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O Acto Único Europeu (1987) «foi o ponto de viragem para a política da Comunidade sobre o ambiente de trabalho» (Parlamento Europeu, 2004a). É com o Acto Único Europeu que a Segurança e Saúde no Trabalho vai encontrar as bases jurídicas para a criação e o desenvolvimento de um novo paradigma de saúde ocupacional no qual se insere o dever legal de prevenção de riscos psicossociais (Comissão Europeia, 1990; Balandi, 1997; Roncero, 2004).

122 Por exemplo, as publicações Stress Prevention in the Workplace, (1993), Prevention du harcèlement et

de la violence sur le lieu du travail (2003), Work-related stress (2007), Violence, bulling and

harassement at work (2007) e algumas publicações sobre diversos aspectos relacionados com a organização e o tempo de trabalho com destaque para os Inquéritos Europeus às Condições de Trabalho, realizados de cinco em cinco anos, desde 1990, onde se dá conta da dimensão dos riscos psicossociais na União Europeia. Os resultados do IV Inquérito, realizado em 2005, foram publicados em 2007. Neles, mais uma vez, se verifica que os riscos psicossociais continuam a representar o tipo de riscos mais importante no trabalho na União Europeia.

O Acto Único Europeu (AUE) veio a constituir a primeira revisão profunda do Tratado de Roma.123 O AUE foi adoptado tendo em vista, principalmente, a realização do Mercado Único Interno, até 31 de Dezembro de 1992. O Mercado Único Europeu requeria, como pressuposto da sua realização, a concretização das chamadas quatro liberdades: de circulação de capitais, de bens e serviços e de trabalhadores.

Para o efeito, era necessário, segundo o Livro Branco do Mercado Único Europeu124, proceder, no prazo de cinco anos, à implementação de cerca de 300 medidas de natureza legislativa, entre as quais algumas medidas a tomar no âmbito da Política Social Europeia. A maior parte das medidas de Política Social a tomar tinha a ver com a Segurança e Saúde no Trabalho. Para um tal volume de diplomas, num tão curto prazo de tempo, exigia-se um processo decisório mais expedito do que o existente até então. Coube ao art. 100.º-A, do Acto Único Europeu criar condições para que as referidas medidas legais pudessem vir a ser tomadas mais rapidamente, ao vir possibilitar que as mesmas pudessem ser aprovadas por maioria qualificada, ao invés da unanimidade, até então, exigida.

O AUE veio aditar ainda ao art. 118.º do Tratado de Roma, o art. 118.º-A. Este novo artigo, ao dizer que «os Estados-Membros empenham-se em promover a melhoria, nomeadamente, das condições de trabalho, para protegerem a segurança e a saúde dos trabalhadores, e estabelecem como objectivo a harmonização, no progresso, das condições existentes neste domínio», veio criar o fundamento legal «constitucional» (ou de direito comunitário primário) (Borchardt, 2000, p. 58) necessário à harmonização e ao desenvolvimento da Segurança e Saúde no Trabalho e, em particular, o direito à

123 «O AUE, assinado no Luxemburgo em 17 de Fevereiro de 1986 por nove Estados-Membros e, em 28

de Fevereiro de 1986, pela Dinamarca, Itália e Grécia, constitui a primeira alteração de grande envergadura do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia (CEE). O AUE entrou em vigor em 1 de Julho de 1987.» (Parlamento Europeu, 2004c).

124 Programa de acção aprovado na reunião de Chefes de Estado e de Governo realizada em Março de

1985, em Bruxelas, com o objectivo prioritário de realização até final de Dezembro de 1992 «do grande mercado interno europeu e a criação de condições propícias à concorrência e às trocas comerciais entre empresas» (Parlamento Europeu, 1991, Ficha Po III/D/2). «O Livro Branco (…) apresenta um programa pormenorizado identificando os entraves físicos, técnicos e fiscais que justificam a manutenção dos controlos nas fronteiras e que impedem o livre funcionamento do mercado bem como um programa coerente, fazendo, de modo sistemático, mais de 300 propostas legislativas necessárias para a eliminação das barreiras.» (Parlamento Europeu, 2004c)

protecção da saúde mental no trabalho e o correspectivo dever legal de prevenção de riscos psicossociais.

Foi, desde logo, importante, para este efeito, o entendimento dado à expressão «condições de trabalho», prevista no n.º 1 do art. 118.º-A do Acto Único Europeu. Segundo o entendimento que lhe era dado pela Dinamarca a nível das instâncias comunitárias e que mereceu acolhimento por parte dos restantes Estados-Membros, por «condições de trabalho» devia entender-se, não só a concepção dos locais de trabalho e as condições físicas (incluindo o uso do equipamento e a exposição do trabalhador a substâncias tóxicas e outras substâncias perigosas no trabalho), mas também as condições socio-económicas em que o trabalho é realizado ou, segundo Pennings (1997, p. 84), «quer os aspectos físicos, quer os aspectos psicológicos quer os sociais do ambiente de trabalho». Transcreve-se a este propósito o teor do Acórdão de 12 de Novembro de 1996, do Tribunal de Justiça Europeu, o qual refere que:

Nada nos termos do artigo 118.º -A do Acto Único Europeu indica que os conceitos de «condições de trabalho», de «segurança» e de «saúde» na acepção desta disposição devam, na falta de outras precisões, ser entendidos de forma restritiva e não no sentido de que abrangem todos os factores, físicos ou outros, susceptíveis de afectar a saúde e a segurança do trabalhador no seu ambiente de trabalho…Além disso, esta interpretação dos termos «segurança» e «saúde» pode nomeadamente assentar no preâmbulo da Constituição da Organização Mundial da Saúde, de que fazem parte todos os Estados-Membros, que define a saúde como um estado completo de bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade (Acórdão de 12 de Novembro de 1996, Processo C-84/89, do Tribunal de Justiça Europeu, cit. in, Cabral e Roxo, 2006, p. 68).

Na sequência do Acto Único Europeu, foi aprovada, em 1989, aquela que viria a ser, a partir de então, a «pedra angular», enformadora de toda a legislação de Segurança e Saúde no Trabalho, na União Europeia: a Directiva-Quadro de Segurança e Saúde no Trabalho (Directiva n.º 89/391/CEE) (Roda & Blanch, 2003).