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A Administração Pública Portuguesa no contexto da modernização administrativa

PARTE II – TÉCNICA FINANCEIRA DA EQUIPA DO FOCO – REGIÃO NORTE

CAPÍTULO 2 ANÁLISE SUMÁRIA DAS PRINCIPAIS QUESTÕES EM

2.1 A modernização administrativa

2.1.3 A Administração Pública Portuguesa no contexto da modernização administrativa

Feitas as considerações precedentes sobre os modelos organizacionais da Administração Pública, interessa agora tentar analisar o sistema administrativo português, procurando encontrar um modelo explicativo.

O sistema administrativo português aproxima-se do modelo clássico, burocrático, de racionalidade estática, weberiana. No essencial, é um sistema ordenado de dominação e subordinação que assenta no princípio da legalidade e da autoridade legal-racional e se baseia no anonimato generalizado, que tem como fonte de avaliação a conformação ou não dos atos às normas preexistentes.

De modo sucinto podemos dizer que todo o “processo administrativo” sofreu um “continuum” desde as raízes do Estado (mesmo antes, com a influência do mundo romano) passando pelo período da reconquista, pela expansão, atravessando as revoluções do século XIX. Mesmo o regime saído da revolução de 1910 mais não fez do que aproveitar outras elites sem que o sistema tenha sofrido alterações profundas. O Estado Novo, legalista, tradicionalista, fortemente hierarquizado, provocou a centralização e introduziu a racionalidade jurídica na vida administrativa. Finalmente, o colapso do Estado Novo trouxe atrás de si a reação contra a velha burocracia. De acordo com Rocha, (1991:46) «o

65 Estado Administrativo não só permanece como foi reforçado pela expansão do setor público da economia, aumento do número de funcionários e importância crescente da elite tecnoburocrática».

Embora, numa segunda fase (anos 70/80), se tenha assistido à publicação de alguns diplomas no sentido da desregulação e até da privatização de alguns serviços, apesar de no horizonte legislativo aparecerem textos que apontam no sentido do modelo “managerial” (desregulação, delegação, descentralização), ainda assim subsistem evidentes formas que, na sua essencialidade, caraterizam o modelo clássico.

A partir dos anos 90 assiste-se a uma certa “desgovernamentalização” responsável e imbuída das condições necessárias ao sucesso, podendo ser um dos instrumentos de mudança. No entanto, a prática (e até a regulamentação) vão no sentido do legal-racional, ou seja, do primado da racionalidade jurídica.

Se as tarefas do Estado, que vêm formuladas no Título IX da nossa Lei Fundamental, consagram genericamente o bem-estar dos cidadãos, a qualidade de vida e a igualdade real entre os portugueses, a grande questão que neste momento se coloca é a de conhecer a resposta que a nossa Administração Pública apresenta no plano dos princípios e no plano das estruturas.

O pano de fundo de atuação da Administração Pública (AP) está definido na Constituição da República (CRP) (no quadro 21 sintetizam-se alguns dos princípios que refuto primordiais).

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QUADRO 21. Síntese de princípios fundamentais da AP na CRP

Artigos Objeto T ar ef as Fu n d am en tais d o E stad o

«São tarefas fundamentais do Estado:

...c) Defender a democracia política, assegurar e incentivar a participação democrática dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais;

d) Promover o bem estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais e culturais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais;...»

266º Prin cíp io s Fu n d am en

tais «1. A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

2. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem atuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade.»

267º E str u tu raç ão d a Ad m in is tr aç ão

«1. A Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximar os serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão efectiva, designadamente por intermédio de associações públicas, organizações de moradores e outras formas de representação democrática.

2. Para o efeito do disposto no número anterior, a lei estabelecerá adequadas formas de descentralização e desconcentração administrativa, sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de acção e dos poderes e superintendência do Governo.

... 4. O processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.

5. É igualmente sempre garantido aos administrados o acesso à justiça administrativa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos.»

Aqui estão vazadas duas ideias importantíssimas: a primeira respeita à submissão da atividade administrativa ao interesse público65; a segunda está intimamente ligada à inexistência de margens duvidosas de atuação e de arbitrariedade por parte de quem detém a responsabilidade de gerir.

Por outro lado, a realização destas tarefas exige a utilização adequada, eficaz e eficiente de meios humanos, financeiros, materiais e organizacionais que o Estado tem à sua disposição. A escassez de recursos sempre tem levantado aos sucessivos governos uma inquestionável preocupação: promover o bem-estar, proporcionar a qualidade de serviços, fomentar a mudança comportamental, exigir a modernização das estruturas - tarefas que envolvem custos que os cidadãos não podem suportar de forma infindável. Então, a modernização só faz sentido e só ganha realmente foros de cidadania se acompanhada de modelos gestionários eficazes e eficientes.

Os princípios constitucionais que dão forma à atividade administrativa seguramente que são aplicáveis a todos os domínios da Administração Pública incluindo a Administração Escolar. Estes imperativos fundamentais tocam profundamente a magna

65Que não se cura aqui de definir, de analisar e de medir, mas que podemos identificar, por comodidade simples, como um conjunto de valores que colocam o bem comum acima do bem individual.

67 questão da modernização administrativa, ela própria um conceito dinâmico, inovador, que se vai desenvolvendo por etapas e de forma seletiva. A não ser assim, dificilmente se procederia a um ajustamento estrutural adequado e eficiente. No entanto, a complexidade e a dimensão das tarefas dificultam a eficiência e a eficácia, a rigidez nas organizações públicas abarca arcaicos métodos de trabalho, com excessivo formalismo, com dependência hierárquica dos longínquos departamentos centrais que estendem a sua longa “manus” aos serviços públicos até aos aspetos mais insignificantes. Daqui se pode concluir que predomina ainda nos nossos serviços públicos uma conceção fayolista das estruturas com um pesado controlo legal racional por parte da tutela ou de quem a representa num sistema pseudo descentralizado, provocador de uma estabilidade aparente.

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