiva para o serviço ativo, ele estará isento da reinclusão e do consequente processo criminal, ocasionando no arquivamento dos autos.

A Súmula n° 8, do Supremo Tribunal Militar, harmoniza:

O desertor sem estabilidade e o insubmisso que, por apresentação voluntária ou em razão de captura, forem julgados em inspeção de saúde, para fins de reinclusão ou incorporação, incapazes para o Serviço Militar,

Referências

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