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1 INTRODUÇÃO

4.1 A Ação de Despejo

Como define Scavone Júnior (2015, p.1282), “a ação de despejo é, em regra, a forma de reaver imóvel cuja origem da posse direta decorre de contrato de

locação”. Portanto, ocorrendo uma resistência à pretensão do locador de reaver a posse direta do imóvel, promove-se a ação de despejo.

As ações de despejo terão o rito ordinário, é o que estabelece o Art. 59, da Lei de Locações. Entretanto, com a vigência do CPC de 2015, o mais correto atualmente é dizer que as ações de despejo terão procedimento comum, tendo em vista que o rito ordinário era uma subdivisão do procedimento comum disposto no CPC de 1973, que além do rito ordinário previa o rito sumário. Contudo, com a edição do novo CPC, extinguiu-se o rito sumário, restando apenas o procedimento comum, na forma do Art. 318 que determina: “Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei. Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução”. Esclarece-se, contudo, que o despejo para uso próprio, por pessoa física, poderá ser proposto no Juizado Especial Cível, seguindo o procedimento da Lei 9.099/1995, art. 8º.

Apresentemos as hipóteses previstas na Lei nº 8.245/91 que permitem a propositura da ação de despejo pelo locador:

a) Artigo 3º, parágrafo único: ausência de vênia conjugal em contratos com prazo que iguale ou suplante 10 anos, quando o cônjuge não estará obrigado a observar o prazo excedente;

b) Artigo 7º: extinção do usufruto ou fideicomisso, sendo passível do nu-proprietário ou fideicomissário, que não anuíram na locação celebrada pelo usufrutuário ou fiduciário, denunciá-la;

c) Artigo 8º: alienação, onerosa ou gratuita, do imóvel locado, que autoriza o adquirente exercer a denúncia;

d) Artigo 9º, I: resilição bilateral do contrato que, prevendo prazo de seis meses para a desocupação, tendo sido subscrito por duas testemunhas, autoriza o despejo liminar;

e) Artigo 9º, II: infração contratual ou legal;

f) Artigo 9º, III: falta do pagamento do aluguel e demais encargos;

g) Artigo 9º, IV: necessidade de realização de obras urgentes, determinadas pela autoridade pública;

h) Artigo 46: término do prazo do contrato celebrado por escrito e com prazo superior a trinta meses;

j) Artigo 47, III: retomada para uso próprio do locador, seu cônjuge ou companheiro e, ainda, de ascendente ou descendente que não disponha de imóvel residencial próprio assim como seu cônjuge;

k) Artigo 47, IV: demolição e edificação licenciada ou realização de obras aprovadas pelo poder público, que aumente pelo menos em 20% a área construída ou 50% de destinada a hotel ou pensão;

l) Artigo 47, V: decurso do prazo de cinco anos, na eventualidade de contrato celebrado verbalmente ou por escrito com prazo inferior a trinta meses;

e) Artigo 51, § 5º: decadência do direito de propor ação renovatória;

m) Artigo 52, I: determinação, pelo Poder Público, para que o locador leve a efeito obras de radical transformação no imóvel locado, ou, ainda, a realização de obras que aumentem o valor do negócio ou da propriedade;

n) Artigo 52, II: necessidade de retomar o imóvel para o próprio uso do locador, transferência do fundo de comércio existente há mais de um ano;

o) Artigo 53: em hospitais, unidades sanitárias, asilos, estabelecimentos de saúde e de ensino, se ocorrer as hipóteses do Art. 9º (infração contratual, falta de pagamento, acordo e reparações urgentes determinadas pelo Poder Público) para demolição e nova edificação ou para reforma com aumento de 50% da área útil; p) Artigo 57: término do prazo contratual, na locação que não esteja submetida à proteção da renovatória, não mais convindo ao locador mantê-la;

q) Artigo 59, parágrafo 1º, V: permanência do sublocatário após a dissolução da locação por qualquer causa. O despejo nesse caso pode ser liminar;

r) Artigo 72, III: melhor proposta de terceiro;

s) Artigo 78: locações residenciais celebradas anteriormente à vigência da Lei 8.245/1991, vigorando por prazo indeterminado.

A despeito de todas as hipóteses acima ensejarem a propositura da ação de despejo, fixaremos o desenvolvimento dessa parte do trabalho na situação de despejo por falta de pagamento dos aluguéis e outros encargos pelo inquilino, pois certamente essa é circunstância que mais provoca a ação de despejo nos tribunais brasileiros e a de maior relevo para o fiador, pois a ausência do pagamento dos aluguéis é que o arrasta para o litígio.

Ressalta-se que não são apenas os aluguéis atrasados possibilitam a ação de despejo por falta de pagamento, outras obrigações acessórias (IPTU, despesas condominiais, contas de água e luz etc.) não quitadas também darão

direito ao proprietário de despejar o inquilino. Portanto, será possível requerer a ação de despejo ainda que estejam os aluguéis em dia, referindo-se a mora apenas aos encargos da locação.

A falta de pagamento dos aluguéis e outros encargos previstos contratualmente também caem na regra do Art. 9º, II, da Lei das Locações, que estabelece que a locação será desfeita em decorrência da prática de infração legal ou contratual, tendo em vista que o locatário é obrigado a pagar pontualmente o aluguel e os encargos da locação, legal ou contratualmente exigíveis, no prazo estipulado ou, em sua falta, até o sexto dia útil do mês seguinte ao vencido, na forma do Art. 23, I.

A ação de despejo por falta de pagamento está regulamentada no Art. 62 da Lei nº 8.245/1991, sendo que a partir de um dia de atraso no pagamento o inquilino já é considerado inadimplente. Portanto, a ação de despejo pode ter início um dia depois do vencimento do aluguel, caso ele não tenham sido pago, cabendo ao locador ajuizar a ação, na forme do Art. 5º, da Lei nº 8.245/91.

A Lei do Inquilinato, em seu Art. 62, I possibilita a ação de cobrança de aluguéis cumulada com a ação de despejo e caso o locador não cumule as demandas, poderá posteriormente cobrar, em ação própria (execução ou ação de cobrança pelo procedimento comum no processo de conhecimento), os valores devidos. Caso haja abandono do imóvel pelo inquilino no curso da ação de despejo cumulada com cobrança de aluguéis, perde-se o objeto relativamente ao despejo, mas a ação prossegue no que se refere à cobrança dos aluguéis atrasados. O Art. 62, I permite que na propositura da ação de despejo, o autor já vincule o pedido de citação de eventual fiador para integrar a ação, mas no que se refere à cobrança dos valores atrasados, pois quanto à resolução do contrato de locação e a consequente requisição da posse direta do imóvel o pedido é feito em face do locatário.

De acordo com o Art. 63 da Lei 8.245/91 “julgada procedente a ação de despejo, o juiz determinará a expedição de mandado de despejo, que conterá o prazo de 30 (trinta) dias para a desocupação voluntária”. Entretanto, se ação de despejo foi motivada pela falta de pagamento dos aluguéis o prazo para desocupação voluntária é reduzido para 15 dias, é o que preconiza o §1º, alínea ‘b’ do artigo em comento.

Poderá haver a execução provisória do despejo, na forma do Art.64 da lei de Locações e não será necessário oferecer caução quando se tratar de ação de despejo por falta de pagamento.

Nesse ponto do nosso estudo, retornemos ao questionamento que é fundamento desse trabalho: Caso tenhamos uma locação garantida por uma fiança fidejussória, em que o locatário não vem pagando os aluguéis por vários meses e o locador se mantem inerte, não ajuizando a devida ação de despejo, como o fiador se desvencilhará de um prejuízo tão vultoso?

Vejamos o seguinte trecho de Segalla (2010, p. 246):

Apesar de dispor de ação de despejo, e até mesmo de ação de execução, não raro o locador, não obstante o impagamento dos aluguéis, deixa de cobrar o inquilino impontual por muitos meses, pois sabe que se o mesmo não pagar o fiador o fará.

Diante disso, a dívida oriunda do contrato de locação se avoluma dia após dia, acrescida de multas, juros e correção monetária, tudo isso ocorrendo sob os olhos benevolentes do locador, o qual não manifesta interesse em cobrar a dívida tão cedo, pois a vantagem que por ele será auferida por vezes superará em muito as aplicações financeiras populares que remuneram o dinheiro a juros baixos. Enquanto isso, a cada novo impagamento do devedor a multa mensal poderá chegar a 20% (!), o que em parte explica o porquê da omissão de alguns locadores: tornam-se sócios do inquilino na ruína do fiador!

Segalla (2010) explica que como a ação de despejo não foi promovida pelo locador, verifica-se que ele passou a tolerar e, porque não dizer, a incentivar a inadimplência do inquilino, desta feita não seria razoável que o fiador tivesse de assistir e aceitar passivamente a omissão do locador sem nada fazer.

Sendo assim, o autor defende que a regra do Art. 834 do CC não é apenas concessiva de legitimação ativa extraordinária ao fiador para dar andamento a uma execução já iniciada, seria também permissiva ao garante para ele ajuizar a ação de despejo por falta de pagamento quando o locador não o fizer e restar configurado o abuso do direito e arremata:

Com efeito, o aplicador da lei, seja o administrador, seja o juiz, não pode desligar-se do resultado de sua ação e considerar cumprido seu dever com a mera e simples aplicação racional da norma aos fatos. Sua tarefa deve ir além: é criativa por natureza, pois que com ela deve integrar a ordem jurídica.

E sendo criativa a atividade do intérprete do direito, com vistas a alcançar resultados justos e socialmente úteis, essas são as considerações que nos permitem defender a outorga de legitimação ativa extraordinária a permitir a propositura da ação de despejo por falta de pagamento ao fiador ante a demora desleal da cobrança da dívida pelo locador (SEGALLA, p. 256).

No que pese ser um posicionamento muito interessante de Alessandro Schirrmeister Segalla, não se compartilha do seu entendimento pelos motivos e razões apontados no próximo tópico.

4.2 A impossibilidade de utilização da ação de despejo pelo fiador do contrato