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A Análise de Discurso como abordagem teórico-metodológica

CAPÍTULO 3 – Abordagem teórico-metodológica da pesquisa

3.2 A Análise de Discurso como abordagem teórico-metodológica

No capítulo 2, discorri sobre o arcabouço teórico da ADC, com foco nos aspectos ontológicos, epistemológicos e sua interface com outras ciências. Nesta seção, apresento a ADC como abordagem teórico-metodológica para a investigação de questões que envolvem linguagem e poder, afinal a ADC é, ao mesmo tempo, uma teoria e um método, isto é, uma abordagem que dispõe de uma base teórica e metodológica para estudos sobre a linguagem e sua relação com outros elementos da vida social (CHOULIARAKI & FAIRCLOUGH, 1999).

Nessa perspectiva, segundo Ramalho e Resende (2011), a Análise de Discurso Crítica oferece ferramentas analíticas para o mapeamento de conexões entre aspectos semióticos e não essencialmente semióticos com dois objetivos, a saber: investigar mecanismos causais e seus efeitos ideológicos e pensar em opções para tentar superar relações assimétricas de poder que podem ser legitimadas em/por textos. Dessa forma, uma vez que discursos se materializam em textos, estes constituem o material empírico do/a analista.

Chouliaraki e Fairclough (1999, p. 60), apresentam uma proposta de arcabouço teórico-metodológico para a ADC, com base na proposta crítica explanatória do RC, o qual está apresentado no Quadro 3.1, a seguir :

Quadro 3.1 – Abordagem teórico-metodológica da ADC 1. Percepção de um problema social com aspectos semióticos

2. Identificação de obstáculos para que o problema seja superado

a) Análise da conjuntura b)Análise da prática particular:

(i) práticas relevantes

(ii) relação do discurso com outros momentos c) Análise de discurso

(i)análise estrutural: as ordens de discurso (ii)análise interacional

3. Investigação da função do problema na prática

4. Investigação de possíveis modos de ultrapassar os obstáculos 5. Reflexão sobre a análise

Fonte: Chouliaraki e Fairclough (1999, p. 60).

A pesquisa crítico-explanatória parte de um problema social com aspectos

semióticos, isto é, uma questão social que envolve poder, potencialmente sustentada por

discursos particulares. Nesse sentido, este estudo foca as representações/discursos potencialmente ideológicas sobre mobilizações grevistas e professores/as envolvidos/as que podem ser legitimadas em (inter)ações/gêneros da mídia impressa e inculcadas em identidades particulares e sociais/estilos. A preocupação com os discursos sobre as mobilizações grevistas é lícita, uma vez que, conforme já referido no Cap. 2, discursos veiculam ideologias e essas servem para legitimar ou alterar, assegurar ou reverter relações de poder, portanto, as reportagens do jornal Correio Braziliense podem servir a propósitos de grupos hegemônicos, além de contribuir para a construção de identidades sociais (dos/as professores/as) enfraquecidas ou empoderadas.

A seguir, o/a pesquisador/a tenta identificar os obstáculos que se interpõem à resolução do problema, fazendo as seguintes análises: (a) da conjuntura; (b) da prática particular; (c) de discurso. A análise da conjuntura detalha a configuração das práticas nas quais o discurso está inserido; nesta pesquisa, foi possível perceber que em países em que políticas neoliberais ditam regras, a educação não é prioridade, portanto seus/suas profissionais não são valorizados/as. Nosso país ocupa o 88º lugar de 127 no

ranking de educação feito pela Unesco, ficando atrás da Argentina, do Chile, do

é contumaz em transformar itens imensuráveis em estatísticas, é necessário refletir sobre a própria pesquisa, sobre nossa posição, por que estamos no final “da fila” e o que fazer para melhorar observando nossas próprias especificidades. Isso não significa que devamos dar uma satisfação ao mundo mas aos/às nossos/as educadores/as e às nossas crianças.

A análise da prática particular também foi concretizada no Capítulo 1, em que

vimos que o debate sobre a educação brasileira gira em torno da suposta “qualidade”, que, nos discursos particulares, é atribuída exclusivamente aos atores escolares (professores/as, alunos/as e demais membros da comunidade escolar) sem qualquer relação com a estrutura educacional, além de os discursos sobre a implementação de políticas de valorização da carreira do magistério ficarem ainda no nível da teoria, o que provoca os movimentos reivindicatórios anualmente. Vimos, ainda, rapidamente (a discussão será aprofundada no Capítulo 4, seção 4.2) como a prática particular da imprensa é contumaz em representar particularmente manifestações de grupos sociais, normalmente, realçando aspectos negativos.

Isso posto, na análise de discurso (ou semiose) desta pesquisa, que diz respeito à análise situada de textos, observando simultaneamente a estrutura e a interação, ou melhor, focando na relação entre as ordens de discurso da rede de práticas (conjuntura) pesquisada, bem como da análise interacional de textos particulares, investigamos formas e significados em textos relacionados a maneiras de (inter)agir/gêneros, maneiras de representar/discurso e a maneiras de identificar(se)/estilos nas reportagens do Correio Braziliense e nas notícias do Site do Sinpro-DF. Tal investigação visa a cotejar os discursos sobre os mesmos eventos, isto é, como esses veículos de comunicação representam as mobilizações dos/as professores/as. Além de analisar interacionalmente esses textos, também utilizamos, como corpus ampliado, entrevistas semiestruturadas realizadas com cinco professoras/colaboradoras a fim de investigar discursos criativos, legitimadores ou de resistência, e para fornecer subsídios para a análise textual das reportagens e notícias. Para isso, lancei mão de categorias linguístico-discursivas relacionadas aos três principais significados do discurso (inter- acional, representacional e identificacional), propostos por Fairclough (2003).

Dando sequência à abordagem teórico-metodológica proposta pela ADC, o passo seguinte é a investigação do problema na prática, que se relaciona com “se” e

“como” o problema tem uma função na prática social pesquisada. Nessa perspectiva, verifica-se a quem interessa o problema para, em seguida, investigar formas de superá- lo uma vez que as pesquisas visam à mudança social.

A investigação de possíveis modos de ultrapassar os obstáculos do problema passa pela análise do corpus com vistas a mapear ações discursivas e práticas que possam ser tomadas em prol da resolução do problema pesquisado. Nesse sentido, é válido ressaltar a relação transformacional entre estrutura e ação, o que permite mudanças. Nas Considerações Finais, retomo essa etapa do estudo.

Por fim, no procedimento de reflexão sobre a análise, que, de fato, permeia todo o fazer investigativo, pensamos sobre os limites e alcances da pesquisa. Assim, ao longo da dissertação e, mais especificamente nas Considerações Finais, indico reflexões sobre questões ligadas à educação no Brasil, aos discursos dos/sobre os/as docentes, à constituição de identidades e representações, porque julgo que a educação é uma área em que mudanças devem ser concretizadas e, para isso, primeiro é preciso pensar, refletir, discutir, e isso parte normalmente de quem está incomodado com o problema.