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Neste mesmo dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! A saber, primeiramente de um grande monte, muito alto e redondo; e de outras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos; ao qual monte alto o capitão pôs o nome de O Monte Pascoal e à terra A Terra de Vera Cruz!

Carta de Pero Vaz de Caminha, Primeiro de maio de 1500.

A Resex do Corumbau localiza-se ao Sul do estado da Bahia (Figura 1), entre os municípios de Porto Seguro (ao norte) e Prado (ao sul), compreendendo o bioma da Zona Costeira Marinha. Situa-se em uma área de 98.174 hectares em águas territoriais brasileiras, entre os pontos geográficos: 16° 43’ 20,53”S e 39° 07’ 11,95”W (Ponta do Jacumã); 16° 43’ 20,53”S e 38° 58’ 51,60”W (Oceano Atlântico); 17° 13’ 28,96”S e 39° 04’ 28,50”W (Oceano Atlântico); 17° 13’ 29,00”S e 39° 12’ 51,63”W (Rio das Ostras).

A região costeira adjacente é um mosaico de ambientes margeados por remanescentes de Mata Atlântica, falésias19 do tipo “Barreiras”, restingas, cordões de dunas frontais, praias arenosas, manguezais, fundos de algas dentre bancos recifais20.

Esta região é classificada como “Litoral Leste” da costa brasileira (Ab’Saber, 2001), compreendendo em “um complexo costeiro com arquipélagos (costas desvinculadas), passando a feixe de restingas que encarceram lagunas de contorno irregular (drenagens na retroterra em um modelo de águas semitrançadas), onde sucessivas barras de pequenos cursos d’água e belas praias arenosas compõem a linha de costa e

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Falésia: termo usado indistintamente para designar formas de relevo litorâneo abruptas ou escarpadas... Nas áreas de tabuleiros da costa oriental do nordeste-leste, as falésias foram talhadas em tempos subatuais, existindo hoje, ordinariamente, transformadas em sinuosas falésias fósseis que recebem o nome popular de barreiras regionais. O trabalho do mar nas falésias se faz pelo solapamento da base (Ab’Saber, 2001).

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Recifes em barreiras paralelas, sob a forma de paleopraias de arenitos, ocasionalmente entremeados por setores biogênicos coralígenos. As rochas que mantêm o recife arenítico têm sido designadas por beach rock, o que caracteriza como herança de paleopraias subatuais litificadas. Muitos autores têm identificado na paisagem dos recifes uma muralha rara de arenitos ou de setores coralígenos alinhados que na maré baixa afloram parcialmente, enquanto nas marés altas se transformam em faixas de arrebentação, as quais atenuam a dinâmica das praias atuais, formando alongadas piscinas naturais, encarceradas entre a linha de costa e o bordo interno ligeramente escarpado dos recifes.

estão presentes tabuleiros21 ondulados com florestas contínuas até a borda leste do Planalto Sul-Baiano. Na Costa do Descobrimento, ocorrem barras graciosas de rios provenientes do Planalto Sul-Baiano. São imensas as potencialidades turísticas desse macrossetor da costa tropical atlântica do país”.

Figura 1: Localização geográfica e delimitação da Reserva Extrativista Marinha da Ponta do Corumbau (à esquerda) e mapeamento da área recifal (à direita), realizado por MMA/SBF (2003).

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Tabuleiro: forma topográfica de terreno que se assemelha a planaltos, terminando geralmente de forma abrupta. Paisagem da topografia plana, sedimentar e de baixa altitude que também aparece na costa da Bahia e Espírito Santo (Ab’Saber, 2001).

Reserva Extrativista Marinha da Ponta do Corumbau Reserva Extrativista Marinha da Ponta do Corumbau

Estudos apontam que praias imediatamente a norte de Porto Seguro e praias aproximadamente 10 km a sul da Ponta do Corumbau possuem inclinação moderada a forte, são compostas por areia grossa e apresentam uma pequena largura da face da praia (Reimão-Silva et. al., 2001). Já, as praias localizadas na porção norte da Ponta do Corumbau são protegidas da ação das ondas grandes vindas de SE e SSE, devido à presença dos recifes de coral (Recife Itacolomis), desta forma, são compostas por areias grossas a muito grossas, apresentam inclinação forte à moderada e uma pequena largura da face da praia, compatíveis com o regime de baixa energia das ondas. Os autores ainda constataram a ocorrência de eventos de erosão costeira, nessas praias, em diferentes épocas do ano.

O Recife Itacolomis, posicionado à frente da Ponta do Corumbau, é um importante banco de recifes coralíneos, que abriga variedade de estoques pesqueiros em recuperação (Francini-Filho & Moura, 2004). A área recifal total mapeada na Resex do Corumbau compreende cerca de 1.846,11 hectares (MMA/SBF, 2003).

Esta formação coralínea encontrada na área da Resex é uma extensão do complexo recifal de Abrolhos, chamado “Banco dos Abrolhos”, o qual é uma área rasa com cerca de 32.000 km2 ao largo da costa sul da Bahia, onde ocorrem diversas espécies endêmicas de corais, crustáceos e moluscos. Neste local foi criado o primeiro Parque Nacional Marinho do Brasil, englobando as ilhas que compõem o Arquipélago dos Abrolhos, locais de nidificação das mais importantes colônias de aves marinhas do país e o principal local de reprodução das Baleias Jubarte (Megaptera novaeangliae) ao Sul do Oceano Atlântico (IBAMA/CNPT & CI, 2002). Esta região de Abrolhos é considerada a mais piscosa da Bahia, com capturas mensais por pescador chegando a 639,77 kg/mês. Os recursos atualmente explorados são peixes (principalmente da família Lutjanidae) e crustáceos marinhos, principalmente o camarão sete-barbas (Xiphopenaeus kroyeri) (IBAMA/CNPT & CI, 2002).

Como indicado pelo Plano de Ação Federal para a Zona Costeira do Brasil, a análise do “Macrodiagnóstico da Zona Costeira do Brasil na Escala da União”, (PNMA, 1996 in MMA, 1998), reconhece a Costa do Descobrimento e Costa das Baleias (BA), como áreas prioritárias para conservação da biodiversidade marinha no Oceano Atlântico. Esta foi declarada pelo Ministério do Meio Ambiente, em 2002, área de Extrema Importância Biológica, com base no “Workshop para Definição de Áreas

Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade Costeira e Marinha do Brasil” (MMA/SIP/DEMAI, 1998).

Até pouco antes da criação da Resex do Corumbau, no ano de 1999, o município de Porto Seguro possuía duas Unidades de Conservação Federais, duas Estaduais, duas Municipais e oito reservas Indígenas, totalmente ou parcialmente inseridas no município. Já o município de Prado apresentava apenas uma Unidade de Conservação Federal totalmente inserida no município e uma Reserva Indígena parcialmente instalada no município (Apêndice 1 - Tabela 1).

Das Unidades de Conservação que intersectam área de entorno com a área de entorno da Resex do Corumbau, estão: a Área de Proteção Ambiental Caraíva – Trancoso, o Parque Nacional do Monte Pascoal e o Parque Nacional do Descobrimento. Estes dois últimos ainda integram o Sítio do Patrimônio Mundial Natural, área reconhecida pela UNESCO como “Costa do Descobrimento - Reservas de Mata Atlântica”, uma área 111.930 hectares localizada entre os estado da Bahia e do Espírito Santo, que abrangendo mais outras seis áreas protegidas que possuem importantíssimos remanescentes de Mata Atlântica (MMA, 2005).

A região é de contrastes, concentrando as áreas mais preservadas do país e, no sentido oposto, também as mais degradadas, uma vez que o município de Porto Seguro, possui apenas 25% de floresta remanescente (Glória, 2005). Para fortalecer as ações preservacionistas, a regional do IBAMA em Eunápolis defende a criação de dez parques nacionais, a consolidação das atuais unidades de conservação, fomento ao crescimento dos remanescentes, implantação de corredores ecológicos e zoneamento econômico-ecológico da região (Glória, op. cit.).

De acordo com o Art. 26 do SNUC: “Quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional”.

Neste contexto, ainda devem ser levados em consideração a existência de diversos conflitos fundiários, com relação à crescente população de “sem-terras” e a secular questão indígena. Sampaio (2000) relata que, “quando o governo federal implantou em 1961 o Parque Nacional de Monte Pascoal, certamente não imaginou que

aquelas centenas de ”caboclos“ que pretendeu indenizar, e que viviam na isolada povoação de Barra Velha no interior do novo Parque, iriam se tornar em menos de duas gerações, o povo indígena mais numeroso da Bahia, um dos mais numerosos do Nordeste capaz de retomar, quase quatro décadas depois, o seu território esbulhado com a implantação do Parque, questionando a própria constitucionalidade dessa Unidade de Conservação ilegitimamente implantada sobre o território de tradicional ocupação do povo Pataxó”.

A questão fundiária do povo Pataxó ficou evidente na mídia na ocasião do “Quinto Centenário do Descobrimento do Brasil”, que desencadeou o movimento de “Retomada” das terras indígenas. Muito antes disto, o Ministério da Cultura no ano de 1994, havia lançado um projeto denominado “Museu Aberto do Descobrimento” (Made): “um conjunto de intervenções paisagísticas, arquitetônicas e fundiárias espalhadas por toda a Costa do Descobrimento, de sentidos e interesses duvidosos...” (Sampaio, 2000), que desapropriaria a terra indígena, a favor de empreendimentos turísticos. Em 1997, evidenciando a impossibilidade de executar tal projeto às vistas dos preparativos para as comemorações para o ano 2000, o Ministério da Cultura constatou que, melhor seria construir o memorial sobre a terra indígena, negociando-o com a comunidade detentora do usufruto exclusivo sobre ela. O povo Pataxó negocia até hoje a demarcação de suas terras esperam ansiosos pelo Museu Aberto do Descobrimento.

Fato ainda relevante à questão fundiária indígena é o crescimento demográfico de 13,6% da população indígena do Estado da Bahia, verificado no período de 1994 a 2000 pelo Departamento de Antropologia da Universidade Federal da Bahia, totalizando um número de 25 mil índios distribuídos em cerca de 12 tribos (Romero, 2005).

Ambos os municípios estudados, Porto Seguro e Prado, são classificados na Mesorregião do Sul Baiano e à Microrregião de Porto Seguro, sendo que o município de Porto Seguro teve sua data de instalação no ano de 1.534 e possui área da unidade territorial de 2.409 km²; e o município de Prado foi instalado no ano de 1.755 e possui área territorial de 1.665 km² (Ministério das Cidades, 2005). Ambos municípios possuem formulada a Agenda 21, porém nenhum destes possuem Plano Diretor, os quais se encontram em um processo lento de criação. De acordo com Glória (2005), o zoneamento urbano e rural de Porto Seguro é fundamental para inibir a ocupação em áreas de preservação: “O conjunto de favelas Baianão é um exemplo da ausência de planejamento urbano que surgiu da invasão, em área de mata, por pessoas atraídas

para trabalhar no setor do turismo e hoje, é uma pequena cidade onde vive quase a metade da população de Porto Seguro”.

De acordo com o Censo Demográfico realizado no ano 2000 (IBGE, 2005), o município de Porto Seguro apresentou cerca de 96.000 residentes e uma densidade demográfica de 39,6 habitantes/km². Já o município de Prado apresentou 26.500 residentes e densidade demográfica de 15,8 habitantes/km². Estimativas realizadas para o ano de 2004 apontaram uma taxa média geométrica de crescimento de 7,5 e 1,9 e uma população de 127.000 e 28.500 residentes, respectivamente para os municípios de Porto Seguro e Prado (Apêndice 1 - Tabela 2). Ainda pode-se verificar um histórico de crescente urbanização nestes municípios, no qual observa-se uma inversão de uma situação domiciliar predominantemente rural, do Censo realizado em 1970, para uma situação predominantemente urbana, do Censo em 2000. Neste ano, foi constatada uma taxa de urbanização de 83,18% e 53,47% respectivamente para os municípios de Porto Seguro e Prado.

O IDH-M22 apresentado para no ano 2000 (PNUD, 2005), indicou condição de desenvolvimento humano intermediário, 0,699 e 0,665 respectivamente, para os municípios de Porto Seguro e Prado. Observa-se um crescimento histórico deste indicador (Apêndice 1 - Tabela 2), o qual, na década de 70, determinou uma condição muito baixa de desenvolvimento humano. O município de Porto Seguro apresentou para o ano 2000 (IBGE, 2005), uma taxa de alfabetização de 82,6% e Prado apresentou uma taxa de 74,2% (Apêndice 1 -Tabela 3).

O número total de domicílios contabilizados pelo Censo chegou a 23.905 e 6.122, para Porto Seguro e Prado respectivamente, sendo que, apenas 5.687 e 182 são atendidos pela rede geral de coleta de esgoto, 12.752 e 3.384 abastecidos com água

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O Índice de Desenvolvimento Humano, além de computar o PIB per capita e corrigi-lo pelo poder de compra da moeda de cada país, também leva em consideração componentes de longevidade e educação. Para aferir a longevidade, o indicador utiliza números de expectativa de vida ao nascer. O item educação é avaliado pelo índice de analfabetismo e pela taxa de matrícula em todos os níveis de ensino. A renda é mensurada pelo PIB per capita, em dólar PPC (paridade do poder de compra), que elimina as diferenças de custo de vida entre os países (PNUD, 2005). Essas três dimensões têm a mesma importância no índice, que varia de zero (nenhum desenvolvimento humano) a um (desenvolvimento humano total): IDH até 0,499 = condição de desenvolvimento humano baixo; entre 0,500 e 0,799 = médio; e índices maiores que 0,800 são considerados de desenvolvimento humano alto. O IDH-Municipal (IDH-M), embora meça os mesmos fenômenos - educação, longevidade e renda, os indicadores levados em conta não são mais adequados para avaliar as condições de núcleos sociais menores (SESPA, 2005).

através da rede pública geral e 19.066 e 3.387 domicílios, recebem coleta urbana de lixo (Apêndice 1 - Tabela 4).

O PIB per capita em 2002 foi de 2.500 e 6.109 para os municípios de Porto Seguro e Prado, respectivamente. Em Porto Seguro, o Produto Interno Bruto de 2002 (IBGE, 2005) recebeu o maior valor adicionado aos Serviços, gerando cerca de R$ 182 milhões, enquanto que em Prado o maior valor adicionado foi da agropecuária com R$ 115 milhões (Apêndice 1 - Tabela 5).

A importância da economia oriunda dos serviços no município de Porto Seguro, pode ser verificada através do número de vôos internacionais que, no primeiro semestre de 2004, apresentou um crescimento total de 367,6% em relação ao mesmo período de 2003 (Jornal da Mídia, 2004), apontando a preferência, cada vez mais crescente, dos turistas estrangeiros pelo segundo principal destino turístico da Bahia, localizado na Costa do Descobrimento. De acordo com a administradora do Aeroporto Internacional de Porto Seguro, o desembarque de turistas estrangeiros, no período de 2003 a 2004, elevou-se de 2.474 para 17.262, o que corresponde a 597,7% de aumento, enquanto os desembarques nacionais subiram de 100.756 passageiros para 130.623, correspondendo a 29,6% de aumento (Jornal da Mídia, op. cit).

De acordo com a Rede de Gestão Compartilhada para o Desenvolvimento do Arranjo Produtivo do Turismo na Costa do Descobrimento (2004), a Costa do Descobrimento, na década de 90, foi alvo de elevados investimentos em Infra-estrutura num total de 120 milhões de dólares concedidos pelo PRODETUR-BA e financiados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento.