RAMON LAMAR DE OLIVEIRA JUNIOR
ANÁLISE COMPARATIVA DA REPRODUÇÃO
DO MANDI-AMARELO,
Pimelodus maculatus Lacèpéde, 1803
(PISCES, PIMELODIDAE), EM DOIS TRECHOS
DO RIO SÃO FRANCISCO, MG.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
BELO HORIZONTE
RAMON LAMAR DE OLIVEIRA JUNIOR
ANÁLISE COMPARATIVA DA REPRODUÇÃO
DO MANDI-AMARELO,
Pimelodus maculatus Lacèpéde, 1803
(PISCES, PIMELODIDAE), EM DOIS TRECHOS
DO RIO SÃO FRANCISCO, MG.
Dissertação apresentada ao Curso de
Pós-Graduação em Biologia Celular
do Instituto de Ciências Biológicas da
Universidade Federal de Minas
Gerais como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em
Biologia Celular.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
BELO HORIZONTE
Esta dissertação foi realizada no Laboratório de Ictiohistologia do Departamento de Morfologia e Centro de Microscopia Eletrônica (CEMEL) do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, sob orientação do Professor Dr. Nilo Bazzoli e colaboração da Professora Dra. Elizete Rizzo e do Dr. Yoshimi Sato, com o apoio das seguintes instituições:
- Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq): PADCT/CIAMB III – processo 62.0088/98-2 e CNPq processo 479733/01; - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG);
- Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF);
- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA);
Dedico essa dissertação a minha esposa Andréia, a minha filha Marina e a minha mãe Helena, que me ensinam diariamente as lições mais importantes da vida.
Ao meu querido pai, que, do Oriente Eterno em que se encontra, sempre iluminará os meus passos. Pai, receba minha eterna gratidão.
Ao Dr. Nilo Bazzoli todo o meu agradecimento pela acolhida e pelo exemplo firme de competência profissional. À Dra. Elizete Rizzo e ao Dr. Yoshimi Sato meu agradecimento pelos ensinamentos, sugestões e críticas.
A
GRADECIMENTOSAo meu grande amigo Renato Ferreira de Andrade, que de aluno fez-se colega e, por tantas vezes, meu mestre.
Aos meus irmãos, Francisco e Fada, pelo apoio constante e interesse no meu trabalho.
Aos amigos do laboratório de Ictiohistologia, Mônica, Bianca, Enemir, Fernanda, Hélio, Ana Luiza, Emanuel e Kinulpe, pela amizade e consideração. Em especial a minha estagiária Luciana Cristelli, pela seriedade e companheirismo.
Aos Professores e funcionários do Departamento de Morfologia, em especial ao Robson Rossoni, Elizabeth Camargo, Ana Maria, Conceição Machado, Antônio Carlos, Iraídes, Ivone, Ivete e Olga.
Aos colegas das disciplinas da pós-graduação: Lamara, Sonja, Daniela, Janaína, Lorenza, Patrícia, Ronaldo, Marcos, Iêda e Lorenza. E ao Othon também, é claro.
A toda equipe do laboratório de Ictiologia e do Programa de Pós-Graduação em Zoologia de Vertebrados da PUCMinas.
Aos meus funcionários, capitaneados pela Suzilane, aos colegas professores e alunos do Núcleo de Aprendizagem pela compreensão, paciência e colaboração.
Ao Dr. Marcelo, Borato e Fabinho, bem como a todos da Fundação Educacional Monsenhor Messias, pelo apoio.
Ao Eli e Toni, grandes companheiros.
Aos professores que tanto contribuíram na minha formação e que são sempre lembrados: Valdemar, Edson Abreu (Gamela), Vila, Jamerson, Roberto, José Mauro, Pedrão, Paulo Novaes, Mairy, Namir e Mário De Maria.
Como pode o peixe vivo
viver fora d'água fria?
Como poderei viver,
sem a tua, sem a tua, sem a tua companhia?
...
O rio de São Francisco corre de noite e de dia
Só o tempo é que não corre
sem a tua, sem a tua, sem a tua companhia.
Peixe vivo
S
UMÁRIORESUMO I
ABSTRACT II
LISTA DE FIGURAS E TABELAS III
Página
1. INTRODUÇÃO ... 1
1.1 Impacto dos reservatórios sobre a reprodução de peixes... 1
1.2 Aspectos morfo-fisiológicos da reprodução dos teleósteos ... 1
1.3 Caracterização dos trechos de estudo ... 4
1.4 Caracterização da espécie Pimelodus maculatus Lacèpéde, 1803 ... 5
2. OBJETIVOS ... 6
3. MATERIAL E MÉTODOS ... 7
3.1 Animais ... 7
3.2 Biometria ... 7
3.3 Estrutura populacional e proporção sexual ... 7
3.4 Histologia e histoquímica ... 7 3.5 Ultra-estrutura ... 8 3.6 Histometria ... 8 3.7 Ovogênese e espermatogênese ... 8 3.8 Ciclo reprodutivo ... 8 3.9 Análise estatística ... 8 4. RESULTADOS ... 9
4.1 Estrutura populacional e proporção sexual ... 9
4.2 Estrutura gonadal e ciclo reprodutivo dos machos ... 12
4.2.1 Morfologia dos testículos ... 12
4.2.2 Células da linhagem espermatogênica ... 15
4.2.3 Histoquímica da secreção intratubular dos testículos ... 17
4.2.4 Estádios do ciclo reprodutivo de machos ... 18
4.2.5 Ciclo reprodutivo nos machos ... 19
4.3 Estrutura gonadal e ciclo reprodutivo das fêmeas ... 21
4.3.1 Morfologia dos ovários ... 21
4.3.2 Células da linhagem oogênica ... 22
4.3.3 Envoltórios ovocitários ... 23
4.3.4 Folículos pós-ovulatórios e folículos atrésicos ... 26
4.3.5 Estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas ... 27
4.3.6 Ciclo reprodutivo nas fêmeas ... 28
4.3.7 Freqüência de atresia ... 30
5. DISCUSSÃO ... 31
5.1 Estrutura populacional e proporção sexual ... 31
5.2 Organização morfo-funcional dos testículos ... 31
5.3 Organização morfo-funcional dos ovários ... 32
5.4 Atresia folicular e folículos pós-ovulatórios ... 34
5.5 Estádios do ciclo reprodutivo ... 34
5.6 Diferenças entre os trechos estudados ... 35
6. CONCLUSÕES ... 36
I
RESUMO
Estudou-se a gametogênese e a reprodução do mandi-amarelo Pimelodus maculatus em dois trechos do rio São Francisco, MG. Os peixes (185 fêmeas e 161 machos) foram capturados no período de julho de 1995 a junho de 1996. A época de reprodução foi estabelecida através da análise microscópica de gônadas e da freqüência relativa dos estádios do ciclo reprodutivo. Os testículos de P. maculatus possuem projeções digitiformes com região cranial espermatogênica e caudal secretora. A região cranial é constituída de túbulos seminíferos com células espermatogênicas contidas em cistos. Os espermatozóides são do tipo primitivo, com cabeça redonda (1,30 ± 0,13 µm), peça intermediária rudimentar e longo flagelo com arranjo axonêmico do tipo 9+2. Na secreção da região caudal detectaram-se glicoproteínas neutras, glicoconjugados ácidos carboxilados e sulfatados. Os ovócitos vitelogênicos são envolvidos por zona pelúcida com três camadas distintas e uma cobertura de material floculento (jelly coat). A zona pelúcida apresenta poros-canais onde microvilosidades dos ovócitos e das células foliculares estabelecem contatos. Os peixes encontraram melhores condições de reprodução no trecho a jusante do rio Abaeté, onde verificou-se maior incidência de machos e fêmeas em atividade reprodutiva. No trecho a jusante da barragem de Três Marias registrou-se elevada freqüência de fêmeas apresentando folículos ovarianos atrésicos e de machos e fêmeas em repouso reprodutivo.
II
ABSTRACT
The present study demonstrated the dynamic process of gametogenesis and the reproduction of the brazilian yellow-mandi catfish, Pimelodus maculatus from two areas of the São Francisco river, MG. Adult females (185) and males (161) were caught between July 1995 and June 1996. The reproductive season was established through the microscopic analysis of gonads and from the relative frequency of the reproductive cycle stages. The testes of P.
maculatus posses finger-like protuberances with a spermatogenic cranial region and secretory
caudal region. The cranial region is made up of seminiferous tubules with spermatogenic cells contained in cysts. The spermatozoa are of the primitive type, with a round head (1,30 ± 0,13 µm), rudimentary middle piece, and long flagellum with a 9+2 axonemal arrangement. In the secretion from the caudal region we detected neutral glycoproteins, sulphated and carboxylated acid glycoconjugates. The vitelogenic oocytes are composed of a zona pellucida with three different layers and a covering of flaky material (jelly coat). The zona pellucida presents pore canals in which microvilli of oocytes and follicle cells establish contacts. Yellow-mandi catfish had better reproductive conditions in the area downstream from Abaeté river, where we found a higher incidence of males and females in reproductive activity. In the area downstream from Três Marias dam we registered a high frequency of females with atretic ovarian follicles, and males and females in reproductive rest.
III LISTA DE FIGURAS E TABELAS
FIGURA 1 - Trecho do rio São Francisco a jusante da UHE de Três Marias. FIGURA 2 - Mapa de localização dos trechos de estudo.
FIGURA 3 - O mandi-amarelo: Pimelodus maculatus Lacèpéde, 1803.
FIGURA 4 - Freqüência bimestral absoluta (Fa) de machos e fêmeas de P. maculatus capturados nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
FIGURA 5 - Freqüência absoluta (Fa) de machos e fêmeas por classes de peso corporal em gramas (PC) e comprimento padrão em centímetros (CP) de P. maculatus em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
FIGURA 6 - Testículos de Pimelodus maculatus. A = localização dos testículos (setas). e = estômago, i = intestino, bg = bexiga gasosa. B = testículos mostrando franjas nas regiões cranial e caudal.
FIGURA 7 - Franja espermatogênica da região cranial dos testículos de Pimelodus
maculatus em estádio de maturação inicial. Setas = túnica albugínea,
asteriscos = tecido intersticial, Z = espermatozóides. HE - 50X
FIGURA 8 - Tecido intersticial em uma franja espermatogênica da região cranial de P.
maculatus. V = vaso sangüíneo, L = células de Leydig. AT - 1100X
FIGURA 9 - Organização testicular do mandi-amarelo em franja espermatogênica da região cranial em estádio de maturação inicial. Asteriscos = cistos de células da linhagem espermatogênica, Z = espermatozóides, S = célula de Sertoli. HE - 800X
FIGURA 10 - Secção de franja secretora da região caudal dos testículos de P. maculatus. Asteriscos = secreção globosa de aspecto coloidal, setas = epitélio. HE -750X
FIGURA 11 - Secção de franja espermatogênica da região cranial dos testículos de P.
maculatus em maturação inicial. G1 = espermatogônias primárias, G2 =
espermatogônias secundárias, C1 = espermatócitos primários, C2 = espermatócitos secundários, T = espermátides, Z = espermatozóides, S = célula de Sertoli. HE - 1200X
FIGURA 12 - Ultra-estrutura das células da linhagem espermatogênica de P. maculatus. A = espermatogônias secundárias (7000X), B = espermatócito primário (10000X), C = espermátides (8000X), D = espermatozóide (29000X), seta = complexo sinaptonêmico.
FIGURA 13 - Reações histoquímicas positivas na secreção presente nos túbulos da região caudal dos testículos de P. maculatus. A = PAS 300X, B = AB pH 2,5 -500X, C = ninhidrina-Schiff - 250X.
IV
FIGURA 14 - Estádios de maturação gonadal de machos de P. maculatus. A = repouso (AT - 300X); B = maturação inicial (HE - 350X); C = maturação avançada/maduro (HE - 150X); D = ducto espermático repleto de espermatozóides em testículo em maturação avançada/maduro (HE - 180X). FIGURA 15 - Distribuição bimestral de freqüência relativa (%) dos estádios do ciclo
reprodutivo de machos de P. maculatus coletados em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
FIGURA 16 - Ovários de Pimelodus maculatus com ovócitos visíveis a olho nu e conspícua vascularização.
FIGURA 17 - Secção do ovário de P. maculatus em repouso mostrando túnica albugínea (seta) e lamelas ovulígeras com ovócitos (asteriscos) (AT -100X).
FIGURA 18 - Secções transversais de ovários de P. maculatus corados por AT (A) e HE (B, C e D). O0 = ovogônias; O1 = ovócito jovem; O2 = ovócito pré-vitelogênico; O3 = ovócito com alvéolos corticais; O4 = ovócito vitelogênico; M = micrópila. A - 350X; B - 220X; C = 100X; D = 1100X.
FIGURA 19 - Ultra-estrutura dos envoltórios ovocitários de O2. CI = camada interna da zona pelúcida; CE = camada externa da zona pelúcida; CF = célula folicular; MIT = mitocôndrias; RER = retículo endoplasmático rugoso; seta = membrana basal; TC = célula tecal; asterisco = fibrilas colágenas. 15000X FIGURA 20 - Ultra-estrutura dos envoltórios ovocitários de O4. AC = alvéolo cortical; GV
= glóbulo de vitelo; MIT = mitocôndrias; CI = camada interna da zona pelúcida; CM = camada média da zona pelúcida; CE = camada externa da zona pelúcida; CF = célula folicular. 20000X
FIGURA 21 - A) Detalhe dos envoltórios ovocitários de O4. CI = camada interna da zona pelúcida; CM = camada média da zona pelúcida; CE = camada externa da zona pelúcida; seta = contato entre microvilosidades do ovócito e da célula folicular; asteriscos = material floculento. 32000X
B) Detalhe do citoplasma das células foliculares de O3. N = núcleo; CG = complexo de Golgi; RER = retículo endoplasmático rugoso; asteriscos = ribossomos. 48000X
FIGURA 22 - Detalhe de O4. CMV = corpo multivesicular; MIT = mitocôndrias; GV = glóbulo de vitelo; ZP = zona pelúcida; seta = microvilosidades do ovócito; CF = células foliculares com grânulos elétron-lúcidos (asteriscos). 26000X FIGURA 23 - Folículo pósovulatório de P. maculatus. CF = células foliculares (HE
-800X). Encarte = célula folicular (seta) com perda de integridade celular (HE - 1500X).
FIGURA 24 - Atresia em folículos pré-vitelogênicos. A = atresia inicial (HE – 500X); B = atresia avançada (HE – 560 X). Encarte = célula folicular (seta) com perda de integridade celular (Feulgen – 850X).
FIGURA 25 - Atresia em folículos vitelogênicos. A: a1 = atresia inicial, a2 = atresia intermediária, a3 = atresia avançada (HE – 250X). B: detalhe de células foliculares (setas) de ovócitos vitelogênicos atrésicos com perda de integridade celular (HE – 750X).
V
FIGURA 26 - Distribuição bimestral de freqüência relativa (%) dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P. maculatus coletadas em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
FIGURA 27 - Freqüência relativa (%) de atresia por estádio do ciclo reprodutivo (ECR) de fêmeas de P. maculatus coletadas em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
TABELA 1 - Freqüências bimestrais absoluta (Fa) e relativa (Fr) de machos e fêmeas de P.
maculatus capturados nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a
jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 2 - Freqüência absoluta do peso corporal (PC) de machos e fêmeas de P.
maculatus nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE
de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 3 - Freqüência absoluta do comprimento padrão (CP) de machos e fêmeas de P.
maculatus nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE
de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 4 - Média e amplitude do comprimento padrão (CP) e peso corporal (PC) para machos e fêmeas de P. maculatus em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
TABELA 5 - Características histológicas e ultra-estruturais das células da linhagem espermatogênica de P. maculatus.
TABELA 6 - Características histológicas dos estádios do ciclo reprodutivo de machos de P.
maculatus capturados no rio São Francisco no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 7 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de machos de P. maculatus coletados no rio São Francisco no trecho I (a jusante da barragem de Três Marias), no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 8 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de machos de P. maculatus coletadas no rio São Francisco no trecho II (a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 9 - Características histológicas das células da linhagem ovogênica de P.
maculatus.
TABELA 10 - Características histológicas dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P.
maculatus capturadas no rio São Francisco no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 11 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P.maculatus coletadas no rio São Francisco no trecho I (a jusante da barragem de Três Marias), no período de julho/95 a junho/96.
VI
TABELA 12 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P. maculatus coletadas no rio São Francisco no trecho II (a jusante do rio Abaeté), no período de julho/95 a junho/96.
TABELA 13 - Freqüências bimestrais absoluta (Fa) e relativa (Fr) de fêmeas de P.
maculatus com ovócitos atrésicos em dois trechos do rio São Francisco
(trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
TABELA 14 - Freqüências absoluta (Fa) e relativa (Fr) por estádio do ciclo reprodutivo de fêmeas de P. maculatus com ovócitos atrésicos em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
1 - I
NTRODUÇÃO1.1 Impacto dos reservatórios sobre a reprodução de peixes
Nos primeiros segmentos de um rio imediatamente abaixo das barragens, observam-se modificações térmicas e hidrodinâmicas que afetam o comportamento dos peixes (BAXTER, 1977). Estudos sobre o comportamento reprodutivo de peixes nos primeiros quilômetros do rio Paraná, a jusante do reservatório de Itaipu, indicaram que as espécies migradoras de grande porte não conseguiram desovar nestas áreas e apresentaram amplo processo de atresia ovariana (AGOSTINHO et al. 1993).
A adequada temperatura da água é um fator importante para maturação gonadal e desova de peixes (De VLAMMING, 1975; PARKINSON et al. 1999; TVEITEN et al., 2000). A liberação de água mais fria pelas barragens do rio Colorado (EUA) resultou em um declínio na abundância das espécies de peixes nativos (HOLDEN & STALNAKER, 1975). Além da temperatura, outros fatores atuam sobre a reprodução: idade, fotoperíodo, precipitação pluviométrica, turbidez, nível da água, alimentação, estresse ambiental, densidade populacional e poluentes (NAGAHAMA, 1983; SHIMIZU, 1999).
A baixa concentração de oxigênio dissolvido na água prejudica os peixes pela diminuição das taxas de alimentação e crescimento, inibição da reprodução e morte (RUANE
et al., 1986). O baixo teor de oxigênio dissolvido a jusante de algumas barragens deve-se à
origem hipolimnética da água liberada (BRADKA & REHACKOVA, 1964). Os reservatórios também ocasionam redução dos picos das vazões, prejudicando a entrada de água em lagoas marginais que são importantes à ecologia de muitas espécies de peixes que desovam ou desenvolvem-se dentro delas (LIGON et al., 1995).
1.2 Aspectos morfo-fisiológicos da reprodução dos teleósteos
O estabelecimento de parâmetros reprodutivos de uma espécie é importante para determinar a época de reprodução e o tipo de desova, bem como verificar as estratégias que a mesma pode utilizar no ambiente em que vive (VAZZOLER, 1996). O conhecimento da gametogênese de espécies nativas constitui etapa básica e primordial para compreender a reprodução natural de peixes brasileiros (BAZZOLI, 1992).
Os testículos dos Siluriformes apresentam ampla variabilidade e em algumas famílias mostram-se formados apenas por tecido espermatogênico, enquanto noutras a parte caudal torna-se secretora e organiza-se em vesículas seminais que não possuem células germinativas mas podem armazenar espermatozóides (LEGENDRE et al., 1996).
Em peixes, as células de Sertoli associam-se com uma espermatogônia primária e originam um cisto no interior do qual ocorre a gametogênese (PUDNEY, 1995). As células de Sertoli que delimitam o cisto unem-se através de desmosomas e junções do tipo tight formando barreira celular que impede a comunicação entre as células germinativas haplóides e o sistema vascular (LOIR et al. 1995). Além de sustentar o cisto, as células de Sertoli fagocitam espermatozóides residuais e restos citoplasmáticos decorrentes da espermiogênese (ANDRADE et al., 2001).
As células de Leydig, ou células intersticiais, produtoras de esteróides, são capazes de produzir, secretar ou acumular produtos de secreção necessários para a gametogênese e expressão de características sexuais secundárias (PAYNE et al., 1996). O número de células de Leydig, bem como o estádio em que se encontram pode variar durante o ciclo reprodutivo (ARBUZOVA, 1995; CAUTY & LOIR, 1995; ANDRADE et al., 2001).
A estrutura, organização celular e o tipo de fertilização determinam a classificação dos espermatozóides. Assim, espermatozóides de cabeça esférica sem acrosoma, peça intermediária contendo poucas mitocôndrias e cauda longa com flagelo de organização (9 + 2) são do tipo primitivo, característicos de peixes de fecundação externa (GRIER, 1981; BILLARD, 1983; MATTEI, 1988), enquanto espermatozóides com cabeça alongada são característicos de espécies de fecundação interna (JAMIESON, 1991).
Os ovários de Siluriformes são órgãos geralmente pares e alongados e, como é comum nos teleósteos, revestidos pela túnica albugínea que emite septos para o interior do órgão, formando lamelas ovulígeras onde alojam-se os ovócitos (LEGENDRE et al., 1996; GRIER, 2000). Em torno dos ovócitos observam-se zona pelúcida, células foliculares e teca; e em seu ooplasma, núcleo vitelínico, vesículas corticais e glóbulos de vitelo (GURAYA, 1986). A análise destas estruturas mostra diferenças entre as espécies, o que permite utilizá-las com propósitos sistemáticos (BAZZOLI, 1992).
O núcleo vitelínico é uma estrutura basófila encontrada no ovócito pré-vitelogênico constituída de ribonucleoproteínas associadas a organelas como mitocôndrias, corpos multivesiculares, retículo endoplasmático, complexo de Golgi e lamelas anulares (GURAYA, 1986; SELMAN & WALLACE, 1989) e que apresenta padrão de dispersão variável dependendo da espécie (BAZZOLI & GODINHO, 1995).
As vesículas corticais ou alvéolos corticais são estruturas citoplasmáticas que surgem no ooplasma periférico durante o desenvolvimento dos ovócitos e contêm glicoproteínas que são liberadas no espaço perivitelínico no momento da fertilização, constituindo bloqueio a polispermia (HART, 1990).
A vitelogenina, produzida no fígado em resposta a estrógenos ovarianos, é transportada por via sangüínea ao ovário onde é endocitada e fragmentada em duas proteínas vitelínicas: lipovitelina e fosvitina (WALLACE & SELMAN, 1981; MATSUBARA & SAWANO, 1995). A formação de vesículas recobertas (coated vesicles) durante a endocitose (SELMAN & WALLACE, 1989) e a incorporação seletiva da vitelogenina indicam a presença de receptores para essa fosfolipoglicoproteína na membrana do ovócito (CARNEVALI et al., 1999). Variações nas concentrações séricas de vitelogenina e outras substâncias como 17β-estradiol, testosterona e hormônios da tireóide foram correlacionadas com mudanças sazonais de temperatura e estádio da vitelogênese (PAVLIDIS et al., 2000).
A zona pelúcida de teleósteos, estrutura acidófila e acelular, é constituída por número variável de camadas de acordo com a espécie, podendo se originar da atividade do ovócito, das células foliculares ou de ambos (TYLER & SUMPTER, 1996). Estudos ultra-estruturais mostram poros-canais na zona pelúcida, os quais são preenchidos por microvilosidades do ovócito e prolongamentos das células foliculares (RIZZO & BAZZOLI, 1991). Utilizando métodos imunocitoquímicos HAMAZAKI et al. (1989) demonstraram que o principal componente glicoprotéico da camada interna da zona pelúcida em Oryzias latipes é produzido no fígado, sob influência de estrógenos. Teleósteos de fertilização externa apresentam zona pelúcida complexa e seus espermatozóides penetram no ovócito por uma abertura especializada, a micrópila (GURAYA, 1986; NAKASHIMA & IWAMATSU, 1994). A morfologia da micrópila e da célula micropilar varia em diferentes espécies de teleósteos de água doce, podendo apresentar morfologia similar em alguns grupos sistemáticos (RICARDO
et al., 1996; RIZZO, 2001).
Células foliculares envolvem os ovócitos, podendo participar dos processos de vitelogênese e desenvolvimento ovocitário (NAGAHAMA, 1983; GURAYA, 1986). Variações na natureza química das glicoproteínas produzidas pelas células foliculares podem estar relacionadas à adesividade dos ovos no substrato (BUSSON-MABILLOT, 1977). A camada folicular apóia-se na membrana basal.
A teca apresenta-se, na maioria dos teleósteos, como camada delgada de natureza conjuntivo-fibrosa, com células semelhantes a fibroblastos dispostas em camada única (LEHRI, 1968).
Após desova, estruturas remanescentes formam folículos pós-ovulatórios que não apresentam função endócrina e são rapidamente reabsorvidos, envolvendo morte celular programada ou apoptose das células foliculares (DRUMMOND et al., 2000).
Estudos recentes da atresia folicular mostraram os eventos degenerativos que ocorrem durante a reabsorção dos ovócitos, culminando com a participação de granulócitos nos estádios finais da reabsorção do folículo (MIRANDA et al, 1999).
1.3 Caracterização dos trechos de estudo
O rio São Francisco, descoberto em 4 de outubro de 1501 por Américo Vespúcio e Gaspar de Lemos, percorre 2.700 km em uma bacia que drena área de 631.133km² e que ocupa 7,4% do território nacional (PLANVASF, 1989). O regime do rio caracteriza-se por cheias no verão e suas águas são utilizadas principalmente para geração de energia, irrigação, navegação e abastecimento (CODEVASF, 1991).
Figura 1 - Trecho do rio São Francisco a jusante da UHE de Três Marias.
Entre Três Marias e Pirapora, a temperatura da água superficial do rio São Francisco varia de 18 a 29oC com médias de 23-25oC (CETEC, 1983). A represa de Três Marias apresenta tendência à estratificação térmica no período de novembro a fevereiro, atingindo, nesta época, diferença entre a superfície (hipolímnio) e o fundo (epilímnio) sempre superior a 3oC. Além disso, os teores de oxigênio aproximam-se da saturação na parte superior da coluna d’água, mas são bem baixos (30% da saturação) a 30 metros de profundidade (ESTEVES et
O rio São Francisco, nos primeiros 34 quilômetros a jusante da Usina Hidrelétrica de Três Marias (trecho I), possui água mais fria que se origina do hipolímnio da barragem e estudos recentes, associados a informações de pescadores, sugerem que os peixes, provavelmente, não reproduzem nesta área (SATO et al. 1995, SATO et al, 2002). A jusante do rio Abaeté (trecho II), numa extensão de 20 quilômetros até a barra do rio de Janeiro, a água do rio São Francisco é mais quente e mais favorável a reprodução de peixes (SATO et
al, 2002) (Fig. 2). TRÊS MARIAS BR 040 BR 040 MG 220 466 474 482 490 496 km 8.020 8.014 8.006 7.998 7.990
7.982 km p/ Belo Horizonte p/ Corinto
p/ Brasília
Represa de Três Marias
Rio São Francisco
Rio Abaeté
Rio de Janeiro
LT
Barra do Rio de Janeiro
Riacho do Sumidouro LEGENDA Trecho de estudo I Trecho de estudo II Cursos d'água Represa Estrada pavimentada Linha de transmissão de energia elétrica Área urbanizada Povoado ESCALA 0 2 4 6 km 2 km N BASE CARTOGRÁFICA
Serviço Geográfico do Exército Região Leste do Brasil - Escala 1:100.000 Folha Três Marias e Chapadão dos Gerais
Figura 2 - Mapa de localização dos trechos de estudo.
1.4 Caracterização da espécie Pimelodus maculatus Lacèpéde, 1803
Pimelodus maculatus, conhecido como mandi-amarelo, é um Siluriforme amplamente
distribuído nas bacias de rios sul-americanos (FOWLER, 1951). O mandi-amarelo, espécie de porte médio do rio São Francisco, é de interesse na pesca esportiva e profissional, sendo
também importante para alimentação da população ribeirinha (SATO, 1999). Ele vive e alimenta-se principalmente no fundo dos rios, possuindo dieta variada constituída de larvas de insetos, algas, moluscos, peixes e fragmentos de vegetais (BENNEMANN et al., 2000). O mandi-amarelo apresenta ferrões cobertos por muco tóxico nas nadadeiras peitorais e na nadadeira dorsal (CEMIG/CETEC, 2000). Ele pode alcançar de 40 a 50 cm de comprimento total e 1,5 a 2 kg de peso corporal (IHERING & WRIGHT, 1935). Trata-se de uma espécie migradora cujo tipo de desova é ponto de controvérsias na literatura, sendo admitida desova parcelada (BAKER et al., 1972; GODINHO et al, 1974; BAZZOLI et al., 1997) e desova total (SATO & GODINHO, 1988; CARVALHO et al., 1995).
Figura 3 - O mandi-amarelo: Pimelodus maculatus Lacèpéde, 1803.
2 - O
BJETIVOS• Analisar comparativamente, através de análise histológica e histométrica, a dinâmica da reprodução de P. maculatus em dois trechos do rio São Francisco, a jusante da barragem de Três Marias (trecho I) e a jusante do rio Abaeté (trecho II);
• Quantificar e comparar a ocorrência de folículos atrésicos através de microscopia de luz nos dois trechos de estudo.
Considerando-se a ocorrência de variações nos condicionantes ambientais das duas regiões de coleta do material, com especial atenção para a temperatura da água, trabalhamos com a seguinte hipótese:
•
Os peixes não estão se reproduzindo no trecho do rio São Francisco a jusante da barragem de Três Marias, em decorrência de condições ambientais desfavoráveis. Em contraposição, os peixes reproduzem-se no rio São Francisco a jusante do rio Abaeté.3 - M
ATERIAL E MÉTODOS3.1 Animais
Capturaram-se 346 exemplares de mandi-amarelo, P. maculatus, em dois trechos do rio São Francisco, sendo 66 machos e 88 fêmeas a jusante da UHE de Três Marias (45o15’W, 18o12’S) até a confluência com o rio Abaeté (45o12’W, 18o02’S) e 95 machos e 97 fêmeas a jusante do rio Abaeté até a barra do rio de Janeiro (45o07’W, 17o55’S). Os peixes foram coletados utilizando-se tarrafas e redes de emalhar, de diferentes tamanhos de malha, no período de julho/95 a junho/96.
3.2 Biometria
De cada exemplar capturado determinaram-se o comprimento total (CT), o comprimento padrão (CP), o peso corporal (PC) e o sexo.
3.3 Estrutura populacional e proporção sexual
O sexo e os dados biométricos obtidos foram tabulados e analisados para determinar as freqüências absolutas e relativas e a proporção sexual entre machos e fêmeas capturados nos dois trechos do rio São Francisco.
3.4 Histologia e histoquímica
Fragmentos de gônadas de todos exemplares capturados foram fixados em líquido de Bouin por 8-12 horas e submetidos às técnicas histológicas de rotina: inclusão em parafina e glicol-metacrilato, cortes de 3 a 5 µm de espessura, coloração com hematoxilina-eosina (HE), tricrômico de Gomori (TG) e azul de toluidina (AT). Para detecção de carboidratos e proteínas nos testículos utilizaram-se técnicas histoquímicas clássicas: periodic acid Schiff (PAS) para glicogênio, glicoproteínas neutras e sialomucinas, alcian blue (AB) para glicoconjugados ácidos e neutros, ninhidrina-Schiff para a identificação de radicais -NH2 de
proteínas e a técnica de Feulgen para a detecção de DNA no núcleo das células foliculares (PEARSE, 1985).
Os estádios de desenvolvimento ovocitário foram estabelecidos baseando-se nas modificações que ocorrem no núcleo, no ooplasma e nos envoltórios ovocitários BAZZOLI & RIZZO (1990) e RIZZO & BAZZOLI (1993). Os estádios da atresia folicular foram estabelecidos baseando-se em alterações que ocorrem no ooplasma e nos envoltórios ovocitários de acordo com critérios estabelecidos por RIZZO & BAZZOLI (1995) e MIRANDA et al. (1999).
3.5 Ultra-estrutura
Fragmentos de gônadas de 10 machos e 10 fêmeas em maturação foram fixados em glutaraldeído 2,5% em tampão fosfato 0,1M pH 7,4, pós-fixados em tetróxido de ósmio e incluídos em resina Epon. Os espécimes foram seccionados com navalha de diamante, contrastados com acetato de uranila e citrato de chumbo e examinados ao microscópio eletrônico de transmissão ZEISS, modelo EM-10.
3.6 Histometria
O diâmetro de ovócitos nas diferentes fases de desenvolvimento, o diâmetro nuclear das células da linhagem espermatogênica, assim como a espessura da zona pelúcida e a altura das células foliculares, foram obtidos utilizando-se o software de análise de imagens KS400-ZEISS.
3.7 Ovogênese e espermatogênese
A classificação e caracterização das fases de desenvolvimento das células da linhagem ovogênica foram feitas baseando-se no diâmetro e nas características histológicas e ultra-estruturais do núcleo, do ooplasma e da parede folicular (zona pelúcida, células foliculares e teca).
As células da linhagem espermatogênica foram classificadas de acordo com as características histológicas e ultra-estruturais do núcleo e do citoplasma, além do diâmetro nuclear.
3.8 Ciclo reprodutivo
A determinação microscópica dos estádios do ciclo reprodutivo de P. maculatus baseou-se na distribuição de ovócitos e células da linhagem espermatogênica de acordo com BAZZOLI et al (1997) e BAZZOLI (2002). Após a determinação dos estádios do ciclo reprodutivo, foram calculadas suas freqüências absoluta e relativa por sexo e por bimestre.
3.9 Análise estatística
Os dados obtidos foram comparados utilizando-se o Teste t de Student e Análise de Variância (ANOVA). Posteriormente um teste de Duncan foi realizado para comparar os dados obtidos, quando registraram-se diferenças estatisticamente significativas (p<0,05).
4 - R
ESULTADOS4.1 Estrutura populacional e proporção sexual
Machos e fêmeas de P. maculatus foram coletados praticamente em todos os bimestres nos dois pontos de amostragem, exceto em maio-junho/96 a jusante da barragem (trecho I) e março-abril/96 a jusante do rio Abaeté (trecho II). A proporção sexual nos dois trechos de estudo foi de aproximadamente 1:1, com pequeno predomínio de fêmeas, 54,2% no trecho I e 50,5% no trecho II. O total de exemplares capturados foi maior no trecho II (Tabela 1 e Fig. 4).
Tabela 1 - Freqüências bimestrais absoluta (Fa) e relativa (Fr) de machos e fêmeas de P.
maculatus capturados nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da
UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
trecho I trecho II
BIMESTRES machos fêmeas total machos fêmeas total
Fa Fr Fa Fr Fa Fr Fa Fr jul/ago 1995 3 33,3% 6 66,7% 9 21 40,4% 31 59,6% 52 set/out 1995 16 40,0% 24 60,0% 40 42 58,3% 30 41,7% 72 nov/dez 1995 24 43,6% 31 56,4% 55 14 50,0% 14 50,0% 28 jan/fev 1996 19 45,2% 23 54,8% 42 8 40,0% 12 60,0% 20 mar/abr 1996 4 50,0% 4 50,0% 8 0 0 0 0 0 mai/jun 1996 0 0 0 0 0 10 50,0% 10 50,0% 20 Totais 66 45,8% 88 54,2% 154 95 49,5% 97 50,5% 192 Fa trecho I 0 5 10 15 20 25 30 35 40
J/A 95 S/O 95 N/D 95 J/F 96 M/A 96 M/J 96
MACHOS FÊMEAS Fa trecho II 0 5 10 15 20 25 30 35 40
J/A 95 S/O 95 N/D 95 J/F 96 M/A 96 M/J 96
MACHOS FÊMEAS
Figura 4 - Freqüência bimestral absoluta (Fa) de machos e fêmeas de P. maculatus capturados nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
As curvas de distribuição das freqüências de peso corporal (PC) e comprimento padrão (CP) por ponto de amostragem mostraram-se com simetria aproximadamente normal apenas no trecho II (Tabelas 2 e 3, Fig. 5).
Tabela 2 - Freqüência absoluta do peso corporal (PC) de machos e fêmeas de P. maculatus nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
Classes de Peso Corporal trecho I trecho II
(PC) em gramas MACHOS FÊMEAS MACHOS FÊMEAS
10,0 – 51,5 26 19 3 2 51,6 – 93,1 15 18 41 11 93,2 – 134,7 13 11 30 30 134,8 – 176,3 9 18 11 30 176,4 – 217,9 2 10 2 12 218,0 – 259,5 1 10 1 1 259,6 – 301,1 0 2 2 1
Tabela 3 - Freqüência absoluta do comprimento padrão (CP) de machos e fêmeas de P. maculatus nos dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
Classes de Comprimento trecho I trecho II
Padrão (CP) em cm MACHOS FÊMEAS MACHOS FÊMEAS
9,5 – 12,1 8 2 0 0 12,2 – 14,8 15 14 2 2 14,9 – 17,5 11 12 9 6 17,6 – 20,2 18 20 39 17 20,3 – 22,9 10 15 34 48 23,0 – 25,6 4 22 5 13 25,7 – 27,9 0 3 1 1
trecho I trecho II Fa de m achos 0 5 10 15 20 25 30 35 40 10,5 -51,5 51,6 -93,1 93,2 -134,7 134,8 -176,3 176,4 -217,9 218 -259,5 259,6 -301,1 Fa de m achos 0 5 10 15 20 25 30 35 40 10,5 -51,5 51,6 -93,1 93,2 -134,7 134,8 -176,3 176,4 -217,9 218 -259,5 259,6 -301,1 Classes de PC Classes de PC Fa de m achos 0 5 10 15 20 25 30 35 40 9,5 - 12,1 12,2- 14,8 14,9 -17,5 17,6 -20,2 20,3 -22,9 23 - 25,6 25,7- 27,9 Fa de m achos 0 5 10 15 20 25 30 35 40 9,5 - 12,1 12,2- 14,8 14,9 -17,5 17,6 -20,2 20,3 -22,9 23 - 25,6 25,7 -27,9 Classes de CP Classes de CP Fa de fêm eas 0 5 10 15 20 25 30 35 40 10,5 -51,5 51,6 -93,1 93,2 -134,7 134,8 -176,3 176,4 -217,9 218 -259,5 259,6 -301,1 Fa de fêm eas 0 5 10 15 20 25 30 35 40 10,5 -51,5 51,6 -93,1 93,2 -134,7 134,8 -176,3 176,4 -217,9 218 -259,5 259,6 -301,1 Classes de PC Classes de PC Fa de fêm eas 0 5 10 15 20 25 30 35 40 9,5 - 12,1 12,2- 14,8 14,9 -17,5 17,6 -20,2 20,3 -22,9 23 - 25,6 25,7 -27,9 Fa de fêm eas 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 9,5 - 12,1 12,2- 14,8 14,9 -17,5 17,6 -20,2 20,3 -22,9 23 - 25,6 25,7 -27,9 Classes de CP Classes de CP
Figura 5 - Freqüência absoluta (Fa) de machos e fêmeas por classes de peso corporal em gramas (PC) e comprimento padrão em centímetros (CP) de P. maculatus em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
O CP de machos e fêmeas e o PC de machos mostraram-se significativamente maiores no trecho II (a jusante do rio Abaeté). O PC de fêmeas não apresentou diferença significativa entre os dois trechos estudados (Tab. 4).
Tabela 4 - Média e amplitude do comprimento padrão (CP) e peso corporal (PC) para machos e fêmeas de P. maculatus em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
trecho I trecho II
Média ± DP Amplitude Média ± DP Amplitude Teste t Machos CP (cm) 16,90 ± 3,83 9,5 – 24,6 19,98 ± 2,12 14,0 – 27,0 *
PC (g) 79,73 ± 50,91 10,0 – 226,0 106,21 ± 44,21 40,0 – 330,0 * Fêmeas CP (cm) 19,51 ± 4,05 10,2 – 27,0 20,9 ± 2,26 14,0 – 26,5 * PC (g) 123,8 ± 71,3 35,0 – 300,0 138,5 ± 45,61 18,0 – 325,0 ns * = diferenças significativas com p < 0,01; ns = diferenças não-significativas com p > 0,05
4.2 Estrutura gonadal e ciclo reprodutivo dos machos
4.2.1 Morfologia dos testículos
Macroscopicamente, os testículos do mandi-amarelo são órgãos pares que se unem na extremidade caudal para formar o ducto espermático comum que se comunica com a papila urogenital. Eles têm volume e coloração variados conforme a fase do ciclo reprodutivo em que se encontram. Apresentam projeções digitiformes ou franjas em toda extensão (Fig. 6).
A
B
e bg i REGIÃO CRANIAL REGIÃO CAUDAL iFigura 6 - Testículos de Pimelodus maculatus. A = localização dos testículos (setas). e = estômago, i = intestino, bg = bexiga gasosa. B = testículos mostrando franjas nas regiões cranial e caudal.
Os testículos são envoltos por túnica albugínea de natureza conjuntiva, que emite septos para o interior das franjas formando tecido intersticial (Fig. 7) constituído de fibras co-lágenas, vasos sangüíneos e células de Leydig (Figs. 7 e 8), além de células mióides e fibras nervosas. O tecido intersticial envolve os túbulos seminíferos. A parede dos túbulos seminífe-ros das franjas da região cranial dos testículos possui células de Sertoli e cistos de células da linhagem espermatogênica (Figs. 9 e 11). Nas franjas da região caudal não se observam células de Sertoli nem cistos de células espermatogênicas, sendo os túbulos revestidos por células cúbicas de núcleos claros e ovais. Estes túbulos, nos peixes em atividade reprodutiva, apresentam secreção acidófila de aspecto globoso e coloidal no lume (Fig. 10).
Z
Z
*
*
*
*
Z
Z
*
*
Figura 7 - Franja espermatogênica da região cranial dos testículos de Pimelodus maculatus em estádio de maturação inicial. Setas = túnica albugínea, asteriscos = tecido intersticial, Z = espermatozóides. HE - 50X
L
L
V
V
L
L
Figura 8 - Tecido intersticial em uma franja espermatogênica da região cranial de P. maculatus. V = vaso sangüíneo, L = células de Leydig. AT - 1100X
Z
Z
Z
S
S
*
*
*
*
*
*
*
*
Figura 9 - Organização testicular do mandi-amarelo em franja espermatogênica da região cranial em estádio de maturação inicial. Asteriscos = cistos de células da linhagem espermatogênica, Z = espermatozóides, S = célula de Sertoli. HE - 800X
*
*
*
*
*
*
Figura 10 - Secção de franja secretora da região caudal dos testículos de P. maculatus. Asteriscos = secreção globosa de aspecto coloidal, setas = epitélio. HE - 750X
4.2.2 Células da linhagem espermatogênica
Com base em características histológicas e ultra-estruturais, identificaram-se as seguintes células da linhagem espermatogênica: espermatogônias, espermatócitos, espermátides e espermatozóides (Tabela 5 e Figs. 11 e 12).
Tabela 5 - Características histológicas e ultra-estruturais das células da linhagem espermatogênica de P. maculatus.
Célula Características morfológicas
Espermatogônias (Figs. 11 e 12A)
Primárias (G1): diâmetro nuclear = 5,78 ± 0,58 µm; maiores células da linhagem espermatogênica; citoplasma claro e abundante;
núcleo grande, vesiculoso, esférico e central; nucléolo evidente; Secundárias (G2): diâmetro nuclear = 4,08 ± 0,60 µm;
em cistos de duas ou mais células; citoplasma claro e reduzido;
núcleo central e esferoidal com cromatina condensada em algumas regiões; nucléolo evidente.
Espermatócitos (Figs. 11 e 12B)
Primários (C1): diâmetro nuclear = 3,20 ± 0,42 µm; citoplasma claro e escasso;
núcleo volumoso em relação ao citoplasma; ocorrência de complexos sinaptonêmicos.
Secundários (C2): diâmetro nuclear = 2,98 ± 0,21 µm; citoplasma claro e escasso;
núcleo grande com cromatina condensada num dos pólos; Espermátides (T)
(Figs. 11 e 12C)
diâmetro nuclear = 1,83 ± 0,23 µm; núcleo com cromatina condensada. Espermatozóides (Z)
(Figs. 11 e 12D)
diâmetro nuclear = 1,30 ± 0,13 µm;
menores células da linhagem espermatogênica;
cabeça esférica, peça intermediária curta com poucas mitocôndrias, ausência de acrosoma;
C1
C1
C2
C2
G2
G2
T
T
S
S
G1
G1
G1
G1
Z
Z
Figura 11 - Secção de franja espermatogênica da região cranial dos testículos de P. maculatus em maturação inicial. G1 = espermatogônias primárias, G2 = espermatogônias secundárias, C1 = espermatócitos primários, C2 = espermatócitos secundários, T = espermátides, Z = espermatozóides, S = célula de Sertoli. HE - 1200X
A
A
C
C
B
B
D
D
Figura 12 - Ultra-estrutura das células da linhagem espermatogênica de P. maculatus. A = espermatogônias secundárias (7000X), B = espermatócito primário (10000X), C = espermátides (8000X), D = espermatozóide (29000X), seta = complexo sinaptonêmico.
4.2.3 Histoquímica da secreção intratubular dos testículos
A análise histoquímica da secreção presente nos túbulos da região caudal dos testículos do mandi-amarelo mostrou reação positiva às técnicas de PAS, alcian blue (pH 0,5 e 2,5) e ninhidrina-Schiff. Estes resultados não se alteraram após hidrólise ácida e tratamento com amilase salivar indicando, deste modo, presença de glicoproteínas neutras, glicoconjugados ácidos carboxilados (incluindo sialomucinas) e glicoconjugados ácidos sulfatados (Fig. 13). Nos peixes em repouso reprodutivo não se observou secreção no lume dos túbulos da região caudal dos testículos.
Figura 13 - Reações histoquímicas positivas na secreção presente nos túbulos da região caudal dos testículos de P. maculatus. A = PAS - 300X, B = AB pH 2,5 - 500X, C = ninhidrina-Schiff - 250X.
4.2.4 Estádios do ciclo reprodutivo de machos
Observações ao microscópio de luz de secções dos testículos do mandi-amarelo permitiram estabelecer escala de maturação gonadal constituída de quatro estádios do ciclo reprodutivo (Tabela 6 e Fig. 14).
Tabela 6 - Características histológicas dos estádios do ciclo reprodutivo de machos de P. maculatus capturados no rio São Francisco no período de julho/95 a junho/96.
Estádio Características histológicas
1 (repouso) (Fig. 14A)
túbulos seminíferos com lume fechado; ausência de secreção na região caudal. 2 (maturação inicial)
(Fig. 14B)
lume dos túbulos seminíferos com pequena quantidade de espermatozóides;
franjas da região caudal com lume aberto e secreção escassa. 3 (maturação avançada / maduro)
(Figs. 14C e 14D)
grande quantidade de espermatozóides no lume dos túbulos seminíferos ou no ducto espermático;
franjas da região caudal com secreção abundante de aspecto globoso e coloidal.
4 (esgotado ou espermiado) não observado no presente estudo
A
B
C
D
A
B
C
D
Figura 14 - Estádios de maturação gonadal de machos de P. maculatus. A = repouso (AT - 300X); B = maturação inicial (HE - 350X); C = maturação avançada/maduro (HE - 150X); D = ducto espermático repleto de espermatozóides em testículo em maturação avançada/maduro (HE - 180X).
4.2.5 Ciclo reprodutivo nos machos
A distribuição bimestral das freqüências absoluta e relativa dos estádios do ciclo reprodutivo de machos capturados nos dois trechos encontra-se nas tabelas 7 e 8 e na figura 15. No trecho I observou-se durante o período de coleta 30,30% dos machos em maturação avançada/maduro enquanto no trecho II registraram-se 47,37% de machos neste estádio.
Observou-se maior freqüência de machos em maturação avançada/maduro no trecho II no bimestre nov-dez/95 (57,14%) em relação ao mesmo bimestre no trecho I (8,33%). No bimestre jan-fev/96, em ambos os trechos estudados, os percentuais de machos em maturação avançada/maduro foram altos: 89,47% no trecho I e 100% no trecho II.
O menor macho capturado em maturação avançada/maduro apresentou, no trecho I, CT de 21,5 cm e CP de 17,5 cm e no trecho II CT de 17,3 cm e CP de 14,0 cm.
Tabela 7 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de machos de P. maculatus coletados no rio São Francisco no trecho I (a jusante da barragem de Três Marias), no período de julho/95 a junho/96.
ESTÁDIOS DO CICLO REPRODUTIVO
Bimestre/Ano 1 2 3 4 TOTAL Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) jul-ago / 95 3 100 0 0 0 0 0 0 3 set-out / 95 10 62,50 5 31,25 1 6,25 0 0 16 nov-dez / 95 13 54,17 9 37,50 2 8,33 0 0 24 jan-fev / 96 0 0 2 10,53 17 89,47 0 0 19 mar-abr / 96 4 100 0 0 0 0 0 0 4 mai-jun / 96 0 0 0 0 0 0 0 0 0 TOTAL 30 45,46 16 24,24 20 30,30 0 0 66
1 = Repouso; 2 = Maturação Inicial; 3 = Maturação Avançada/Maduro; 4 = Totalmente Espermiado
Tabela 8 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de machos de P. maculatus coletados no rio São Francisco no trecho II (a jusante do rio Abaeté) no período de julho/95 a junho/96.
ESTÁDIOS DO CICLO REPRODUTIVO
Bimestre/Ano 1 2 3 4 TOTAL Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) jul-ago / 95 3 14,28 8 38,10 10 47,62 0 0 21 set-out / 95 6 14,28 18 42,86 18 42,86 0 0 42 nov-dez / 95 0 0 6 42,86 8 57,14 0 0 14 jan-fev / 96 0 0 0 0 8 100 0 0 8 mar-abr / 96 0 0 0 0 0 0 0 0 0 mai-jun / 96 8 80,00 1 10,00 1 10,00 0 0 10 TOTAL 17 17,89 33 34,74 45 47,37 0 0 95
trecho I trecho II % ESTÁDIO 3 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 3 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 2 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 2 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 1 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 1 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
Figura 15 - Distribuição bimestral de freqüência relativa (%) dos estádios do ciclo reprodutivo de machos de P. maculatus coletados em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
4.3 Estrutura gonadal e ciclo reprodutivo das fêmeas
4.3.1 Morfologia dos ovários
Os ovários de P. maculatus são órgãos pares, alongados e fusiformes (Fig. 16). As extremidades caudais afilam-se gradativamente para constituir os ductos ovarianos que se unem para formar o ducto ovariano comum que se abre no exterior através da papila urogenital.
Figura 16 - Ovários de Pimelodus maculatus com ovócitos visíveis a olho nu e conspícua vascularização.
Microscopicamente, os ovários são revestidos pela túnica albugínea, constituída de tecido conjuntivo denso contendo fibras musculares lisas e vasos sangüíneos. A túnica albugínea emite septos para o interior do órgão formando lamelas ovulígeras, nas quais encontram-se as células da linhagem ovogênica (Fig. 17).
*
*
*
*
*
*
Figura 17 - Secção do ovário de P. maculatus em repouso mostrando túnica albugínea (seta) e lamelas ovulígeras com ovócitos (asteriscos) (AT -100X).
4.3.2 Células da linhagem ovogênica
Baseando-se em características histológicas, identificaram-se as seguintes fases de desenvolvimento das células da linhagem ovogênica: ovogônias (O0), ovócitos jovens (O1), ovócitos pré-vitelogênicos (O2), ovócitos com alvéolos corticais (O3) e ovócitos vitelogênicos (O4) (Tabela 9).
Tabela 9 - Características histológicas das células da linhagem ovogênica de P. maculatus.
Célula Características
Ovogônias (O0) (Fig. 18A)
diâmetro celular = 12,7 ± 2,1 µm; formam ninhos nas lamelas ovulígeras; núcleo esférico e vesiculoso;
citoplasma ligeiramente acidófilo. Ovócitos jovens
(O1) (Fig. 18A)
diâmetro celular = 37,8 ± 5,0 µm;
citoplasma basófilo, homogêneo e de aspecto vítreo; núcleo vesiculoso com nucléolos periféricos; zona pelúcida não visualizada;
células foliculares pavimentosas. Ovócitos pré-vitelogênicos
(O2) (Fig. 18A)
diâmetro celular = 93,1 ± 7,7 µm;
citoplasma basófilo e finamente granular com núcleo vitelínico; núcleo vesiculoso;
zona pelúcida delgada (1,3 ± 0,2 µm);
células foliculares pavimentosas (1,8 ± 0,2 µm). Ovócitos com alvéolos corticais
(O3) (Fig. 18B)
diâmetro celular = 286,3 ± 30,9 µm; citoplasma com alvéolos corticais; núcleo vesiculoso de contorno irregular;
zona pelúcida evidente (1,7 ± 0,2 µm), apresentando estriações transversais;
células foliculares cúbicas ( 5,9 ± 0,8 µm). Ovócitos vitelogênicos
(O4)
(Figs. 18C e 18D)
diâmetro celular = 450,3 ± 29,6 µm;
citoplasma com glóbulos de vitelo acidófilos; núcleo vesiculoso às vezes excêntrico;
zona pelúcida espessa (2,2 ± 0,2 µm) com aparelho micropilar evidente;
A
B
D
C
O0 O1 O2 O3 O4 O4 MFigura 18 - Secções transversais de ovários de P. maculatus corados por AT (A) e HE (B, C e D). O0 = ovogônias; O1 = ovócito jovem; O2 = ovócito pré-vitelogênico; O3 = ovócito com alvéolos corticais; O4 = ovócito vitelogênico; M = micrópila. A - 350X; B - 220X; C = 100X; D = 1100X.
4.3.3 Envoltórios ovocitários
Os ovócitos do mandi-amarelo são envolvidos por zona pelúcida, células foliculares e teca. Ao microscópio eletrônico de transmissão a zona pelúcida é visualizada a partir dos O2, sendo constituída de duas camadas (Fig. 19). Gradativamente, ela aumenta de espessura apresentando 3 camadas nos O4 (Fig. 20). Microvilosidades dos ovócitos atravessam poros-canais da zona pelúcida e estabelecem contato com prolongamentos das células foliculares (Fig. 21A). Nos O4 observa-se camada de material floculento sobre a zona pelúcida (Fig. 21A).
As células foliculares apoiam-se sobre membrana basal acelular e aumentam de altura à medida que os ovócitos se desenvolvem. Organelas envolvidas com síntese protéica (ribossomos, retículo endoplasmático rugoso, complexo de Golgi e mitocôndrias) são abundantes nas células foliculares de O2 e O3 (Figs. 19 e 21B), enquanto o citoplasma das células foliculares dos O4 apresenta-se repleto de grânulos elétron-lúcidos (Fig. 22).
A teca é constituída de células semelhantes a fibroblastos, capilares sangüíneos e fibrilas colágenas (Fig. 19).
O2
CI
CE
TC
*
CF
MIT
RER
Figura 19 - Ultra-estrutura dos envoltórios ovocitários de O2. CI = camada interna da zona pelúcida; CE = camada externa da zona pelúcida; CF = célula folicular; MIT = mitocôndrias; RER = retículo endoplasmático rugoso; seta = membrana basal; TC = célula tecal; asterisco = fibrilas colágenas. 15000X GV CI CE MIT CM AC CF
Figura 20 - Ultra-estrutura dos envoltórios ovocitários de O4. AC = alvéolo cortical; GV = glóbulo de vitelo; MIT = mitocôndrias; CI = camada interna da zona pelúcida; CM = camada média da zona pelúcida; CE = camada externa da zona pelúcida; CF = célula folicular. 20000X
CI CE
*
CM*
A
RER
CG
*
*
*
B
N
Figura 21 - A) Detalhe dos envoltórios ovocitários de O4. CI = camada interna da zona pelúcida; CM = camada média da zona pelúcida; CE = camada externa da zona pelúcida; seta = contato entre microvilosidades do ovócito e da célula folicular; asteriscos = material floculento. 32000X
B) Detalhe do citoplasma das células foliculares de O3. N = núcleo; CG = complexo de Golgi; RER = retículo endoplasmático rugoso; asteriscos = ribossomos. 48000X
GV CF MIT
*
CMV*
*
ZPFigura 22 - Detalhe de O4. CMV = corpo multivesicular; MIT = mitocôndrias; GV = glóbulo de vitelo; ZP = zona pelúcida; seta = microvilosidades do ovócito; CF = células foliculares com grânulos elétron-lúcidos (asteriscos). 26000X
4.3.4 Folículos pós-ovulatórios e folículos atrésicos
Folículos pós-ovulatórios apresentam lume irregular e parede constituída de células foliculares hipertrofiadas e teca conjuntiva. Nas fases mais avançadas observam-se algumas células foliculares com perda da integridade celular caracterizada por condensação nuclear e segregação da cromatina (Fig. 23).
CF
CF
Figura 23 - Folículo pós-ovulatório de P. maculatus. CF = células foliculares (HE - 800X). Encarte = célula folicular (seta) com perda de integridade celular (HE - 1500X).
No presente estudo observaram-se ovócitos pré-vitelogênicos em processo de atresia, especialmente nos peixes em repouso capturados no trecho I. Nesses ovócitos observaram-se perda da basofilia citoplasmática e desaparecimento do núcleo (atresia inicial – Fig. 24A) e células foliculares com núcleo oval ou esférico, às vezes com as características de perda da integridade celular observadas nos folículos pós-ovulatórios (atresia avançada - Fig. 24B).
A
B
Figura 24 - Atresia em folículos pré-vitelogênicos. A = atresia inicial (HE – 500X); B = atresia avançada (HE – 560 X). Encarte = célula folicular (seta) com perda de integridade celular (Feulgen – 850X).
Em ovócitos vitelogênicos atrésicos observou-se fragmentação e desaparecimento da zona pelúcida, bem como redução gradual do conteúdo do ovócito. Células foliculares com características de perda de integridade celular também foram observadas, as quais tornaram-se gradativamente mais freqüentes (Fig. 25).
A
a1
a2
a3
A
B
B
Figura 25 - Atresia em folículos vitelogênicos. A: a1 = atresia inicial, a2 = atresia intermediária, a3 = atresia avançada (HE – 250X). B: detalhe de células foliculares (setas) de ovócitos vitelogênicos atrésicos com perda de integridade celular (HE – 750X).
4.3.5 Estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas
Observações ao microscópio de luz de secções dos ovários de P. maculatus permitiram estabelecer escala de maturação gonadal constituída de quatro estádios (Tabela 10).
Tabela 10 - Características histológicas dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P. maculatus capturadas no rio São Francisco no período de julho/95 a junho/96.
Estádio Características histológicas
1 (repouso) ovários contendo apenas ninhos de ovogônias, O1 e O2. 2 (maturação inicial) presença de O1, O2 e O3.
3 (maturação avançada / maduro) presença de O1, O2, O3 e O4.
4 (desovado) presença de folículos pós-ovulatórios, O1 e O2; atresia de O3 e O4.
4.3.6 Ciclo reprodutivo nas fêmeas
A distribuição bimestral das freqüências dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas capturadas nos dois trechos encontra-se nas tabelas 11 e 12 e na figura 26. No trecho I observou-se durante o período de coleta apenas 3,41% das fêmeas em maturação avançada/maduro e no trecho II registraram-se 24,14% de fêmeas neste estádio.
Observaram-se maiores freqüências de fêmeas em maturação avançada/maduro no trecho II nos bimestres nov-dez/95 (92,86%) e jan-fev/96 (100%). No trecho I estes valores foram menores: nov-dez/95 (3,23%) e jan-fev/96 (4,36%).
A menor fêmea capturada em maturação avançada/maduro apresentou, no trecho I, CT de 26,1 cm e CP de 21,6 cm e no trecho II, CT de 20,7 cm e CP de 17,0 cm.
Tabela 11 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P.maculatus coletadas no rio São Francisco no trecho I (a jusante da barragem de Três Marias), no período de julho/95 a junho/96.
ESTÁDIOS DO CICLO REPRODUTIVO
Bimestre/Ano 1 2 3 4 TOTAL Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) jul-ago / 95 6 100 0 0 0 0 0 0 6 set-out / 95 23 95,83 0 0 1 4,17 0 0 24 nov-dez / 95 29 93,54 0 0 1 3,23 1 3,23 31 jan-fev / 96 18 78,26 0 0 1 4,36 4 17,39 23 mar-abr / 96 4 100 0 0 0 0 0 0 4 mai-jun / 96 0 0 0 0 0 0 0 0 0 TOTAL 80 90,91 0 0 3 3,41 5 5,68 88
1 = repouso; 2 = maturação inicial; 3 = maturação avançada/maduro; 4 = desovado
Tabela 12 - Distribuição bimestral de freqüência absoluta (Fa) e relativa (Fr) dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P. maculatus coletadas no rio São Francisco no trecho II (a jusante do rio Abaeté), no período de julho/95 a junho/96.
ESTÁDIOS DO CICLO REPRODUTIVO
Bimestre/Ano 1 2 3 4 TOTAL Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) Fa Fr(%) jul-ago / 95 31 100 0 0 0 0 0 0 31 set-out / 95 23 76,67 1 3,33 6 20,00 0 0 30 nov-dez / 95 1 7,14 0 0 13 92,86 0 0 14 jan-fev / 96 0 0 0 0 2 100 0 0 2 mar-abr / 96 0 0 0 0 0 0 0 0 0 mai-jun / 96 9 90,00 0 0 0 0 1 10,00 10 TOTAL 64 73,56 1 1,15 21 24,14 1 1,15 87
trecho I trecho II % ESTÁDIO 4 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 4 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 3 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 3 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 2 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 2 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 1 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
% ESTÁDIO 1 0 20 40 60 80 100
J/A S/O N/D J/F M/A M/J
Figura 26 - Distribuição bimestral de freqüência relativa (%) dos estádios do ciclo reprodutivo de fêmeas de P. maculatus coletadas em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
4.3.7 Freqüência de atresia
No trecho I verificou-se ocorrência de atresia em ovócitos pré-vitelogênicos e vitelogênicos em 44,32% das fêmeas enquanto no trecho II a atresia ocorreu em apenas 5,74% das fêmeas (Tabela 13). No trecho I também registrou-se maior freqüência de atresia nos ovários em repouso reprodutivo (38,75%) quando comparado com o trecho II (6,35%) (Tabela 14 e Fig. 27).
Tabela 13 - Freqüências bimestrais absoluta (Fa) e relativa (Fr) de fêmeas de P. maculatus com ovócitos atrésicos em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
Bimestre/Ano trecho I trecho II
n Fa Fr(%) n Fa Fr(%) jul/ago 1995 6 5 83,33 31 0 0 set/out 1995 24 11 45,83 30 3 10,00 nov/dez 1995 31 8 25,81 14 0 0 jan/fev 1996 23 15 65,22 2 0 0 mar/abr 1996 4 0 0 0 0 0 mai/jun 1996 0 0 0 10 2 20,00 TOTAL 88 39 44,32 87 5 5,74
Tabela 14 - Freqüências absoluta (Fa) e relativa (Fr) por estádio do ciclo reprodutivo de fêmeas de P. maculatus com ovócitos atrésicos em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de Três Marias; trecho II: a jusante do rio Abaeté) de julho/95 a junho/96.
Estádios trecho I trecho II
n Fa Fr(%) n Fa Fr(%) 1 80 31 38,75 64 4 6,25 2 0 0 0 1 0 0 3 3 3 100 21 0 0 4 5 5 100 1 1 100 TOTAL 88 39 44,32 87 5 5,74 % trecho I 0 20 40 60 80 100 1 2 3 4 sem atresia com atresia ECR % trecho II 0 20 40 60 80 100 1 2 3 4 sem atresia com atresia ECR
1 = repouso; 2 = maturação inicial; 3 = maturação avançada/maduro; 4 = desovado
Figura 27 - Freqüência relativa (%) de atresia por estádio do ciclo reprodutivo (ECR) de fêmeas de P.
maculatus coletadas em dois trechos do rio São Francisco (trecho I: a jusante da UHE de
5 - D
ISCUSSÃO5.1 Estrutura populacional e proporção sexual
O número de machos e fêmeas pode variar entre as espécies, mas na maioria das vezes ele é próximo da proporção de 1:1 (NIKOLSKI, 1963), conforme também observado no presente estudo. As variações nas proporções sexuais podem estar relacionadas com diferentes taxas de crescimento entre os sexos, seletividade dos petrechos de pesca e estratificação da população (BARBIERI, 1992).
Devido à existência de legislação de pesca, no presente estudo não foram capturados exemplares imaturos, impossibilitando a determinação do tamanho de primeira maturação sexual pelo método do L50, tamanho no qual 50% da população é imatura e 50% da população é adulta (VAZZOLER, 1996). Por isso, determinaram-se os tamanhos mínimos de machos e fêmeas em maturação avançada/maduro como indicativo do provável tamanho de primeira maturação sexual de P. maculatus, conforme procedimentos utilizados por BAZZOLI (2002).
5.2 Organização morfo-funcional dos testículos
Testículos com projeções digitiformes ou franjas, observados em P. maculatus do presente estudo, são relatados em outros pimelodídeos (LOIR et al, 1989), como também em outros Siluriformes das famílias Auchenipteridae (MEISNER et al., 2000), Clariidae (SIRCAR, 1970), Doradidae (GIESE et al., 1999) e Ictaluridae (SNEED & CLEMENS, 1963). Apesar do aspecto franjado, os testículos do mandi-amarelo contêm túbulos seminíferos com células espermatogênicas organizadas em cistos, similar ao observado na maioria dos teleósteos (GRIER, 1981). No presente estudo observou-se que células espermatogênicas têm desenvolvimento sincrônico, de modo que em cada cisto todas as células encontravam-se na mesma fase. Entretanto, a composição de células espermatogênicas é variável entre as franjas, como também observado em P. maculatus e Iheringichthys
labrosus por BAZZOLI et al. (1997).
A distribuição e organização das células da linhagem espermatogênica, das células de Sertoli e das células de Leydig do mandi-amarelo são semelhantes aos relatos para a maioria dos teleósteos (PUDNEY, 1995). As características histológicas e ultra-estruturais das células espermatogênicas do mandi-amarelo são similares às do pimelodídeo I.labrosus (SANTOS, 2001).
No presente estudo observaram-se condensação nuclear, redução citoplasmática e formação de flagelo durante a espermiogênese, semelhante aos relatos de NAGAHAMA