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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O LIVRO DIDÁTICO: RECURSOS E POSSIBILIDADES

2.1.7 Água no Semiárido

A região semiárida do Brasil apresenta várias características como baixas precipitações, distribuição irregular de chuvas e elevadas taxas de evaporação, além das condições geológicas com o predomínio de formações cristalinas que dificultam um maior armazenamento de água no subsolo.

De acordo com Ab’Saber (1992, p. 10), os aspectos que dão similaridade as regiões semiáridas são sempre de origem climática, hídrica e fitogeográfica, baixos níveis de umidade, escassez de chuvas anuais, irregularidade no ritmo de precipitações ao longo dos anos, prolongamento dos períodos de carência hídrica, solos problemáticos tanto do ponto de vista físico quanto do geoquímico (solos salinos, solos carbonáticos) e ausência de rios perenes, sobretudo no que se refere às drenagens autóctones.

Segundo o Grupo de Trabalho Interministerial, formado em 2004 pelo Ministério do Meio Ambiente – MMA e pelo Ministério da Integração Nacional – MI, atualmente o semiárido brasileiro compreende 969.589,4 km², 1.133 municípios e uma população de 20.858.264 pessoas. Este grupo baseou-se em três critérios técnicos para formalizar esta delimitação:

a) precipitação pluviométrica média anual inferior a 800 milímetros; b) índice de aridez de até 0,5, calculado pelo balanço hídrico, que relaciona a precipitação e a evapotranspiração potencial, no período entre 1961 e 90; c) risco de seca maior que 60% tomando-se por base o período entre 1970 e 1990. (SANTANA, 2007, p.24).

Na descrição das condições climáticas encontradas na região Nordeste, em especial no semiárido, (SILVA 2010) afirma que a variabilidade interanual da precipitação é, em muitos casos, decorrentes de fenômenos meteorológicos de grande escala, como o El Niño. No entanto, há anos em que se verifica a ocorrência de secas sem que se tenha o registro deste fenômeno. Podem assim, estar associadas também aos padrões de temperatura da superfície do mar (TSM) sobre os oceanos tropicais, os quais afetam a posição e a intensidade da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) sobre o Oceano Atlântico a qual influencia na ocorrência das precipitações, em sua quantidade, intensidade e frequência.

Em relação aos recursos hídricos, segundo (SILVA 2010) a irregularidade e os baixos índices das precipitações convergem para as baixas taxas de escoamento superficial, tornando essenciais a construção de açudes e a perfuração de poços, a fim de possibilitar a utilização da água para consumo humano e animal, bem como para a produção de alimentos. Entretanto, as águas subterrâneas são limitadas, devido ao fato de 70% do semiárido estar localizado sob embasamento geológico cristalino, fazendo com que os solos apresentem pequena espessura e, portanto baixo potencial de armazenamento de recursos hídricos.

Destacando a questão da água no semiárido brasileiro, as principais características inerentes ao Nordeste Semiárido para Vieira (2000, p.11) são:

Rios intermitentes; Secas periódicas e cheias frequentes; Uso predominantemente da água para abastecimento humano e agropecuário; Águas subterrâneas limitadas, em razão da formação cristalina que abrange cerca de 70% do semiárido; Precipitação e escoamento superficial pequenos, se comparados ao restante do Brasil; enquanto em todo o país o escoamento específico é de 21l/s/km2, no nordeste é de apenas 4 l/s/km2; A eficiência hidrológica dos reservatórios é extremamente baixa, em função das altas taxas de evaporação; a disponibilidade efetiva anual, oriunda de reservatórios, é de cerca de 1/5 de sua capacidade de acumulação; Conflitos de domínio, entre União e estados, em trechos de rios perenizados por reservatórios públicos; Necessidade do uso conjunto de águas superficiais e subterrâneas, nas aluviões que se estendem ao longo de rios providos de reservatórios de montante; Existência de ampla, embora insuficiente, infraestrutura hídrica construída ao longo dos anos, com reservatórios de todos os tamanhos, públicos e privados, e poços perfurados no sedimento e no cristalino; há problemas de segurança, manutenção e operação (VIEIRA, 2000, p.11).

O semiárido brasileiro, historicamente, tem se caracterizado como sendo uma região com graves indicadores sociais, e apresenta um número ainda grande de municípios com baixo Índice de Desenvolvimento Humano – IDH. Faz-se necessário entender a complexidade deste território no que se referem aos desafios ambientais, socioculturais, políticos e econômicos, de modo que seja superada a vulnerabilidade às secas, e que a sociedade que habita esta complexa região possa encontrar um caminho viável e sustentável de desenvolvimento.

O trabalho de (MELO et al 2008) ressalta que o semiárido brasileiro é uma das regiões semiáridas mais povoadas entre todas as terras secas existentes nos trópicos ou entre os trópicos, sendo a sua população superior a vários países da América Latina e seu território superando em quilômetros quadrados vários países da Europa. Estes números reforçam a complexidade geopolítica da região e o desafio de conviver com as peculiaridades climáticas

deste local. (MELO et al, 2008) ainda ressalta que, o peso da deficiência das precipitações no semiárido brasileiro é acentuado não apenas por causas físicas, mas sim por questões socioeconômicas e políticas.

Estudos da EMBRAPA Semiárido indicam que o maior desafio a ser enfrentado com relação à água para consumo das famílias e dos animais e para a produção de alimentos, talvez não seja a escassez de chuva, mas uma gestão integrada e compartilhada com os diferentes usuários dos recursos hídricos. Não é a falta de chuva a responsável pela oferta insuficiente de água na região, mas a má distribuição, associada a uma alta taxa de evapotranspiração, que resultam no fenômeno da seca (SÁ & SILVA, 2010). Neste sentido, a expressão “conviver com o semiárido” em oposição ao “combate à seca” tem significado uma mudança de abordagem do problema, o que proporciona a criação de ações, projetos e programas, com alcances aparentemente simples, mas de grande impacto nos indicadores da região.

As políticas públicas desenvolvidas em todo o Brasil visam a diminuição dos vários entraves ao desenvolvimento socioeconômico brasileiro. Porém na região Nordeste os indicadores sociais desfavoráveis, o elevado nível de desemprego, a baixa produtividade agrícola além e principalmente dos problemas relacionados a seca colocaram essa região na pauta das Políticas Públicas nacionais.

O semiárido brasileiro foi alvo de políticas públicas que na maioria das vezes não atendia as necessidades reais. Várias foram às políticas de combate a seca nessa região, algumas lograram êxodo, outras atenderam a uma minoria e outras foram desenvolvidas, porém não de acordo com as especificidades e características da região. Nessa região as diversas intervenções foram de caráter centralizador e fragmentado. No caso do setor hídrico, surgem a partir de premissas unilaterais e para atender na maioria das vezes a interesses pontuais, particulares, quer seja na construção de barragens, em projetos de irrigação, perfuração de poços ou construção de adutoras.

A seca, fenômeno natural que se tornou a imagem da região Nordeste para o resto do país, sempre foi discutida a partir da premissa do combate, de eliminar o problema, mas por ser um fenômeno natural não atentaram para o discurso da convivência e da busca de alternativas que amenizem seus impactos sejam ambientais, sociais e econômicos. Atrelado aos discursos políticos das oligarquias regionais a seca balizou diversos programas a curto prazo como as frentes de trabalho que geraram de forma emergencial renda as famílias afetadas pelo problema. Medidas a longo prazo como a Política de açudagem, infraestrutura hídrica e perfuração de poços. Toda essa política foi para (CAVALCANTI 1981, p 77) “um

trabalho predominantemente inócuo, porque reteve população sem gerar um simultâneo fortalecimento da economia de alimentos – agravando o impacto social da seca”. Esse quadro descreve bem o problema da seca e da falta de políticas apropriadas ao enfrentamento dos seus efeitos na de cada de 1970. (DUQUE, 1974 apud CAVALCANTI 1981. p, 78) retrata “na defesa contra as secas o Governo se lembrou das barragens, das estradas, etc., mas esqueceu do homem e da sua preparação para uma existência de luta no meio seco”. Outro aspecto relevante destacado por (CAVALCANTI, 1981, p.101) “as políticas concebidas nesse contexto ou tem se distanciado dos diagnósticos que as antecederam, ou simplesmente tem partido de uma compreensão defeituosa da problemática”. Nesse contexto as políticas no semiárido brasileiro priorizaram o fornecimento de linhas de crédito, reflorestamento a exemplo do plantio de algaroba (prosopis juliflora), infra-estrutura e a política de açudagem. De acordo com (TORRES; SILVA & LIMA, 2006, p. 22) “no Semiárido do nordeste brasileiro, durante décadas o problema de acesso à água, tinha como justificativa principal o fator climático da região, com a evolução da ciência e consequentemente o desenvolvimento de novas técnicas, passaram a existir possibilidades de extrair ou represar a água, então, o problema da falta de água passa a ser também de natureza política”. Para Garjulli (2003).

Na região semiárida o acesso à água para fins produtivos, sempre esteve muito vinculado à propriedade da terra. A demanda da população pobre manteve-se, ao longo dos anos, circunscrita ao atendimento de água para consumo humano, quer seja nos períodos de seca, através de carros pipa e perfuração de poços ou, de forma mais permanente, com a construção de pequenas barragens, adutoras e cisternas. (GARJULLI 2003, p. 3)

Os índices pluviométricos tem sido um dos fatores predominantes para secas frequentes e os períodos de estiagem que predominam nessa região. No entanto essas características servem de artifícios para a reafirmação de poder como afirma POLLETO (2001):

Na verdade, a seca foi instrumentalizada pelas elites regionais como um negócio, como uma oportunidade para atrair recursos federais com juros subsidiados ou doados, bem como para organizar, com, frentes de trabalho para realizar obras que beneficiavam suas fazendas. É isso que ficou conhecido como indústria da seca. Em vez de buscar um conhecimento mais profundo das condições ecológicas da região por políticas adequadas a um desenvolvimento favorável a todas as pessoas, a seca serviu como moeda de troca das elites com os detentores de responsabilidades governamentais. Com isso, os períodos de seca se transformaram em oportunidades de maior enriquecimento e domínio sobre a população. Para os que detinham pequenos lotes de terra, e especialmente para os que trabalhavam em terra alheia pagando com parte da produção, os períodos de seca significavam

insegurança total, miséria. Abandonados e muito explorados, tinham a pobreza como companheira permanente. A seca, por isso, forçava seu êxodo, em busca desesperada por oportunidades de sobrevivência. Nada melhor para os latifundiários: era oportunidade para apossar-se de mais terras praticamente de graça. (POLLETO, 2001, p.14).

Nesse sentido Coutinho (2010, p. 40) destaca que os problemas de abastecimento, gestão e acesso à água não estão apenas relacionados aos fatores morfoclimáticos, mas está diretamente voltada para o tipo de modelo que foi estabelecido desde os princípios da colonização, modelo baseado nas grandes estruturas fundiárias, na superexploração da mão de obra, e dos recursos naturais, sustentando pelo mercado explorador e enraizado, principalmente nas concepções políticas, que associaram por séculos, à seca como principal fator para o não desenvolvimento da região.

As características físicas e socioeconômicas impactam de forma negativa no contexto educacional do semiárido brasileiro, de acordo com o relatório Situação da Infância e da Adolescência Brasileira 2009 – O Direito de Aprender, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Semiárido é a região com maior dificuldade na formação educacional de crianças e jovens. Segundo o estudo, essa região concentra metade da população de analfabetos acima de 15 anos e apresenta altos percentuais de evasão escolar.

Segundo o coordenador Naidison Baptista da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA, 2008) um dos fatores que levam os alunos principalmente os residentes na zona rural a abandonarem os estudos é a falta de interesse na escola, cujo currículo não leva em consideração a realidade dos estudantes. Muitas escolas acabam contribuindo para a construção da imagem do Semiárido como um lugar de atraso e de falta de oportunidades.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) prevê que as instituições de ensino adaptem conteúdos curriculares e metodologias aplicadas às reais necessidades e interesses dos estudantes e às peculiaridades da região. Ou seja, estudar conteúdos relacionados ao Semiárido é um direito dos alunos que vivem nessa região.