• Nenhum resultado encontrado

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES

5.3 PERCEPÇÃO DOS PRINCIPAIS SEGMENTOS

5.3.2 A Agricultura

Os agricultores entrevistados, predominantemente, são de unidade familiar, cultivando principalmente mandioca, banana e arroz para subsistência, com alguma comercialização de excedente. Foram entrevistados 31 agricultores, perfazendo 38,75 % dos entrevistados. O tamanho médio das

propriedades foi de quinze hectares. Toda a região apresenta problemas fundiários, principalmente no que diz respeito à sobreposição de títulos de propriedade. A maior concentração de imóveis está localizada na bacia do Rio Tagaçaba e Serra Negra e do Rio Guaraqueçaba.

A representação da unidade familiar rural divide-se em área nuclear, roçado e floresta. A área nuclear é composta pela residência (compreendendo o jardim e quintal).

Afastado da unidade nuclear encontra-se o roçado, onde são desenvolvidas as atividades econômicas de agricultura de subsistência. A observação dos recursos florestais nas áreas de manejo permite ao agricultor local elaborar experimentos agroflorestais rudimentares. O estímulo ao pequeno produtor no experimento de espécies potenciais para o desenvolvimento de sistemas agroflorestais deve ser incentivado, valorizando o conhecimento já adquirido para o desenvolvimento e manejo de consórcios florestais (LIMA, 1996).

Sobre a infra-estrutura, há um consenso sobre a situação crítica vivida pela população do continente vive em função das péssimas condições da estrada (PR-405), e uma divergência de opiniões sobre as ações a serem tomadas em relação a essa questão.

Nesse aspecto, a maior parte (cerca de 90%) dos moradores da sede do município e das comunidades marginais à estrada, a maior parte apóia não o asfaltamento da estrada, mas a reparação e manutenção constante da mesma, de forma a criar condições de tráfego, o que traria uma série de benefícios, entre eles a própria conservação da área, pela facilidade de fiscalização e controle da mesma. Para Rodrigues et al. (2003), a densidade demográfica não tem justificado maiores investimentos em infra-estrutura.

As práticas agrícolas da população guaraqueçabana foram herdadas dos antigos indígenas que ocupavam a região. Segundo SPVS (1994), estas práticas possuem uma dinâmica que permite o manejo de trechos da floresta. A roça de subsistência, também conhecida como “coivara” é aberta em uma área de floresta, aonde após o processo de corte, derrubada e queima, os nutrientes são suficientes para o plantio de mandioca, banana,

feijão, milho, cará, inhame entre outros. “A área após três anos de uso é abandonada por um período de 10 anos, permitindo sua recuperação”.

O caminho entre a sede da unidade familiar até a roça torna-se área de observações e manejo de espécies por parte dessas comunidades. Os roçados permitem ao agricultor o manejo de espécies frutíferas e de valor econômico. São locais de observação, aprendizado e manejo do aproveitamento de recursos florestais (LIMA, 1996).

Conforme Rodrigues et al. (2003), os principais tipos de produtores rurais do município de Guaraqueçaba são: aqueles cuja renda agrícola sustenta a reprodução simples (12%); os semi-proletários, cuja renda agrícola não sustenta a reprodução simples, tendo a família que obter a maior parte da renda fora do trabalho agrícola (52%). Em terceiro viriam os agricultores que vendem força de trabalho, cuja renda agrícola não sustenta a reprodução simples e suas outras rendas são menores que a renda agrícola (6%) e por último os agricultores indigentes: a renda agrícola não sustenta a reprodução simples; não possuem outras rendas (23%). Tem-se ainda as fazendas, compondo 7% da distribuição da força de trabalho na região (na grande maioria para criação de búfalos).

A maioria dos agricultores do município de Guaraqueçaba vive em situação inviável ou insustentável economicamente, ao considerar a renda que essa maioria obtém da agricultura. Complementarmente, constata-se a elevada importância das outras rendas (outras ocupações e aposentadorias) para sustentar a reprodução das famílias (RODRIGUES et al., 2003).

Os referidos autores apontam que a situação de indigência dos 23% dos agricultores pode estar encoberta pela condição peculiar gerada pela legislação da APA: a legislação vigente não permite e penaliza a extração de palmito. Esta é uma atividade realizada de modo clandestino por grande parte da população nativa da região. Embora seja contraditório, por outro lado, os recursos derivados do palmito, ainda que contribuam para melhorar o nível econômico da população rural, não têm, em geral, importância decisiva para o conjunto dos habitantes rurais do município, a ponto de proporcionar condições de vida ''sustentáveis''.

Ainda que seja considerado pelas comunidades rurais um recurso apropriado, atualmente a exploração do palmito é difícil devido a escassez do produto e as condições de comercialização.

Rodrigues et al. (2003) afirmam que a situação de crise e insustentabilidade da agricultura e dos agricultores no município de Guaraqueçaba se circunscreve em uma crise generalizada da agricultura de pequena escala, no nível mundial, decorrente de um forte processo de concentração da base agrária, falta de competitividade dos seus produtos- chave (banana e mandioca) e conseqüentes mudanças na distribuição espacial da população rural/urbana.

Embora esse aspecto também seja relevante, o que predomina no município entre os segmentos estudados é o clima de instabilidade social causado pela presença de instituições ambientais, ONGs ambientalistas e aplicação de leis não compreendidas pela população como foco central da crise presente na região. A junção desses dois aspectos conjunturais teve assim um efeito devastador para a estrutura produtiva tradicionalmente praticada na região.

Analisando a série histórica de dados de produção e produtividade da mandioca e da banana, detectou-se o estancamento desses indicadores entre o período 1983–1999 (PARANÁ, 1999).

As condições do mercado de farinha de mandioca e de banana são, em geral, desfavoráveis. Há uma tendência de diminuição do consumo desses produtos.

Também não tem havido políticas permanentes e bem planificadas de pesquisa agrícola, de assistência técnica, de apoio à produção local.

A legislação interfere no uso das terras às margens dos cursos d'água e das terras em encostas acentuadas, fazendo com que os agricultores de menores recursos econômicos, que ocupam as terras marginais, sejam mais prejudicados. Esta situação determina a impossibilidade de utilizar terras de melhores condições localizadas nas várzeas dos rios, nos baixios aproveitáveis e nas encostas. O processo de autorização do IBAMA para o “desmate” vem a ser lento, muitas vezes concluído fora dos prazos dos

calendários técnicos correspondentes às diversas culturas, situação que configura um desestímulo à realização das atividades agrícolas.

Rodrigues et al. (2003) argumentam que o que torna inviável economicamente os sistemas de produção atuais não seriam os instrumentos legais de proteção ambiental, e sim as condições de mercado, o baixo preço de venda dos produtos, as condições de transporte, além da qualidade, da escala de produção, da escassa diversificação da oferta de produtos mercantis.

Um aspecto relevante foi observado por um entrevistado sobre o desmatamento na região. Enquanto o local encontrava-se sob o domínio do machado e dos pequenos roçados de queimada, a região estava protegida. Após a introdução da moto-serra, houve ameaça real para as florestas de Guaraqueçaba - “ninguém segura o homem” (João Amadeu, nativo e morador de Guaraqueçaba). Ou seja, enquanto a cultura encontrava-se sob o domínio caiçara, havia sustentabilidade nos sistemas. Após a entrada dos modelos convencionais de consumo intensivo dos recursos naturais, houve uma quebra nas regras tradicionais culturais.

FIGURA 09: AGRICULTOR FAMILIAR DE TAGAÇABA