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A afirmação do novo PCP

No documento O PCP e a guerra fria (páginas 97-127)

As greves operárias do Outono de 1942 marcam o início desse “redespertar”, numa conjuntura em que se avolumavam os problemas de abastecimento, originando o sistema de racionamento e em que, por isso, de alguma forma os sinais de alerta estavam dados até pela mensagem que os dirigentes dos Sindicatos Nacionais dirigem a Salazar, em Abril desse ano, e pela resposta que este lhes dá, recusando-lhes qualquer papel a esse nível, isto é, qualquer papel de natureza efectivamente sindical258.

Para mais, um conjunto de medidas claramente impopulares vinha agravar essa situação de tensão latente e prestes a transbordar em conflitualidade social, como a obrigatoriedade de descontos nos salários já por si muito degradados, ou da prestação das horas extraordinárias pagas apenas a 50%.

As greves irrompem em Lisboa, alastrando à sua coroa industrial. Iniciam-se e desenvolvem-se espontaneamente na Carris a meio de Outubro, alargando-se aos Telefones cerca de duas semanas depois, quando rompia já o mês de Novembro, ganhando, então em enchente rápida, a adesão fundamental dos estaleiros da CUF de Lisboa, envolvendo os estivadores do Porto de Lisboa e as oficinas da CNN.

255

Cf Centro de Documentação do Museu do Neo-Realismo, Espólio Literário de Joaquim Namorado, Armando Bacelar,

Resposta..., p. 2

256Cf Fernando Rosas, As lutas sociais nos campos durante a II Guerra Mundial, in Salazarismo e Fomento Económico,

Editorial Notícias, Lisboa, 2000, pp 220-222

257Cf Fernando Rosas, História de Portugal, Sétimo Volume, O Estado Novo,..., pp. 353-369 258

É a Lisboa industrial e ribeirinha que descola para a greve, que galgará o rio, conquistando para o movimento os estaleiros da Parry & Son, em Cacilhas e as fábricas da CUF do Barreiro. E por esses primeiros dias de Novembro, as adesões continuam na velha Alcântara industrial, com a Fábrica Sol, a Sociedade Nacional de Sabões ou a Fábrica de Lâmpadas Lumiar, chegando à Tabaqueira e à Fábrica de Louças de Sacavém, já na fronteira com a corda de Vila Franca. Segundo o próprio Instituto Nacional de Trabalho e Previdência teriam estado em greve 14 mil trabalhadores 259

Mas se nestas greves participam, naturalmente, muitos militantes comunistas, como Alfredo Dinis que é o responsável pela célula da Parry & Son e membro do Comité Local de Almada, isso não significa que o PCP as tivesse dirigido.

José Gregório (Alberto) no informe que apresenta ao III Congresso sobre as greves de 1942 e 1943, reportando-se às primeiras, reconhece que a “(...) a direcção do

nosso Partido, apesar de anteriormente ter conduzido os trabalhadores na sua luta diária até ao ponto de eclosão do movimento, não se deu conta a tempo do amadurecimento das condições que facilitaram o desencadeamento da greve e não desempenhou nela o seu verdadeiro papel dirigente” 260

Esta situação que o dirigente comunista atribui à perda de contactos do Secretariado com a organização regional, a base do partido e com o aparelho técnico ocorrem justamente num momento de reordenamento interno do próprio Secretariado, desfalcado com as prisões dos meses e semanas anteriores.

No entanto, a espontaneidade, a combatividade, a rapidez com que o movimento cresce no início de Novembro e os sectores industriais que toca teriam espalhado uma onda de entusiasmo no interior do partido. Em fins de 42, pouco antes de ser preso, Militão Ribeiro, Secretário do Bureau Político, num manifesto que redige, coloca a palavra de ordem de “greve geral” 261

Perante a incapacidade do governo conter a tendência de agravamento das condições de vida populares, o PCP passa então a avaliar a situação objectiva como potencialmente favorável ao desencadeamento de novo surto grevista. Discute-se como organizar novas greves, com que amplitude e carácter. O secretariado recomposto, com Cunhal, José Gregório e Manuel Guedes, conclui que as condições estão mais maduras na região de Lisboa, segundo as informações recebidas do Comité Regional.

259Cf Idem, pp 376-379 260

I Congresso Ilegal do Partido Comunista Português, Alberto [José Gregório], O Partido e as grandes greves de 1942 e 1943, Editorial “Avante!”, 1944, p. 11

261

IAN/TT, PIDE-DGS, PC 507/42, 2º vol., Cópia de carta de Alberto [José Gregório a Militão Ribeiro, preso], em 30.9.43, dact., [25]

As greves de Julho de 1943, contrariamente às anteriores, vão ser organizadas e dirigidas pelo PCP, não lhe conferindo, contudo, o carácter de greve geral. Isto porque, segundo a Direcção do partido, nem o estádio de desenvolvimento da organização partidária a nível nacional, nem o grau de consciência revolucionária das massas trabalhadoras, o permitiam.

Em finais de Julho, o Secretariado do Comité Central considera reunidas as condições para avançar em Lisboa, Almada, Barreiro e Ribatejo e proclama que "Para

se oporem à força brutal com que o fascismo obriga os trabalhadores à fome e à miséria, só resta aos trabalhadores responder com a força das massas. Há que recorrer a formas superiores de luta. Há que suspender o trabalho! Há que ir para a greve! Há que fazer marchas de fome! Há que assaltar todos os locais onde os géneros estejam açambarcados! Há que ir buscar os géneros onde os houver!"262.

É criado um Comité de Greve para a condução do movimento, articulando operativamente a direcção partidária com o Comité Regional e as células de base, ao mesmo tempo que se constituíam Comités de Greve onde fosse possível. Paralelamente, montava-se um aparelho de distribuição de propaganda.

A 26 de Julho eclodem as primeiras greves, nos corticeiros de Almada. Quando a GNR intervém para expulsar os operários das fábricas e encerrá-las são já 3500 em greve. No dia seguinte, a combustão alastra: A CUF do Barreiro, a Parry & Son, a Mundet, na Amora, entram em greve. Na frente ribeirinha de Lisboa acompanham-nas os estaleiros navais da CUF, as oficinas da CNN, os estivadores, a Fábrica Sol, a Dargent. Seriam então bem mais de dez mil.

É publicado neste dia um segundo manifesto do Partido Comunista para reforçar a combatividade dos sectores que vinham aderindo e procurar ampliá-los:

“Um recuo ou desistência, colocariam as massas trabalhadoras à mercê

do patronato, representaria para o futuro uma exploração redobrada e o desencadeamento de um terror permanente sobre as massas trabalhadoras. A Unidade e a Luta são as condições da vitória. É necessário continuar a alastrar o movimento” 263

A 28 desse mês de Julho, o PCP fala já em 50 mil operários em greve.

O movimento salta para as ruas, multiplica-se em marchas da fome, incorpora largo número de mulheres, hasteia bandeiras negras, desencadeia acções temerárias 262Idem, cit. [22]

263

junto de fábricas hesitantes na paralisação, enfrenta as forças policiais. É assim na Lisboa Ocidental, com os carros eléctricos a serem apedrejados para forçar a adesão da Carris e é assim no Barreiro, centro da tempestade, com a tentativa de invasão da CP, para que também aí o trabalho parasse, ou com os assaltos às propriedades para roubar fruta. Estas zonas são ocupadas pela GNR, pela PSP, pela PVDE. No Barreiro, chega-se a declarar o estado de sítio e em Lisboa os quartéis entram de prevenção.

A 29 de Julho, ainda há fábricas a entrar em greve, como a estratégica Central Tejo, que abastecia energia a boa parte da cidade. A paralisação arranca das oficinas e só não alastra às caldeiras porque aí os fogueiros são obrigados ao trabalho.

Datado deste dia, um manifesto do Secretariado do CC do PCP incita ao prosseguimento da greve, reclama aumento geral de salários e exorta ao seu alastramento a todo o país 264.

A ligação aos serviços secretos ingleses surge, como mero expediente de defesa ou não, nalguns depoimentos de grevistas presos pela PVDE. Assim, João Gandara, apontado como militante comunista no Barreiro, teria dito a um grupo de grevistas que “Esta greve é apenas mais um ou dois dias, pois a Embaixada Britânica, recebeu uma

Comissão de Pessoal da CUF e disse-lhe o seguinte: Vão embora descançados, pois se em dois ou trez dias não lhes resolverem nada, vão pelo campo e hasteiem a bandeira ingleza e deixem depois o resto connosco, pois lá irão géneros e dinheiro para vocês e vão à Quinta do Braamcamp (Sociedade Manuel de Cortiças) onde serão atendidos o que tem sucedido” 265

Porém, a partir dos últimos dias do mês, os despedimentos compulsivos, as prisões em larga escala e a mobilização militar para substituir os grevistas indiciam o recuo do movimento. A 4 de Agosto é o próprio Partido Comunista que aconselha a retomar o trabalho, no que José Gregório vai designar de “retirada organizada” 266,

dadas as proporções que a repressão vinha assumindo.

No resto do país, a única movimentação de vulto é a greve de 2000 operários do calçado em S. João da Madeira, seguida de manifestação maior, mas já numa altura em que o PCP apelara ao recuo na cintura industrial de Lisboa.

A vaga grevista de Julho-Agosto de 1943 assumia-se como o mais importante movimento social da conjuntura de guerra pelo número de operários envolvidos, pela 264Cf Secretariado do Comité Central do Partido Comunista Português, Em greve e unidos a vitória será nossa, 29 de Julho de

1943, imp., 1 p.

265IAN/TT, PIDE-DGS, PC 906/43, 5º vol., [Informação] João Francisco Rocha Gandara, [76] 266

radicalização suscitada, pelo âmbito regional e intersectorial alcançado, pelos sectores estratégicos tocados numa economia de guerra.

No entanto, apesar da combatividade, o movimento apenas conseguira ultrapassar, em temos significativos, a zona de Lisboa e S. João da Madeira e começa a refluir por efeito da repressão pronta e ampla por parte do governo. Sectores que um ano antes tinham estado presentes, como a Carris e os telefones, não aderem desta feita, como tão cedo não voltariam a envolver-se outros que se haviam rijamente destacado no verão de 1943, particularmente no Barreiro.

Mas, apesar das deficiências e erros267, perante os trabalhadores o PCP surgia

como força política dirigente 268, sinal que a “reorganização” se consolidava e que este

novo PCP se impunha perante o velho partido, que se ia desagregando num processo irreversível.

Não obstante, o Secretariado do PCP, mesmo nestas circunstâncias, nunca admitiria, mesmo à luz da conjuntura e da situação objectiva que as determinara, a plena dimensão política das greves. No III Congresso, José Gregório (Alberto) preocupa-se em relativizar este aspecto ao afirmar que “O último movimento de julho-agosto

provoca que, com o recrudescimento da nossa organização e actividade, se criam cada vez mais possibilidades para um movimento de carácter insurreccional e ponto de partida imediato para o derrubamento do salazarismo” 269

Isto para um amanhã a definir, ainda que reconhecendo que o movimento elevou a consciência política e revolucionária das massas trabalhadoras.

Na prisão, Militão Ribeiro, que ousara criticar as greves, é duramente repreendido por José Gregório, em nome do Secretariado do CC do PCP, considerando a sua opinião “absolutamente destrutiva, e que é o resultado dos teus poucos informes,

àcerca do movimento, da falta de serenidade e falsa visão política. O Sec. Rechaça e protesta conta a tua afirmação de que “Tem-se a impressão de que se actuou aventureiramente” (...) O Sec. Entende que não é o Partido mas sim tu que tens de fazer uma auto-crítica perante o próprio Partido pela maneira como analisas o ultimo movimento, bem como o papel que nele desempenhou a direcção do Partido” 270.

Ao papel desempenhado pelo Partido Comunista nas greves, torna-se necessário acrescentar a iniciativa tomada, pouco antes, de propor às restantes forças políticas da 267

I Congresso Ilegal do Partido Comunista Português, Alberto [José Gregório], O Partido e as grandes greves..., pp 12-14

268

Cf IAN/TT, PIDE-DGS, PC 1040/43, [128]

269I Congresso Ilegal do Partido Comunista Português, Alberto [José Gregório], O Partido e as grandes greves..., pp 15-16 270

oposição a criação do Movimento de Unidade Nacional Antifascista (MUNAF), que respondia à viragem do sentido da guerra, pendendo favoravelmente aos Aliados e na ideia de Frente Nacional Antifascista que a Internacional Comunista defendia.

Num dos primeiros números de O Militante, a propósito da necessidade de organizar a resistência contra o apoio de Salazar ao Eixo, o PCP não só reconhece implicitamente a alteração que significava a agressão da URSS pelo exército nazi, como acrescenta:

“Abaixo os mal-intencionados que apregoam a neutralidade a todo o

custo para, mais facilmente auxiliarem as potências fascistas!

Esclareçamos os bem intencionados de que a neutralidade salazarista não passa duma mistificação para favorecer o ”Eixo” !

Continuemos o Exército da Vitória pela união de todos os povos esmagados pelo fascismo!

Unifiquemos a nossa resistência ao auxílio prestado por Salazar aos fascistas do “Eixo”, e às suas manobras de guerra!

Viva a união de todos os anti-fascistas !” 271.

Todavia, será o Secretariado recomposto depois das prisões de 1942 que conseguirá dar, entre finais desse ano e inícios do seguinte, passos decisivos no sentido de relançar a unidade anti-fascista nesses preciso termos.

Nesse sentido, o PCP beneficiou da própria evolução da conjuntura internacional de guerra e, internamente, do crescendo do movimento social. Do mesmo modo, beneficiaria de uma renovação do pessoal político no quadro da oposição, com a constituição Núcleo de Acção e Doutrinação Socialista, mais próximo de posições de unidade com o Partido Comunista e que mediará os contactos com as velhas correntes oposicionistas – Partido Republicano, Maçonaria, o que restava do PS (SPIO) e de sectores da CGT.

A evolução dos contactos parece tomar um curso positivo, tomando rapidamente a forma de proposta de base programática “para a constituição da Unidade Nacional de

todas as organizações, grupos e individualidades anti-fascistas e patrióticas”272, que, no

essencial, apontava para o derrube de Salazar e sua substituição por um Governo de Unidade Nacional que se comprometia a tomar medidas contra o “Eixo”, de saneamento dos germanófilos da função pública e do Exército, dissolução das organizações do 271Linha Geral. Desmascaremos a política de guerra de Salazar, in O Militante, III série, 3, Setembro de 1941

272

regime, como a Legião e a União Nacional, de libertação dos presos políticos, extinção do Tarrafal, abolição das instituições corporativas, sem esquecer o estabelecimento de uma política de salários de acordo com o custo de vida ou uma Reforma Agrária Democrática, comprometendo-se com a convocação de eleições para uma Assembleia Constituinte.

O objectivo desta proposta era a construção de um programa de Unidade Nacional e a formação de um organismo dirigente dessa frente nacional, de base interpartidária, que propunha. O ano de 1943 revelar-se-ia decisivo nesse sentido.

Tornava-se, no entanto, ao PCP necessário tranquilizar, em nome da abrangência e do carácter nacional do movimento a criar, os sectores mais conservadores da oposição não comunista, mais renitentes à aliança que propunha. Não deixa por isso de ser interessante verificar como O Militante dá a sua primeira página à justificação da possibilidade de haver “casos muito especiais em que pode ser constituido um Comité

de Unidade Nacional com a participação de operários e patrões (em geral pequenos industriais) que se opõem em conjunto à política do govêrno fascista e aos grandes monopolistas”273 .

Assim, em Dezembro de 1943 seria formalmente constituído o Movimento de Unidade Nacional Anti-Fascista (MUNAF), dotado de um Comité Nacional, cujos trabalhos preparatórios teriam estado a cargo de uma “comissão operacional”, composta por José Magalhães Godinho, do Núcleo de Acção e Doutrinação Socialista; pelo Comandante Moreira de Campos, do PRP e por Fernando Piteira Santos, do PCP.

Se é verdade que toda esta acção do PCP se faz num quadro de relações cortadas com o movimento comunista internacional, isso não significa isolamento total nem conformismo por parte dos “reorganizadores” em relação a essa situação.

A carta que em Julho de 1941 Júlio Fogaça tenta fazer chegar ao Komintern através de Rodrigues Miguéis e do PC Americano é disso exemplo:

“Já pensásteis o que era a nossa situação no começo ? Quando eramos

apenas uma dúzia de camaradas, na sua maior parte saídos da prisão, sem contacto directo com as massas, e que perante nós se encontrava a polícia fascista que nos libertou depois de longos anos de prisão e uma organização cheia de provocadores que se chamava ainda PCP ? E,

273

A possível participação de operários e patrões num mesmo Comité de Unidade Nacional, in O Militante, III série, 21, Julho

entretanto, chegámos, sem contacto com os dirigentes da IC, sem conhecer bem as suas decisões, sem dinheiro, sem ligações directas com as massas, e no terror fascista, a empreender a reorganização do Partido, a fazer desaparecer os restos daquilo que ainda se chamava o Partido, a denunciar os provocadores perante os operários, a fazer tudo o que existe hoje, que sendo ainda pouca coisa, é já um testemunho do nosso trabalho passado e a esperança de um trabalho maior no futuro” 274.

Era o elogio da “reorganização” que, ao mesmo tempo, justificava a sua necessidade face a um partido velho, minado por provocadores, na linha aliás do que a própria Internacional Comunista concluíra três anos antes.

O novo partido prestava particular atenção ao estudo das posições soviéticas e do Movimento Comunista Internacional, não obstante o corte de canais e a própria situação internacional de guerra, o que se fazia através da audição regular da Rádio Moscovo, que era uma tarefa dos quadros comunistas, como reconhecerá Cunhal, quando em 1947 procede ao restabelecimento formal de relações com o MCI, ao declarar que “Rádio Moscovo esclarece frequentemente acontecimentos da vida

internacional que, de outra forma, tardariam muito tempo a ser esclarecidos” 275.

Porém, antes teriam havido alguns contactos formais com o movimento internacional, mas no sentido do PCP dar cobertura e apoio logístico à passagem de dirigentes do PC de Espanha exilados na América Latina para o interior do seu país276.

Santiago Carrillo, que a partir do México fez parte da estrutura do PC de Espanha que organizava a passagem dos militantes e quadros da América Latina para o seu país via Portugal, afirma, a propósito do papel então desempenhado pelo PCP:

“Foi nessa oportunidade que tomámos contacto pela primeira vez, com o

Partido português, que se encontrava desligado desde há bastante tempo da Internacional Comunista. Precisávamos muito da ajuda dos Portugueses. Mais tarde, eu mesmo fui a Portugal. Os camaradas portugueses comportaram-se sempre com extraordinária lealdade e grande sentido de solidariedade” 277

Efectivamente, segundo detalhado relatório que Carrillo envia a Dimitrov já em 1943, em capítulo especificamente dedicado à organização em Portugal, refere duas 274

António Ventura (introdução e notas), Documentos sobre uma tentativa de contacto entre o Bureau Político do PCP (Júlio

Fogaça) e a I.C. em 1941..., p. 28 275

José Milhazes, O começo de uma grande amizade, in Público de 3.10.94

276CfÁlvaro Cunhal, Duas intervenções..., p. 117 277

fases, uma a cargo de um dirigente vindo de França, quadro da Internacional Comunista, mas que consideraria ser prioritário apoiar a reorganização do PCP, para depois montar o aparelho de apoio ao PCE, acabando por ser preso em Março de 1941.

A segunda fase, completamente independente da anterior, mais consolidada, inicia-se no mês seguinte e integra um conjunto de quadros e dirigentes bastante mais alargado, que também acabam por ser presos e entregues à polícia de Franco, e fuzilados, donde conclui que “em Portugal não se pode ter uma grande organização do

partido, apenas pode ser um ponto de apoio para o envio e recepção de pessoas e de literatura e que a direcção deste ponto deve encontrar-se no próprio país, e não em Portugal” 278.

De qualquer modo, com um núcleo orgânico maior ou menor, o apoio do aparelho do PCP foi considerado indispensável, principalmente ao nível das casas clandestinas e dos meios de transporte, para que Portugal pudesse funcionar como placa giratória para introduzir militantes em Espanha que procedessem à reconstituição do PCE no interior do país vizinho.

De qualquer modo, esta acção só por si não chegará para alterar as relações do PCP com a Internacional Comunista, cuja dissolução em 1943 se dará sem que as relações interrompidas desde1938 tenham sido restabelecidas.

Deste modo, se o III Congresso encerra o essencial do processo “reorganizativo”, não encerra ainda definitivamente esse ciclo, pois permanecia em aberto essa importante e decisiva questão, que era a de reatar os laços com o centro do sistema comunista, lugar ocupado pela URSS no imaginário e no concreto dos comunistas portugueses.

O III Congresso, o primeiro realizado na clandestinidade, era para os que o

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