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O IV Congresso e “o caminho para o derrubamento do fascismo”

No documento O PCP e a guerra fria (páginas 135-181)

fascismo”

A direcção do PCP admitindo como muito próximo o fim do regime tendia ao mesmo tempo moderar os apelos e proclamações impetuosas que haviam caracterizado o seu discurso dominante desde meados de 1944, numa cuidadosa inflexão de discurso.

Era também a constatação de que após as greves de Maio de 1944, se verificara uma quebra evidente no movimento operário e popular, cujas acções, umas mais espontâneas que outras, não conseguiam ultrapassar um carácter localizado. Por mais que a imprensa partidária destacasse as movimentações ocorridas e apelasse à necessidade unificação dos movimentos, o Secretariado percebia bem como não havia condições para que isso se verificasse.

364

Por mais que continuasse a denunciar o putsch ou a pregar a inviabilidade de uma intervenção estrangeira pela mão dos Aliados, que libertasse o país de Salazar, o partido sabia certamente que à beira do verão desse ano se congeminava novo movimento militar e continuava a perceber bem que não podia ficar de fora, porque isso avolumaria drasticamente as probabilidades da sua exclusão nas negociações sobre o afastamento de Salazar.

Por outro lado, a União Soviética, após a Conferência de Postdam365, ao dar

prioridade à estabilização da sua hegemonia político-militar na área de influência que lhe coubera, remetia qualquer alteração política no quadro peninsular para a esfera de decisão dos aliados, designadamente dos britânicos, o que colocava o PCP numa posição de subalternidade, que os Aliados e as forças políticas internas que apoiavam queriam que fosse o mais contida e limitada possível, precisamente para não trazer a desordem para as ruas, criando situações perigosamente incontroláveis, que tanto temiam.

O que paralisa os manejos da conspiração militar é a ilusão na transformação do regime por dentro, trazida pelo discurso de Salazar aos dirigentes da União Nacional, a 18 de Agosto de 1945, em que anuncia a dissolução da Assembleia Nacional e a promessa de realização de novas eleições, ainda que os sinais não iludissem muito quanto às intenções do regime continuar a controlar o processo, pois ao mesmo tempo que, no quadro da revisão constitucional e em legislação subsequente, é alargado o número de deputados e são criados círculos eleitorais de base distrital, mantinha-se o princípio de que a lista maioritária elegeria todos os deputados 366 e Salazar nas suas

intervenções de Agosto e Outubro foi sempre afastando a possibilidade da participação partidária e sublinhando limites de conteúdo crítico que toleraria.

Logo em Outubro, quando Salazar se preparava para anunciar a data das eleições, de uma das muitas tertúlias de café, onde se reuniam homens da oposição – intelectuais, profissionais liberais, comerciantes – partiria, por antecipação ou arrebatamento, com uma boa dose de voluntarismo, sentido de oportunidade e audácia, a ideia de requerer ao governo civil uma reunião pública para discutir a situação política que, surpreendentemente viria a ser autorizada. Dessa sessão, no Centro Escolar

365

Cf. Franco Nogueira, Salazar, As Grandes crises (1936-1945) e O Ataque (1945-1958), vols. III e IV, Liv. Civilização, Porto, 1986, pp 579-580 e 9-10, respectivamente

366

Cf. Rita Almeida de Carvalho, A Assembleia Nacional no Pós-Guerra (1945-1949), Afrontamento/Assembleia da República, Lisboa/Porto, 2002, p. 34

Almirante Reis, realizada a 8 de Outubro de 1945 nasceria o Movimento de Unidade Democrática.

Muito dessa iniciativa tinha como protagonistas militantes da União Socialista, mesmo que não tivesse propriamente sido organicamente decidida. No entanto, suficientemente expedita para deixar de fora o Partido Comunista, ainda que alguns militantes pudessem ter sido contactados ou estivessem a par do que se passava. Também o MUNAF foi objectiva e ostensivamente ultrapassado, atendendo até que membros da União Socialista no CNUAF, como Gustavo Soromenho ou José Magalhães Godinho, que era inclusivamente membro do seu órgão executivo, estivessem bem por dentro da ideia desde início.

A sessão pública transbordou e a imprensa mais liberal dedicou-lhe exuberante atenção. Desde então sucediam-se as adesões, as notícias e entrevistas com diferentes personalidades que se iam juntando a essa onda. Em actos públicos a oposição marcava presença e dava corpo a um movimento político que se instalava nos interstícios de uma legalidade de contornos ainda mal definidos.

O MUD faz exigências ao governo, quer mais tempo para que as eleições decorram em condições democrática, por isso reclama o seu adiamento e um novo recenseamento, mas também demanda que sejam autorizados partidos políticos, jornais livres e garantia de direitos e liberdades, o que é evidentemente recusado, desencadeando-se ou ganhando força um movimento de adesão ao MUD por subscrição de listas.

O PCP desconfia dos promotores da reunião do Centro Almirante Reis, mas a iniciativa não lhe pode ser indiferente, até pela amplitude e potencialidades que gerara. Parece haver desorientação pois a sessão de 8 de Outubro e a forma como fora secundada a sua convocação trocavam as voltas ao esquematismo dos termos do debate no seio da oposição e as manifestações de Maio e Outubro revelavam uma disposição popular de sair à rua em torno de causas políticas.

O Bureau Político na reunião realizada entre a sessão pública do Centro Almirante Reis e a resposta do governo às reclamações que daí saíram, procura desvalorizar aquela iniciativa, considerando-a apenas pelo apoio massivo que suscitou, preferindo centrar-se com mais entusiasmo nas possibilidades abertas pela perspectiva de realização de eleições, pela perspectiva de alargamento das possibilidades de actuação legal que abria.

Como que numa miragem de legalidade à vista, o manifesto saído dessa reunião é subscrito com os nomes, pseudónimos e profissões dos membros em exercício do Bureau Político – Álvaro Cunhal (Duarte), Manuel Guedes (Santos) e José Gregório (Alberto), que constituíam o Secretariado, Pires Jorge (Gomes), Sérgio Vilarigues (Amílcar) e José Luís [Manuel] Domingues (Luís). Apenas este último não apresentava o seu nome correctamente grafado.

Esboçam-se aí quatro condições mínimas para que o PCP aceite ir às urnas: existência de liberdades, autorização de todos os partidos políticos, adiamento das eleições e novo recenseamento eleitoral. Na opinião do Bureau Político, a haver condições, o que faz sentido é a apresentação de listas únicas da oposição, “listas de unidade nacional feitas

por todas as forças antifascistas”367.

Era efectivamente em torno deste conjunto de ideias que se definia o eixo central das orientações políticas para a nova conjuntura que se vinha desenhando desde a Primavera de 1945, mas que tomava contornos mais precisos a partir do verão, com os discursos de Salazar.

Se em Maio-Junho já não era a insurreição que se colocava, mas um discreto atentismo nos manejos golpistas dos militares republicanos liberais aos quais o PCP se esforçava por colar as movimentações populares de rua, associando-se-lhes ostensivamente; em Outubro-Novembro toda a conjuntura estava marcada pela perspectiva de eleições e pela questão da participação ou não da oposição. Sem grandes resistências, o MUD irá pronunciar-se pelo abstencionismo.

Só a partir de então o MUD passa a ser nomeado como movimento amplamente implantado, o que não eliminava a concepção dirigente que devia ter o CNUAF e os Comités de Unidade Nacional, cujo fortalecimento continua a ser defendido 368, embora

sem grande resultado, a avaliar pela resistência dos dirigentes do MUD a integrarem o MUNAF e pelos sinais de paralisação dos seus órgãos.

Entretanto, o que está em curso é a discreta, mas eficaz tutela do MUD pelo PCP. A segunda e particularmente a terceira Comissão Central do MUD, em Novembro de 1945 e Julho de 1946, reforçam essa tendência.

A partir de finais de Dezembro de 1945 começam as demissões dos subscritores das listas de apoio ao MUD das funções públicas que exerciam, as sedes são encerradas, uma a uma e há estações de correio que dizem ter indicações para recusar o registo de 367Bureau Político do Partido Comunista Português, O Partido Comunista e as Próximas Eleições, Outubro de 1945

368

correspondência em nome do Movimento 369 . Mas, ao mesmo tempo, continua ainda a

ser possível organizar significativas acções de rua, como as manifestações de 31 de Janeiro, já em 1946, no Porto e particularmente em Lisboa.

A manifestação fora, em Lisboa, meticulosamente preparada pelos militantes comunistas na Comissão Distrital do MUD. Fora o caso, por exemplo de Mário Soares que “Havia durante semanas trabalhado intensamente, feito planos e realizado dezenas

de reuniões preparatórias”370. Ao apelo do Movimento teriam estado na rua muitos

milhares de pessoas, 50 mil segundo o PCP. Na base da estátua de António José de Almeida cada comissão do MUD presente depositava uma coroa de flores e apesar do dispositivo policial intimidatório, foi possível organizar dois cortejos que seriam violentamente dispersos, mas já bastante longe do local da estátua, revelando a eficácia organizativa do evento.

Se para Mário Soares, esta demonstração teria suscitado a intensificação do cerco repressivo ao MUD 371, o PCP retiraria daí os necessários dividendos que lhe

permitiam concluir que se inseria numa tendência evidenciada desde Maio do ano anterior em que “o povo português entrou abertamente no caminho da luta política”. Para o Partido Comunista esse era mais um grande passo no caminho da “conquista da

Democracia”. A acção continha os ingredientes políticos essenciais:

“Como no Dia da Vitória é o povo português que canta o hino

nacional e empunha a bandeira nacional e são os fascistas que carregam sobre os que cantam a Portuguesa e arrancam as bandeiras nacionais das mãos dos manifestantes” 372.

Só agora, o PCP deslocava com determinação o eixo da sua intervenção para o MUD, para a defesa da sua legalidade, para o reforço da sua organização. As referências à superior função dirigente do CNUAF perdiam centralidade no seu discurso político.

Por outro lado, também no seio do partido, havia militantes e quadros que desprezavam as possibilidades de trabalho legal pelos efeitos devastadores da repressão e, por isso, sustentavam a prevalência do trabalho ilegal, clandestino, o recurso a acções violentas, afastando-se assim do MUD.

É neste contexto que começam a chegar a Lisboa, vindos do Tarrafal, amnistiados, membros da OCPT que defendiam a “Política de Transição”. O seu 369

Cf. Dossier Repressão. Requisições de emblemas, Arquivo de Manuel João da Palma Carlos

370

Mário Soares, Portugal Amordaçado, Arcádia, s.l., 1974, p. 125

371Cf. Idem, p. 126 372

desembarque no cais de Alcântara, particularmente os muitos que chegaram em Fevereiro de 1946 no navio “Guiné”, motivara uma calorosa recepção de “milhares de

pessoas” 373, preparada através do MUD.

Mas as divergências mantinham-se. Os militantes da OCPT vinham na disposição de cerrar fileiras em torno da defesa da “Política de Transição”, sabiam das adversidades internas que encontrariam. O partido, por sua vez, em nome da defesa conspirativa determina que a integração orgânica desses elementos não fosse nem automática nem colectiva, o que lhe permitia isolar a organização de qualquer contaminação.

Tratava-se de um embate turbulento. Os quadros chegados do Tarrafal confrontados com essa situação acusavam o partido de ter montado um cordão sanitário à sua volta.

Assim, numa lógica de fracção continuam a manter contactos regulares entre si e

com os que não tendo sido amnistiados permaneciam em Cabo Verde374, ao mesmo

tempo que contactam igualmente os militantes legais que conheciam, designadamente ao nível do MUD 375 e ensaiam iniciativas próprias, como a criação de uma editora

associando-se a militantes como Piteira Santos ou Antonino de Sousa 376.

O carácter de fracção é, no entanto implicitamente reconhecido pela direcção do partido, que aceita fazer uma reunião entre dois membros do Secretariado e três dos dirigentes da OCPT – Júlio Fogaça, Militão Ribeiro e Gilberto de Oliveira, reunião aliás não só inconclusiva como abruptamente encerrada377.

O contacto que tomam com a realidade que encontram no interior do país reforça a convicção nas suas propostas políticas. As manifestações da Vitória, o lançamento do MUD, as manifestações de 31 de Janeiro haviam confirmado, no seu entendimento, as razões que sustentavam378.

Mesmo desembarcando num momento em que a repressão sobre o MUD se vinha desencadeando, o ambiente que encontram era ainda de uma certa descompressão motivada pelo final da guerra, que levava, por um lado, a que com algum desaforo fosse 373

Cf. Miguel Wager Russell, Recordações dos tempos difíceis..., p. 132

374Cf. Cartas de Augusto [Costa Valdez] a Júlio [Fogaça], Lisboa, 13 de Março de 1946, mns, 2 pp; a Fernando [Vicente],

Lisboa, 26 de Março de 1946, dact., 2 pp; de Fernando [Vicente] a Júlio [Fogaça], Tarrafal, 13 de Maio de 1946, mns, 3 pp; Academia das Ciências de Lisboa, Herança Júlio Fogaça, 62/4/43

375

Cf. Ramiro, [Júlio Fogaça], Breve Análise de alguns erros..., p. 3

376Cf Carta de [João Faria] Borda a Júlio [Fogaça], Tarrafal, 10 de Fevereiro de 1946, mns, 2 pp, Academia das Ciências... e [Informações] ... [expurgado] de 30 de Abril, 30 de Maio, 24 de Junho, 16 de Julho, 25 de Agosto de 1946, IAN/TT, Pide-DGS, P.

3968-SR, [45]

377Cf. Ribeiro [Gilberto de Oliveira], Queridos Camaradas, Junho de 1950..., pp 2-3 [106-107] 378

habitual encontrar quem criticasse aberta e publicamente o governo e, por outro, que o regime ainda não se tivesse conseguido recompor do abalo provocado pelo desfecho do conflito mundial.

O MUD surgia-lhes como o exemplo do movimento antifascista que defendiam, substancialmente diferente do MUNAF que radicava num acordo e num equilíbrio interpartidário. Viam aí as potencialidades consentâneas com a “Política de Transição”, justamente nos aspectos que a direcção do PCP mais criticava e desconfiava no MUD; viam aí o terreno onde se justificaria a própria suspensão do Avante!,. Achavam que a situação propiciava uma actuação mais abertamente legal, que o partido devia ter um corpo de funcionários reconhecidos como tal e actuando à luz do dia.

Dos contactos que iam estabelecendo valorizam a percepção que julgavam ter das deficiências da vida partidária – ligações esparsas e diluídas com os militantes em trabalho legal, problemas na distribuição da imprensa pela organização, um ambiente criticista por parte dos seus interlocutores, que se queixavam de falta de directrizes, actuações divergentes de militantes com as mesmas tarefas379, enfim, um rol

suficientemente vasto para reforçar a ideia de que era necessário regenerar o partido e que essa era a sua missão.

Ao longo da primeira metade de 1946 realizaram-se várias reuniões com dirigentes da OCPT para discutir o problema da Política de Transição, onde mantinham a ideia de que “haveria que manter uma unidade de vistas e de atitudes que não

enfraquecessem a posição da OCPT”380, isto é, um funcionamento em fracção.

A caminho do IV Congresso era nesta tensão interna que o PCP vivia. De qualquer modo, a situação chegara a um impasse tal que só o congresso deveria resolver.

O IV Congresso vai realizar-se no final de Julho de 1946, na Lousã com a presença de mais de quarenta participantes, entre os quais vários ex-tarrafalistas defensores da Política de Transição, designadamente Júlio Fogaça, Militão Ribeiro, Francisco Miguel, Gilberto de Oliveira ou Augusto Valdez.

O informe central, O Caminho para o derrubamento do fascismo, é mais uma vez apresentado por Álvaro Cunhal, aprofundando as bases fundamentais do informe apresentado dois anos e meio antes ao III Congresso.

379Cf. Ramiro, [Júlio Fogaça], Breve Análise de alguns erros..., p. 3 380

O congresso realizava-se num momento crucial da história do século XX nos primórdios já suficientemente nítidos da guerra fria, que o informe assinalava “A

reacção internacional apoia Salazar porque Salazar torna Portugal uma base para as suas conspirações e manobras, para a sua acção contra os povos livres e contra a URSS” 381.

Do ponto de vista da situação interna, o documento dedica particular destaque à caracterização da formação social portuguesa, ainda que prevaleça uma análise de conjuntura, que condicionava um rasgo de olhar de longo curso. Trata-se, no entanto, de um esforço que, deste ponto de vista avança substancialmente em relação aos materiais do congresso anterior.

A ideia fundamental Álvaro Cunhal pretendia demonstrar era que Portugal não era um país pobre, mas um país onde a pobreza e a miséria resultavam de interesses anti-nacionais, ao serviço da constituição de grandes grupos económicos que o estado protegia à sombra da organização corporativa e sob a protecção directa do governo.

Para o dirigente comunista “Portugal é um país rico. É a política fascista de

protecção aos monopólios que condena Portugal ao atraso e à miséria. As riquezas nacionais, o progresso nacional, o nível de vida do povo, estão submetidos aos interesses dum punhado de exploradores sem pátria que ostentam uma vida de luxo e de prazer. É esses interesses que o salazarismo defende e não os interesses nacionais. A esses interesses – duma minoria parasitária e monopolista –, o salazarismo sacrifica o bem-estar do povo e o progresso nacional” 382

Esta ideia de um Portugal rico, úbere de recursos naturais implicava o aproveitamento pleno da capacidade dos seus solos, das potencialidades da irrigação; da exigência que as disponibilidades alimentares sirvam prioritariamente a alimentação das classes populares. Mesmo as esparsas referências que faz ao desenvolvimento industrial colocam-no sempre a jusante do sector primário; são apenas as indústrias tradicionais – do linho, do vinho, do azeite.

A denúncia que formula quanto à organização corporativa, à sua rede institucionalmente verticalizada, a caracterização da situação económico-social a que procede dos assalariados sem terra e dos pequenos e médios agricultores assentam em bases reformistas – melhor política de arrendamento, mais apoio técnico, alargamento do acesso ao crédito e seu embaratecimento, política de preços agrícolas mais vantajosa. 381 Álvaro Cunhal (Duarte), O caminho para o derrubamento do fascismo..., p. 89

382

Não está ainda aqui qualquer conceito de reforma agrária, por mais que insista em que a política económica do governo conduz à formação ou à consolidação de grupos económicos e de monopólios.

Do mesmo modo, em relação à indústria ou aos transportes. Verbera-se contra as políticas de entrega destes ramos de actividade económica ao sector privado, mas não é explicitamente formulada a bandeira da nacionalização dos meios e sectores de produção considerados estrategicamente decisivos para o desenvolvimento e o progresso do país, aqui e ali sempre genericamente mencionados.

Mesmo o problema candente da electrificação, como esteio do processo de industrialização, é visto apenas do ponto de vista da população que acede à electricidade e do seu consumo per capita, o que sendo um aspecto relevante, indispensável quanto à melhoria das condições de vida, não consegue configurar um modelo de desenvolvimento, para lá do aproveitamento dos recursos naturais e do aumento da produção.

Porém, para além da caracterização da formação social portuguesa, o essencial do Informe Político ao IV Congresso, debruça-se sobre a via para o derrube do fascismo, sistematizando e aprofundando o modelo que ficará conhecido como a via do levantamento nacional.

Considerando então o MUD como o alicerce legal da Unidade Nacional, apontando exaustivamente o que trouxe de novo à situação política o seu aparecimento e estruturação, como que para deixar bem clara a importância que se lhe passava a dedicar, o Informe parte para a sistematização das principais tendência reconhecidas como nocivas que foram germinando no seu seio, justamente as tendências legalistas e defensivas que vinham sendo criticadas pela imprensa comunista havia meses.

Reafirmam-se, em consequência os principais eixos de afirmação do MUD, que consistiam na inserção e dinamização dos protestos, movimentações e lutas populares quer de carácter económico quer, mais importante ainda, de carácter abertamente político; factores determinantes na mobilização de vastos sectores sociais, não perdendo, todavia, de vista que a espinha dorsal da Unidade Nacional era a unidade da classe operária ou, por outras palavras, a reiteração da tese da frente única operária vertebrante da frente antifascista.

Na enumeração dos erros cometidos entre congressos surgia a questão dos GACs associada a uma designada deriva esquerdizante que via a insurreição no imediato e como resultado da acção voluntária do partido e que levava a que o combate a esses

“excessos” fossem combatidos com recurso à obra clássica de Lenine O Esquerdismo,

doença infantil do Comunismo, incidindo sobre as condições objectivas e subjectivas da

insurreição, procurando, explicitamente, precaver o partido contra pulsões e pressões de

esquerda que borbulhariam particularmente junto da sua base operária.

Se através dessa crítica se ergue uma espécie de muro à esquerda, este serve de contraponto à crítica que, à direita, se consubstanciava na “Política de Transição”. A estratégia do partido definia-se assim no espaço entre estas duas balizas, colocando as

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