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3 A INTERNACIONALIZAÇÃO DO ESTADO DA BAHIA (2007-2014), DO

3.2 A AGENDA INTERNACIONAL DO MUNICÍPIO DE SALVADOR (2005-

Em 2005, no primeiro ano de mandato do Prefeito João Henrique Carneiro, a Prefeitura de Salvador assumiu postura inovadora no Estado, ao criar a Secretaria Extraordinária de Relações Internacionais (SECRI). Pela primeira vez, um Município baiano passou a contar com uma Secretaria voltada especificamente para relações internacionais.

Apesar do nome de Secretaria, a estrutura criada não se tratava de uma Secretaria propriamente dita, mas de uma estrutura de Gabinete ligada à Secretaria de Governo. Foi por meio do decreto municipal n. 15.474/2005 que o então Prefeito atribuiu ao cargo de Secretário Extraordinário os encargos de promoção das relações internacionais no município de Salvador. O caput do referido decreto afirma que há a “necessidade de implementar estratégia voltada às Relações Internacionais como instrumento dinamizador de continuidade das ações de intercâmbio cultural, econômico e turístico, ampliando o desenvolvimento de Salvador”. (SALVADOR, 2005)

Segundo o Ex-Secretário Extraordinário de Relações Internacionais de Salvador (2005-2008), Leonel Leal Neto19, o então Prefeito João Henrique entendia que o

Município tinha um grande potencial de inserção no âmbito internacional devido ao seu contexto histórico, cultural e turístico, de modo que poderia alavancar o seu desenvolvimento local a partir dessa atuação externa. A estrutura da Secretaria foi

89 montada com o objetivo de efetivar a internacionalização do Município, fortalecendo a imagem da cidade e potencializando a atração de investimentos internacionais.

A estrutura da SECRI passou por algumas mudanças já na primeira gestão de João Henrique. Inicialmente, eram quatro Coordenações especializadas: Cooperação Bilateral; Relações Multilaterais; Captação de Investimentos Internacionais; e Redes de Cidades. Já ao final de 2007, houve alterações em sua estrutura de Coordenações, notadamente a extinção da Coordenação de Redes e Cidades e a sua substituição pela Coordenação de Cooperação Descentralizada. Por fim, em março de 2008, foi criada a Assessoria de África e Diáspora, que atuaria de maneira transversal abordando questões de raça e gênero. (RIBEIRO, 2009, p. 142-143)

Ademais, no segundo mandato de João Henrique, a SECRI foi extinta juntamente com a Secretaria Municipal de Governo; em seu lugar, foi instalado o Gabinete do Prefeito, que tinha como órgão a Assessoria de Relações Internacionais. Nessa nova estrutura, Leonel Leal Neto cumulou as funções de Chefe de Gabinete e Assessor de Relações Internacionais do Município entre 2009 e 2010. Nos dois anos subsequentes, Leonel continuou como Assessor de Relações Internacionais.

Segundo o Ex-Secretário (informação verbal), a intenção da Prefeitura Municipal de Salvador de fortalecer a articulação internacional com a estruturação da SECRI surtiu efeito sobretudo no que tange à atração de investimentos no setor imobiliário, que ultrapassaram os cem milhões de reais. Além disso, ampliou-se a capacidade de captação de recursos não reembolsáveis e a interação com o sistema ONU. Relativamente à organização, as articulações com o poder municipal resultaram na instalação do escritório do PNUD em Salvador, em 2005, e da primeira Casa da ONU do Brasil20, em 2010, em espaço cedido pela Prefeitura.

Um dos caminhos perseguidos pela Prefeitura durante todo o período analisado foi o de ampliar e fortalecer a participação de Salvador em fóruns e associações de cidades. A cidade já era filiada tanto ao Centro Ibero-Americano de Desenvolvimento Estratégico Urbano (CIDEU), como à União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA). O CIDEU foi um desses espaços onde o Município passou a buscar mais projeção, já que essa associação tinha relevância na troca de aprendizados em planejamento estratégico urbano. No ano de 2007, Salvador ganhou

90 destaque nessa instância ao ser eleita líder da sub-rede do CIDEU no Brasil, projeção essa que ajudou na articulação para que o CIDEU apresentasse à gestão municipal projetos urbanos de planos diretores de várias cidades ibero-americanas. (RIBEIRO, 2008, p. 237)

Para Leonel Leal Neto, a importância do CIDEU se dá no desenvolvimento do planejamento estratégico urbano, na lógica de pensar a cidade como um ente vivo, que tem que ter viabilidade econômica e social atrelada à sustentabilidade; que tem que ser competitiva sem exclusão social. Esse olhar sistêmico trouxe aprendizado para o corpo técnico, o que, potencialmente, gera resultados positivos para o desenvolvimento local.

A UCCLA foi outro espaço relevante para o Município entre 2005 e 2012. A associação é formada por cidades de língua portuguesa e busca fomentar a cooperação e o desenvolvimento econômico entre os Municípios membros. Salvador conseguiu uma aproximação com duas instâncias relevantes: as cidades africanas lusófonas, com as quais o Município conseguiu compartilhar experiências em gestão urbana; e com cidades portuguesas com conhecimento na questão da estruturação urbana, a exemplo de Lisboa, que passou por uma renovação urbana recente atrelada à valorização de seu centro histórico.

A trajetória de Salvador na UCCLA ganhou expressividade no período analisado. Em julho de 2005, Salvador foi selecionada pela UCCLA como a Capital Lusófona da Cultura para o Biênio 2006/2007, após a Assembleia Geral anual da instância ter ocorrido na cidade. À época, em sessão solene na Câmara dos Deputados, o Prefeito João Henrique Carneiro e o Secretário Extraordinário de Relações Internacionais Leonel Leal Neto destacaram a importância do título para a capital da Bahia, sobretudo pelas perspectivas de ampliação das relações bilaterais e multilaterais com as cidades-membro da UCCLA (SALVADOR, 2005). Em 2010, Salvador assumiu a presidência da UCCLA por meio de seu então Vice-Prefeito, Edvaldo Brito, para um mandato de um ano.

A criação da SECRI teve um caráter inicial de construção de uma instância política nova na Prefeitura de Salvador. A partir de então, a articulação internacional da Prefeitura passou a ser de responsabilidade dessa Secretaria, de modo que a estrutura administrativa municipal teve que se adequar à nova sistemática. O objetivo

91 inicial era se consolidar enquanto instância política, seguido nos dois anos subsequentes por uma agenda voltada à atração de investimentos externos, à cooperação técnica e financeira e à participação em eventos e espaços de fortalecimento da atuação internacional a nível local. (RIBEIRO, 2008, p. 218)

Esse foi um período no qual houve crescimento do mercado imobiliário com a atuação internacional da Prefeitura. O desenvolvimento urbano é um dos vetores principais que levam Municípios a atuarem internacionalmente. Nesse sentido, nos primeiros anos de sua existência, a SECRI dedicou esforços a fortalecer os setores imobiliário, hoteleiro e náutico, conseguindo êxito sobretudo no primeiro e no segundo setores em países como Portugal e Espanha. Para que se consolidasse a imagem de Salvador para os investidores desses países, a SECRI atuou realizando missões com foco econômico e de negócios, receptivo de delegações estrangeiras, participação em feiras internacionais de negócios e a divulgação do Município em geral junto à atores internacionais dos setores de interesse. (RIBEIRO, 2008, p. 229)

Relativamente à atração de novos investimentos no exterior, Leonel Leal Neto (informação verbal) destaca que o poder público é responsável por gerenciar essa atração com cuidado, observando a dinâmica do tecido empresarial local e o real fortalecimento do desenvolvimento no Município. As relações internacionais devem ser utilizadas a nível local com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento, sob pena de causar exclusão social. Ainda segundo o antigo gestor, o desenvolvimento precisa ser sempre acompanhando de inclusão social e suas contradições precisam ser constantemente gerenciadas.

Importante ressaltar que o Município de Salvador já se relacionava com atores internacionais em outras gestões municipais, mas isso era feito de modo pulverizado entre as diversas Secretarias e órgãos existentes. Não havia uma coordenação ou uma estrutura que articulasse as relações internacionais do Município. Em que pese o novo aparato administrativo ter sido implantado em 2005 com a criação da SECRI, a cidade já possuía relacionamento anterior com outros governos subnacionais, acordos de irmanamento e participação em missões e eventos do gênero.

Em 2007, Salvador se tornou membro da Associação Internacional de Cidades Educadoras (AICE), uma Associação que atua nos cinco continentes e que tem como objetivo “auxiliar governos, prefeituras, secretarias e cidades a implementarem

92 medidas voltadas ao desenvolvimento integral de seus habitantes, tendo a educação, a equidade e os direitos humanos como alicerces” (CIDADES EDUCADORAS, 2019). No mesmo ano, o Município sediou o evento da AICE em parceria com a Prefeitura de Salvador e de Belo Horizonte, intitulado O Direito a uma Cidade Educadora. O evento contou com a participação de diversas autoridades estaduais, municipais e de entidades que atuam na área da educação. (UNDIME, 2007)

Ainda no âmbito da associação do Município de Salvador à AICE, a Secretaria Municipal de Educação implantou, em 2008, o programa Cidade Educadora em todas as escolas públicas municipais. Assim, Salvador se tornou a primeira capital a adotar o programa, que tinha como objetivo efetivar um conjunto de ações, produtos e serviços integrados que colaborassem para a articulação entre os conteúdos curriculares, a literatura e o trabalho com valores. Um dos projetos desenvolvidos no âmbito do programa é o Bairro-Escola Rio Vermelho (BERV), iniciativa que mobiliza poder público e sociedade civil para promover inovações nas escolas da região. (MEKARI, 2015)

A partir dos pontos analisados, percebe-se que o Município de Salvador vivenciou a atividade paradiplomática de maneira estruturada, com formatações específicas da administração pública que visavam a criação de uma agenda permanente de atuação internacional, bem como articulou com diversos entes internacionais no período, notadamente as redes de cidade e o Sistema ONU. Além da atuação a nível estadual, os Municípios também conseguem implantar uma agenda internacional propositiva, a exemplo de Salvador.

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