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CAPÍTULO II- O Amor

1. Os quatro tipos de amor

1.4. Ágape –caridade

“Ágape” é o maior amor de todos, o amor divino. Trata-se do amor que Deus tem para com o Homem, bem representado na figura de Jesus, do amor que o Homem tem para com Deus e do amor que o Homem deve ter pelo seu semelhante. “O amor-ágape é uma noção colectiva.”58 Ou seja de todos os amores é o mais abrangente, por ser dirigido a todo o indivíduo, sem qualquer distinção. Amar a Deus e ao próximo, incluindo os nossos inimigos é o mandamento central e revolucionário do Cristianismo. Jesus Cristo é o expoente máximo deste amor. Todo o cristão é convidado a amar, tendo-o como exemplo. A caridade é, por isso, o núcleo do Cristianismo, como salienta Anders Nygren. Trata-se de um amor doador e incondicional. 59Doador por ser um amor que dá tudo sem esperar nada em troca. É um amor tão grandioso que chega a ser sacrificial. Como salienta Alan Soble: “ ágape é um amor que

56 Ibidem. 57 Ibidem, 6

58 NYGREN, Anders, Érôs et Agapè, Tome I, Les Éditions du Cerf, Paris, 2009, p. 37. 59 Cf. Ibidem, pp. 40-41.

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dá, um amor que faz até mesmo o supremo sacrifício em favor do bem-amado.”60 Incondicional, porque não precisa de nenhuma condição para que o amor exista. Mesmo que se erre, o amor manter-se-á. Ou seja, a caridade ama mesmo os que não são dignos, pelos seus atos, de amor e é capaz de dar a vida pelos outros, como fez Jesus Cristo. Tal como afirma Anders Nygren: “A qualidade, boa ou má, daqueles que são objeto do amor divino, não entra mais em linha de conta.”61 Além de ser incondicional é também um amor constante, porque não diminui nem aumenta, ama de forma linear, sem esmorecer, independentemente do mérito do amado. Como afirma Alan Soble: “o ágape de Deus é constante porque a natureza de Deus é amar e amar constantemente […] Deus ama constantemente e não como uma resposta por mérito;”62 Ou seja, o amor - caridade ama o outro, independentemente da sua virtude. Na mesma linha de pensamento, Anders Nygren refere: “Ágape é espontâneo e sem motivo.” 63 Trata-se de uma dádiva de Deus.

A tónica do amor encontra-se no amante e não no ser amado. Anders Nygren, a esse propósito, declara: “Dizer que Deus ama o homem, não é fazer um julgamento sobre o

homem, mas sobre Deus”.64 A caridade faz parte da natureza de Deus e por ser a Sua essência, Ele ama a todos do mesmo modo, mas distintamente. Ou seja, ama cada um por si, com as suas particularidades, de forma espontânea, sem motivo, sem limites e sem qualquer tipo de restrições. “Segundo o cristianismo, o amor motivado é humano, o amor espontâneo e “não motivado”, divino.”65 A caridade é amar para além das ações, boas ou más, do amado. “O amor de Deus não saberia estar limitado pela conduta do homem. A distinção entre dignos e indignos, justos e pecadores, não constitui um limite para o seu amor.”66 Esta capacidade de amar só é possível, porque se trata do amor do Criador. Deus ama todas as suas criaturas e é esse amor que as valoriza. O homem só tem valor, porque Deus lhe transmite esse valor, amando-o. Como salienta Anders Nygren: “Ágape não reconhece valores, cria-os. Ama e, deste modo, confere valor. O homem amado por Deus não tem nenhum valor em si mesmo; o que lhe dá um valor é o facto de que Deus o ama. Ágape é um princípio de criação de valor.”67 Nesse mesmo sentido, John A. Brentlinger afirma: “É dito que o amor de Deus pelo Homem não se baseia no valor do Homem, Deus não ama o Homem devido a um valor que os

60 SOBLE, Alan, ed., Eros, Agape and Philia, Readings in the Philosophy of Love, p. xvi. 61 NYGREN, Anders, Érôs et Agapè, Tome I, p. 73.

62SOBLE, Alan, ed., Eros, Agape and Philia, Readings in the Philosophy of Love, p. 43.

63NYGREN, Anders, "Agape and Eros", in SOBLE, Alan, ed., Eros, Agape and Philia, Readings in the

Philosophy of Love, Paragon House, New York, 1989, p. 90.

64 NYGREN, Anders, Érôs et Agapè, Tome I, p. 75. 65 Ibidem, p. 74.

66 Ibidem, p. 76. 67 Ibidem, p. 77.

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seres humanos possuem, o amor de Deus é concedido como uma dádiva, e os seres humanos têm valores devido a esta dádiva.” 68

O homem também tem amor. Deus quando criou o homem, também o fez com essa capacidade de amar, porque é um ser feito à Sua imagem. Mas Deus ama sempre primeiro. Deus ao amar o homem faz com que este, se tiver noção da grandeza do dom que lhe foi concedido pelo Criador, ame o seu Criador, mas também o seu próximo. O homem é convidado a dar-se, como salienta Anders Nygren: “A natureza absoluta do amor a que ele (o homem) é o objeto, leva-o à obrigação de dar-se.”69 A caridade tem assim, também as características de ser paciente e esperançosa. Ou seja, Deus continua à espera que o homem possa vir a amá-Lo e a amar o seu semelhante. A caridade aguarda que esse amor, que tem origem em Deus, seja correspondido.

É por isso que não há nenhum outro tipo de amor que possa superar este.Sendo o amor-caridade o mais abrangente é também o mais exigente. Este amor está fundamentado na fé, como salienta a Carta Encíclica Deus carita est: “ágape como expressão do amor fundado sobre a fé e por ela plasmado.”70 Todo o cristão, além de ser fruto deste amor de Deus, terá de agir com este amor no seu dia-a-dia, a exemplo de Cristo. Para o cristão, este amor que ama incondicionalmente, é tão altruísta e exigente que só através da força do Espírito Santo é que, efetivamente, se consegue vivenciá-lo e fazê-lo presente, porque a caridade provem de Deus, como é referido em Gal 5, 22-23 “22Mas o fruto do Espírito é: caridade, alegria, paz,

paciência, benignidade, bondade, fidelidade, 23mansidão, temperança. Contra estas coisas não

existe lei.”