Capítulo II Contexto de análise: uma aldeia do barrocal do Algarve
2.2. A aldeia de Alte no contexto do município de Loulé
O concelho de Loulé, o maior da província do Algarve, tem uma área de 765
quilómetros quadrados.
Este concelho distribui-se, no momento da elaboração da presente dissertação, por
onze freguesias e é constituído por quatro zonas com caraterísticas distintas: a Serra, a
Beira Serra, o Barrocal e o Litoral (CML, 2012) (ver figura 2.2).
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Figura 2.2 - Mapa do concelho de Loulé
Fonte: www.cfp.es-loule.edu.pt - consultado a 2 de Maio de 2012
De acordo com Veiga e Silva (2003), o concelho de Loulé encontra-se numa
posição estratégica, a meio da região algarvia. O concelho de Loulé é um dos que mais
turismo atraiu nos últimos anos. Destacam-se empreendimentos como a Quinta do Lago,
Vilamoura, Dunas Douradas, Vale do Lobo ou Vila Sol; o património natural como a Ria
Formosa, as Paisagens Protegidas Locais da Fonte Benémola e da Rocha da Pena; as praias
de Vilamoura, Quarteira, Vale do Lobo, Garrão, Ancão e Quinta do Lago; as aldeias rurais
do interior como Alte, Salir e Querença; o património construído; as grutas de Loulé,
destacando as minas de Sal Gema; o património arqueológico como a anta do Alagar, a
necrópole da Vinha do Casão, as ruínas romanas do Cerro da Vila; os campos de golfe e as
festividades locais das quais destacamos as festas da Mãe Soberana, o secular Carnaval de
Loulé e os modernos eventos como o Festival MED, o Festival de Jazz e a Noite Branca
são, sem dúvida, recursos que promovem esta atração.
O concelho faz a fronteira entre o barlavento e o sotavento e até metade do século
passado era um concelho agrícola, mas hoje o litoral tem uma densa expansão urbana e
demográfica causada pelo desenvolvimento turístico e o interior apresenta um abandono
populacional, enquanto a sede de concelho dedica-se sobretudo aos serviços (Sousa, 2005).
Relativamente à cidade de Loulé, esta remonta ao período do Paleolítico Inferior
Carrusca (2001). No que diz respeito ao património construído podemos destacar a Torre
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da Vela; a Igreja Matriz de Loulé, antiga mesquita árabe; o castelo e sua alcáçova; o pano
de muralhas; a porta do Convento da Graça; a ermida de Santana, no palácio Gama Lobos;
a ermida de Nª Senhora dos Pobres e o seu cruzeiro; a Igreja de S. Francisco; a ermida de
Nª Senhora da Conceição; o Convento de Santo António; a ermida e o Santuário da Nª
Senhora da Piedade; o Convento do Espírito Santo; o Mercado de Loulé; o palácio da
Fonte da Pipa e o Cineteatro Louletano.
Já no que diz respeito à freguesia de Alte, de acordo com os Censos de 2011, esta
freguesia tem uma população residente de 1.997 habitantes (ver gráfico 2.3). Comparando
com os resultados dos Censos de 2001 (2.176 habitantes), verificamos que existe uma
perda de 179 habitantes.
Gráfico 2.3 - Número de habitantes da freguesia de Alte - Censos 2011
Fonte: INE
Segundo Raposo (1995) a freguesia de Alte, com cerca de 97 quilómetros
quadrados, encontra-se em posição central relativamente à região do Algarve e no extremo
noroeste do concelho a que pertence. Integra território das sub-regiões do barrocal, beira-
serra e serra algarvia e dista, aproximadamente, 24 quilómetros da sede de concelho.
No dizer de Oliveira (1989) a origem de Alte provém da lenda que nos fala de uma
rica lavradora que vinda do Freixo Verde se dirigia todos os domingos à missa na ermida
de Santa Margarida. Um dia, o padre não esperou pela dita lavradora para iniciar a missa e
esta, quando passava pelo local que hoje é Alte, foi informada de que a missa já havia
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terminado e descontente disse: “Alto! Aqui mandarei edificar uma igreja”, o que de facto
veio a suceder.
Em 1988, a freguesia ficou sem a área da atual freguesia de Benafim, que a esta
data se constituiu como tal. Segundo a Junta de Freguesia de Alte (2012) a freguesia tem
aproximadamente 60 montes. Existem algumas aldeias abandonadas, casos da Rocha
Amarela e da Soalheira, sinal de desertificação que se vai cada vez mais sentindo no
interior (ver figura 2.3)
Figura 2.3 - Mapa da freguesia de Alte
Fonte: Junta de Freguesia de Alte
Segundo Raposo (1995), a atual freguesia de Alte terá sido habitada desde a época
do neolítico, há 4000 anos a.C. O povo que aqui se encontrava praticava a agricultura e a
pastorícia, sendo ainda seminómada. Utilizava algumas grutas existentes na freguesia
como abrigo e outras para enterramento dos seus mortos. Já na época da Idade dos Metais,
a área da freguesia era muito importante, pois possuía 12 minas de cobre. Durante a
ocupação romana deveria existir uma ligação secundária que passava na freguesia, ligando
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Salir e Messines, com o principal objetivo de fazer o escoamento de produtos extraídos das
minas e do esparto que aqui era fortemente cultivado, base da produção de cordas e alcofas
utilizadas pelos mineiros. Pensa-se, também, que terão existido várias villae agrícolas nos
atuais locais de Santa Margarida, Cerca do Zambujal, Fonte Santa, Quinta do Morgado e
Corte Bucho, graças à descoberta de vários achados arqueológicos. No período
muçulmano, junto do cerro da Rocha Maior terá existido um paço, sobre o qual no século
XVII se construiu um tanque para rega dos pomares de laranja e um castelo semelhante aos
de Salir e de Paderne, que terá dado origem ao nome de um dos cerros de Alte. Deste
período foram, ainda, encontradas sepulturas e vários outros vestígios arqueológicos. No
século XIII surge o domínio senhorial de Alte, atribuído a João Gomes de Ribadeneyra,
que se distingue nas lutas contra os muçulmanos, durante o reinado de D. Afonso III. Os
senhores de Alte tiveram, desde então, uma importância muito grande, destacando-se o 17º
senhor de Alte, Manuel Ribadeneyra que teve um papel ativo contra o domínio espanhol,
no século XVII. Ainda neste século, as principais culturas do morgado eram a laranja, o
figo e o azeite. Nesta altura, o esparto continuava a ter grande importância, sendo a
segunda atividade económica a seguir à agricultura. Existiam, ainda, a extração de minério,
a palma, o linho, a aguardente de figo ou de medronho e a lã de ovelha. No século XIX, é
construída a ponte de Alte e abre-se a estrada nacional em alcatrão até São Bartolomeu de
Messines, abre uma escola primária, uma das poucas no interior e desenvolve-se ainda
mais a indústria do esparto. No século XX, com as constantes campanhas do trigo, o solo
torna-se cada vez menos agricultável e nos anos 50 expande-se o fenómeno da emigração
para vários países. A partir dos anos 80 investe-se na modernização da agricultura e no
comércio, registando-se o regresso de muitos emigrantes. A sede de freguesia é a mais
beneficiada em termos de desenvolvimento. Na década de 90 e nos primeiros anos deste
século desenvolvem-se infraestruturas importantes como a Escola Profissional de Alte, o
Polo do Esparto, o Posto de Informação Turística, o Alte Hotel, a Horta das Artes e o Polo
de Cândido Guerreiro e Condes de Alte.
No que diz respeito ao desenvolvimento arquitetónico da aldeia, afirmam Raposo e
Silva (2000) que a parte mais antiga da aldeia se desenvolveu na margem direita da ribeira,
junto da Igreja Matriz, datada do final do século XIII. O conjunto de ruelas íngremes e
chaminés rendilhadas está aqui localizado. No começo do século XIX começam a aparecer
as casas mais urbanas, por influência dos ricos comerciantes de esparto, com novos
elementos decorativos. No entanto, é nos últimos 40 anos do século passado, com o
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regresso de muitos emigrantes à aldeia natal, que surgem muitas modificações com o
aparecimento de casas com influências de vivenda suburbana. A modernização e melhoria
de infraestruturas desenvolveram-se a partir do 25 de Abril, o que levou, igualmente, à
perda de algum património precioso da aldeia, com a reconversão e alteração desse mesmo
património.
Considerando Raposo (1995), é fácil aperceber-se que, tal como sucede com quase
todas as freguesias do interior do concelho de Loulé, é cada vez mais notório o
envelhecimento da população, a taxa de natalidade reduzida e a baixa escolaridade. No que
diz respeito às atividades económicas ainda subsiste a agricultura, os trabalhos artesanais, o
comércio e serviços na área do turismo. Nos anos 20 do século passado, o Guia de Portugal
apresentava nos itinerários turísticos ao Algarve, uma visita a Alte, passando pela Queda
do Vigário e pela Rocha dos Soidos.
Em 1938 a aldeia participou nas provas do concurso da Aldeia Mais Portuguesa de
Portugal e, embora desclassificada na fase final do concurso, esse facto deu-lhe
reconhecimento a nível regional. Nessa altura é feita a primeira apresentação, de propósito
para este acontecimento, de um grupo informal de folclore que vem a ser oficialmente
fundado em 1939 como Grupo Folclórico de Alte, e que em 1948 passa a fazer parte da
Casa do Povo de Alte (Raimundo, 2013). Começam-se a desenvolver algumas
infraestruturas e os visitantes começam a procurar a aldeia. O grande desenvolvimento
surge, sobretudo nos anos 70 e 80 do século passado.
Relativamente ao património construído e natural da aldeia, destaca Sousa (2003) a
Fonte Pequena, local onde passa a ribeira com água pura e onde se encontram o
monumento e os painéis de azulejo dedicados à obra do poeta altense Cândido Guerreiro.
Um pouco mais a norte, a cerca de 500 metros, situa-se a Fonte Grande, local utilizado
para as comemorações do 1º de Maio e dos festivais de folclore. Aqui, a ribeira transforma-
se, no verão, numa piscina para quem quer banhar-se nas suas águas frescas.
Na aldeia, pode-se ainda encontrar a ermida de S. Luís, datada do século XVIII; a
Rua dos Pisadouros, com os painéis de azulejo evocativos da tradição do esparto na aldeia;
a casa onde nasceu o poeta Cândido Guerreiro; a Igreja Matriz e o antigo hospício,
posteriormente Casa dos Condes de Alte e hoje polo museológico. Existem ainda outros
recursos como o polo do esparto; a queda de água do Vigário; o armazém da alfarroba
transformado num dos polos da Escola Profissional de Alte; a Horta das Artes, um
pequeno centro cultural local de artes plásticas, com estúdio para representações teatrais; a
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Off the Wall, uma galeria de exposições; o Papa-figos, onde se produzem artesanalmente
sabonetes com azeite e essências naturais aromáticas; o monumento a José Cavaco Vieira,
antigo presidente de junta e fundador do Grupo Folclórico de Alte, entre muitos outros
cargos; e os miradouros da Galvana e dos Soidos. Existe, ainda, o hotel rural Alte Hotel,
vários restaurantes e alguns locais de venda de artesanato. No que respeito aos eventos
destacamos o Carnaval, a Semana Cultural - que inclui uma prova nacional de BTT e um
passeio pedestre e as comemorações do 1º de Maio -, o festival de folclore de verão e as
festas de S. Luís.
Como conclusão, destacamos que a aldeia ainda apresenta um aspeto coeso de
povoação alcandorada, no meio de vários cerros de onde destacamos os quatro principais:
Galvana, Castelo, Francelheira e Rocha Maior, e o seu casario branco construído na
margem da ribeira de Alte. Quando a entrada se faz pela estrada proveniente de Loulé,
avista-se a planície da Várzea do Morgado, em contraste claro com a aglomeração de
casario da aldeia (Sousa, 2005).
Quando o olhar do visitante é mais astuto, pode verificar-se que existem várias
alterações à arquitetura tradicional da aldeia, que algumas intervenções realizadas acabam
por destacar, e que a aldeia assume, mais do que nunca, um aspeto vazio de população.
Acaba por ser a escola profissional, que aqui existe, a origem da existência de duas
centenas de jovens que diariamente “vivem” na aldeia e que organizam atividades que
trazem ainda mais pessoas ao local.
Apresentam-se, nas páginas seguintes, quatro pranchas fotográficas com imagens
de alguns dos principais recursos da aldeia de Alte.
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Figura 2.4- Vista geral da aldeia de Alte
Figura 2.5-Igreja Matriz de Alte
Figura 2.6- Ermida de São Luís
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Figura 2.7 - Casa onde nasceu Cândido Guerreiro
Figura 2.8 - Polo museológico do esparto
Figura 2.9 - Polo museológico do esparto (interior)
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Figura 2.10 - Polo museológico Cândido Guerreiro e Condes de Alte
Figura 2.11 - Queda do Vigário
Figura 2.12 - Vista da Fonte Grande (Fotos da autora)
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Figura 2.13 - Vista da Fonte Pequena
Figura 2.14 - Estátua a José Cavaco Vieira
Figura 2.15 - Painel de azulejos na Rua dos Pisadouros (Fotos da autora)