UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL BARRIGA VERDE - FEBAVE
MESTRADO
EM EDUCAÇÃO E CULTURA
OS DEVERES PARA CASA
NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
ANGELA APARECIDA RICARDO SOUZA
ANGELA APARECIDA RICARDO SOUZA
OS DEVERES PARA CASA
NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
Dissertação apresentada para obtenção do Título de Mestre em Educação e Cultura pela Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC em convênio com a Fundação Educacional Barriga Verde - FEBAVE.
Orientador : Prof. Dr. SÉRGIO SCHMITZ
“(...) O professor trouxera de casa os nossos trabalhos escolares e, chamando-nos um a um, devolvia-os com o seu ajuizamento. Em certo momento me chama e, olhando ou re-olhando o meu texto, sem dizer palavra, balança a cabeça numa demonstração de respeito e consideração. O gesto do professor valeu muito mais do que a própria nota dez que atribuiu à minha redação. O gesto do professor me trazia uma confiança ainda obviamente desconfiada de que era possível trabalhar e produzir”.
(Freire, 2001, p.48).
“Senhor!
Que toda literatura
Que tua palavra traz,
Seja para nossos trabalhos
AGRADECIMENTOS
A DEUS - Presença constante - fonte de luz e amor.
À MINHA FAMÍLIA - Pelo amor, carinho, incentivo nas horas
difíceis.
AOS MESTRES - Pela paciência e sabedoria com que dirigiram
esta conquista.
AOS COLEGAS - Pelo compartilhar das alegrias e lamentos.
RESUMO
A abordagem do tema: Os deveres de casa no processo ensino aprendizagem, com o objetivo de fazer um estudo reflexivo à luz das idéias de
alguns autores que abordaram o assunto, e de pesquisa de campo em escolas com
características peculiares: escola particular, escola pública de zona rural, e escola
pública da cidade, em Orleans SC, no período de agosto de 2003 a março de 2005.
Levou-nos a entender que os deveres são tarefas extraclasse ou atividades
complementares que os professores mandam da escola para os alunos executarem
em casa, com o objetivo de aprofundar os conhecimentos dos conteúdos estudados
em sala de aula, organizar-se no cumprimento dos compromissos, ter ordem, maior
responsabilidade pelos afazeres escolares e principalmente visando o
desenvolvimento cognitivo, afetivo, psicomotor e emocional do educando. A
comunidade escolar dá vários nomes para essas atividades: tarefas para o lar, lições
de casa, deveres, deveres para o dia tal, atividades para o lar, atividades extras.
Qualquer dessas nomenclaturas ou outras no mesmo sentido significa deveres para
casa no processo ensino aprendizagem. Todas podem cumprir o papel de
exteriorizar os estudos dos conteúdos programáticos fora do período escolar. Elas
exercem uma função social importante, pois, através de seu contato, os pais tomam
conhecimento do trabalho didático realizado na escola, interagindo com os filhos.
Permitem também a interação entre pais e professores para que haja um bom
relacionamento das crianças para com as responsabilidades escolares,
possibilitando-lhes um melhor aproveitamento e indicando dificuldades dos alunos e
as deficiências da estruturação didática do professor. A comunidade escolar e a
família devem ser parceiras na educação das crianças nenhum dos segmentos pode
deixar de cumprir o seu papel de orientar, incentivar e levar o educando a efetuar a
aprendizagem. É no educando que está a fragilidade do processo. Qualquer que
seja o descuido com relação à aprendizagem ou relações interpessoais, tanto por
parte dos educadores quanto dos pais causa sérios problemas à criança de difícil
reversão.
ABSTRACT
Homework are tasks or complementary activities which teachers order
students to do at home in order to develop contents studied in class, to improve their
sense of responsability, order and, most of all, their emotional and cognitive
capacities.The school community gives several names to these activities: tasks for
home, lessons for home, and extra-activities. All of these activities, in fact, have the
same purpose in the learning teaching process. All of them may help students
outside classroom. They have an important social goal because through them,
parents interact with their children and know the pedagogic work of school. It is a way
to connect teachers and parents in order to give students an opportunity to be more
responsible in school activities; and is also a way to point out and draw attention on
students and teachers problems.
Key – words: learning teaching process, homework, knowledge, teachers, students,
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...9
2 A COMUNIDADE ESCOLAR NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM ...15
2.1 A ação dos envolvidos no processo ...15
2.2 O Papel dos Pais...28
2.3 O papel dos alunos...31
2.4 O papel do professor ...32
3 A RELEVÂNCIA DOS DEVERES PARA CASA... 34
3.1 Deveres para casa: sua contribuição para a aprendizagem...34
3.2 Quantidade X qualidade ...39
4 A COERÊNCIA : OBJETIVOS X DEVERES PARA CASA ... 41
4.1 Adequação de objetivos ...41
5 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS ... 47
5.1 Do questionamento ...47
5.1.1 A opinião dos pais ...48
5.1.2 A posição dos educadores ...58
5.1.3 A perspectiva do aluno...70
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 82
REFERENCIAIS......85
APÊNDICE A – DOCUMENTO TRANSCRITO DA ENTREVISTA COM A ALUNA W.M – 12 ANOS 4A SÉRIE – ORLEANS SC...90
APÊNDICE B – DOCUMENTO TRANSCRITO DA ENTREVISTA COM A ORIENTADORA V.R. - ORLEANS SC. ...92
APÊNDICE C - DOCUMENTO TRANSCRITO DA ENTREVISTA COM A PROFESSORA E.S. - ORLEANS SC………..96
ANEXO A - EXEMPLO DE TAREFA………...100
ANEXO B – REPORTAGEM ...111
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Acompanhamento dos pais em relação à assiduidade de seu filho(a) em relação as
tarefas de casa ...48
Tabela 2 – Certeza do pai em relação à realização dos deveres de casa pelo filho...50
Tabela 3 – Reclamações dos filhos em relação às tarefas escolares ...50
Tabela 4 – É normal pedir ajuda para fazer as tarefas ...52
Tabela 5 – Análise dos pais em relação ao nível das tarefas...53
Tabela 6 – Local e horário de realização das tarefas ...54
Tabela 7 – Opinião dos pais em relação as tarefas de casa ...54
Tabela 8 – Tarefas que seu filho(a) mais aprecia...55
Tabela 9 – A função das tarefas na opinião dos pais ...56
Tabela 10 – Atitude dos pais quando são chamados na escola...57
Tabela 11 – Assiduidade em cumprir as tarefas de casa ...59
Tabela 12 – Bases para as tarefas de casa...61
Tabela 13 – Atitude tomada quando o aluno não cumpre as tarefas ...62
Tabela 14 – Orientação dada aos pais que vêm à escola...63
Tabela 15 – Motivos que levam os alunos a não fazerem as tarefas...64
Tabela 16 – Tarefas mais apreciadas ...65
Tabela 17 – Aluno que cumpre as tarefas tem mais rendimento escolar...66
Tabela 18 – Fator que influencia a assiduidade nas tarefas ...67
Tabela 19 – Situações em que o aluno se prejudica por não cumprir com as tarefas ...68
Tabela 20 – Função dos deveres para casa...69
Tabela 21 – Assiduidade nas tarefas...70
Tabela 22 – Função dos deveres para casa...71
Tabela 23 – Motivo pelo qual não fez a tarefa ...72
Tabela 24 – Medidas tomadas pela professora quando não faz tarefa...73
Tabela 25 – Atitude dos pais quando chamados na escola ...74
Tabela 26 – Situações em que a falta nas tarefas prejudica ...75
Tabela 27 – Objetivo da professora ao passar tarefas ...76
Tabela 28 – A professora deve continuar a dar tarefas ...77
1 INTRODUÇÃO
Os deveres de casa são constantes em nosso meio educacional. Essa
prática está inclusa em todos os tipos de metodologias de ensino, seja de escolas
públicas, seja de particulares. Todo professor, de qualquer disciplina, usa esse
recurso como forma de fixação de conteúdos ministrados e também para avaliar o
desempenho do aluno fora da sala de aula.
Não obstante, percebendo o tema de maneira mais abrangente, fez-se
necessária uma divisão a fim de que o estudo contemple todos os aspectos
propostos.
Num primeiro momento, discorremos sobre a inter-relação presente na
comunidade escolar acerca do processo ensino-aprendizagem, ou seja, sobre a
interação entre escola, aluno e família no que tange ao assunto em foco.
A relevância dos deveres escolares para casa faz parte do segundo
momento deste estudo. Demonstrar a importância dessa técnica é fundamental para
que possam avaliar as possibilidades negativas e positivas desse ato escolar.
Contemplamos ainda a relação existente entre a aplicação de deveres para
casa com o conteúdo programático da Matriz Curricular1.
Finalmente, desenvolveu-se um estudo de campo com base nos dados
coletados e na análise descritiva acerca do tema.
O professor usa os deveres de casa com objetivos definidos, mas encontra
dificuldade em fazer com que grande parte dos alunos assuma esse compromisso.
1
Muitos alunos não vêem as atividades extraclasse2 como apoio à sua
aprendizagem, e essa falta de discernimento faz com que ocorra um elevado nível
de inadimplência, criando um clima de insatisfação nos professores e nos pais.
Gadotti (2001, p.51) afirma: “Só se aprende quando se gosta, quando se ama o que
se estuda”.
Esse clima de insatisfação generalizada provoca o conflito aluno X escola X
pais. O aluno é cobrado por sua falta de responsabilidade, a escola busca meios
para despertar a empatia do aluno em relação aos deveres de casa e, por fim,
convoca os pais para que tenham uma participação mais efetiva no processo
ensino-aprendizagem3
.
O professor afirma ser necessário passar deveres para casa, pois é uma
possibilidade de reforçar os temas apresentados durante o período passado em sala
de aula. Além disso, trata-se de uma técnica de desenvolvimento que pode
desencadear no aluno a busca para a pesquisa, a leitura e a escrita, auxiliando-o
para um melhor desempenho nas atividades escolares, como afirma Veiga
(1991, p. 25): “Se as técnicas têm esse caráter instrumental, pode-se afirmar que
elas encontram sua razão de ser no serviço que prestam. No entanto, conhecê-las
teoricamente não garante o seu sucesso. A maneira de utilizá-las é que define seu
potencial [...]”.
A percepção de que o aluno não gosta de fazer deveres de casa é fato no
cotidiano escolar. Essa recusa pode ser indício de que o procedimento do professor
deve passar por uma avaliação, um estudo minucioso de como e quando aplicar as
tarefas e até que ponto elas são relevantes no processo didático-pedagógico4.
Para os pais, os deveres de casa são dilemas constantes e, às vezes, fonte
de conflito na família5, uma vez que a grande maioria dos pais não possui
2
São as que, ligadas ou não às disciplinas curriculares, procuram conferir mais autenticidade às atividades escolares e ocorrem fora da sala de aula (NÉRICI, 1967, p.10).
3
Ensinar e aprender, pois, são duas facetas do mesmo processo e que se realizam em torno das matérias de ensino, sob a direção do professor (LIBÂNEO, 1994, p.55).
4
“Processo de aprendizagem que se realiza através do relacionamento interpessoal muito forte entre aluno e professor” (MASETTO, 1997, p.14).
5
conhecimento técnico-pedagógico6, sentindo-se numa situação desconfortável, sem
poder auxiliar os filhos.
É comum encontrar casos de pais que usam de violência contra os filhos
porque querem que eles sejam assíduos com os deveres de casa, uma vez que a
escola lhes cobra a responsabilidade.
As famílias de instrução escolares mais elevadas e economicamente mais
favorecidas buscam ajuda de várias formas, seja através do acesso a bibliotecas, a
pesquisas na internet, seja em aulas particulares. Os menos favorecidos
economicamente, mas que possuem consciência de sua participação no processo
de escolarização7
dos filhos, buscam auxílio com parentes, amigos, vizinhos,
objetivando, dessa forma, suprir as necessidades impostas pelos temas escolares.
Há famílias, no entanto, que deixam os filhos sofrerem todas as
conseqüências, sem tomar conhecimento da situação, abstendo-se assim de
qualquer relação com o processo ensino aprendizagem.
Sob o ponto de vista do educando, pode-se afirmar que muitos são
acometidos de uma aversão aos deveres de casa. Sabem argumentar, fazem
alegações contingentes tanto aos pais quanto aos professores. Preferem atividades
mais prazerosas. Correm, brincam, fazem inúmeras atividades diferentes durante o
dia, mas quando é hora de fazer os deveres da escola resistem das mais variadas
formas.
O dilema dos deveres de casa começa tão logo as crianças ingressam no
universo escolar. Nos primeiros anos de escolaridade aceitam essa tarefa com
facilidade, porém, com o decorrer do tempo, passam a oferecer resistência às
atividades extraclasse.
crianças possam aprender a ser mais humanas, a amar, a formar a sua personalidade única, a desenvolver sua auto-imagem e a relacionar-se com a sociedade mais ampla e imutável da qual e para qual nascem “ (ACKERMAN, 1974, p.23)
6
“Técnicas, recursos ou meios de ensino: são complementos da metodologia colocados à disposição do professor para o enriquecimento do processo de ensino” (LIBÂNEO, 1994, p.53)
7
O problema existe e precisa ser estudado com profundidade. É necessário
saber as suas causas, analisar as relações que tem com o desenvolvimento afetivo,
cognitivo e psicomotor dos alunos no processo ensino-aprendizagem para a busca
de soluções.
Desse modo, desenvolver estudos reflexivos sobre o ato de enviar deveres
da escola para serem feitos em casa e sua implicação no processo
ensino-aprendizagem é o objetivo principal deste trabalho. Neste ínterim, cabem as
questões norteadoras, levando aos questionamentos:
- É importante mandar deveres para casa?
- Como os deveres podem ajudar na aprendizagem?
- Quando se tornam prejudiciais ao aluno?
- Existe coerência com o conteúdo programático curricular?
- O que pensam os professores, os pais e os alunos a respeito do assunto?
As atividades extraclasse ou tarefas complementares têm o objetivo de
aprofundar conhecimentos relacionados aos conteúdos estudados em sala de aula e
vão se tornando cada vez mais importantes e necessárias à medida que a vida
escolar vai ficando mais intensa e mais complexa, ampliando o universo do
conhecimento. Além de complementar o assunto abordado em sala de aula,
contribui para o desenvolvimento do senso de responsabilidade, trazendo consigo
condições favoráveis à formação da personalidade do indivíduo como cidadão.
Na prática pedagógica o professor precisa contar com esse recurso, para
que possa chegar aos objetivos propostos com mais segurança, avançando nos
conteúdos programáticos ao mesmo tempo em que se certifica do crescimento do
aluno. Eventualmente observa-se que há alunos que reúnem boas condições para o
acompanhamento normal dos conteúdos e não o fazem por falta de interesse, tendo
assim a aprendizagem prejudicada.
As crianças que cumprem regularmente com os deveres escolares
tornam-se facilmente responsáveis e têm um detornam-senvolvimento afetivo, cognitivo e
psicomotor mais seguro, ficando mais atentas às aulas e mais envolvidas com o
A criança que estuda regularmente e com responsabilidade se situa na
escola e compreende bem o seu significado, vai crescendo e se infiltrando
corajosamente na intensa e complexa vida social.
Foi nosso envolvimento de na carreira no magistério que despertou a
inquietação sobre esse aspecto pedagógico e que possibilitou observar, na prática, o
procedimento de professor e aluno com relação aos deveres de casa. Nossa
preocupação é o número significativo de alunos que não cumprem as suas tarefas
escolares em casa e de professores que fazem uso desse recurso sem o
envolvimento pedagógico necessário para um bom desempenho dos alunos.
Por essa razão sentimo-nos motivados a estudar com profundidade este
tema, propondo um trabalho que, por certo, ajudará a esclarecer questionamentos
feitos por todos os profissionais da área e, principalmente, pelas famílias dos
educandos, que terão a oportunidade de conhecer melhor as suas atitudes em
relação ao tema.
Trabalhamos o tema “Deveres para casa” organizando uma pesquisa com o
intuito de desenvolver estudo reflexivo sobre o assunto e sua implicação para o
processo ensino-aprendizagem junto aos professores, pais e alunos das Séries
Iniciais do Ensino Fundamental da Escola Barriga Verde – Centro, Orleans SC,
caracterizada escola particular. Foi incluída a Escola de Ensino Fundamental
Cônego Santos Sprícigo – Bairro Alto Paraná – Orleans SC, caracterizada carente.
Incluí–se também a Escola B. Municipal Lauro Pacheco dos Reis – Bairro Nova
Orleans – Orleans SC, caracterizada escola de atendimento misto com meio rural e
classe operária.
Foram envolvidas quatro turmas de alunos das séries iniciais do Ensino
Fundamental, com 25 alunos cada, suas respectivas famílias e o segmento de
educadores da Instituição.
A pesquisa de campo foi sistematizada de forma a perceber-se a opinião de
alunos de 1ª, 2a,3a e 4ª séries, educadores e pais através de instrumento em forma
A análise foi descritiva, embora em determinados momentos tenha-se acreditado ser
interessante a inserção de gráficos para melhor pontuar determinadas situações.
Sempre que se fez necessário, foram incluídos depoimentos colhidos em
entrevistas, observações anotadas no cotidiano escolar e testemunhos de pessoas
que já atuaram no campo educacional, a fim de enriquecer o trabalho,
principalmente em razão da escassa bibliografia.
Deveres para casa são um procedimento antigo, e, dadas à escassa
bibliográfica encontrada sobre o tema, detectam poucos estudos específicos, o que
de certa forma, frustrou os esforços em esclarecer ainda mais os questionamentos a
cerca do assunto.
O referencial bibliográfico é pouco expressivo em relação à literatura
necessária à abordagem do tema, já que livros que poderiam servir de suporte para
a pesquisa são limitados. Dessa forma, uma pesquisa de campo tornou o trabalho
mais confiável, pois são depoimentos documentados de pessoas que vivenciam o
fato e que serão analisados à luz da revisão bibliográfica e da experiência
educacional que arregimentamos ao longo da vida profissional.
Espera-se que este trabalho possa contribuir para transformar e melhorar as
2 A COMUNIDADE ESCOLAR NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
2.1 A ação dos envolvidos no processo
O trabalho docente nas séries iniciais não pode ser considerado uma tarefa
fácil. Vários fatores contribuem para um resultado negativo ou positivo no
desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Um fator bastante considerável, ainda
nos dias de hoje, é o que chamamos de lições de casa, tarefas extraclasse, tarefas
complementares, tarefas para o lar, deveres, tema, atividades para o dia, enfim,
nomenclaturas que são usadas pelos professores para nomear as atividades que os
alunos desenvolvem em casa.
Ensinar o aluno a organizar-se com seus compromissos, ter maior
responsabilidade pelos afazeres escolares e principalmente pelo seu próprio
desenvolvimento intelectual são objetivos primordiais das tarefas de casa, uma vez
que é uma forma de exteriorizar os estudos dos conteúdos programáticos,
levando-os além do universo da sala de aula. De acordo com Ribeiro (1997, p.13):
O estudo é uma atividade importante. Ao aprendermos a estudar melhoramos os nossos desempenhos na vida escolar, nas avaliações e na vida profissional. A sociedade em que vivemos está cada vez mais seletiva, isto tem feito com que as exigências em relação ao nível de capacitação sejam ascendentes [...].
Tanto as escolas públicas quanto as particulares enfrentam problemas
relacionados às lições de casa, o que gera dificuldades no relacionamento professor
X aluno X pais. As tarefas vão se tornando cada vez mais importantes à medida que
a vida social vai ficando mais intensa e mais complexa.
As tarefas contribuem para o desenvolvimento cognitivo, afetivo, psicomotor
Plano de Ensino8, dando suporte ao sistema de avaliação9 em classe, uma vez que
fornece subsídios para a compreensão do desempenho dos alunos e dos
professores durante o período de estudo:
Educar é, antes de tudo, mobilizar o aluno para que se torne um “aprendiz”. É verdade que isso supõe dispositivos didáticos precisos, uma constante observação formativa, uma organização e uma gestão eficazes da classe (PERRENOUD, 2000, p. 75 ).
A prática da lição de casa proporciona uma vinculação afetiva entre pais e
filhos, pois o tempo dedicado ao cumprimento das tarefas escolares é momento de
inter-relação, de troca, em que os laços afetivos podem se fortalecer. Entende-se
que isso só é possível através da tomada de consciência de que as tarefas enviadas
para casa devem ser realizadas pelas crianças e observadas pelos pais. “A posição
da mãe ou do pai é a de quem, sem nenhum prejuízo ou rebaixamento de sua
autoridade, humildemente, aceita o papel de enorme importância de assessor ou
assessora do filho ou da filha” (FREIRE, 2001, p.120).
Figura 1: Mãe e filha cuidando das tarefas escolares.
Fonte: OBA, lições de casa. Nova Escola,Rio de Janeiro, ed abril, n.122, p. 8-15, maio 1999.
8
“Roteiro organizado das unidades didáticas – denominado também plano de curso ou plano de unidade” (LIBÂNEO, 1994, p.232).
9
É preciso deixar claro que as lições de casa são de responsabilidade das
crianças e que elas devem fazê-las sozinha, mas compreendendo que podem contar
com a ajuda dos pais quando precisarem. A inter-relação se estabelece quando os
pais colocam nas mãos os cadernos dos filhos, tomam conhecimento dos assuntos
em estudo e do que o professor solicitou como tarefa para casa, ajudando-os no
que for possível, facilitando assim a aprendizagem.
A tarefa é atividade que serve ao aluno como exercício do que aprendeu, ao professor como avaliação daquilo que o aluno já sabe fazer. Os pais não devem realizá-la por ele, mas apenas auxiliá-lo. Enquanto a criança realiza a tarefa, a presença física do adulto substitui a presença da professora e lhe
dá a segurança que necessita, obtendo a aprovação quando acerta. (www. dinamiconet.com.br, p.01, 2004 ).
Estar atento ao desenvolvimento dos filhos não é apenas um compromisso,
é também uma obrigação. Na verdade é um momento prazeroso em que se semeia
a cultura no seio familiar, pois o professor executa o valioso papel de assumir
compromissos de disseminar a cultura junto à escola, aos alunos e à sociedade.
Entende-se que são os professores que têm a obrigação de desenvolver
holisticamente seus educandos, orientando-os para que se tornem verdadeiros
estudantes e indivíduo em constante busca pelo conhecimento e possibilitando-lhes
uma educação que ofereça acesso a instrumentos que irão auxiliar no seu
desenvolvimento cultural e social. Segundo Charlot (1997, apud PERRENOUD,
2000, p. 75):
A relação com o saber é a relação com o mundo, consigo mesmo e com o outro de um sujeito confrontado com a necessidade de aprender:
A relação com o saber é um conjunto (organizado) das relações que um sujeito mantém com tudo que diz respeito ao “aprender” e ao saber.
Para apresentar conteúdos relevantes que contribuam para a formação de
indivíduos conscientes, críticos e capazes de orientar o seu próprio aprendizado,
faz-se necessário que os professores que atuam diretamente com as crianças
conheçam a clientela com a qual estão trabalhando, a fim de elaborar aulas
Devem programar atividades de acordo com o nível de desenvolvimento da
aprendizagem cognitiva, afetiva e psicomotora dos alunos e manter-se informado
sobre o material didático-pedagógico10 para que o aluno possa dar seqüência às
atividades em casa.
Ao oferecer condições para que as crianças possam estudar, ser
compreendidas, ouvidas, possam expressar seus sentimentos e se desenvolver
social e emocionalmente, tanto em sala de aula, quanto fora dela, torna-se mais fácil
compreendê-las e ser compreendido por elas.
Ter em mente que as aulas são preparadas para os alunos e não o aluno
para elas irá beneficiar o trabalho do professor, que precisa contar com alguns
princípios permissivos de dinamização e desenvolvimento de habilidades reflexivos
que definem critérios para reconhecer os avanços individuais e coletivos dos alunos,
e a partir daí determinar sua linha de ação, negociando as diferenças de idéias
surgidas nos grupos, fazendo uso de instrumentos de observação do aluno11
, de
questionamentos e análises, tornando-se assim um investigador de seu próprio
trabalho.
Figura 2: Alunos felizes ao término da atividade.
Fonte: OBA, lições de casa. Nova Escola, Rio de Janeiro, ed abril, n.122, p. 8-15, maio 1999.
10
Material utilizado pelo aluno para o acompanhamento das aulas ( LUCKESI, 1995, p. 53 ). 11
A utilização de metodologias que possam determinar as metas, objetivos ou
propósitos e o planejamento de tarefas que estimulem o interesse e facilite a
independência dos alunos têm fundamental importância na hora de transferir tarefas
para serem executadas em casa. Outro fator considerável é o olhar sobre o erro do
aluno. Esse erro deve ser entendido como origem da construção do saber, o ponto
de partida para o aprendizado e não o fim do processo de ensino-aprendizagem. O
aluno precisa saber reconhecer seus erros para corrigi-los, sem tomar como castigo
quando o professor ou os pais lhe pedem para refazer as tarefas erradas:
É preciso ultrapassar a sistemática tradicional de buscar os absolutamente certos e errados em relação às respostas do aluno e atribuir significado ao que se observa em sua tarefa, valorizando idéias, dando importância a suas dificuldades, sugerindo-lhes o seu próprio prestar atenção. O respeito e a valorização de cada tarefa favorecem a expressão por ele de crenças verdadeiramente espontâneas (HOFFMANN, 2001, p.84).
Nesse sentido, o professor e a família caminham juntos para uma
construção mútua do processo educativo do aluno, um processo interativo que
possibilita o crescimento total do educando.
Professores atentos conseguem perceber, nos conteúdos que trabalham,
quais as atividades que despertam mais interesse nos alunos. Algumas destas
atividades estão expostas nos gráficos e são justamente esses tipos de atividades
que devem ser organizadas para que sejam trabalhadas em casa. A confecção de
murais, por exemplo, pode oportunizar aos alunos a procura de figuras, reportagens
e instrumentos de trabalho, como tesouras, cola, pincéis atômicos; já as entrevistas
com pessoas mais velhas ou com pessoas da própria família da criança devem
servir para que eles ouçam histórias e valorizem sua cultura. Outras atividades
dessa natureza podem se tornar interessantes e repletas de oportunidades de
aprendizagem.
Os movimentos que os educandos fazem para cumprir as tarefas ajudam a
fixar a aprendizagem, porque geralmente são feitos após o estudo dos conteúdos e
vêm a enriquecê-los com novos aspectos e conhecimentos práticos. .
Atividades repetitivas, exercícios já trabalhados em classe ou que ainda
alunos, fazendo com que percam o entusiasmo pelos afazeres escolares, haja vista
não encontrarem novidades nos trabalhos, que os obrigam, mais uma vez, a ficarem
parados e concentrados como em sala de aula. Segundo Libâneo (1994, p. 193):
A tarefa de casa deve ser cuidadosamente planejada pelo próprio professor, explicada aos alunos, e seus resultados devem ser trabalhados nas aulas seguintes. Nada mais frustrante para os alunos do que empenhar-se nas tarefas e depois receber um mero “visto” do professor.
É fundamental que o professor detecte os erros recorrentes nas tarefas de
casa e busque neles a resposta para as dificuldades dos alunos.
As atividades devem ser atraentes para as crianças, a fim de fazê-las
participantes ativas do processo educativo, intercambiando informações variadas e
estimulando-as a participar das aulas de forma efetiva, consciente e dinâmica, ao
contrário do que geralmente acontece – uma atitude postural estática lhes é cobrada
em sala de aula.
As tarefas classificadas como confusas, difíceis ou monótonas dependem
sempre da ajuda de um adulto para serem entendidas e nem sempre o aluno dispõe
da atenção de seus familiares para auxiliá-lo em sua demanda. Então não é
aconselhável que sejam direcionadas para casa, sob pena de desencorajar os
alunos, que podem temer o resultado e a cobrança dos professores no dia seguinte.
Constata-se tal situação no relato abaixo transcrito, que foi testemunhado em sala
de aula, no campo de estudo:
Profa. Y. M. – “O que aconteceu com você, que está aí cabisbaixo? Cadê o
seu caderno que não está em cima da mesa, para conferir as tarefas?”.
Responde Zezinho: “Eu esqueci o caderno em casa, professora”.
E a professora, interpelando mais um pouco, faz com que o aluno acabe por
apresentar o caderno com a tarefa em branco. A professora passa um sermão12
pelo fato de ele não ter feito os deveres e ter escondido o caderno, mas não
12
pergunta o porquê de sua atitude. A reação do aluno é chorar. Então ele é levado
para a sala de orientação.
Ao ser questionado pela orientadora, confessa que não fez a tarefa porque
não sabia fazê-la.
A orientadora conversa com a professora e solicita uma atenção especial
para o caso daquela criança. A professora acata a sugestão, um pouco contrariada,
dizendo ao menino que se voltar a acontecer ficará de castigo.
Essa atitude da professora é uma revelação de que ela se importava
simplesmente com o cumprimento das tarefas, sem preocupação com o
aprendizado. Hoffmann (2001, p.12; 81) refere-se a isso:
As crianças, os jovens em sua atividade natural e espontânea são levados sempre a responder aos nossos desafios, e tentar, a “chutar”, a inventar respostas para questões propostas. (Ainda mais quando sabem que as tarefas valem nota!) Se eles nem mesmo tentam, então é um grave sinal de alerta. Piaget (1926) citado por Macedo (1991), refere-se a uma reação da criança que denomina de não-importismo: ’Quando a pergunta feita aborrece a criança ou de maneira geral, não provoca nenhum esforço de adaptação, a criança responde qualquer coisa e de qualquer forma, sem mesmo procurar divertir-se ou construir um mito.[...] O mesmo perigo ocorre quando o aluno responde apenas para contentar o professor, decorando o que lê sem compreensão (crença sugerida, segundo Piaget). É necessária a atenção dos professores em relação à “questão em branco” nas tarefas de aprendizagem. Sem compreender o assunto, o estudante não tem como realizá-las. Não responde porque a tarefa não chega a ser perturbadora a ponto de levá-lo a inventar respostas. Sem entendimento, somente irá responder por memorização.
As crianças precisam ser respeitadas, ouvidas e compreendidas para que
não precisem recorrer a subterfúgios para se auto proteger. É necessário que um
ambiente de segurança emocional, afetiva e de interação seja construído para que
elas não se sintam frágeis perante situações que poderiam ser resolvidas facilmente
com perguntas e respostas. Para Tiba (1996, p.106), “Os alunos vão se interessar
pelo conteúdo previsto no programa escolar se houver uma correlação entre ele e o
seu dia-a-dia. O professor sábio reconhece a importância desse conhecimento para
Os professores têm o compromisso com a educação dos alunos, mas não
estão sozinhos. A escola, como instituição, deve cumprir o seu papel de
inseminadora da diversidade cultural13 e da pluralidade individual14, precisa estar
consciente de seu comprometimento nesse processo. Gestores, especialistas,
docentes, agentes de serviços gerais, todos devem ajudar positivamente no
desempenho educacional, para que possam ter alunos com um bom índice de
auto-estima, que consigam confiar nas pessoas com quem se relacionam no ambiente
escolar, favorecendo a criação de laços afetuosos entre todos os envolvidos no
processo.
Além dos professores, todos os profissionais que atuam junto aos alunos e
também a família precisam dar a sua contribuição, fazendo-se presentes nos
momentos em que a criança constrói o seu saber e o seu senso de
responsabilidade, dirigindo suas atitudes para um relacionamento dialético com a
escola.
É da família que parte o fortalecimento ou então a desestabilização da
educação da criança. Os problemas econômicos, por exemplo, fazem com que os
pais assumam compromissos exagerados fora do lar, deixando a família, enquanto
grupo, um tanto vulnerável.
Os pais são fragilizados por sentimentos de culpa: culpam-se pela vida
agitada que levam, pela falta de tempo dedicado aos filhos, pela impossibilidade de
realizar os sonhos de consumo que a sociedade impõe nos dias atuais. São tantas
as culpas que, muitas vezes, perdem o controle da situação. É comum a oferta de
presentes em troca de respostas positivas com relação às responsabilidades
escolares, dificultando ainda mais o relacionamento entre pais e filhos e,
principalmente, da criança com a escola, pois cumprem mecanicamente a obrigação
13
Cada realidade cultural tem sua lógica interna, a qual devemos procurar conhecer para que façam sentido as suas práticas, costumes, concepções e as transformações pelas quais estas passam. É preciso relacionar a variedade de procedimentos culturais com os contextos com que são produzidos. (SANTOS , 1988, p. 8).
14
de realizar as tarefas escolares, sem refletir sobre o verdadeiro sentido desse ato.
Num contexto mais amplo, tolhem do filho as possibilidades de aquisição de novos
conhecimentos, que se inicia com os bons hábitos de estudo cultivados dentro e fora
do ambiente escolar.
Para conciliares situações econômicas e educacionais, há pais deixando de
lado os antigos preconceitos e assumindo uma nova postura perante a sociedade.
Veja o relato de um pai de alunas gêmeas, o Sr. S.A.:
Foi fácil, professora. Resolvi abandonar meu emprego e ficar em casa com elas, já que a mulher trabalha no escritório e ganha mais que eu; assim posso olhar os cadernos, ajudar a resolver os problemas, fazer leituras, fazer pesquisas com elas, cuidar delas, fazer comida, lavar roupas [...] Faço tudo em casa (informação oral15)
Esse ato, até incomum pelo fato de alterar formas de comportamentos já
cristalizados na sociedade, onde o pai e não a mãe é quem abandona o trabalho
para se dedicar às filhas, mostra-nos que ainda existem famílias que se preocupam
com o futuro de seus filhos, assumindo-os com responsabilidade mesmo tendo que
ir contra alguns preconceitos sociais. A educação das crianças precisa do
acompanhamento familiar para que elas possam se desenvolver por meio de uma
relação efetiva com a escola e com a sociedade.
O Sr. S.A. tem consciência de que a diminuição da renda familiar limita
ainda mais o conforto que a família precisa, porém sabe que a participação
constante na educação das filhas irá compensar a perda financeira. “- Eu sei que
podia dar um par de tênis melhor ou um vestido mais bonito, mas acho que se eu
cuidar bem da educação delas, não vou ter problemas mais tarde” (Informação
oral16).
A família deverá procurar a melhor forma de resolver seus problemas sem
acarretar enormes prejuízos, tanto econômicos quanto afetivos. A educação
adquirida através da família faz com que o educando se sinta seguro para agir frente
às diversas situações em que o dia-a-dia o coloca. Assumir a educação da criança
15
Entrevista concedida em 23/agosto/2003, às 9h no auditório da Secretaria Municipal de Educação em Orleans.
16
junto com a escola é envolvê-la nos estudos, fazendo com que tenha bom gosto
pelos afazeres escolares, cresça valorizada, sinta-se capaz de enfrentar as
dificuldades geradas pela sociedade sem preocupar-se com os preconceitos,
tornando-se livre e autônoma.
As famílias podem resolver seus problemas de várias formas, usando
creches, jardins de infância, escolas de tempo integral ou deixando a criança com
parentes, porém nada substitui a presença dos pais no processo
ensino-aprendizagem. O Sr. S.A. decidiu ir mais longe, além da escola ele se ocupa
diretamente com todas as obrigações inerentes à família, sem se preocupar com o
preconceito social. Fica em casa e sustenta sua atitude dizendo: “- Alguém, pai ou
mãe, tem que se dedicar para a família; se as famílias cuidassem melhor de seus
filhos não tinha tanta criança na rua ou mal cuidada” (Informação oral17
)
O caso do Sr. S.A. com certeza pode ser entendido como um caso à parte,
já que tomou a atitude que julgou ser melhor para si e para sua família. Há, no
entanto, famílias que precisam de orientações, de ajuda para encaminhar seus filhos
no relacionamento com os estudos e com a própria escola.
Normalmente é a escola que convoca os pais para assumirem uma posição
diante da postura de seus filhos na escola. Às vezes não precisa de muito trabalho
para se ter pais preocupados com o desempenho dos filhos. Tomemos como
exemplo a Professora Maria Izabel, que convocou os pais dos seus alunos para uma
reunião e recomendou que ajudassem as crianças a se organizar e valorizar suas
atividades. Disse a professora: “[...] mesmo sendo analfabetos, deveriam olhar
diariamente os cadernos dos filhos, conta o interesse dos pais pelas coisas que as
crianças produzem, funciona como um grande incentivo.”( OBA..., 1999, p. 8-15).
17
Figura 3: Professora em reunião com os pais para discutir o assunto deveres de casa
Fonte: OBA, lições de casa. Nova Escola,Rio de Janeiro, ed abril, n.122, p. 8-15, maio 1999.
Não há necessidade que o pai ou a mãe abandonem seu trabalho para dar
à criança a devida atenção. É preciso organizar o tempo passado com ela,
tornando-o prtornando-odutivtornando-o em busca dtornando-o ctornando-onhecimenttornando-o, ctornando-onscientizandtornando-o-a da imptornando-ortância de
estudar, valorizando todas as possibilidades encontradas para enriquecer-lhe a
sabedoria.
Observa-se que as crianças pontuais com as atividades escolares são
aquelas que encontram em seu meio o incentivo necessário para alcançar o
desenvolvimento, uma vez que há pessoas preocupando-se com o seu bem-estar
em todos os sentidos, em especial na educação, fazendo-se presentes,
independente de serem pais, professores ou responsáveis.
Como pais ou responsáveis, não devem deixar os filhos à mercê de suas
próprias vontades, mas sim fazê-los caminhar ao encontro das responsabilidades
com a escola e com o convívio social num todo; como professores, devem
dedicar-se à função de educador e assumir com responsabilidade as atividades inerentes ao
cargo..
Crianças que têm pais preocupados e atentos estão livres de situações
constrangedoras como a do menino que escondeu o caderno. O cuidado e a
de ajudar o professor no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem,
encoraja-os para assumir compromissos cada vez mais envolventes dentro do
processo educativo, já que sabem que podem contar com as pessoas que se
interessam por seu desempenho.
As dificuldades e reclamações dos professores com relação aos alunos que
não fazem as tarefas de casa têm várias causas, inclusive o desempenho do próprio
professor, pois as tarefas só contribuem verdadeiramente para o correto
aprendizado se forem bem planejadas, dinâmicas e estimularem o envolvimento do
educando com o cotidiano escolar.
Tarefas mal planejadas não trazem benefícios para o aluno e nem para o
professor, levando-o a deparar-se com as dificuldades que ele próprio criou e
muitas vezes não consegue resolver sozinho. É importante que o professor esteja
atento a todas as informações possíveis a respeito de seus alunos. Conversas e
visitas à casa dos pais, informações através de colegas, entrevistas e observações
feitas por especialistas educacionais da escola são úteis para a construção de um
perfil do aluno.
As relações entre pais e professores são imprescindíveis para a troca de
informações sobre a criança, já que sua personalidade se estrutura mediante a
participação nos distintos grupos a que pertence. Considere-se que a família
também pode ser o ponto de desequilíbrio entre o educando e as suas
responsabilidades para com a escola.
Se a família deixar de cumprir o seu papel de mediadora, encorajadora e
deixar de estabelecer os limites para que o indivíduo se sinta seguro com o que
deve ou não fazer, o desequilíbrio nas relações familiares ou escolares, na maioria
das vezes, provoca transtornos no aprendizado da criança. Ela precisa viver num
ambiente onde se sinta segura, amada e compreendida para que desenvolva
comportamentos adequados ao meio em que vive e construa uma personalidade
firme e confiante.
A família e a escola têm a responsabilidade de colocar no seio da sociedade
desempenhar aí seu papel. Essa função é o que qualifica ambas as instituições
como agências formadoras, que devem lograr êxito em seus objetivos.
Notadamente, o convívio social de hoje não tem mais as mesmas
características de alguns anos atrás, quando o autoritarismo era a chave mestra na
competência da educação. Pais e professores detinham o poder de liderança,
comandados pelo autoritarismo, ou melhor, mandavam e eram obedecidos a troco
de severos castigos. A situação foi mudando, e na educação moderna houve uma
profunda evolução no sentido de compreender que o castigo em si não provoca mais
mudança de comportamento.
Mudanças dessa natureza influem no relacionamento junto à escola e aos
pais, que partem em busca de soluções para os problemas enfrentados com seus
filhos no cumprimento das tarefas escolares em casa ou na escola. As crianças
precisam conviver em ambientes que promovam o desenvolvimento sem
repressão, embora seja um problema que exige muito dos pais, professores e
escola. Conforme Piaget (l973, p. 68), “[...] nada é mais difícil para o adulto que
saber apelar para a atividade real e espontânea da criança [...]”.
Para ele a criança precisa de espontaneidade para fazer as suas tarefas, e
quando o adulto se depara com uma criança que não possui naturalmente esse
dom, se embaraça com a postura que deve tomar frente a ela, causando
dificuldades no relacionamento adulto x criança, o que leva essa criança ao
desânimo e a faz deixar de lado os seus compromissos com a escola.
Estudos feitos por Montessori (apud PILETTI,1984, p.108) levaram à
conclusão de que a atribuição do professor não é só a de falar, mas também a de
preparar e dispor uma série de motivos, de atividades culturais, num ambiente
expressamente preparado. Pequenos atos, como lavar as mãos, podem tornar-se
situações de aprendizagem não apenas de hábitos, mas de conhecimento, servindo
como tarefa de casa – simples e fácil de cumprir – e levando a criança
gradativamente a tarefas mais complexas futuramente, após sentir-se segura de
seu êxito.
A problemática do dever de casa é significativa e penetrante, com ênfase em
“Professora A.F. interpela: – Martha (nome fictício), responde esta pergunta: Em que
região do Brasil situa-se o Estado de Santa Catarina?” E Martha começa a chorar,
dizendo que está com dor de cabeça. A professora conversa com a menina e
descobre que não fez os deveres em casa. Situações assim são vividas pelos
professores todos os dias na escola.
É nesse momento que se faz necessária à intervenção da equipe
pedagógica da escola na busca das causas que estão levando as crianças à
negligência com seus compromissos. Por que o trabalho proposto não despertou o
interesse, o prazer, a dedicação, o empenho da criança? Algo está errado, uma vez
que a criança, por natureza, é criativa, adora desafios, extasia-se diante do novo. O
professor precisa repensar sua prática pedagógica, sua metodologia, penetrar no
mundo misterioso da criança e buscar desvendar o que ali se passa.
A criatividade, o dinamismo, a compreensão e dedicação do professor são
fundamentais para provocar uma mudança comportamental na criança Segundo
Libâneo (1994, p.105):
É necessário reafirmar que todo estudo ativo é sempre precedido do trabalho do professor: a incentivação para o estudo, a explicação da matéria, a orientação sobre os procedimentos para resolver tarefas e problemas, as exigências quanto à precisão e profundidade do estudo etc. é necessário, também que o professor esteja atento para que o estudo ativo seja fonte de auto-satisfação para o aluno, de modo que sinta que ele está progredindo, animando-se para novas aprendizagens.”
As lições de casa são as ligações entre a escola e a família, pois ambas são
responsáveis pela educação da criança, pelo seu bom desempenho escolar
contribuindo na formação de um cidadão pleno, consciente de sua função social,
agente transformador de sua própria história.
2.2 O Papel dos Pais
A intervenção dos pais no processo de ensino dos filhos é de crucial
importância, pois são as pessoas que inspiram confiança, por isso devem se
posicionar como assessores diretos no desempenho das suas funções estudantis,
ensinando-os que são responsáveis pela autonomia que vai se constituindo nas
várias experiências, nas inúmeras decisões que vão sendo tomadas a cada dia.
Faz-se necessário que levantemos algumas questões acerca da participação
direta dos pais e familiares na vida escolar dos filhos. É imprescindível que se
estabeleça um roteiro com a finalidade de tornar mais prática a ação e a
compreensão do momento certo para intervir:
a) Demonstrar interesse pelas atividades que a criança traz da escola: se aqueles que são seus referenciais de vida não valorizam a escola, não
há possibilidade de que a criança a valorize.
b) Estabelecer equilíbrio entre diversão e obrigação: a criança deve estar em uma atitude mental propícia no momento de realizar suas
tarefas. Para tanto, é necessário que possua uma organização diária que
lhe permita alternar momentos de lazer com as responsabilidades
escolares.
c) Promover o cuidado com os materiais escolares: o papel dos pais ou responsáveis não se limita apenas à aquisição dos materiais escolares a
serem utilizados pela criança, é preciso contribuir para que aprendam a
usá-los de forma produtiva.
d) Estimular o interesse da criança pela aprendizagem: oportunizar uma vivência cultural para a criança. Estimulá-la em todas as áreas possíveis:
cultura, esporte, arte, etc.
e) Incentivar a auto-estima da criança: a rotina escolar não é fácil. Procurar conhecê-la, fazendo visitas periódicas à escola. Demonstrar
confiança em seus atos.
f) Despertar hábitos de estudo: estimular a criança a realizar suas tarefas com organização, intensidade e concentração. Ajudá-la a administrar seu
próprio tempo.
g) Oferecer um local adequado para estudar: o local deverá ser tranqüilo, bem iluminado e arejado. O aluno deverá dispor de todos os materiais
h) Ensinar a escutar: acostume a criança a ouvir com atenção as informações que lhe são dadas e elaborar uma idéia de avaliação.
Conversar com o professor poderá ajudar, a saber, as unidades de
estudos seguintes, para estimular as crianças a ler sobre assuntos que
serão dados futuramente.
i) Estimular a leitura, a escrita e os cálculos: ajudar a criança a fazer revisão em assuntos já estudados, elaborar resumos escritos para
facilitar o estudo para provas, proporcionar a participação em cálculos
que envolvam a rotina familiar: compras de alimentos, salários, etc.
j) Promover o estudo para as avaliações: mostrar que as avaliações não são umas ameaças e sim umas ajudas para ampliar seu conhecimento.
Ajudar a fazer anotações de tópicos mais importantes, elaborar perguntas
sobre o assunto, realizar leituras de toda a matéria. 18
A ajuda e a participação constantes dos pais são fundamentais para superar
dificuldades em relação aos deveres de casa. Ajudar quer dizer “cooperar” ou
auxiliar para que a criança perceba que seu esforço é valorizado e sua capacidade é
ilimitada. Sendo assim, os pais podem se mostrar interessados, valorizarem o
conhecimento, encorajar e inspirar seus filhos a serem competentes. Eles devem
ajudar seus filhos a desenvolver planos de estudo de forma que possam participar
das atividades que gostam, sejam quais forem, tais como esportes, informática,
ballet, sapateado; enfim, atividades que venham a somar para a educação e a
formação do caráter da criança.
As brincadeiras com amigos também não devem ficar de fora, pois o
convívio com outras crianças é fundamental para o crescimento social e interativo.
No caso de se deparar com uma criança que não gosta de fazer as tarefas,
não deve dar explicações simplistas como: meu filho é preguiçoso, por isto não faz
os deveres. Deve buscar as explicações, investigar as razões junto à escola, com os
profissionais competentes ou junto aos médicos, se necessário.
18
2.3 O papel dos alunos
Estamos vivendo a era da informação e do conhecimento, numa sociedade
que nos permite ter acesso a um turbilhão de dados, que, depois de assimilados,
transformam-se em novos conhecimentos.
O aluno precisa desenvolver o próprio potencial para construir seu
conhecimento, ampliar o rol de suas capacidades e com isso elevar seu
desempenho.
A tarefa de casa é um autêntico e indispensável complemento da escola
,desde que o aluno a entenda como auxiliar de sua aprendizagem.
Algumas posturas são fundamentais por parte do aluno para que esse
momento se transforme realmente na consolidação do desenvolvimento das aulas.
a) Responsabilidade: Assumir com responsabilidade os deveres de casa é uma forma de exercitar a liberdade e preparar-se para construir
ou produzir o conhecimento. A criança aprende desde cedo a assumir
seus compromissos e, conseqüentemente, será um adulto
responsável.
b) Organização: Incorporar bons hábitos, como horário apropriado, local adequado, espírito de pesquisa, criatividade, estabelecimento de
metas. Isso significa gerenciar melhor o tempo e ter uma vida
organizada. Se acostumada desde cedo, a criança incorporará esses
hábitos, que farão um grande diferencial no desempenho de suas
funções quando adulto.
c) Hábito de leitura: A criança precisa aprender que a leitura é fundamental para o sucesso na vida das pessoas. Quem lê amplia o
vocabulário desvenda mistérios e entende melhor o mundo que o
cerca. É preciso estar consciente de que a tarefa de casa não é uma
simples obrigação, mas sim um momento de pesquisa em prol de
d) Concentração: Concentrar-se numa meta significa focalizar nela atenção e energia, pois é difícil se distrair quando se está totalmente
concentrado.
e) Local adequado: É importante que a criança tenha um local limpo e arejado para realizar suas tarefas, longe da TV, sons e barulhos
diversos. É um momento de concentração, e a energia da criança
deve estar voltada apenas para o cumprimento de seus deveres.
O aluno que busca sua autonomia está livre das cobranças deselegantes
facilmente consegue estabelecer progressos como estudante, passa a ter gosto
pela execução dos deveres e a aquisição de novos conhecimentos necessários à
ascendência em seu universo. Como afirma Freire (1996, p.31), [...] “ao ser
produzido, o conhecimento novo supera outro que antes foi novo e se fez velho e se
“dispõe” a ser ultrapassado por outro amanhã”.
2.4 O papel do professor
O professor precisa desenvolver eficientemente a personalidade do aluno.
Precisa incorporar hábitos que contribuam para desenvolver seres humanos
inteligentes e felizes, capazes de sobreviver em um mundo cada vez mais
estressante.
O ser humano precisa aprender continuamente, estar aberto às
transformações e apto às mudanças.
O professor precisa construir uma ponte entre as informações que transmite
e o cotidiano dos alunos.
Assim sendo, o objetivo do professor em relação às tarefas de casa é
ensinar os alunos a serem pensadores e não repetidores de informação. Para isso
faz-se necessário que assuma determinadas posturas a fim de despertar o interesse
desses alunos:
a) Ser criativo: Desenvolver atividades significativas para que o estudante possa pensar, refletir e relacionar todos os aspectos do
b) Ser motivador: As pessoas normalmente sentem-se motivadas perante uma meta. O professor deve cobrar metas e procedimentos
dos alunos em relação a determinadas tarefas. Dessa forma o aluno
se motiva para a realização do trabalho.
c) Envolver os pais: Desenvolver lições de casa especiais, que só devem ser feitas com o apoio dos pais. Isso fará com que eles se
sintam integrados com os filhos, como se estivessem ao lado deles em
sala de aula.
d) Ser coerente: Entre a tarefa de casa e a aula não pode existir separação. Não é correto que as tarefas de casa contenham
atividades cuja matéria não foi devidamente trabalhada em aula. Isso
significa incoerência entre a teoria e a prática.
e) Ser incentivador: Valorizar os trabalhos dos alunos. Elogiar freqüentemente é uma maneira eficaz de mantê-los interessados no
desempenho de suas atividades.
f) Ter expectativas: Que resultado o professor quer alcançar de seus alunos? Ser específico em termos de qualidade dos resultados.
O professor é o esteio da educação e a sua segurança e competências o fazem tornar-se livre para executar a docência com o brilho de um vencedor que
sabe ensinar ao mesmo tempo em que aprende. Fechamos com Freire (1996,p.25.):
“Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das
diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro.
3 A RELEVÂNCIA DOS DEVERES PARA CASA
3.1 Deveres para casa: sua contribuição para a aprendizagem
Os deveres para casa podem funcionar como um suporte para que o aluno
reforce sua aprendizagem. Neste âmbito, busca-se delinear uma nova postura em
que o dever de casa passe a ser um complemento das atividades diárias escolares,
além de um instrumento de avaliação do processo ensino-aprendizagem. Castro
(apud PILETTI, 1984, p.142-143) enfatiza a inclusão das tarefas extraclasse no
processo de escolarização:
Desde o início de sua vida escolar a criança leva lições para casa”. Essas lições podem ser cópias, respostas a questionários, problemas a resolver, desenhos, composições, etc.
Esses variados tipos de tarefas têm a seguinte finalidade:
a) Rever o conteúdo da aprendizagem; repetir para fixar ou memorizar conhecimentos; assimilar; compreender matéria do curso.
b) Praticar certas habilidades; aplicar noções aprendidas.
c) Coordenar, integrar, relacionar dados; desenvolver a capacidade de exprimir-se de modo pessoal a respeito da matéria.
d) Experimentar, pesquisar, construir, inventar (e denominar as técnicas adequadas para tanto).
e) Ampliar os horizontes do conhecimento escolar, tomar conhecimento da realidade extra-escolar.
f) Inter-relacionar as diferentes matérias do currículo.
O autor menciona os compromissos do educando para com a escola,
relatando os vários tipos de atividades dadas pelos professores desde os primeiros
dias de ingresso na vida estudantil.
Enfatiza a importância dos deveres de casa como instrumento de
memorização e fixação dos conteúdos trabalhados em sala de aula. Neste caso, os
exercícios de repetição ganham espaço para promover a assimilação, sem, contudo
determinados exercícios, não garantem a superação de suas dúvidas em relação a
eles.
Ao citar a expressão “exprimir de modo pessoal a respeito da matéria” está
apresentando um enfoque mais voltado ao desenvolvimento de capacidades que
auxiliam o aluno a compreender melhor o tema em questão. Coordenando,
integrando ou relacionando dados são atividades, que exigem exercício da
capacidade cognitiva do aluno, levando-o a pensar e, conseqüentemente, servirá de
ponto de ancoragem para novos conteúdos.
Submetendo o aluno ao exercício de sua intelectualidade em busca de
dados, a quantificação e a análise desses dados exigirão que ele domine uma série
de habilidades, desenvolvendo-se ainda mais e cumprindo o papel relevante das
lições de casa.
Ampliar os conhecimentos escolares é sem dúvida a mais importante função
dos deveres para casa. O universo restrito da sala de aula ganha novos espaços à
medida que o aluno começa a tomar conhecimento da realidade em que vive e a
relacioná-la com os conceitos aprendidos.
Favorecer a interdisciplinaridade é um dos pontos mais positivos. Ao
determinar uma tarefa, o professor poderá estar contemplando nela as várias
disciplinas interligadas. Observar uma planta e realizar um relatório pode, ao mesmo
tempo, desenvolver conceitos de Ciências (partes da planta), Língua Portuguesa
(relatar as partes da planta e suas especificidades) e Artes (desenhar a planta e
expor esse desenho em cartaz).
Podemos perceber que o processo de ensino deve ser considerado um
processo de educação, já que a assimilação dos conhecimentos, e o domínio das
capacidades e habilidades ganham sentido se levarem os alunos a determinadas
atitudes e convicções que orientem as suas atividades na escola e na vida.
No entanto, essa conscientização ainda não foi totalmente desencadeada
em nosso modelo escolar, como podemos atestar através do depoimento da
Os professores têm liberdade de escolha quanto ao passar ou não tarefas para casa. A minha orientação é que o professor que optar por adota-las deve ficar atento aos movimentos dos alunos, como se relacionam com elas (as tarefas). Todos percebem e eu também, que o aluno cumpridor das tarefas são muito responsáveis; tudo o que se pede a criança realiza, faz com prazer, ao contrário do que não cumpre com as tarefas de casa: são desatentos, pouco realizam, não gostam de cumprir o que o professor pede mesmo em sala de aula” (Informação verbal)19.
Constata-se no depoimento acima que o objetivo do dever para casa está
em incutir senso de responsabilidade nos alunos, embora já venha implícito no
discurso que não há que intervir muito junto à criança que não demonstra interesse.
Não existe uma forma única de educação, nem um único modelo também. A
escola não é o único lugar onde se aprende, mas é local para transformar-se,
mediando objetivos-conteúdos-métodos que assegurem o processo formativo entre
alunos, professor, matéria (conteúdos) e escola para formalizar a educação.
O processo de educação na escola consiste em ensinar e aprender, ações
indissociáveis no processo educativo. As tarefas de casa dão fortalecimento ao
andamento da aprendizagem com a qualidade do envolvimento familiar para a
comprovação do ato educacional. Para Libâneo (p. 192, 1994):
A tarefa para casa é um importante complemento didático para a consolidação, estreitamente ligada ao desenvolvimento das aulas. A tarefa para casa consiste de tarefas de aprendizagem realizadas fora do período escolar. Tanto quanto os exercícios de classe e as verificações parciais de aproveitamento, elas indicam ao professor as dificuldades dos alunos e as deficiências da estruturação didática do seu trabalho.
Vale ressaltar, como já referido no capítulo anterior, que essa prática oferece
a oportunidade de uma vinculação afetiva entre pais e filhos, pois o tempo que
ambos dispensam para cumprem as tarefas escolares são momentos de
inter-relação e de reciprocidade que fortalecem os laços afetivos.
A criança deve ser inteirada de suas responsabilidades escolares desde
cedo, como forma de criar condições e meios para inseri-la no estudo ativo, no
desenvolvimento intelectual, sobretudo na responsabilidade e no hábito de estudar,
como nos diz Libâneo (1994, p.201):
19
O objetivo do processo de ensino e de educação é que todas as crianças desenvolvam suas capacidades físicas e intelectuais, seu pensamento independente e criativo, tendo em vista tarefas teóricas e práticas, de modo que se preparem positivamente para a vida social.
Até o momento, deparamos-nos com duas questões importantes em relação
às tarefas de casa: a mobilização da criança para o estudo ativo e desenvolvimento
intelectual e a inter-relação com os pais. Essas questões nos levam à compreensão
de sua aplicação e amplitude, e provocam uma reflexão a respeito do pouco estudo
que é realizado sobre o tema, uma vez que a literatura sobre o assunto é muito
escassa.
As questões ligadas ao dever de casa encontram-se ainda num nível
bastante nebuloso, que não ultrapassa os resultados do ato em si. Entender o
porquê da relevância das tarefas extraclasse não é primordial ainda para pais,
alunos e professores. O que se considera neste momento é apenas a questão
metodológica, o fato do aluno levar para casa uma parte de seu universo escolar. As
questões ligadas à aprendizagem e ao desenvolvimento ainda não fazem parte do
entendimento desse importante aspecto da rotina escolar.
Os referenciais que se tem sobre tarefas de casa apresentam-se em
pequenas abordagens feitas por autores em trabalhos de linha pedagógica, pouco
contribuindo para elucidar um assunto que tem perturbado profundamente a rotina
escolar de pais e professores, que se deparam com crianças sem disposição para
cumprir seus compromissos escolares.
A falta de informação contribuiu para uma falha na percepção necessária a
todo ato pedagógico:
Do ponto de vista pedagógico há uma diferença essencial que não pode ser perdida de vista, o professor de um lado, e os alunos de outro, encontram-se em níveis diferentes de compreensão que poderíamos chamar de “síntese precária”, a compreensão dos alunos é de caráter sincrético. (Saviani, 1983, p.73).
Esta diferença entre professor e aluno contribui para a falta de empatia que
inevitavelmente ocorre em sala de aula e que atinge o momento do estudo
É preciso repensar a situação, pois as tarefas que são enviadas para casa,
na sua maioria são para refazer exercícios feitos na sala de aula, uma forma de
rever o conteúdo da aprendizagem, repetir para fixar ou para memorizar
conhecimento. Essa é uma receita que não funciona, segundo Libâneo (1994,
p.98): “O coroamento do processo de ensino se dá quando os alunos,
independentemente, podem utilizar os conhecimentos em situações diferentes
daquelas anteriormente trabalhadas”.
Libâneo aponta com clareza que essa diferença de conhecimento precisa
ser diminuída cada vez mais. E esse fenômeno precisa alcançar as tarefas para
casa, pois, à medida que os alunos conseguem avançar nos conhecimentos, as
tarefas extraclasse passam a ser um complemento e até uma abertura para novas
construções desse conhecimento.
Para estimular o desejo e o gosto pelos estudos o professor precisa criar
situações diferentes, para que os alunos se sintam atraídos pela magia do aprender,
de experimentar e vivenciar as novidades a cada atividade: “Lições que repetem
exercícios dados em classe ou que tratam de matéria ainda não explicada pelo
professor desmotivam o aluno” (OBÁ.., p. 8, 1999).
É imprescindível ainda que o professor conheça a realidade de seus alunos,
evitando cobrar temas que estão fora do alcance dos alunos. Local adequado para
estudo e materiais para pesquisa também fazem parte das necessidades para a
realização da tarefa extraclasse.
O dever de casa é, por excelência, elemento de fixação dos conteúdos
ministrados, mas também contribui para a formação da disciplina necessária ao
desenvolvimento de mentalidade voltada aos estudos. Ao professor cabe torná-lo
acessível. Como diz Libâneo (1994, p.89),
Ao avaliarmos a importância dos deveres de casa, precisamos ter clareza
das questões aí envolvidas: postura de professores, atitudes de alunos e
participação de pais ou responsáveis.
3.2 Quantidade X qualidade
Mais importante que o tempo gasto na lição de casa é o tipo de atividade
solicitada pelo professor. De nada vale o aluno permanecer durante horas realizando
um dever de casa se esse dever não auxiliar o aluno a construir novas
aprendizagens.
No entanto, a quantidade de dever de casa preocupa não somente
educadores como também os familiares. Muitos pais consideram que a tarefa serve
de argumento para manter os filhos em casa; outros acreditam que através da lição
de casa, o filho irá superar a defasagem de aprendizado que vem apresentando.
A quantidade e o tipo de lição de casa devem ser determinados pelo
professor de acordo com o nível dos alunos e com o planejamento, o que veremos
no capítulo seguinte.
Acumular tarefas também é um sério problema que ocorre em classes com
mais de um professor. É importante que os professores envolvidos no processo
estejam em sintonia com seu planejamento e possam controlar o fluxo diário de
atividades extraclasse. Quando não estão sobrecarregados, os alunos podem
trabalhar de forma mais produtiva.
Outro aspecto relevante em relação às tarefas de casa é o que diz respeito à
correção. O educando precisa ser conscientizado de que o momento de correção da
tarefa deve servir para avaliar seu entendimento sobre determinado assunto. Neste
sentido, o professor é o mediador e facilitador do processo. Segundo Hoffmann
(2001, p.115), “O tema ‘correção’ envolve o aprofundamento de muitos aspectos.
Mas, dentre todos, exige o princípio essencial de respeitar a criança em suas etapas
de desenvolvimento”.
A correção das tarefas de casa deve ajudar todas as crianças a crescer: os