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Singularidades de fase em luz clássica

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Academic year: 2021

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Paulo Cesar Aguiar Brandão Filho

Singularidades de fase em luz clássica

CAMPINAS 2016

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Brandão Filho, Paulo Cesar Aguiar,

B733s BraSingularidades de fase em luz clássica / Paulo Cesar Aguiar Brandão Filho. – Campinas, SP : [s.n.], 2016.

BraOrientador: Luiz Eduardo Moreira Carvalho de Oliveira. BraCoorientador: Solange Bessa Cavalcanti.

BraTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Física Gleb Wataghin.

Bra1. Singularidades (Matemática). 2. Coerência (Ótica). 3. Plasmon (Física). 4. Ressonância de plasmon de superfície. I. Oliveira, Luiz Eduardo Moreira Carvalho de,1952-. II. Cavalcanti, Solange Bessa. III. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Física Gleb Wataghin. IV. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Phase singularities in classical light Palavras-chave em inglês:

Singularities (Mathematics) Coherence (Optics)

Plasmon (Physics)

Surface plasmon resonance

Área de concentração: Física Titulação: Doutor em Ciências Banca examinadora:

Luiz Eduardo Moreira Carvalho de Oliveira [Orientador] Kleber Roberto Pirota

Fernando Iikawa

Eduardo Jorge da Silva Fonseca Ernesto Amador Reyes-Gómez

Data de defesa: 01-04-2016

Programa de Pós-Graduação: Física

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MEMBROS DA COMISSÃO JULGADORA DA TESE DE DOUTORADO DE PAULO CESAR AGUIAR BRANDÃO FILHO – RA: 142411 APRESENTADA E APROVADA AO INSTITUTO DE FÍSICA “GLEB WATAGHIN”, DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, EM 01/04/2016.

COMISSÃO JULGADORA:

- Prof. Dr. Luiz Eduardo Moreira Carvalho de Oliveira – (Orientador) – DFMC/IFGW/UNICAMP

- Prof. Dr. Kleber Roberto Pirota – DFMC/IFGW/UNICAMP - Prof. Dr. Fernando Iikawa – DFMC/IFGW/UNICAMP - Prof. Dr. Eduardo Jorge da Silva Fonseca – IF/UFAL

- Prof. Dr. Ernesto Amador Reyes-Gómez – Instituto de Física/UdeA

A Ata de Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

CAMPINAS 2016

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• Pessoal da república Terra do Nunca com quem tive o prazer de conviver nos meus primeiros anos em Barão Geraldo: Woody, Cachaça, Guido, Léo, Sabrina, Vinagre e Erin.

• Orientadores por compreenderem (ou pelo menos aceitarem) minha maneira de fazer física: Profa. Solange e Prof. Oliveira.

• Galera do Jeca e associados, cuja amizade com a maioria já ultrapassa 15 anos (em ordem alfabética): Aderval, Barata, Bush, Camila, David Meke, Diogo, E. Peruca, Fabiano, Fach, Greg, Isinha, Jeca, João, Johnathan, Kyo, L. Souto, L. Lyra, L. Sorgato, Mamão, Saco, Shermans, Simões, Tássio.

• Amigos da UFAL: Momba, Gilson, Golfs, Kgs, Bozo, Dan, Sina, Neto, Alex, Coca, Cabeça, Moniellen.

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Singularidades de fase simulam um “esqueleto” do campo eletromagnético de tal forma que várias informações sobre a distribuição do campo e o comportamento físico podem ser obtidas. As singularidades permeiam todos os sistemas ópticos genéricos e são imunes à perturbação do sistema. Nesta tese estudamos suas propriedades em várias situações de interesse físico, distribuídas da seguinte forma: No Capítulo 1 introduzimos o conceito de singularidade de fase bem como sua definição formal e sua relação com o momento angular de um feixe de luz. No Capítulo 2 entraremos no regime nanométrico da luz com o objetivo de criar um campo evanescente caracterizado por uma dinâmica rica de singularidades de fase com possiveis aplicações na manipulação de objetos em nanoescala. No Capítulo 3 continuaremos no regime nanométrico da luz com o objetivo de criar e compreender a física de um plasmon de superfície possuindo uma singularidade de fase. Mostramos que é possível criar um campo plasmônico, acoplado à superfície de um metal, possuindo vórtices ópticos. No Capítulo 4 tratamos de luz parcialmente coerente, onde estudamos singularidades de fase em campos cuja natureza é estatística. Nosso trabalho conclui que é possível utilizar difração para medir a carga topológica de feixes parcialmente coerentes. Por fim, no Capítulo 5, as conclusões serão estabelecidas bem como as perspectivas futuras.

(7)

this thesis we study their properties in various situations of physical interest distributed as follows: In Chapter 1 we introduce the concept of phase singularity and its formal de-finition together with its relationship with the angular momentum of a beam of light. In Chapter 2 we proceed to the nanometer domain of light to create an evanescent field with a rich phase singularitiy dynamics aiming at possible applications in the manipulation of objects on a nanoscale. In Chapter 3 we will continue in the nanometer domain and our goal will be to create and understand the physics of a surface plasmon having a phase singularity. We show that it is possible to create a plasmonic field, coupled to the metal surface, possessing optical vortices. In Chapter 4 we will enter into the optical statistical domain, where the study of phase singularities in partially coherent fields will take place. Our results indicate that it is possible to use diffraction to measure the topological charge associated with partially coherent light beams. Finally, in Chapter 5, conclusions are discussed as well as future prospects.

(8)

1 Singularidades de Fase 10

1.1 Introdução e definições . . . 10

1.1.1 Singularidade Screw . . . 13

1.1.2 Singularidade Edge . . . 15

1.2 A carga topológica . . . 16

1.3 Casos genéricos e não-genéricos . . . 17

1.4 Momento angular da luz . . . 20

1.4.1 A contribuição de Leslie Allen . . . 21

1.4.2 Momento angular orbital e as singularidades de fase . . . 23

1.4.3 Uma partícula interagindo com a singularidade . . . 26

1.4.4 Medindo o momento angular orbital de um feixe de luz . . . 28

1.5 Conclusões . . . 30

2 Singularidades em campos evanescentes 31 2.1 Ondas planas e singularidades . . . 32

2.2 O campo evanescente . . . 36

2.3 Dinâmica em um campo evanescente . . . 39

2.4 Conclusões . . . 42

3 Singularidades em Plasmons de superfície 44 3.1 Óptica de metais . . . 45

3.2 Plasmons de superfície . . . 47

3.3 Transmissão de luz por pequenas aberturas em metais . . . 51

3.3.1 Emissão extraordinária de luz (EEL) . . . 54

3.4 Singularidades em Plasmons de superfície . . . 55

3.4.1 Interação Spin-órbita . . . 55

(9)

4.2 Revisitando padrões de interferência . . . 68

4.2.1 Interferômetro de Michelson . . . 68

4.2.2 Interferômetro de Young . . . 71

4.3 Propagação da Intensidade Mútua . . . 75

4.4 O teorema de Van Cittert-Zernike . . . 76

4.4.1 Exemplo: Uma fonte incoerente circular de raio 𝑎 . . . . 77

4.5 Difração de luz parcialmente coerente por aberturas . . . 78

4.6 Singularidades em luz parcialmente coerente . . . 81

4.7 Difração de luz parcialmente coerente por uma abertura triangular . . 83

4.8 Conclusões . . . 89

5 Conclusões gerais e perspectivas 90

(10)

Capítulo 1

Singularidades de Fase

“Scientific research consists in seeing what everyone else has seen, but thinking what no one else has thought.” - Albert Szent-Gyorgyi, Nobel Prize 1937

O objetivo deste primeiro capítulo é familiarizar o leitor com os conceitos utili-zados na área de pesquisa atualmente conhecida como óptica singular, formando a base teórica para os capítulos posteriores. Com esse objetivo em mente, a seção 1.1 introduz a ideia de singularidade de fase em campos de onda bem como sua definição formal. Na seção 1.2 a carga topológica será definida como a quantidade que caracterizará quanti-tativamente uma singularidade em duas dimensões. Casos genéricos (sem simetria no sistema) e não-genéricos (com simetria) serão exemplificados e suas propriedades de esta-bilidade estrutural discutidas na seção 1.3. A relação das singularidades com o momento angular orbital da luz será analisada na seção 1.4 bem como a interação mecânica entre um objeto macroscópico e um campo que possui uma frente de onda helicoidal.

1.1

Introdução e definições

A palavra singularidade possui um significado bastante preciso nas ciências exa-tas. Dizemos que uma grandeza é singular quando (em certas circunstâncias) não podemos ou não conseguimos definir o seu valor numérico. Tome como exemplo a hora em várias partes do mundo. No momento em que escrevo este parágrafo (em Maceió, Alagoas) meu relógio marca 12 horas e 37 minutos. O relógio de outra pessoa andando pelas ruas de Nova York deve marcar 10 horas e 37 minutos e no Cairo as pessoas já devem estar

(11)

redor do mundo, como ilustra a Figura 1.1. Qual seria então a hora dos relógios situados exatamente nos polos do globo? Se desenharmos linhas conectando todos os relógios que marcam a mesma hora, observaremos que todas as linhas convergem para dois pontos, um situado no polo norte e outro no polo sul. Nesses pontos a hora é indefinida e ao redor deles ela assume todos os valores possíveis. Este é somente um de vários exem-plos que ocorrem no mundo físico onde certas grandezas não possuem valores definidos. Um outro exemplo importante de singularidade ocorre no coração durante uma fibrilação (perturbação irregular do ritmo cardíaco) [1]. Essas perturbações são chamadas de rotors e foram verificadas experimentalmente [2]. Veremos adiante que a fase de uma onda é uma variável dinâmica que possui essas características singulares.

Polo Norte

Polo Sul ?

?

Figura 1.1: Ilustração da distribuição de horários ao redor do mundo. As linhas pretas contínuas ligam regiões que possuem o mesmo valor no relógio.

Nosso objetivo principal é estudar certas características gerais do campo eletro-magnético. Portanto, a princípio devemos levar em consideração os campos vetoriais elétrico e de indução magnética E(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) e B(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡), respectivamente, que satisfa-zem as equações de Maxwell. Entretanto, iremos adotar aqui a aproximação escalar, que consiste em representar o campo eletromagnético por um campo escalar complexo

𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) que satisfaz a equação da onda linear 𝑐2∇2𝜓 = 𝜕2

𝑡𝜓, onde 𝑐 é a velocidade da

luz no vácuo. Chamamos a atenção para o fato de que essa é uma aproximação válida em certos problemas onde a polarização da luz não desempenha um papel fundamental no sistema [3, 4]. A teoria de singularidades do campo eletromagnético, levando em con-sideração o caráter vetorial do campo, é descrita pelas singularidades da polarização [5,

(12)

6, 7, 8] e não será o objeto de estudo desta tese.

Com as aproximações tomadas, considere a definição formal de uma singularidade de fase [9, 10]:

Definição de singularidade de fase (DSF). A fase do campo escalar complexo 𝜓 num ponto (𝑥, 𝑦, 𝑥) é dita singular se ℜ[𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡)] = 0 e ℑ[𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡)] = 0, onde 𝜓 é um

campo escalar complexo que satisfaz a equação da onda.1

Para entender a DSF devemos lembrar o significado de um campo escalar complexo 𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡). Dado um ponto espacial e um certo valor temporal 𝑡, um campo complexo associa àquele ponto um número complexo da forma 𝑎 + 𝑏𝑖 (matemáticos falariam que, neste caso, um campo complexo é uma função 𝜓 : R4 → C). Assim, para um dado campo,

nosso espaço é completamente preenchido por números complexos, 2 + 2𝑖 aqui, 3𝑖 ali, etc, que geralmente variam com o tempo. O que a Definição de singularidade de fase nos diz é que existem certos pontos especiais cujo valor do campo neles é 0 + 0𝑖. Lembrando que qualquer número complexo pode ser representado na forma polar 𝑎 + 𝑏𝑖 = 𝜌 exp(𝑖𝜑), onde

𝜌 = (𝑎2 + 𝑏2)1/2 é o chamado módulo e 𝜑 = tan−1(𝑏/𝑎) a fase, concluímos que nesses

pontos o campo tem uma amplitude bem definida, cujo valor é obviamente zero, mas uma fase indefinida [𝜑 = tan−1(0/0)].

Mas qual seria a forma geométrica desse conjunto de pontos? Eles formam algum padrão característico ou são apenas pontos não conectados espalhados pelo espaço? Para responder é necessário uma visão geométrica da DSF. A equação ℜ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 0 repre-senta uma superfície no espaço tridimensional e ℑ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 0 uma outra superfície, ambas em movimento. Podemos olhar para o conjunto de pontos singulares como sendo parte da intersecção de duas superfícies que se movem no espaço, como ilustra a Figura 1.2. Concluímos que os pontos onde a fase é singular formam linhas no espaço (pontos em duas dimensões), pois duas superfícies genericamente se intersectam numa linha.2 Nessa

tese iremos considerar apenas os casos onde o campo de onda possui uma única frequên-cia de oscilação temporal. Com essa suposição pode ser demonstrado que as superfícies ℜ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 0 e ℑ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 0 ficam estacionárias no espaço e, consequentemente, as linhas singulares não se movem com o decorrer tempo.

1ℜ(𝜂) indica a parte real de 𝜂 e ℑ(𝜂) a parte imaginária de 𝜂.

2A palavra “genericamente” também possui um significado bastante preciso que será discutido mais

(13)

Figura 1.2: Intersecção das duas superfícies, ℜ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 0 e ℑ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 0, mostrada como uma linha vermelha.

As linhas singulares possuem duas propriedades muito importantes que iremos discutir agora. Elas são estruturalmente estáveis e em geral são genéricas. Dizer que uma certa linha singular no espaço é estruturalmente estável significa dizer que ela é imune à perturbações. Caso mudássemos algum parâmetro no sistema físico, a linha singular não pode simplesmente sumir mas apenas mudar de forma ou se locomover pelo espaço. Para entender o conceito de linha singular genérica devemos observar os valores de fase que aparecem em torno do ponto singular. Da mesma forma que mostramos na Figura 1.1, todos os valores de fase aparecem em torno de um ponto singular. Nos casos genéricos a fase acumula por 2𝜋 em torno da singularidade. Casos onde a fase aumenta por valores maiores que 2𝜋 são chamados não-genéricos. Ambos os casos serão discutidos mais profundamente na seção 1.3 após a introdução da carga topológica na seção 1.2.

Nas seções 1.1.1 e 1.1.2 iremos estudar dois exemplos simples de singularidades a fim de entender melhor as ideias discutidas nesta seção bem como observar o que acontece com o valor da fase quando estamos próximos à um ponto singular.

1.1.1

Singularidade Screw

Considere a seguinte solução da equação da onda: 𝜓 = 𝑘(𝑥 + 𝑖𝑦) exp[𝑖(𝑘𝑧 − 𝜔𝑡)], onde 𝑘 = 𝜔/𝑐. Ela representa uma onda movendo-se na direção 𝑧 e com frequência temporal angular 𝜔. Aplicando a DSF, as duas superfícies são dadas por 𝑥 = 0 e 𝑦 = 0. Como a solução é uma onda monocromática, as duas superfícies não se movem no espaço e estão representadas na Figura 1.3. Observe que a direção da linha singular é a mesma da propagação da onda e que ela é uma linha reta.

(14)

Utili-Singularidade

Figura 1.3: Intersecção das duas superfícies ℜ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 𝑥 = 0 e ℑ𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 𝑦 = 0. Observe que a singularidade, representada pela linha reta vermelha, se estende ao longo da direção de propagação da onda.

zamos um gráfico de pseudocolor onde associamos uma cor para cada valor de fase. Como os pontos singulares formam uma linha reta no espaço tridimensional, em duas dimen-sões devemos observar pontos singulares (neste exemplo, o ponto 𝑥 = 𝑦 = 0). Observe na Figura 1.4 que, da mesma forma que todas as horas ocorrem perto da singularidade nos polos do globo terrestre da Figura 1.1, todas as cores (ou valores de fase) ocorrem próximo ao ponto singular. Analiticamente, a equação da fase no plano transverso (para 𝑧 = 0 e 𝑡 = 0 por simplicidade) é dada por 𝜑(𝑥, 𝑦) = Φ, onde Φ é o ângulo polar no sistema de coordenadas polares [𝑥 = 𝜌 cos Φ e 𝑦 = 𝜌 sin Φ]. Desta forma, a singularidade na origem aparece como decorrente do fato de que o ângulo polar não é definido na origem do sistema de coordenadas. kx ky −1 −0.5 0 0.5 1 −1 −0.5 0 0.5 1 −3 −2 −1 0 1 2 3

Figura 1.4: Distribuição transversal da fase da solução 𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 𝑘(𝑥 + 𝑖𝑦) exp[𝑖(𝑘𝑧 − 𝜔𝑡)]. Observe como todas as cores convergem para o ponto singular localizado na origem do sistema de coordenadas 𝑥 = 𝑦 = 0.

O nome screw3 foi utilizado por causa da forma da frente de onda da solução.

(15)

Portanto a frente de onda da solução 𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 𝑘(𝑥 + 𝑖𝑦) exp[𝑖(𝑘𝑧 − 𝜔𝑡)] possui uma geometria helicoidal. Iremos encontrar essa geometria mais adiante quando introduzirmos o momento angular orbital de um feixe de luz.

Figura 1.5: Frente de onda (pontos onde a fase possui o mesmo valor) de uma solução com uma singularidade de fase do tipo screw.

1.1.2

Singularidade Edge

Considere agora uma outra solução da equação da onda que também se propaga na direção 𝑧: 𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) = 𝑘(𝑎𝑥 + 𝑘𝑥2 + 𝑖𝑧) exp[𝑖(𝑘𝑧 − 𝜔𝑡)], onde 𝑎 é uma constante.

Aplicando a DSF obtemos as superfícies 𝑥 = 0, 𝑥 = −𝑎/𝑘 e 𝑧 = 0. As singularidades formam portanto duas retas paralelas localizadas no plano 𝑧 = 0, uma delas em 𝑥 = 0 e a outra em 𝑥 = −𝑎/𝑘. A diferença fundamental entre a singularidade screw e edge é que nesta última a direção das retas singulares é perpendicular à direção de propagação da onda. Outra diferença é que nessa última solução obtemos duas retas no lugar de uma. Tomando o limite 𝑎 → ∞ podemos fazer com que a linha singular em 𝑥 = −𝑎/𝑘 se afaste cada vez mais do eixo 𝑧 e desta forma podemos isolar uma singularidade edge dada pela equação aproximada 𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) ≈ 𝑘(𝑎𝑥 + 𝑖𝑧) exp[𝑖(𝑘𝑧 − 𝜔𝑡)]. É claro que fazendo esse limite mudamos a distribuição de amplitude perto da singularidade em 𝑥 = 0, mas desta forma conseguimos isolar uma singularidade edge assim como obtivemos anteriormente uma singularidade isolada do tipo screw. Notamos aqui a primeira dinâmica entre as linhas singulares. À medida em que um parâmetro do sistema muda, podemos obter novas geometrias (o parâmetro nesse exemplo foi o número 𝑎). O termo quadrático no campo

(16)

escalar representa uma interação entre as duas linhas singulares. Uma consequência disso é a criação e aniquilação de singularidades que iremos tratar no próximo capítulo.

Os dois exemplos de singularidades screw e edge servem para nos familiarizar com a geometria das linhas singulares encontradas em soluções da equação da onda. Da mesma forma que existem singularidades screw e edge isoladas, existe também o caso misto, isto é, uma linha reta singular que faz um certo ângulo 𝜃 com o eixo de propagação 𝑧. Outro efeito interessante ocorre quando perturbamos um campo que possui uma singularidade screw com uma onda plana cuja amplitude é pequena em comparação com a amplitude da onda original. Pode ser demonstrado que a linha reta singular se deforma em uma forma de hélice [9]. Vamos encontrar geometrias complicadas mais na frente. Antes precisamos saber como caracterizar quantitativamente esses pontos singulares em duas dimensões.

1.2

A carga topológica

Considere qualquer ponto numa linha singular e escolha o sentido de um pequeno caminho fechado em torno dessa linha de tal forma que a mudança total de fase seja 2𝜋. Vamos chamar essa escolha de sentido de circulação. Utilizando a regra da mão direita podemos associar um sentido à singularidade, dado por um vetor unitário ^d, como ilustra a Figura 1.6.

Figura 1.6: O sentido de circulação de uma singularidade permanece o mesmo ao longo do seu comprimento. Ele foi escolhido de acordo com o sentido em que a fase aumenta.

Em muitas ocasiões observamos a distribuição de fase de uma onda em um plano (como na Figura 1.4), restrigindo nossa visualização para duas dimensões. Isso é bastante comum no laboratório onde o feixe de luz possui uma direção de propagação bem definida e o físico experimental faz suas medidas do padrão de difração em um plano perpendicular à direção de propagação. Com relação ao plano em duas dimensões as singularidades de

(17)

𝑠 = 1 2𝜋

∮︁

𝑑𝜑. (1.1)

Note que a definição do índice topológico 𝑠 só serve para pontos pertencentes ao plano e que ela é totalmente dependente do sentido em que colocamos o plano transversal. Podemos também utilizar o vetor ^d para identificar 𝑚 investigando se ele aponta para fora do plano (𝑠 = +1 na Figura 1.7) ou para dentro (𝑠 = −1). O número inteiro 𝑚 é chamado de carga topológica, e apesar de alguns autores utilizarem esse nome quando se trata somente de lasers, nas discussões a seguir usaremos esta denominação para qualquer tipo de singularidade em duas dimensões. Em todos os exemplos descritos até agora obtivemos 𝑠 = ±1 (Ex: Figura 1.4).

Figura 1.7: Caracterização do ponto singular em duas dimensões. Visto de cima, a integração é adotando o sentido anti-horário.

Em resumo, para caracterizar um ponto singular (tendo em mente que as linhas singulares se tornam pontos em duas dimensões) observamos a mudança de fase em torno do ponto. Tomando o valor total sofrido pela mudança de fase e dividindo por 2𝜋, obtemos a carga topológica, que é um número inteiro.

1.3

Casos genéricos e não-genéricos

Vimos pela DSF que geralmente os pontos singulares formam linhas no espaço tridimensional. Mas o que significa (matematicamente falando) a palavra geralmente nesse contexto? É claro que duas superfícies geralmente se intersectam formando uma linha, mas existem certos casos particulares onde os pontos de intersecção formam uma

(18)

superfície. Tais casos ocorrem quando há uma forte simetria no sistema (geralmente cilín-drica), e isso limita a forma topológica das superfícies. Para entender melhor, considere a seguinte solução da equação da onda em coordenadas cilíndricas

𝜓(𝜌, 𝜑, 𝑧, 𝑡) = 𝜓0𝐽𝑚(𝑘𝜌𝜌) exp[𝑖(𝑚𝜑 − 𝑘𝑧𝑧 − 𝜔𝑡)], (1.2)

onde 𝜓0 é uma amplitude constante, 𝐽𝑚(𝑥) a função de Bessel do primeiro tipo de ordem

𝑚, 𝑘2

𝜌+ 𝑘𝑧2 = (𝜔/𝑐)2, (𝜌, 𝜑, 𝑧) são as coordenadas do sistema cilíndrico e 𝑚 é um número inteiro. A equação (1.2) é conhecida como feixe Bessel de ordem 𝑚 [11] e representa um feixe não-difratante que se propaga na direção 𝑧.4 Se aplicarmos a DSF na Eq. (1.2)

encontramos o resultado ℑ𝜓 = ℜ𝜓 = 𝐽𝑚(𝑘𝜌𝜌) = 0 que representa superfícies singulares em três dimensões. Como consequência, os pontos singulares não formam linhas, mas superfícies, em três dimensões e linhas em duas dimensões. A Figura 1.8 (a) ilustra a fase da Eq. (1.2) em um plano 𝑧 constante e a Figura 1.8 (b) sua intensidade, ambas assumindo 𝑚 = 3.

Figura 1.8: Perfil transversal de (a) fase e (b) intensidade da Eq. (1.2) com 𝑚 = 3. A intensidade é definida como o módulo ao quadrado do campo complexo e o círculo de cor preta na parte (a) indica uma singularidade central em 𝜌 = 0 com carga topológica 𝑚 = 3.

Considerando o caso 𝑚 = 3, a equação 𝐽3(𝑘𝜌𝜌) = 0 representa uma família de cilindros concêntricos com raios 𝑟1 = 𝑝1/𝑘𝜌, 𝑟2 = 𝑝2/𝑘𝜌, ... onde 𝑝𝑖 é a i-ésima raiz da função de Bessel 𝐽𝑚(𝑝). Para a função de Bessel de ordem 3, 𝑝1 = 0 e, consequentemente,

a primeira “superfície” é na verdade uma linha localizada no eixo 𝑧, como mostra o ponto singular circulado por uma linha preta no centro da Figura 1.8 (a). Observe como a fase muda em torno do ponto singular por um total de 6𝜋, caracterizando uma carga topológica igual a 3 de acordo com a Eq. (1.1). A próxima superfície cilíndrica possui um raio igual a 6.3802/𝑘𝜌 e está indicada na Figura 1.8 (b) como sendo o primeiro círculo de intensidade

4J. Durnin foi o primeiro a estudar essa solução em 1987. Ele observou que como a intensidade (dada

pelo módulo ao quadrado do campo) não depende da coordenada de propagação 𝑧, o feixe se propagaria sem mudar seu perfil transversal.

(19)

Nesse exemplo, a Eq. (1.2) possui uma simetria cilíndrica bem aparente. Como os pontos singulares não são linhas no espaço, esperamos que elas sejam instáveis no sentido de que, após uma perturbação, se “quebrem” em linhas tridimensionais estáveis. Para visualizar essa quebra, vamos perturbar a Eq. (1.2) com um perfil Gaussiano da forma

𝜓𝑝𝑒𝑟𝑡 = 𝜓0𝐽𝑚(𝑘𝜌𝜌) exp(𝑖𝑚𝜑) + 𝑎 exp(−𝜌2/𝑤2), (1.3)

onde 𝑎 é uma constante muito menor que 𝜓0 e 𝑤 a cintura da Gaussiana. Para

de-monstrar a instabilidade de alguma entidade física, devemos perturbá-la e observar a sua decomposição em suas componentes estáveis. É exatamente isso o que acontece com a Eq. (1.2) quando a perturbamos com um feixe Gaussiano na forma dada pelo segundo termo à direita na Eq. (1.3). A Figura 1.9 (a) mostra o novo perfil transversal de fase da solução perturbada (com a quebra de simetria) onde foram utilizados os valores 𝑎 = 0.15

e 𝑘𝜌𝑤 = 200. Observe como o ponto singular no centro do padrão, que possuía carga

topológica 𝑚 = 3, foi decomposto em três novos pontos singulares cada um possuindo uma carga topológica 𝑚 = 1, circulados na Figura 1.9 (a) por linhas pretas. Em outras palavras, a linha singular no eixo 𝑧 pode ser vista como uma composição de três linhas singulares, cada uma possuindo um valor unitário da carga topológica. Elas se condensam (no caso sem a perturbação) para formar a linha singular central com carga topológica igual a três. Da mesma forma, as superfícies singulares em três dimensões podem ser vistas como compostas por várias linhas singulares de carga topológica unitária. Após a perturbação observe que temos somente pontos singulares em duas dimensões, como é claramente visto na Figura 1.9 (a). É nesse sentido que dizemos que um ponto singu-lar com carga topológica unitária é a entidade estável (genérica) do sistema e que ela é estruturalmente estável.

Em resumo, pontos singulares em duas dimensões (ou linhas singulares em três dimensões) com carga topológica igual a um, formam as entidades genéricas e estrutu-ralmente estáveis de um sistema constituído por um campo de onda complexo. Quando observamos os pontos singulares formando superfícies em três dimensões, ou mesmo pon-tos em duas dimensões mas com carga topológica maior que um, sabemos que estamos

(20)

Figura 1.9: Perfil transversal de (a) fase e (b) intensidade da Eq. (1.3). Observe como o ponto singular central da figura anterior se quebra em 3 pontos singulares com carga topológica unitária, mostrados na parte (a) dentro dos círculos.

lidando com uma alta simetria no sistema. Tais casos são chamados não-genéricos, não são estruturalmente estáveis e não aparecem naturalmente na natureza, mas podem ser criados de forma fácil em laboratórios.

1.4

Momento angular da luz

Uma partícula de massa 𝑚 que se move no espaço pode ser caracterizada em mecânica clássica por uma quantidade definida por L = r × p, chamada de momento angular, onde r é o vetor posição e p = 𝑚v o seu momento linear. Em um sistema fechado sem a presença de torque, pode ser demonstrado que a quantidade L não varia com o tempo. Ela é uma constante de movimento e pode ser utilizada para caracterizar o sistema. Quando consideramos corpos rígidos é útil definir um outro termo de momento angular chamado de spin. Tome como exemplo o nosso planeta Terra orbitando em torno do sol. Seu movimento de revolução em torno da estrela é tratado pelo termo orbital do momento angular, enquanto que seu movimento em torno do próprio eixo é tratado pelo termo de spin. Tudo isso é conhecido pelos estudos da mecânica clássica.5 Como essas

ideias se aplicam ao próprio campo eletromagnético no vácuo e sem a presença de cargas? Poynting foi o primeiro a sugerir que luz com polarização circular carregasse um momento angular [12]. Para medir essa contribuição de momento angular, Poynting indicou, poderiam ser utilizadas várias placas birrefringentes suspensas por uma linha fina. Uma placa birrefringente de 𝜆/4 transforma a polarização circular incidente em uma polarização linear transmitida. A onda incidente perderia portanto seu momento angular que seria totalmente transferido para as placas, podendo o torque ser medido. Entretanto,

5Em mecânica quântica esses conceitos tomam um caráter ainda mais fundamental. O termo de spin,

por exemplo, não representa uma rotação física de massas, mas uma propriedade intrínseca de cada partícula sem análogo clássico.

(21)

realizou o experimento utilizando somente uma placa de 𝜆/4 e um espelho para feedback [13]. É interessante notar que o experimento foi feito na década de 30, bem antes da invenção do laser. Beth utilizou uma fonte de luz de tungstênio e uma fibra de quartzo para suspender a placa e confirmou a teoria de Poynting. O trabalho de Beth é aceito atualmente como o primeiro experimento a medir o momento angular da luz.

Cinquenta e seis anos se passaram desde o experimento de Beth até Allen e colaboradores corretamente associarem uma outra contribuição ao momento angular da luz. Desta vez, a contribuição tomou o nome de momento angular orbital e será nosso objeto de estudo na próxima seção (a contribuição medida por Beth ficou conhecida como momento angular de spin).6 Uma nova área de manipulação mecânica utilizando a luz

começou então a ser investigada.

1.4.1

A contribuição de Leslie Allen

O artigo de Allen e colaboradores foi o primeiro a associar um momento angular orbital da luz com a fase espacial de um feixe de luz criado em laboratório [15].7 Os autores estudaram as soluções conhecidas como feixes Laguerre-Gauss e mostraram que elas possuiam um momento angular diferente do proposto até então, e que ele dependia da estrutura espacial do feixe. O feixe Laguerre-Gauss é representado por um campo escalar complexo, dado por

6Vale notar que a luz também possui momento linear que ficou mais conhecido pelos trabalhos

pio-neiros de Arthur Ashkin relacionados com a pressão de radiação do campo eletromagnético [14].

7Para ser mais preciso, o neto do famoso biólogo evolucionário Charles Darwin, Charles Galton Darwin,

publicou um artigo em 1932 onde sugere a existência de uma outra contribuição de momento angular para fótons do tipo 𝑚¯ℎ com 𝑚 sendo qualquer inteiro [16]. Além disso, já era conhecido que transições

multipólos em interações luz-matéria resultam numa luz emitida possuindo momento angular em múltiplos

de ¯ℎ. A ideia original de Allen foi perceber que esse momento angular orbital era uma propriedade natural

de feixes com fase helicoidal e que poderia ser criado de forma muito fácil num laboratório utilizando um modulador espacial de luz, por exemplo.

(22)

𝜓𝑝𝑚(𝜌, 𝜑, 𝑧) = 𝐶 (1 + 𝑧2/𝑧2 𝑟)1/2 [︃ 𝜌√2 𝑤(𝑧) ]︃𝑚 𝐿𝑙𝑝 [︃ 2𝜌2 𝑤2(𝑧) ]︃ exp [︃ − 𝜌 2 𝑤2(𝑧) ]︃ × exp [︃ −𝑖𝑘𝜌2𝑧 2(𝑧2+ 𝑧2 𝑅) ]︃ exp(−𝑖𝑚𝜑) exp [︂ 𝑖(2𝑝 + 𝑚 + 1) tan−1 𝑧 𝑧𝑅 ]︂ (1.4)

onde 𝐶 é uma constante, 𝑧𝑅 o comprimento de Rayleigh, 𝑤(𝑧) o raio do feixe, 𝐿𝑙𝑝 o polinômio associado de Laguerre, 𝑚 um inteiro, 𝑝 um inteiro positivo e a cintura do feixe está em 𝑧 = 0. A expressão (1.4) não é solução da equação da onda, como o feixe Bessel, mas sim da equação paraxial da onda em coordenadas cilíndricas. Nessa aproximação, a derivada de segunda ordem do campo, e o produto das derivadas de primeira ordem, são ignorados e 𝜕𝑢/𝜕𝑧 é tomado como sendo pequeno comparado com 𝑘𝑢, onde 𝑢 representa o campo e 𝑘 = 2𝜋/𝜆. O perfil transversal de intensidade do feixe Laguerre-Gauss é formado por anéis de luz, assim como o feixe Bessel, porém, o número de anéis de intensidade é dado por 𝑝 + 1. Note que o feixe possui o mesmo termo de fase exp(𝑖𝑚𝜑) obtido anteriormente para o feixe Bessel.

Allen assumiu um vetor potencial linearmente polarizado na forma A(𝜌, 𝜑, 𝑧) = 𝜓𝑝𝑚(𝜌, 𝜑, 𝑧)^x. Com isso, conseguiu calcular os campos elétrico e magnético e suas variáveis dinâmicas. Uma delas é a expressão para a densidade de momento angular, dada por j = r × p, onde p é a densidade de momento linear, que pode ser escrita como p = S/𝑐2, onde S é o vetor de Poynting. Fazendo as devidas substituições, encontramos

que j = −𝑚 𝜔 𝑧 𝜌|𝜓| 2𝜌 +^ 𝜌 𝑐 [︃ 𝑧2 (𝑧2+ 𝑧2 𝑅) − 1 ]︃ |𝜓|2𝜑 +^ 𝑚 𝜔|𝜓| 2𝑧.^ (1.5)

Uma integração na seção transversal do feixe cancela o primeiro e o segundo termo, pois são simétricos em relação ao eixo de propagação 𝑧, deixando assim somente a componente

𝑧. A razão entre o fluxo de momento angular 𝐽𝑧 =∫︀ 𝑗𝑧𝑑𝑎 e a energia 𝐸 =∫︀ 𝑢𝑑𝑎, onde 𝑢

é a densidade de energia, é

𝐽𝑧

𝐸 =

𝑚

𝜔, (1.6)

enquanto que a razão entre o fluxo de momento angular 𝐽𝑧 e o fluxo de momento linear

(23)

momento angular intrínseco devido à polarização circular, sendo assim uma nova con-tribuição que chamou de orbital. As mesmas relações podem ser obtidas pela mecânica quântica. O momento angular de um fóton na direção 𝑧 é dado por 𝑚¯ℎ e sua energia por ¯ℎ𝜔, donde segue que a razão é a mesma deduzida na Equação (1.6) de uma maneira clássica, isto é, utilizando a teoria de campos clássica. Da mesma forma, como o mo-mento linear é dado por ¯ℎ𝑘, a Equação (1.7) segue. A analogia pode ser feita ainda mais forte observando que o operador de momento angular nas variáveis espaciais é dado por 𝐿𝑧 = −𝑖𝜕/𝜕𝜑, cuja expressão (1.4) é um autoestado com autovalor 𝑚.8

O que deve ser enfatizado aqui é que o número inteiro 𝑚 aparece na expressão final da razão entre o momento angular de um feixe e sua energia. Portanto, ele representa o estado de momento angular orbital, e como vimos no exemplo do Feixe Bessel, em algumas seções anteriores, ele está relacionado à carga topológica da singularidade de fase do campo. Ficou estabelecido então que as singularidades de fase possuem uma relação direta com o momento angular orbital de um feixe de luz. Como o número 𝑚 é um inteiro, variando de −∞ a +∞, o número de graus de liberdade do estado de momento angular orbital de um feixe de luz é muito maior que o seu estado de polarização, ou de spin, que só pode assumir dois estados, +1 ou -1, isto é, polarização à esquerda ou à direita.

1.4.2

Momento angular orbital e as singularidades de fase

Momento angular é geralmente associado com algo que gira. No caso de campos eletromagnéticos na aproximação escalar, como o feixe Bessel, existe uma certa gran-deza que “circula” dentro do campo. Para um campo monocromático escalar, 𝜓(r) = 𝜌(r) exp [𝑖𝜒(r)], onde 𝜌 e 𝜒 são reais, definimos essa grandeza como sendo a corrente óptica:

J(r) = ℑ(𝜓*∇𝜓). (1.8)

8A propósito, não é necessário uma aproximação paraxial para que as relações (1.6) e (1.7) sejam

satisfeitas partindo de um campo clássico. Em [17] demonstrei que elas também são verdadeiras para o feixe Bessel, que como vimos, é solução da equação da onda sem aproximações.

(24)

Não se deve confundir o J da Eq. (1.8) acima com o J da seção anterior, que caracterizou o momento angular orbital. A corrente J(r) é solenoidal, pois verifica-se sem dificuldades que ∇ · J = 0. Fisicamente podemos associar J a uma densidade de momento linear local, pois podemos reescrevê-la de uma maneira que ela represente o valor esperado do operador momento linear ⟨𝜓| ^𝑝 |𝜓⟩, onde ^𝑝(r) = (1/2)[𝛿(^r − r)^p + ^p𝛿(^r − r)] com ^

p = −𝑖∇. A densidade é local pois a corrente depende da variável de posição r. Vamos agora considerar um exemplo tratado por M. Berry [18] para mostrar o comportamento da corrente J(r) na presença de singularidades de fase.

Considere a superposição linear no vácuo de 10 ondas com direções de propaga-ção aleatórias, todas elas possuindo a forma 𝜓(r) = exp(𝑖𝑘𝑧𝑧)Ψ(𝑥, 𝑦), isto é, são ondas não-difratantes (assim como o feixe Bessel discutido anteriormente). A superposição de 10 ondas com direções aleatórias serve o propósito de obtermos singularidade genéricas, com cargas topológicas iguais a um e estruturalmente estáveis. Em outras palavras, não queremos simetria no sistema. Assim, escrevemos

Ψ(𝑥, 𝑦) =

10

∑︁

𝑛=1

𝑎𝑛exp [𝑖(𝑘𝑛𝑥𝑥 + 𝑘𝑛𝑦𝑦 + 𝜑𝑛)] , (1.9)

onde 𝑘𝑛𝑥 e 𝑘𝑛𝑦 são as componentes transversais do vetor de onda, 𝜑𝑛 a fase inicial e 𝑎𝑛 a amplitude do campo 𝑛.9 Na Figura 1.10, a linha mais fina representa pontos onde a fase

possui um valor constante (cada linha representa um valor de fase diferente), enquanto a linha mais grossa é tangente à corrente J(r) em cada ponto. Observe como as linhas de fase se encontram em cinco pontos na figura. Esses cinco pontos formam as singularidades de fase. As linhas tangentes à J são assintoticamente circulares em torno de cada vórtice. Por essa razão, as singularidades de fase também são chamadas de vórtices ópticos.

O fato de que a corrente de momento J circula em torno dos vórtices parece ser a origem da associação entre singularidades de fase e momento angular orbital. O mesmo comportamento ocorre em mecânica dos fluidos com fluxos irrotacionais, onde a velocidade angular é concentrada nas linhas singulares do campo de velocidade. Para campos com uma alta simetria circular, como os feixes Laguerre-Gauss e Bessel, esta associação pode ser feita. Quando a simetria é quebrada, a associação perde a validade, como iremos argumentar agora.

9Os valores numéricos dos parâmetros não nos interessam aqui, mas podem ser vistos na Tabela A.1

(25)

Figura 1.10: As linhas mais grossas são tangentes à corrente J enquanto que as mais finas representam a frente de onda do campo total. É fácil distinguir 5 singularidades na figura. O inset mostra a direção azimutal das ondas planas individuais. Retirado de [18].

Como vimos anteriormente, a densidade de momento angular para campos veto-riais é dada por j = r × p, onde p é a densidade de momento linear que pode ser deduzida das equações de Maxwell como sendo S/𝑐2. Como estamos tratando de campos escalares,

o análogo da densidade de momento linear é a densidade de corrente dada pela Equação (1.4.5) que, como enfatizamos anteriormente, pode ser vista como o valor esperado da densidade de momento. Portanto, temos a associação J ↔ p. Como não estamos levando em consideração a natureza vetorial do campo, a contribuição do momento angular de spin deve ser rejeitada e obtemos a expressão para o momento angular orbital somente:

L(r) = r × J(r), (1.10)

com J(r) dado pela Equação (1.8). Substituindo 𝜓(r) = exp(𝑖𝑘𝑧𝑧)Ψ(𝑥, 𝑦) com Ψ(𝑥, 𝑦) [Equação (1.9)], obtemos a densidade de momento angular orbital do campo total. A Figura 1.11 ilustra o gráfico em duas dimensões de |𝐿𝑧|. Os pontos pretos indicam os vórtices da Figura 1.10. Observe como eles pertencem às regiões de valor nulo do momento angular orbital. Em duas dimensões L(r) é zero em linhas que incluem as singularidades. Concluímos que as singularidades não podem contribuir para o momento angular orbital de um campo de luz. Por outro lado, a densidade de momento angular orbital não é zero em torno dos vórtices e, como consequência, uma quantidade de momento angular pode ser transferida para partículas que estejam em contato com o campo, como será descrito na próxima seção.

Qual a origem do momento angular orbital num feixe de luz com simetria cilín-drica? Como vimos anteriormente, o momento angular orbital na direção de propagação

(26)

é dado por 𝐿𝑧 = 𝜌𝑆𝜑 onde 𝑆𝜑 é a componente azimutal do vetor de Poynting, que por sua vez é proporcional à componente azimutal do momento linear 𝑝𝜑 do feixe. A densi-dade de momento linear local p é perpendicular à frente de onda do feixe. Dessa forma, para um feixe com fase helicoidal, a origem do momento angular orbital aparece como consequência da existência de uma componente azimutal do momento linear. O momento linear local não está portanto na mesma direção que a propagação do feixe mas possui uma torção (skew) em relação ao eixo de propagação do feixe por um ângulo 𝜃 = 𝑚/𝑘0𝜌,

onde 𝑘0 = 2𝜋/𝜆 e 𝜆 é o comprimento de onda da luz. Medidas diretas foram efetuadas

experimentalmente e a relação 𝜃 = 𝑚/𝑘0𝜌 foi confirmada [19].

Figura 1.11: Gráfico do módulo da componente 𝑧 da densidade de momento angular orbital dado pela Eq. (1.10) para a superposição de dez ondas planas. Os pontos circulares indicam os vórtices da Fig. 1.10. Tais pontos passam pelas linhas nulas do momento angular orbital. O número de onda transverso é escolhido como sendo 𝐾 = 2𝜋 de tal forma que as distâncias 𝑥 e 𝑦 (eixo horizontal e vertical, respectivamente) são múltiplos do comprimento de onda transverso. Retirado de [18].

1.4.3

Uma partícula interagindo com a singularidade

Para entender a dinâmica do momento angular da luz, iremos considerar um experimento feito em 1995 que relatou sistematicamente, pela primeira vez, a transferência de momento angular orbital para uma partícula (da ordem de micrômetro) de um campo de luz possuindo uma singularidade do tipo screw [20]. Como já vimos na seção anterior, a singularidade por si só não é diretamente responsável pela transferência de momento angular para a partícula, mas sim a topologia da frente de onda helicoidal que ela gera. O experimento foi feito utilizando um laser He-Ne com 𝜆 = 632, 8 nm, um holograma para criar a singularidade e um microscópio com uma câmera de vídeo acoplada para registrar o movimento das partículas.

(27)

(a) (b)

Figura 1.12: Um dos métodos experimentais para criar um feixe de luz com uma singulari-dade de fase. (a) Grade de difração feita pelo computador (holograma) com carga topológica igual a 1. (b) Padrão de difração gerado. [Retirado de www.ucl.ac.uk/∼ucapphj/tweezers/Seye Project.htm.]

Vamos tratar primeiramente a questão de como criar experimentalmente uma sin-gularidade de fase, já que o laser utilizado pelos autores gera um modo de saída Gaussiano, mais conhecido como 𝑇 𝐸𝑀00, que não possui singularidades. Uma das várias maneiras, e

a que foi utilizada pelos autores, é utilizar uma grade de difração, ou holograma [21, 22]. Um holograma é construído com um certo material de modo que, em algumas regiões, a luz é completamente bloqueada e em outras, ela é completamente transmitida. A Figura 1.12 (a) ilustra um holograma utilizado para gerar um feixe com carga topológica igual a 1 ou -1. Fazendo uma onda plana incidir no holograma, obtemos um padrão de difração transmitido constituído por várias ordens como mostra a Figura 1.12 (b) [23]. Pode-se ver claramente três ordens de difração na figura. O padrão do meio da figura (ordem zero) é característico do modo 𝑇 𝐸𝑀00, ou feixe gaussiano, enquanto que as duas ao lado

repre-sentam feixes Laguerre-Gauss com cargas topológicas iguais a 𝑚 = 1 e 𝑚 = −1. Portanto, utilizando o holograma apropriado, pode-se criar uma família de feixes Laguerre-Gauss possuindo singularidades e descritos pela Equação (1.4). Atualmente o uso de modula-dores espaciais de luz (MEL) se tornou mais comum devido à facilidade de manipulação computacional do cristal líquido por onde a luz deve ser transmitida.

Após selecionar a ordem desejada, o feixe é direcionado para o microscópio onde irá interagir com as partículas. As partículas do experimento consistiram de pó cerâmico dispersas em querosene com diâmetro variando entre 1-2 𝜇m. Utilizando um holograma com 𝑚 = 3, os autores observaram que as partículas podem ficar confinadas na região central escura do feixe. Elas poderiam então ser movidas mudando o deslizador do micros-cópio, localizado na base do aparato. A velocidade máxima na qual as partículas ainda ficavam aprisionadas no spot foi medida como sendo em torno de 5 𝜇m/s. Também foi verificado que as partículas aprisionadas sempre giravam na mesma direção da helicidade

(28)

do feixe, definida pelo sentido de rotação da fase helicoidal. Mudando este sentido (de 𝑚 = 3 para 𝑚 = −3, por exemplo), as partículas giravam no sentido oposto. A frequência de rotação medida variava entre 1 e 10 Hz, dependendo da forma e tamanho da partícula. Na Figura 1.13 podemos observar uma dessas partículas em rotação, determinada pelo círculo vermelho. Ela é bem assimétrica com tamanho em torno de 2 𝜇m que gira com frequência em torno 1 Hz.

Figura 1.13: Resultado experimental da transferência de momento angular de um feixe com uma singularidade de fase screw para uma partícula da ordem de micrômetro. Retirado de [20].

Também é possível criar em laboratório um feixe de luz que possua não somente uma fase helicoidal (dando origem ao momento angular orbital) mas uma polarização circular (dando origem ao momento angular de spin). A interação desse feixe de luz com a matéria depende exclusivamente da interação spin-orbital gerada pelas duas contribui-ções. Demonstra-se que uma partícula presa num dos anéis de luz, de um feixe do tipo Laguerre-Gaussiano por exemplo, com polarização circular pode ter seu sentido de rotação controlado mudando o sentido das duas contribuições de momento angular. Por exemplo, se o feixe possui uma polarização circular à esquerda, caracterizando um momento angu-lar de spin 𝑠 = +1 e um momento anguangu-lar orbital 𝑚 = +1 a partícula pode girar com uma frequência 𝑓 maior do que o caso onde 𝑠 = +1 e 𝑚 = 0. Se 𝑠 = +1 e 𝑚 = −1 é observado que a frequência de rotação da partícula é nula [24, 25, 26].

1.4.4

Medindo o momento angular orbital de um feixe de luz

Medir o momento angular orbital de um feixe equivale a medir sua carga topo-lógica porque, como vimos, ela representa um autovalor do operador momento angular orbital ou, em termos clássicos, aparece na relação (1.6). Mas a carga topológica possui uma conexão com o perfil de fase do campo, portanto, medir o momento angular orbital se torna basicamente uma medida do perfil de fase. Para se obter informação de fase de uma certa configuração de campo podemos fazer a interferência do feixe na qual

(29)

quere-𝜓𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙(𝜌, 𝜑, 𝑧) = 𝜓0𝐽𝑚(𝑘𝜌𝜌) exp(𝑖𝑚𝜑) exp(𝑖𝑘𝑧𝑧) + 𝑎 exp(𝑖𝛽𝑧) exp(𝑖𝛼𝑥) (1.11)

onde (𝛼, 𝛽) são as componentes 𝑥 e 𝑧 de k e 𝑎 é a amplitude da onda plana. O perfil de intensidade num certo plano 𝑧 é dado por 𝐼 = |𝜓𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙|2 como mostra a Figura 1.14 nos casos 𝑚 = 1 e 𝑚 = 2. Podemos observar na figura que o perfil de intensidade é diferente para diferentes valores de 𝑚.10 Note que ele representa a transmissão de um

holograma como mostrado na Fig. 1.12 para o caso 𝑚 = 1. Em outras palavras, o padrão de intensidade resultante da superposição (1.11) possui a informação da carga topológica do feixe. Para determinar o valor de 𝑚 a partir do padrão de interferência, podemos contar as “ramificações” existentes a partir do ponto central na Figura 1.14.

Figura 1.14: Intensidade resultante da superposição entre um feixe Bessel com carga topológica igual à 1 (esquerda) e 2 (direita) e uma onda plana propagando-se com um certo ângulo 𝜃 em relação ao eixo 𝑧.

Uma outra forma de medir a carga topológica foi proposta em 2010 baseada na difração [27]. Após criar experimentalmente um feixe Laguerre-Gaussiano com carga topológica 𝑚, os autores utilizaram uma abertura em forma de triângulo equilátero para servir de fenda. O perfil resultante de intensidade num certo plano 𝑧 muito distante do plano da abertura foi medido e a Figura 1.15 mostra um destes resultados. Claramente o perfil de difração depende da carga topológica. Para determinar o valor de 𝑚 a partir do padrão de difração basta medir o número de máximos de intensidade 𝑛 num lado da rede triângular truncada gerada pela difração e subtrair uma unidade, 𝑚 = 𝑛 − 1. A luz utilizada para obter os resultados descritos na Figura 1.15 (e em toda as figuras

10Por lembrar a aparência geométrica de um garfo, esse tipo de perfil de intensidade é também chamado

(30)

incluidas nesse capítulo) foi uma luz laser que, como sabemos, possui uma coerência muito alta. O termo coerência pode ser definido de uma maneira muito precisa e isto será feito no capítulo 4 onde iremos estender os resultados de medidas da carga topológica mas utilizando feixes de luz parcialmente coerentes.

Figura 1.15: Perfil de intensidade resultante da difração de um feixe Laguerre-Gauss com 𝑚 = 1, 2, 3 por uma abertura triangular. Linha de cima: Teoria. Linha de baixo: Experimento. O valor da carga topológica é dado por 𝑚 = 𝑛 − 1 onde 𝑛 é o número de máximos num lado da rede triangular truncada de intensidade. Retirado com permissão de [27].

1.5

Conclusões

Mostramos neste capítulo introdutório uma propriedade genérica e estrutural-mente estável da luz: suas singularidades de fase. Elas aparecem naturalestrutural-mente em expe-rimentos de difração e espalhamento, constituindo assim uma parte intrínseca do mundo natural. O conceito de carga topológica foi introduzido com o objetivo de caracterizar o ponto singular em duas dimensões bem como a distinção entre casos genéricos e não-genéricos. A física de um campo com singularidades foi entendida utilizando o conceito físico de momento angular de um feixe de luz. Uma partícula em contato com um campo singular pode sofrer a ação de um torque caracterizando uma transferência de momento angular do campo para a partícula. Em primeira vista as singularidades parecem ter uma relação direta com a contribuição de momento angular. Porém, uma análise mais deta-lhada mostrou que os pontos singulares não contribuem para a expressão de densidade de momento angular, mas sua presença no espaço altera a topologia da frente de onda e, com isso, gera uma rotação que caracteriza a dinâmica do feixe. No próximo capítulo iremos nos aprofundar mais um pouco com relação às formas geométricas das linhas singulares.

(31)

Capítulo 2

Singularidades em campos

evanescentes

“I remember my friend Johnny von Neumann used to say, with four parameters I can fit an elephant, and with five I can make him wiggle his trunk.” - Quote from Enrico Fermi

Neste breve capítulo iremos demonstrar uma primeira aplicação dos conceitos introduzidos no capítulo anterior. Na seção 2.1 mostraremos como criar singularidades de fase utilizando uma superposição linear de 𝑁 ondas planas que se propagam num espaço livre, isto é, sem dielétricos. Na seção 2.2 discutiremos um pouco sobre campos evanescentes e como podem ser gerados. Por fim, na seção 2.3, os resultados originais da nossa pesquisa serão discutidos. Nosso objetivo é demonstrar a criação de uma rede de singularidades no campo evanescente de um sistema formado por ar e um material dielétrico, utilizando o conceito do ângulo de Brewster. Os resultados indicam que uma rica topologia de singularidades de fase, incluindo criação e aniquilação de cargas topoló-gicas, é possível utilizando um simples modelo linear. Os resultados descobertos sugerem uma nova abordagem para o aprisionamento de partículas em campos evanescentes pois, como foi discutido no capítulo anterior, a fase helicoidal em torno de um ponto singular possui uma densidade de momento angular orbital que pode ser utilizada para transferir momento à partículas aprisionadas no campo.

(32)

2.1

Ondas planas e singularidades

Vamos começar com o caso mais simples, uma onda plana no vácuo cuja expressão é dada por 𝜓(r, 𝑡) = 𝜓0exp(𝑖k · r − 𝑖𝜔𝑡). De acordo com a DSF concluímos que nenhum

ponto espacial satisfaz o sistema ℜ𝜓(r, 𝑡) = ℑ𝜓(r, 𝑡) = 0, portanto uma onda plana não contém singularidades de fase (o que já era esperado pois ela preenche todos os pontos do espaço com intensidade diferente de zero). Para duas ondas planas de mesma frequência

𝜔 temos1

𝜓(r, 𝑡) = 𝜓1exp(𝑖k1· r − 𝑖𝜔𝑡) + 𝜓2exp(𝑖k2· r − 𝑖𝜔𝑡 − 𝜑). (2.1)

Em primeiro lugar observe que se k1 = k2 voltamos ao caso anterior que não possui

singularidades, assim vamos assumir que k1 ̸= k2. Sabemos também que a superposição de

duas ondas planas no vácuo gera um padrão de interferência com linhas de zero intensidade em um plano e superfícies planas no espaço, como pode ser visto em qualquer livro de graduação em física através do experimento da dupla fenda de Young (as duas ondas planas podem ser vistas como sendo emitidas uma por cada abertura, desde que o plano de observação esteja muito distante delas). Dessa forma, esperamos que os pontos satisfeitos pela definição de singularidade de fase sejam pertencentes a vários planos no espaço. Aplicando a DSF, encontramos que os pontos singulares r satisfazem a equação 𝛿k · r = 2𝜋𝑝 − 𝜑, com 𝛿k = k1 − k2 e 𝑝 um inteiro. Que representa uma equação com vários

planos, um para cada valor de 𝑝. Está ilustrada na Figura 2.1 a superposição de duas ondas planas com vetores de onda k1 e k2. Observe que os planos de intensidade nula são

perpendiculares ao vetor 𝛿k, como determinado pela solução do sistema ℜ𝜓 = ℑ𝜓 = 0. Ao olhar para um padrão de interferência do tipo dupla fenda, podemos explicar os máximos e mínimos através de duas formas. A forma mais comum, que consta em pra-ticamente todos os livros introdutórios de óptica, utiliza o conceito de fase mas de uma maneira diferente da que estamos tratando aqui. Nesse conceito, existe um certo número caracterizado pela diferença de distância percorrida pelas ondas emitidas nas aberturas de tal forma que, se em um determinado ponto no plano de observação esse número for um múltiplo do comprimento de onda da luz, obtemos um máximo de intensidade. A

1A amplitude 𝜓

0da onda plana única no vácuo pode ser tomada como sendo real, pois uma fase global

não altera a dinâmica do sistema. Assim, tomamos as amplitudes 𝜓1e 𝜓2como sendo reais e adicionamos

(33)

Figura 2.1: Ilustração da superposição de duas ondas planas no vácuo com vetores de onda k1 e k2. O vetor de diferença 𝛿k = k1− k2 é perpendicular aos planos de intensidade nula (planos onde a fase é singular) mostrados à direita.

vantagem dessa visão é que ela é físicamente intuitiva e simples. Por outro lado, com a definição de singularidades de fase introduzida, podemos olhar para um problema de interferência de uma nova maneira. Os zeros de intensidade são resultados das singula-ridades de fase, que ocorrem genericamente na natureza e são estruturalmente estáveis, isto é, é esperado que eles existam na maioria dos sistemas ópticos. Claro, para calcular o padrão de intensidade resultante da difração temos que utilizar as equações de difração de Fresnel ou Fraunhofer, que podem ser bastante trabalhosas. O conceito de singularidade revela um “esqueleto” do campo óptico resultante, e pode nos dar informações valiosas de uma maneira mais simples. É interessante notar que os planos singulares formados pela superposição de duas ondas planas não são genéricos. Eles não formam linhas no espaço com carga topológica igual a um. Em outras palavras, eles se “quebram” ao serem perturbados. Isso pode ser explicado notando que, qualquer que seja a direção das duas ondas planas, sempre podemos encontrar um plano de simetria entre elas. Outra forma de observar que a situação não é genérica é perturbar o sistema com uma outra onda plana, como veremos a seguir.

A superposição de três ondas planas recebeu o primeiro tratamento sistemático de singularidades em 2001 por J. Masajada e B. Dubik [28]. Descartando a parte temporal, o problema seria encontrar valores de posição r = (𝑥, 𝑦, 𝑧) de tal forma que a parte real e imaginária de 𝜓(r) =∑︀3

𝑗=1𝜓𝑗exp(𝑖k𝑗· r + 𝑖𝜑𝑗) se anulem simultaneamente. Infelizmente encontrar os zeros de uma função escrita como uma série truncada de Fourier em 3 di-mensões não é trivial [29]. No caso de duas ondas planas conseguimos resolver o sistema e determinar a equação satisfeita pelos pontos singulares. Para entender a geometria obe-decida pelas singularidades de três ondas planas, tomamos a expressão da intensidade 𝐼 do campo resultante, pois onde ℜ𝜓 = ℑ𝜓 = 0 também temos que 𝐼 = |𝜓|2= 0. Considere

(34)

então o campo total escrito na forma particular

𝜓𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙(r) = 𝜓0+ 𝜓0exp(−𝑖𝑘𝑥𝑥) + 𝜓0exp(−𝑖𝑘𝑦𝑦), (2.2) que descreve a distribuição de amplitude no plano 𝑧 = 0. O campo total é composto por três ondas planas com vetores de onda k1 = 𝑘1z, k2 = 𝑘𝑥x + 𝑘𝑧z e k3 = 𝑘𝑦y + 𝑘𝑧z. A intensidade é dada por 𝐼(𝑥, 𝑦) = 𝜓2

0{3 + 2 [cos(𝑘𝑥𝑥) + cos(𝑘𝑦𝑦) + cos(𝑘𝑥𝑥 − 𝑘𝑦𝑦)]} que representa um padrão de máximos e mínimos de luz. Para identificar os pontos nulos, o termo entre colchetes deve ser igual a −3/2. Isso ocorre quando [30]

𝑘𝑥𝑥 = (︂ 𝑚 + 1 3 )︂ 2𝜋 (2.3) 𝑘𝑦𝑦 = (︂ 𝑛 + 2 3 )︂ 2𝜋 (2.4)

com 𝑚 e 𝑛 inteiros. Portanto a interferência de três ondas planas formam uma rede de pontos singulares em duas dimensões. Pode ser demonstrado que em três dimensões esses pontos formam linhas retas paralelas. Saímos de um caso que não era genérico (superposição de duas ondas planas) para um caso genérico que pode ser visto como uma perturbação das duas ondas planas anteriores. Fica claro que, à medida que aumentamos o número de ondas na superposição, o padrão geométrico de singularidades se torna cada vez mais complicado.

Cinco anos se passaram até M. Padgett e colaboradores estudarem o comporta-mento das singularidades a partir da superposição de quatro e cinco ondas planas [31]. Denotando cada onda plana por 𝜓𝑗 = 𝑎𝑗exp(𝑖k𝑗 · r) e assumindo 𝑎1 ≥ 𝑎2 ≥ ... ≥ 𝑎4, os

autores concluíram:

• Se 𝑎1 = 𝑎2 = 𝑎3 = 𝑎4 → Os pontos singulares formam linhas retas podendo se

cruzar em determinados locais [Figura 2.2(𝑎)].

• Se 𝑎1+𝑎2 = 𝑎3+𝑎4 → Os pontos singulares formam linhas curvas podendo se cruzar

em determinados locais [Figura 2.2(𝑏)].

• Se 𝑎1+ 𝑎4 ≤ 𝑎2+ 𝑎3 → Os pontos singulares formam uma rede de linhas helicoidais

(35)

(a) (b)

(c) (d)

Figura 2.2: Topologia das singularidades formada pela superposição de 4 ondas planas de tal forma que (a) 𝑎1= 𝑎2 = 𝑎3= 𝑎4, (b) 𝑎1+𝑎2= 𝑎3+𝑎4, (c) 𝑎1+𝑎4≤ 𝑎2+𝑎3e (d) 𝑎1+𝑎4≥ 𝑎2+𝑎3. Retirado de [31].

O vetor de onda de cada onda particular pertence à um ponto numa rede cúbica no espaço k de espaçamento Δ𝑘. O motivo dessa escolha é que o campo total se torna periódico tanto na direção axial (com período 4𝜋𝑘/Δ𝑘2) quanto na direção transversal (com período

2𝜋/Δ𝑘) [32, 33]. Assim se torna possível calcular a geometria das singularidades em uma única “célula unitária” e copiar o padrão por todo o espaço para obter a geometria em sua forma mais completa. Essa célula unitária está descrita na Figura 2.2. Claramente na medida em que adicionamos ondas planas no sistema a geometria dos vórtices se torna cada vez mais complicada. Para a superposição de 5 ondas planas não encontramos mais uma relação geométrica bem definida relacionando as amplitudes das ondas. Utilizaremos esses resultados mais adiante quando aplicarmos as ideias de singularidade em um campo evanescente. Um avanço muito importante envolvendo singularidades de fase e super-posição de ondas ocorreu em 2001 num artigo publicado por M. V. Berry e seu aluno de doutorado M. Dennis. Eles demonstraram que efetuando uma superposição de feixes Bessel [Equação (1.2)] é possível criar geometrias de linhas singulares mais exóticas como links e nós, abrindo assim novas possibilidades de manipulação da luz num domínio da ordem do comprimento de onda [34, 35, 36, 37].

(36)

2.2

O campo evanescente

Campos evanescentes aparecem em vários sistemas físicos e desempenham um pa-pel fundamental em inúmeras aplicações no domínio nanométrico da luz [38]. Portanto, estudar suas propriedades e características torna-se um papel fundamental na caracteri-zação de sua dinâmica. O caráter evanescente aparece quando uma das componentes do vetor de onda k é um número imaginário. Talvez o exemplo mais comum seja a interação entre uma onda eletromagnética e uma interface que separa dois meios com índices de refração diferentes. Se a onda propaga-se do meio com índice de refração maior para o meio com índice de refração menor, existe um ângulo crítico de tal forma que se a onda incide na interface com um ângulo (com relação à normal da interface) maior que ele, o campo é totalmente refletido. Esse é o princípio básico que possibilita, por exemplo, a aplicabilidade das fibras ópticas. Apesar do fluxo de energia (dado pelo vetor de Poyn-ting) ser refletido, o campo não é zero no outro lado da interface e possui uma densidade de energia finita, entretanto ele não se propaga. Vamos tornar essas ideias mais precisas. Considere uma onda escalar caracterizada pelo vetor de onda k1 que se propaga

num meio com índice de refração 𝑛1 (𝑧 ≤ 0) incidente num meio com índice de refração

𝑛2 (𝑧 > 0) em um ângulo de incidência 𝜃1, como ilustra a Figura 2.3. Sabemos pelo

experimento que isso dará origem à duas ondas, uma refletida e uma transmitida. Vamos caracterizar a onda refletida pelo vetor de onda k2 e a onda transmitida por k3:

𝜓𝑖(r) = 𝜓𝑖exp(𝑖k1· r), (2.5)

𝜓𝑟(r) = 𝜓𝑟exp(𝑖k2· r), (2.6)

𝜓𝑡(r) = 𝜓𝑡exp(𝑖k3· r), (2.7)

onde os índices 𝑖, 𝑟 e 𝑡 se referem às ondas incidente, refletida e transmitida, respectiva-mente, |k1|= |k2|= 𝑛1𝜔/𝑐 e |k3|= 𝑛2𝜔/𝑐. Com a ajuda da Figura 2.3 podemos escrever

k1 = 𝑘1(^𝑧 cos 𝜃𝑖+ ^𝑥 sin 𝜃𝑖), k2 = 𝑘2(−^𝑧 cos 𝜃𝑖+ ^𝑥 sin 𝜃𝑖) e k3 = 𝑘3(^𝑧 cos 𝜃𝑡+ ^𝑥 sin 𝜃𝑡). Como

queremos estudar campos evanescentes, nossa atenção deve ser voltada à componente 𝑧 do vetor de onda do campo transmitido, dada por

(37)

a 𝑘3𝑧 = 𝑛2𝜔 𝑐 (︁ 1 − sin2𝜃𝑡, )︁1/2 (2.9) e utilizando a lei de Snell (𝑛1sin 𝜃𝑖 = 𝑛2sin 𝜃𝑡), podemos reescrever a Equação (2.9) em termos do ângulo de incidência 𝜃𝑖:

𝑘3𝑧 = 𝑛2𝜔 𝑐 (︁ 1 − 𝑛2𝑓 sin2𝜃𝑖 )︁1/2 , (2.10)

onde 𝑛𝑓 = 𝑛1/𝑛2 é a fração entre os dois índices de refração. Observe agora que 𝑘3𝑧

pode ser tanto real quanto imaginário, dependendo apenas do termo entre parênteses na Equação (2.10). Como 𝜃𝑖 é um número real, sin 𝜃𝑖 não pode assumir valores maiores que 1. Assim, é necessário que 𝑛𝑓 > 1 para que 1 − 𝑛2𝑓 sin2𝜃𝑖 seja negativo. Dizer que 𝑛𝑓 precisa ser maior que 1, significa dizer que o meio onde a onda se propaga inicialmente deve possuir um índice de refração maior que o do meio transmitido. Uma maneira de realizar isso é, por exemplo, utilizar vidro (𝑛1 ≈ 1.333) como o meio inicial e o próprio ar

(𝑛2 ≈ 1) como o meio transmitido. Para um certo valor de 𝑛𝑓, o ângulo crítico é dado por 𝜃𝑐 = sin−1(1/𝑛𝑓) . Se o ângulo de incidência for maior que o ângulo crítico, o campo para 𝑧 > 0 torna-se evanescente

Figura 2.3: Geometria utilizada na descrição do campo evanescente. As ondas incidente, refletida e transmitida têm vetores de onda k1, k2e k3respectivamente. 𝑛1representa o índice de refração do material onde a luz se propaga inicialmente e 𝑛2 o índice de refração do meio onde a luz é

(38)

Assumindo 𝑛𝑓 > 1, o campo transmitido pode ser descrito por (para 𝑧 > 0)

𝜓𝑡(r) = 𝜓𝑡exp(−𝛾𝑧) exp(𝑖𝑘3𝑥 sin 𝜃𝑡), (2.11) onde 𝛾 = 𝑘3(𝑛2𝑓sin2𝜃𝑖 − 1)1/2. Portanto, para um determinado plano 𝑧 = 𝑧0 a onda se

propaga na direção 𝑥, mas à medida em que nos afastamos do plano 𝑧 = 0 a amplitude diminui exponencialmente e não apresenta o caráter ondulatório periódico. Utilizando a Equação (1.8) da corrente de momento podemos calcular J(r) utilizando o campo da Equação (2.11). Um cálculo trivial mostra que

J(r) = 𝜓2𝑡𝑘3𝑥exp(−2𝛾𝑧)^𝑥. (2.12)

Portanto não existe fluxo de corrente na direção 𝑧. Todo o transporte de momento está confinado à direção de propagação 𝑥. Assim, apesar de existir uma densidade de energia finita na região próxima à interface, ela não flui, apenas decai à medida que nos afastamos. Esse fenômeno é chamado de reflexão interna total e a Figura 2.4 mostra o resultado experimental de uma medida direta da extensão espacial do campo evanescente [39]. Os autores utilizaram uma ponta muito fina de uma fibra óptica e acoplaram-na com um microscópio de tunelamento óptico. Dessa forma o campo evanescente é acoplado com a fibra e se torna um campo propagante cujo sinal pode ser detectado pelo sistema e transformado em corrente elétrica.

Figura 2.4: Medida direta de um campo evanescente gerado por uma reflexão interna total entre vidro e ar. As franjas de interferência aparecem como consequência do aparato experimental utilizado que resultou numa superposição de duas ondas. Retirado de [39].

Referências

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