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2 A MONITORIA NO ENSINO SUPERIOR

3.2 A abordagem Psicossocial do Construcionismo Social

Para Gergen, o construcionismo social não tem a intenção de adotar uma postura essencialista para construir conhecimentos objetivos que possam ser vistos como reflexo ou mapa do mundo. Para ele “a pesquisa construcionista social ocupa-se em apreender os processos pelos quais as pessoas descrevem, explicam, ou, de alguma forma, dão conta do mundo em que vivem (incluindo-se a si mesmas)” (GERGEN, 2009, p. 301).

Gergen (2009) discute que os termos que usamos para descrever nossas experiências no mundo fazem parte da linguagem que é uma construção social. Por isto, estes termos em si não encerram a essência do mundo. Além de os termos serem construções sociais, os significados que eles podem assumir dependem da comunidade onde são empregados. Por exemplo, o termo educação assume sentidos diferentes dependendo do contexto. A educação que os pais devem proporcionar aos filhos não tem o mesmo sentido de educação em um contexto escolar. Assim, a educação pode ter o sentido de alfabetização, escolarização, profissionalização, emancipação humana ou política pública.

Desta maneira o termo educação não encerra em si mesmo um sentido objetivo encontrado no mundo. Por isto, a respeito de um mesmo termo existem diferentes perspectivas de acordo com a comunidade que o utiliza. E se forem abandonadas todas as perspectivas sobre o que significa educação, então qual significado o termo assume? Nenhum. Portanto argumenta que todos os termos que descrevem o que é real para nós estão inseridos em alguma forma de relação social.

Além disto, Gergen (2009) nos convida a desconfiar de todo o conhecimento que nos é apresentado como natural e dado como certo. Para ele o conhecimento deve ser compreendido como uma construção social, pois até os termos utilizados para descrever esse conhecimento foram construídos socialmente, por isto também estão localizados no espaço e no tempo. Ao compreender como tal conhecimento foi construído e em qual contexto, é possível refletir que por trás de cada produção de sentido existem valores e intenções, que guiam ou legitimam nossas ações.

Gergen (2009) também argumenta que o que é conhecido e tomado como verdade deve ser objeto de suspeita porque é uma construção que precisou ser aceita na comunidade em que foi proposta. Assim o conhecimento tomado como verdade não depende exclusivamente de sua validade empírica, mas também da maneira como foi produzido e explicado. Neste sentido uma proposição de conhecimento é mais facilmente aceita não na

medida em que possui validade empírica, mas na medida em que segue as regras de produção de conhecimento da comunidade na qual é proposto.

Gergen (2009) também considera que a negociação das compreensões sobre o mundo é de importância crítica, pois estão conectadas com outras atividades das quais participam as pessoas. As próprias descrições e explicações sobre o mundo são consideradas formas de ação social e compõem parte de vários modelos sociais. Assim, elas servem tanto para sustentar e apoiar certos padrões, quanto para a exclusão de outros. “Alterar descrições e explicações é, portanto, desafiar certas ações e propor outras.” (GERGEN, 2009, p. 306).

Além disto, propõem que o construcionismo social seja mais do que uma abordagem teórica que proponha um reflexo do mundo, argumentando que ele seja um instrumento a partir do qual seja possível estabelecer diálogo entre as diferentes possibilidades de atribuir sentido ao mundo, além de possibilitar a construção de maneiras alternativas de concebê-lo.

A respeito desta postura de não assumir como natural o conhecimento e buscar compreender como se deu sua construção, Spink e Frezza (2013) se baseiam em um texto de Tomás Ibáñez publicado em 1994, no qual ele aborda quatro temáticas que são elementos centrais do realismo fundante da ciência moderna: a dualidade sujeito-objeto, a concepção representacionista do conhecimento, a retórica da verdade e o cérebro como instância produtora de conhecimento.

Em relação à dualidade sujeito-objeto, Ibáñez (1994 apud Spink; Frezza, 2013) apresenta que no empirismo o objeto é determinação última do conhecendo, sendo que projeto científico busca aproximar-se e apreender da maneira mais precisa possível este objeto. No idealismo o conhecimento surge não a partir do objeto, mas das categorias do entendimento que constituem a mente humana, onde o projeto científico busca desenvolver estas categorias e a maneira pela qual o sujeito pensa. E no interacionismo o conhecimento surge na interação do sujeito com o objeto, constituindo nas palavras de Spink e Frezza uma espécie de construcionismo fraco. Ibáñez aponta que para o construcionismo tanto o objeto quanto o sujeito são construções sócio-históricas e que precisam ser desfamiliarizadas, ou dito de outra maneira, não aceitas como naturais, buscando como se deu sua construção.

Esta concepção de origem do conhecimento na dualidade sujeito-objeto leva à critica ao segundo elemento que é a concepção representacionista do conhecimento. Uma vez o conhecimento é produto construído socialmente na interação entre sujeito e objeto, não se pode tomar o conhecimento com um espelho do mundo, pois as próprias categorias utilizadas para descrever o mundo são construídas socialmente. Mas isto não significa que se trata de

um vale tudo, pois como dito anteriormente, o conhecimento da realidade é tomado como aquele que é comum aos membros de uma comunidade.

Desta maneira a crítica que Ibáñez apresenta à retórica da verdade é que não se pode tomar a verdade como sendo um conhecimento absoluto. O que é tomado como verdade é um conhecimento produzido e compartilhado a partir de convenções de uma comunidade. Assim não se tem a verdade do mundo, a verdade de nossas convenções sociais. E ressalta que, não se trata de viver em um mundo em que não existem verdades, mas de considerar que o que é tomado como verdade é fruto de convenções sociais definidas por sua conveniência, coerência, utilidade, moralidade.

Por fim, Ibáñez critica a postura de conceber o cérebro como órgão produtor de conhecimentos e único que abriga nossa estrutura de pensamentos. O que Ibáñez apresenta é que também lançamos mão de outros elementos para pensar, como a linguagem, que é uma produção social. Além disto, apresenta a contribuição das tecnologias da inteligência, como a escrita, calculadora, imprensa e computadores, nos auxiliam na produção de nossos pensamentos. Isto fica tanto mais claro na medida em que observamos o desenvolvimento cada vez maior de softwares com o propósito de auxiliar no processamento e na análise de dados de pesquisas.

Entretanto, as principais críticas dirigidas ao Construcionismo Social são em relação ao seu relativismo e ao reducionismo linguístico (SPINK; FREZZA, 2013). Em relação ao primeiro já foi tratado que toda produção de significações a respeito da vida cotidiana, seja sobre o mundo ou sobre nós mesmas, se dá em um processo relacional. Assim, embora seja possível produzir quantas significações sejam possíveis, apenas aquelas que são comuns entre outras pessoas são tomadas como real. Assim, reconhece que a construção do que é dado como conhecido é processual, envolvendo aspectos históricos, sociais e políticos.

Quanto ao reducionismo linguístico, tal crítica é dirigida ao compreender que o Construcionismo toma tudo o que é material como produções linguísticas. Mas Spink e Frezza (2013, p. 15) observam que “algo adquire o estatuto de objeto a partir do processo de construção linguístico-conceitual. Isso não quer dizer, entretanto, que todos os fenômenos se reduzam à linguagem; que esse algo que adquire estatuto de objeto a partir da linguagem seja de natureza linguística”.

Mesmo assim, Gergen (2001) discute que o Construcionismo Social não necessariamente precisa colidir com o Realismo. Para o autor, o pesquisador que assume uma postura construcionista deve estar comprometido com as potencialidades que são oferecidas,

inclusive quando elas são aumentadas ao serem tratadas em conjunto com outras posturas, desde que respeitados os limites. Em outras palavras, é infrutífero e incoerente participar da guerra científica na busca por estabelecer o construcionismo social como a única maneira correta de se fazer ciência. Assim recomenda abertura a apreciar os pontos positivos de outras perspectivas sem perder de vista suas limitações.

Uma discussão que permite compreender como a linguagem permite a produção de sentidos no cotidiano é apresentada na próxima seção, onde são apresentados aspectos centrais que orientaram a proposta metodológica deste trabalho.