• Nenhum resultado encontrado

A molhabilidade de um determinado material pode ser avaliada através da medição do ângulo de contacto, 𝜃, definido como o ângulo formado entre a superfície sólida e a tangente à superfície do líquido na linha de contacto com o sólido – Figura 15.

Figura 15. Definição do ângulo de contacto, θ, de um líquido sobre uma superfície lisa.

Através do valor do ângulo de contacto é possível avaliar diretamente o grau de molhabilidade. A molhabilidade é considerada boa quando se verificam ângulos de contacto inferiores a 90º e considerada má para valores superiores a 90º. Nas situações limite 0º e 180º, considera-se molhabilidade completa e molhabilidade nula, respetivamente – Figura 16 – [2] [52].

Figura 16. Representação do formato da gota em cada regime de molhabilidade: (1) Molhabilidade completa; (2) Molhabilidade boa; (3) Molhabilidade má; (4) Molhabilidade nula.

A disposição da gota sobre a superfície depende essencialmente da relação entre forças adesivas (responsáveis pelo espalhamento do líquido) e as forças coesivas (responsáveis por manter a gota coesa e com a superfície mínima) [2]. Por outras palavras, a molhabilidade é controlada pelas energias de superfície, 𝛾$%, 𝛾$' e 𝛾'%. Assim, o ângulo de contacto resulta do equilíbrio termodinâmico

existente na interface sólido-líquido-vapor, onde a força resultante na direção da interface é nula, sendo este equilíbrio expresso através da equação de Young – equação (1) – [2] [52] [53].

Líquido Superfície 𝜃 𝛾$' 𝛾'% 𝛾$% (1) (2) (3) (4) Superfície 𝜃 = 0° 0° < 𝜃 < 90° 90° < 𝜃 < 180° 𝜃 = 180°

22

𝛾$%= 𝛾$'+ 𝛾'% ∙ 𝑐𝑜𝑠 𝜃 (1)

onde 𝛾$% representa a energia de superfície do sólido, 𝛾$' a tensão interfacial sólido-líquido e 𝛾'% a

tensão superficial do líquido e 𝜃 o ângulo de contacto de Young.

A equação de Young é apenas válida para superfícies homogéneas, não porosas e topograficamente lisas – superfícies ideais [52] [54]. Contudo, de acordo com Shuttleworth and Bailey, o estudo da molhabilidade em superfícies rugosas mostrou que o espalhamento da gota e o ângulo de contacto dependem também da rugosidade da superfície [55].

Numa superfície rugosa, o ângulo de contato real é o ângulo entre a tangente à interface líquido-vapor e a superfície local do sólido – Figura 17.

Figura 17. Definição do ângulo de contacto, θ, de um líquido sobre uma superfície rugosa.

Neste tipo de superfícies, a linha a tracejado representa a superfície aparente do sólido, do ponto de vista macroscópico e é sobre esta linha que o ângulo de contacto é medido – ângulo de contacto aparente [54].

A relação entre molhabilidade e rugosidade foi descrita por Wenzel em 1936, afirmando que a rugosidade tem um impacto direto na molhabilidade [56]. No caso de uma superfície hidrofóbica (θ > 90º), um aumento na rugosidade provoca um aumento no ângulo de contacto. Por outro lado, numa superfície hidrofílica verifica-se um aumento da molhabilidade com o aumento da rugosidade. A relação descrita por Wenzel é dada pela equação (2),

𝑐𝑜𝑠 𝜃4= 𝑟 ∙ cos 𝜃 (2)

onde 𝜃4 representa o ângulo de contacto medido, 𝜃 representa o ângulo de contacto da equação de

Young, e 𝑟 representa o rácio de rugosidade dado pela equação (3),

𝑟 = Á𝑟𝑒𝑎 𝑆𝑢𝑝𝑒𝑟𝑓𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙 𝑅𝑒𝑎𝑙

Á𝑟𝑒𝑎 𝑆𝑢𝑝𝑒𝑟𝑓𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙 𝑃𝑟𝑜𝑗𝑒𝑡𝑎𝑑𝑎 (3)

que pode ser calculado através dos parâmetros de rugosidade obtidos através de uma análise com um perfilómetro [53] [54].

Superfície Líquido

23 É importante referir ainda que a equação de Wenzel tem por base o pressuposto que o líquido penetra nas ranhuras rugosas do material, tal como esquematizado na Figura 17, e que o tamanho da gota é bastante superior comparativamente com a escala da rugosidade do material [52] [54].

Cassei e Baxter também desenvolveram uma teoria relativamente às superfícies rugosas, afirmando que o líquido não penetra nas ranhuras do material, formando uma interface composta [57]. Sendo o papel um material heterogéneo e rugoso, a correção dos ângulos de contacto medidos torna-se essencial caso o objetivo seja calcular a energia de superfície do papel, através da equação de Young. Devido à natureza hidrofílica do papel, a teoria descrita por Wenzel seria a mais adequada, uma que vez que se assemelha mais com a realidade.

No presente trabalho, a correção não será aplicada devido a não ter sido possível realizar a medição dos parâmetros necessários para tal efeito. Contudo, a coerência interna dos resultados não será afetada, visto que a amostra sólida tem por base a mesma folha de papel, que se supõe ter uma rugosidade constante em toda a superfície.

2.1.1. Medição Experimental do Ângulo de Contacto

Para medir experimentalmente o ângulo de contacto, existem algumas técnicas como o método da gota séssil, o método da placa de Wilhelmy ou o método de Washburn. Dentro destas, o método da gota séssil é o mais usado, não só pela sua simplicidade de operação, mas também por ser um método de medição direto [52].

O método da gota séssil é um método ótico que consiste, em primeiro lugar, na deposição suave de uma gota sobre uma superfície sólida recorrendo, por exemplo, a uma micro-seringa. De seguida, procede-se à aquisição das imagens e por fim, efetua-se a análise do perfil da gota. Na Figura 18, encontra-se esquematizado o método experimental.

Figura 18. Desenha esquemático do método experimental para medição de ângulos de contato: método da gota séssil. 1 - Formação da gota; 2 - Deposição sobre a superfíie; 3 - Remoção da seringa e início da aquisição de

imagem; 4 - Evolução do perfil da gota ao longo do tempo.

O equipamento típico associado a esta técnica é o goniómetro ótico – Figura 19. Um goniómetro típico consiste num suporte móvel com a micro-seringa (2) localizada entre uma fonte de luz (1) e um dispositivo de aquisição de imagem, geralmente câmaras de vídeo CCD (5). Após formada a gota, são registadas fotografias pelo dispositivo de aquisição de imagem e analisado pelo software associado (6).

Aquisição de imagem

1 2 3 4

24 No caso de as medidas serem efetuadas a uma temperatura diferente da temperatura ambiente, é necessário que a gota se encontre dentro de uma câmara termostatizada à temperatura desejada (4).

Neste trabalho em particular, devido ao fenómeno da retrogradação do amido, foi necessário colocar também a micro-seringa (2) dentro duma cápsula aquecida com resistências elétricas (3), de modo a retardar este fenómeno dentro da seringa e evitar problemas como alteração das propriedades do líquido ou obstrução na agulha.

Relativamente a outros cuidados gerais, é importante referir que tanto a micro-seringa como a agulha deverão estar devidamente limpas. Todo o equipamento deve estar sobre uma mesa estável, de modo a evitar que as vibrações externas afetem os resultados. Relativamente à superfície do papel, é necessário assegurar que esta se encontra devidamente nivelada e que não existem poeiras ou outros contaminantes no momento da medição, como por exemplo impressões digitais. Assim, deverão ser tomados cuidados adicionais no manuseamento das amostras de papel. Para garantir a qualidade das imagens, e consequentemente dos resultados, a luz proveniente da fonte deve ser difusa. Caso contrário, poderá haver reflexão de luz por parte da gota ou aparecimento de defeitos inexistentes nas imagens adquiridas.

Figura 19. Esquema da montagem experimental associada à medição do ângulo de contacto pelo método da gota séssil.

No que diz respeito à medição de ângulos de contacto, é possível obter dois tipos de resultados: ângulo de contacto estático, relativo ao equilíbrio inicialmente estabelecido; e o ângulo de contacto dinâmico, correspondente à evolução deste ao longo do tempo.

Quanto ao cálculo do ângulo de contacto, existem diferentes métodos que podem ser usados, dependendo do software disponível e do poder de computação. Um dos métodos mais usados é o

Axisymetric Drop Shape Analysis (ADSA), pelo facto de ser uma técnica versátil e flexível, uma vez que

permite o cálculo da tensão superficial e de ângulos de contacto [58].

Este método tem por base a relação existente entre a forma da gota e a tensão superficial, sendo esta relação descrita pela equação de Laplace – equação (4).

Δ𝑃 = γ ∙ I1 𝑅J+ 1 𝑅KL (4) 6 1 2 3 4 5

25 onde Δ𝑃 representa a diferença de pressão na interface, γ a tensão interfacial, 𝑅J e 𝑅K raios de curvatura

da gota.

O método encontra-se dividido em três etapas:

§ A primeira etapa consiste na obtenção de perfis teóricos através de integração numérica da equação de Laplace com valores conhecidos da tensão superficial, densidade, aceleração da gravidade e curvatura da gota.

§ Na segunda etapa, a imagem experimental é analisada de modo a extrair um conjunto de coordenadas cartesianas a partir do perfil da gota.

§ Por fim, na terceira etapa, procede-se ao melhor ajuste possível da equação de Laplace ao perfil da gota obtido experimentalmente.

Outro pressuposto implícito nesta técnica é o conceito de axissimetria, ou seja, uma simetria rotacional em torno de um eixo perpendicular à superfície do sólido, assumindo que a linha de contacto da gota com o sólido é circular [59].

A simplicidade deste método recai na baixa necessidade de inputs, sendo apenas necessário a imagem da gota e um conjunto de coordenadas especificas, extraídas a partir do perfil da gota. No caso da tensão superficial é ainda necessário a diferença de densidades entre o líquido e o gás (muitas vezes a densidade do gás é desprezável face à densidade do líquido), e a aceleração gravítica.

Para além do cálculo dos ângulos de contacto e do erro associado, o software permite também a computação de outras propriedades da gota, como o volume, a área superficial e o diâmetro da base.

Para uma entendimento mais detalhado desta técnica experimental, sugere-se a leitura de [58] [60] [61].

Documentos relacionados