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3.3 Aprendizagem pela experiência e reflexão

3.3.3 A aprendizagem transformadora

As idéias de Mezirow têm forte relação com as premissas da aprendizagem pela experiência, difundindo dentro deste campo sua noção sobre “perspectiva transformadora”, na qual o desenvolvimento de adultos envolve um tipo de aprendizagem que surge através das experiências de vida (MEZIROW, 1978), e cujo foco é a idéia de transformação, desencadeada por uma reflexão crítica.

É importante destacar que as idéias de Freire (1987), educador brasileiro, tiveram grande influência em seu pensamento, colaborando para uma visão mais crítica e transformadora da realidade e da educação. Freire defende uma educação problematizadora, que envolve o desenvolvimento da capacidade crítica e de reflexão do indivíduo, rompe com os esquemas verticais característicos da “educação bancária” ou domesticadora, e para realizar-se como prática da liberdade precisa superar a contradição entre educador e educandos. Permite a interpretação da realidade que cerca o indivíduo, tomando consciência da sua situação.

Neste sentido a educação libertadora, problematizadora, já não pode ser o ato de depositar, ou de narrar, ou de transferir, ou de transmitir “conhecimentos” e valores aos educandos, meros pacientes, à maneira da educação “bancária”, mas um ato cognoscente. (FREIRE, 1987, p.68).

Mezirow (1978) define aprendizagem como uma atividade de dar significado: “aprendizagem é entendida como o processo de usar a interpretação prévia para construir uma nova ou revisada interpretação do significado da experiência de alguém, para guiar a ação futura” (MEZIROW, 1996, p.162). Esse processo, segundo ele, é modelado e delimitado por nossas estruturas de significado, que podem ser transformadas através de reflexão, e tem duas dimensões distintas: os esquemas de significado, que são as crenças, sentimentos, atitudes e juízos de valor, e as perspectivas de significado, que são as predisposições orientadoras, os sistemas de regras que governam a percepção e a cognição, como as ideologias, os traços de personalidade e os estilos de aprendizagem. Os esquemas, na verdade, são manifestações das perspectivas de significado, sendo estas últimas, as lentes através das quais as pessoas filtram e interpretam o mundo.

A aprendizagem, então, pode consistir numa mudança em alguma de nossas crenças ou atitudes (esquemas de significado) ou pode ser uma mudança na nossa perspectiva como um todo. Esta transformação de perspectiva é essencial para a aprendizagem transformadora, sendo definida como:

[...] o processo de tornar-se criticamente consciente sobre como e porque nossos pressupostos restringem a forma como percebemos, entendemos e sentimos o mundo, reformulando estas premissas para permitir uma perspectiva mais discriminadora, permeável e integradora, [...] que facilitará uma melhor compreensão do significado da experiência. (MEZIROW, 1990, p.14).

experiências, dando sentido aos acontecimentos de suas vidas, e é somente através desse processo de reflexão de premissas que existe a oportunidade para uma mudança das perspectivas de significado, ou seja, uma aprendizagem pela experiência mais significativa e transformadora.

A Teoria de Aprendizagem Transformadora desenvolvida por Mezirow (1991) parte do pressuposto que a principal diferença entre a aprendizagem de crianças e de adultos é que a primeira caracteriza-se por ser um processo de formação e a segunda por ser um processo de transformação. A aprendizagem formadora ocorre na infância através de socialização (aprendizagem informal ou tácita de normas através dos pais, parentes e amigos que permite nos encaixarmos na sociedade) e através de escolarização. Neste momento, formas aprovadas de ver e entender modeladas pela linguagem, cultura e experiência pessoal, colaboram para estabelecer limites na nossa futura aprendizagem, podendo encorajar ou não o pensamento transformador. Já no adulto a influência externa deve ser minimizada, pois ele deve ser capaz de realizar suas próprias interpretações, não aceitando passivamente a realidade que lhe é imposta pelos outros. Torna-se crucial que o adulto seja capaz de negociar valores e significados de forma crítica, reflexiva e racional.

Nesta teoria, identificam-se quatro formas distintas em que a aprendizagem do adulto pode ocorrer: aprendendo através de esquemas de significado existentes, através de novos esquemas de significado, através da transformação de esquemas de significado, e através da transformação das perspectivas de significado. Esta última é uma experiência de aprendizagem mais significativa e menos comum, pois só ocorre quando há reflexão de premissas e pressupostos.

Mezirow (1991) diferencia três tipos de reflexão: a reflexão de conteúdo, que é pensar sobre a experiência real; a reflexão de processo refere-se a pensar sobre formas de lidar com a experiência e sobre estratégias de resolução de problemas; e o último tipo, o único que pode

levar à aprendizagem transformadora, é a reflexão de premissas, que envolve o exame de pressupostos socialmente construídos, para determinar se as crenças e valores ainda permanecem funcionais. Assim, um dos conceitos centrais dessa teoria é que o Aprendizado Transformador envolve uma avaliação reflexiva de premissas, um processo baseado sobre uma outra lógica de movimento, através das estruturas cognitivas, identificando-se e julgando-se pressuposições. O aprendizado reflexivo possibilita o acesso aos pressupostos e torna-se transformador sempre que se descobre que as suposições ou premissas são distorcidas, não autênticas ou inválidas. Desta forma, o aprendizado transformador, através da reflexão de premissas, resulta em perspectivas de significados transformadas. Neste tipo de aprendizagem nós reinterpretamos a experiência antiga ou anterior a partir de uma série de expectativas novas, dando, então, um novo significado e perspectiva para a experiência antiga. Por outro lado, as reflexões de conteúdo e processo somente podem levar às outras formas de aprendizagem, que implicam em confirmação, criação ou transformação de esquemas de significado.

Para o autor, uma pessoa irá se desenvolver quando elevar sua capacidade de validar um aprendizado prévio, através da reflexão, e agir para modificá-lo, quando for necessário. Desta forma, a reflexão ocupa um papel central no processo de aprendizagem, pois é através dela que as estruturas de significados de um adulto são transformadas. E a postura ativa do aprendiz é essencial para a construção do processo de aprendizagem, pois, através dela, a pessoa irá construir suas próprias interpretações do mundo.

O desenvolvimento do adulto, enfim, significa a realização progressiva da sua capacidade em participar completamente e livremente num diálogo racional, para alcançar um entendimento mais amplo, mais discriminador, permeável e integrador da sua experiência como um guia de ação (MEZIROW, 1994).

transformadora: “Nós podemos aprender simplesmente adicionando conhecimentos em nossos esquemas de significado ou aprendendo novos esquemas de significado com os quais fazemos interpretações sobre nossa experiência”. A aprendizagem transformadora significativa, para ele, é menos comum de acontecer e envolve três fases: a reflexão crítica dos pressupostos da pessoa, o diálogo para validar esta reflexão, que envolve concordância e consenso para construir novos entendimentos e significados, e ação reflexiva e decisão para mudança, componentes estes, indispensáveis para que ocorra este tipo de aprendizagem.

Este processo de transformação de perspectiva, segundo ele, envolve uma seqüência de atividades de aprendizagem que se inicia, com maior freqüência, com um dilema desorientador, passando por diversas fases como: auto-exame, exame crítico das pressuposições, exploração de novos papéis e relações, planejamento de ações, desenvolvimento de perspectivas alternativas buscando novos conhecimentos e capacidades, que culminam com a alteração do auto-conceito, permitindo a reintegração do contexto da vida do indivíduo, segundo as condições ditadas pela nova perspectiva. Ressalta, porém, que “A seqüência das atividades de aprendizagem transformadora não é composta por etapas invariáveis de desenvolvimento. Ao invés disso, devem ser entendidas como momentos seqüenciais que tornam os significados esclarecidos” (MEZIROW, 1991, p.193).

Após o estabelecimento de um dilema desorientador, Mezirow (1991) considera que a análise crítica das perspectivas alternativas é fundamental com vistas a aprendizagens significativas. Segundo o autor, ao impactar a mente do aprendiz, o dilema desorientador cria possibilidades para novas aprendizagens sob outros enfoques, diferentes daqueles construídos anteriormente. A análise de outras possibilidades é fundamental para que o indivíduo aprenda significativamente, e não seja um mero reprodutor de técnicas ou conteúdos.