• Nenhum resultado encontrado

A agricultura urbana e os espaços verdes necessitam de água para a sua manutenção e competem com outros usos urbanos da água. Na Europa do sul, a competição pode ser agravada especialmente durante os meses de verão. As alterações climáticas, ao destabilizarem o ciclo hidrológico, tendem a exacerbar estes problemas (Wagner e Breil, 2013). As projeções indicam uma descida da precipitação que será muito crítica para as atividades humanas e, que será acentuada pelo aumento das temperaturas, levando a secas mais frequentes (Bates et al., 2008; Lionello et al., 2014). No meio urbano, o principal uso da água é para o consumo humano, o que significa que outras fontes de água não potável poderiam ser usadas para a agricultura, desde que tenham um fornecimento constante e sejam seguras para a saúde pública. Deste modo, à medida que os abastecimentos de água centralizados se tornam mais propensos à escassez de água, o fornecimento é ampliado para incluir fontes "descentralizadas" existentes na própria cidade. A utilização de água reciclada e dessalinizada são muitas vezes apontadas como medidas de adaptação, embora no primeiro caso hajam preocupações relativas à saúde e à segurança alimentar, e no segundo caso estejam associados elevados custos energéticos. O uso de água subterrânea tem como uma das vantagens ter um custo menos elevado que a utilização da água de rede ou reciclada. A necessidade de água para rega pode ser diminuída através da introdução de espécies mais adaptadas às alterações climáticas, mudança nas datas de plantação, na adoção dos sistemas de irrigação e na reabilitação de sistemas antigos (Bates et al., 2008). Aumentar a eficiência do uso da água, no entanto, pode ser contraproducente se a mesma quantidade de água é consumida simplesmente porque há mais (paradoxo de Jevons). Desta forma, é necessário uma combinação do aumento da produtividade da água e uma boa governação para cobrir o uso total de água para irrigação (Elbehri et al., 2017). Na cidade de Perth, Austrália, o consumo de água subterrânea para irrigação, através de furos privados, resultou na poupança da cidade em água tratada para consumo humano. Todavia, os cidadãos que usaram esta fonte de água consumiram mais água para a irrigação, do que os que usaram outras origens. Uma sequência de verões excecionalmente secos resultou na imposição por parte da autoridade da água de Perth, de restrições ao consumo da água para rega, independente da sua origem (Saayman e Adams, 2002). Existem, assim, alguns aspetos chave que devem ser abordados (Foster e Hirata, 2011), como a promoção da gestão conjunta por parte das concessionárias dos recursos de água subterrânea e a regularização de furos privados em áreas urbanas. Neste contexto, a resiliência das cidades poderá passar pelo uso da água de acordo com a sua qualidade, pela promoção de recarga natural e da recarga artificial dos aquíferos urbanos e, pela utilização de métodos de produção agrícola mais eficientes no uso dos recursos, nomeadamente solo e água.

4. Usos da água subterrânea para a agricultura em Lisboa

Desde os tempos mais remotos que Lisboa foi abastecida por água subterrânea captada em poços, minas e nascentes localizadas na área citadina ou nas suas vizinhanças. Em meados da década de 40 do século passado existiam 3360 pontos de água entre poços, furos e minas, muitos deles para uso agrícola (fig.2) (Ribeiro et al.,2010).

58

Figura 2 – Localização das captações de água subterrânea na área Metropolitana de Lisboa, na década de 40 e respectivo enquadramento geológico (Esc. 1/10000).

A sua distribuição espacial encontra-se localizada preferencialmente em três litologias: Formação das Argilas e Calcários dos Prazeres, Formação de Benfica e Complexo Vulcânico de Lisboa, estando mais relacionada com a forma como ocorreu a expansão urbana, no passado, do que com a produtividade das formações captadas.

Ocupando a vertente norte da colina do Castelo de São Jorge, a Mouraria está intimamente ligada à história da cidade. À sua topografia acidentada correspondeu um traçado sinuoso que, descendo pela encosta até ao vale de água abundante, se traduziu numa actividade agrícola constituída, essencialmente, pelas culturas da oliveira e da vinha, e pela exploração de quintais em que a água subterrânea desempenhou um papel histórico.

59

O território onde actualmente está delimitada a freguesia do Lumiar, conheceu ocupação humana desde os alvores da pré-história. No séc. XVI definiram-se dois núcleos populacionais originando um incremento da construção de edifícios laicos e religiosos. No início do séc. XVIII, era definido o Lumiar, como "um sítio de nobres quintas, olivais e vinhas", Actualmente os espaços verdes são escassos e estão praticamente limitados a pequenos jardins, ao Parque das Quintas das Conchas e dos Lilases e ao Parque Monteiro-Mor. Os poços na zona do Luminar captam formações sedimentares holocénicas e miocénicas, de origem marinha, de grande complexidade litológica, as quais apresentam grande variabilidade de características hidrodinâmicas. Em alguns espaços como o Parque do Monteiro-Mor e a Quinta das Conchas e Lilazes a água subterrânea captada em poços e galerias de mina continua a ser utilizada para rega.

Referências Bibliográficas

Bates, B.C., Kundzewicz, Z.W., Wu, S., Palutikof, J.P. e Eds., 2008. Climate Change and Water. Technical Paper of the Intergovernmental Panel on Climate Change, IPCC Secretariat, Geneva.

Berry, P.M., Betts, R.A., Harrison, P.A., Sanchez-Arcilla, A. e Eds., 2017. High-End Climate Change in Europe, Sofia.

Bhaskar, A.S., Welty, C., Maxwell, R.M. e Miller, A.J., 2015. Untangling the effects of urban development on subsurface storage in Baltimore. Water Resources Research, 51(2): 1158-1181.

Cameron, Ross W.F.; Blanuša, Tijana; Taylor, Jane E.; Salisbury, Andrew; Halstead, Andrew J.; Henricot, Béatrice; Thompson, Ken. The domestic garden – Its contribution to urban green infrastructure, Urban Forestry & Urban Greening, Volume 11, Issue 2, 2012, Pages 129-137, ISSN 1618- 8667, http://dx.doi.org/10.1016/j.ufug.2012.01.002

Elbehri, A., Challinor, A., Verchot, L., Angelsen, A., Hess, T., Ouled Belgacem, A., Clark, H., Badraoui, M., Cowie, A., De Silva, S., Erickson, J., Joar Hegland, S., Iglesias, A., Inouye, D., Jarvis, A., Mansur, E., Mirzabaev, A., Montanarella, L., Murdiyarso, D., Notenbaert, A., Obersteiner, M., Paustian, K., Pennock, D., Reisinger, A., Soto, D., Soussana, J-F., Thomas, R., Vargas, R., Van Wijk, M. & Walker, R. , 2017. FAO-IPCC Expert Meeting on Climate Change, Land Use and Food Security: Final Meeting Report, FAO and IPCC.

Foster, S., Chilton, J., Nijsten, G.-J. e Richts, A., 2013. Groundwater—a global focus on the ‘local resource’. Current Opinion in Environmental Sustainability, 5(6): 685-695.

Foster, S. e Hirata, R., 2011. Groundwater use for urban development: enhancing benefits and reducing risks, On the water front-2011. Stockholm International Water Institute, Stockholm, pp. 21-33.

Haase, D., 2009. Effects of urbanisation on the water balance – A long-term trajectory. Environmental Impact Assessment Review, 29(4): 211- 219.

Haase, D. e Nuissl, H., 2007. Does urban sprawl drive changes in the water balance and policy? Landscape and Urban Planning, 80(1): 1-13. Lionello, P. et al., 2014. The climate of the Mediterranean region: research progress and climate change impacts. Regional Environmental Change, 14(5): 1679-1684.

Musolff, A., Leschik, S., Reinstorf, F., Strauch, G. and Schirmer, M., 2010. Micropollutant Loads in the Urban Water Cycle. Environmental Science & Technology, 44(13): 4877-4883.

Quintino, M., & Alfaiate, T. (2008). Permeable inner yards. Drawing. AutoCAD.AL-HAMA - Methodology for Integrating Groundwater in Sustainable Planning and Management of Urban Landscapes. The Case-Study of Alfama, Lisbon.

Renouf, M. A. and Kenway, S. J. (2016), Evaluation Approaches for Advancing Urban Water Goals. Journal of Industrial Ecology, 21: 995–1009. doi:10.1111/jiec.12456

Ribeiro L. (coord.), Buxo A, Pires C., Matos C., Silva C, Oliveira E., Miguens F., Nascimento J., Moreso L., Condesso de Melo M.T. Amaro S. (2010) Geo-referenciação e caracterização da água subterrânea dos poços, furos e minas da cidade de Lisboa. Relatório final, EPAL, 70p.

Saayman, I.C. e Adams, S., 2002. The use of garden boreholes in Cape Town, South Africa: lessons learnt from Perth, Western Australia. Physics and Chemistry of the Earth, Parts A/B/C, 27(11): 961-967.

Tubau, I., Vázquez-Suñé, E., Carrera, J., Valhondo, C. e Criollo, R., 2017. Quantification of groundwater recharge in urban environments. Science of The Total Environment, 592: 391-402.

60

Verbeeck, K., Van Orshoven, J. e Hermy, M., 2011. Measuring extent, location and change of imperviousness in urban domestic gardens in collective housing projects. Landscape and Urban Planning, 100(1): 57-66.

Wagner, I. e Breil, P., 2013. The role of ecohydrology in creating more resilient cities. Ecohydrology & Hydrobiology, 13(2): 113-134.

Yang, Y., Lerner, D.N., Barrett, M.H. e Tellam, J.H., 1999. Quantification of groundwater recharge in the city of Nottingham, UK. Environmental Geology, 38(3): 183-198.

Zipper, S.C., Soylu, M.E., Kucharik, C.J. e Loheide Ii, S.P., 2017. Quantifying indirect groundwater-mediated effects of urbanization on agroecosystem productivity using MODFLOW-AgroIBIS (MAGI), a complete critical zone model. Ecological Modelling, 359: 201-219.

61

Soluções (sedutoras) de Design para uma alimentação sustentável

Documentos relacionados