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O âmbito ou núcleo de proteção da liberdade profissional é o direito protegido, a parcela da realidade objeto da proteção constitucional46, aquilo que a norma de direito fundamental garante prima facie, ou seja, sem levar em consideração as possíveis restrições47.

43“No mais, o equívoco não está nas rígidas exigências para o exercício da advocacia, antes

o contrário. Caberia ao legislador impor a obrigatoriedade de exame para o exercício daquela outra nobre atividade, o que estaria em total consonância com o texto constitucional. O mesmo vale para as demais carreiras que representam riscos à

coletividade, mas dispensam o teste de conhecimentos mínimos.” (Min. Marco Aurélio no recurso referido).

44BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 503918/MT, 2ª Turma, Rel. Min.

Franciulli Netto, julgamento em 24/06/2003, DJ de 08/09/2003. Disponível em:

<http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=503918&processo=503918&&tipo_ visualizacao=RESUMO&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true.>. Acesso em: 16 jun. 2018.

45BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 414.426, Acórdão, Min. Ellen Gracie, Brasília, DF,

10.10.2011. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=6242682>. Acesso em: 06 abr. 2017.

46MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade.

São Paulo: Celso Bastos Editor, 1998, p. 150-151.

47ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução: Virgílio Afonso da Silva.

Gilmar Ferreira Mendes48 ensina que:

A definição do âmbito de proteção configura pressuposto primário para o desenvolvimento d e qualquer direito fundamental. O exercício dos direitos individuais pode dar ensejo, muitas vezes, a uma séria de conflitos com outros direitos constitucionalmente protegidos. Daí fazer-se mister a definição do âmbito ou núcleo de proteção (Schutzbereich) e, se for o caso, a fixação precisa das restrições ou das limitações a esses direitos.

Um precedente do STF, excluindo o trottoir da liberdade de locomoção para as prostitutas, esclarece melhor49: “não há direito constitucionalmente assegurado à prática do trottoir, a qual é contrária aos bons costumes, ofensiva da moralidade pública e fonte de constrangimento para transeuntes e residentes”.

É a preocupação elementar da dogmática no sentido de saber se o direito50 que se julga limitado ou restringido está de fato inserido na categoria do direito fundamental trabalhado, na perspectiva de que, do possível âmbito de proteção inicialmente apresentado, se exclua, desde logo, toda ou qualquer hipótese fática que não permita o estabelecimento de uma mínima conexão com o provável conteúdo do direito fundamental em foco.51

Há diferenças conceituais entre as atividades previstas no dispositivo estudado: trabalho, ofício ou profissão, sendo que estas últimas são sinônimas.

Segundo Leonardo Martins, “ofício ou profissão referem-se a uma atividade à qual o titular do direito se dedica de forma duradoura para a consecução dos meios da própria subsistência econômica,”52ao passo que ao “termo trabalho falta a característica “forma duradoura”, pois o termo indica que deverá ser protegida até

48MENDES, Gilmar Ferreira. Hermenêutica Constitucional e Direitos Fundamentais.

Brasília: Brasília Jurídica. 2002, p. 210.

49BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Ordinário nº 59.104, Acórdão, Min. Moreira

Alves, Brasília, DF, 3.11.1981. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000024152&base=base Acordaos>. Acesso em: 06 abr. 2017.

50SILVA FILHO, Dermeval Rocha da. Anotações sobre Limites e Restrições aos Direitos

Fundamentais na Constituição Federal de 1988. Revista da AGU. Brasília, n. 35, p. 126- 142, jan-março de 2013.

51FREITAS. Luiz Fernando Calil. Direitos Fundamentais Limites e Restrições. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p.225.

52MARTINS, Leonardo. Liberdade e Estado Constitucional. Leitura Jurídico-Dogmática de

uma Complexa Relação a partir da Teoria Liberal dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2012, p. 161.

mesmo uma atividade singular, praticada uma única vez, com a finalidade de se adquirir certa remuneração.53

E intentando um critério para sindicar quando um trabalho, ofício ou profissão não estão abarcados no âmbito protetor da norma, o Prof. Martins pontua que o trabalho ilícito, que se apresenta por um atividade singular que se choca com outros bens constitucionais, não faz parte da área de proteção do tipo normativo previsto no art. 5º, XIII, da CF, o mesmo ocorrendo com o ofício ou profissão que não se amolda ao plexo de atividades coordenadas que somente no seu conjunto podem conduzir ao exercício profissional.

Para ilustrar este último caso, cita o exemplo do advogado que exerce a profissão por um feixe de atividades, como a elaboração de petições, recursos e participação de audiências, circunstâncias conhecidas e atribuídas a uma série de práticas que evidenciam o exercício da advocacia, arrematando o raciocínio no sentido de que “se a proteção se refere ao mencionado feixe coordenado, significa que caem fora da área de proteção [...] do art. 5º, XIII, da CF [...] as atividades individualizadas que se chocarem contra o ordenamento jurídico,54” e que, por serem proibidas, não gozam em seu conjunto do amparo estatal.

E finaliza, dizendo que “não se trata de deixar de proteger a “profissão do assaltante profissional de bancos” ou do “traficante de substâncias entorpecentes”, mas de suas atividades individualizadas que são proibidas e que, por isso, conjuntamente também não podem ser protegidas55”enquanto profissão.

Portanto, só por aqui já se vê que a expressão “qualquer” constante do enunciado legislativo há de ser relativizada, dado que não é todo trabalho, ofício ou profissão que são livres e merecem a proteção constitucional.

De outro lado, essa definição da área de proteção e do próprio conteúdo normativo do direito é muito importante, uma vez que em determinadas situações, como veremos, os direitos fundamentais trazem consigo, sim, alguns parâmetros de proteção (pressupostos fáticos e jurídicos), algo que se permite enxergar a partir de sua ínsita estrutura dogmática, não sendo, portanto, direitos formais e sem conteúdo.

José Afonso da Silva, ao comentar o inciso estudado, ensina que:

53MARTINS, op. cit., p. 161. 54MARTINS, op. cit., p. 162. 55MARTINS, op. cit., p. 162.

[...] o dispositivo confere liberdade de escolha de trabalho, de ofício e de profissão, de acordo com as propensões de cada pessoa e na medida em que a sorte e o esforço próprio possam romper as barreiras que se antepõem à maioria do povo. [...] Como o princípio é o da liberdade, a eficácia e a aplicabilidade da norma são amplas quando não exista lei que estatua condições ou qualificações especiais para o exercício do ofício ou profissão ou acessibilidade à função pública. Vale dizer, não são as leis mencionadas que dão eficácia e aplicabilidade à norma. Não se trata de direito legal, direito decorrente da lei mencionada, mas de direito constitucional [...]56

Enfim, a norma jusfundamental garante, a priori sem indeterminação semântica, que o mercado de trabalho pode ser diretamente acessado pelo cidadão, sendo livre para todas as profissões e ofícios, permitindo a Constituição, em caráter excepcional, a imposição de certos limites ao seu exercício apenas nos termos que ela mesma estabelece, que é o atendimento das qualificações profissionais. Esses termos, se de fato restritos ou amplos, serão analisados oportunamente.

1.6 A LIBERDADE PROFISSIONAL PREVISTA NO ART. 5º, XIII, COMO REGRA E