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5 BIOTECNOLOGIA: UM CAMPO EM FORMAÇÃO

5.3 A biotecnologia no mundo

Apesar dos números em relação à biotecnologia serem modestos, com apenas um quinto das empresas americanas tendo resultado positivo (ERNST & YOUNG, 2003a), segundo Bonacelli e Salles-Filho (2000), estaríamos vivendo uma nova revolução que, pelos sinais apresentados, continuará conduzida pelos países mais desenvolvidos, principalmente pelos Estados Unidos, que detêm o maior parque industrial e tecnológico do planeta, como também pelas maiores empresas de biotecnologia, além de um grande número das chamadas “novas empresas de biotecnologia” (NEBs). Ainda segundo esses autores, a biotecnologia no Brasil e em outros países da América Latina ressentem-se de elementos fundamentais para o domínio e o desenvolvimento das novas técnicas da biotecnologia, como também os

atividades inovativas. Já é possível perceber alguns indícios dessa revolução. Nos Estados Unidos, grandes empresas de biotecnologia, como a Genentech, já são mais valorizadas que tradicionais empresas da elite farmacêutica, como Bristol-Myers Squibb, Bayer e Eli Lilly. Apesar dos lucros ainda não serem o destaque do setor, a aposta em rendimentos futuros tem sido grande, como pode ser percebido pela valorização da Genentech.

Esse setor vem crescendo rapidamente nos últimos anos, passando de U$ 8 bilhões de receita, em 1993, para U$ 20 bilhões, em 1999, segundo dados da Ernst & Young (2000), com perspectiva de U$ 27 bilhões para 2003, só nos Estados Unidos, considerando as três

categorias de atividade.

Já a expressão da bioindústria brasileira, pela estimativa da Fundação Biominas (2001), foi da ordem de 0,38% a 0,65% do PIB brasileiro, no ano de 2000, o que corresponde aproximadamente de R$ 5,4 a 9 bilhões, concentrados principalmente nas atividades de baixa e intermediária complexidade.

O relatório da Ernst & Young (2003a) sobre a indústria da biotecnologia identificou um pequeno aumento no número das empresas lucrativas, de 19% para 21%. Segundo analistas da Ernst & Young, a indústria da biotecnologia está começando sua curva de inovação de forma acelerada. Das empresas pesquisadas, houve um aumento de 845% na Europa, próximo de 200% no Canadá e mais de 85% nos Estados Unidos, nos últimos cinco anos. Para eles, os melhores anos do setor ainda estão por vir. No entanto, os investidores de risco, tão necessários ao desenvolvimento desse tipo de empresas, estão cada vez mais

seletivos quanto ao local e forma de investimento. No Brasil, isso é ainda mais evidente. Júdice (2003) afirma que dos nossos fundos de capital de risco, poucos têm interesse num segmento com exigências de retorno tão longas, com prazo de maturação bem superior a outros investimentos.

Segundo aquele relatório, as empresas farmacêuticas e de biotecnologia estão agindo ao redor do mundo por meio de parcerias, alianças em pesquisa e desenvolvimento e

terceirização para levar produtos ao mercado de maneira mais eficiente. Outros fatos constatados são que os governos nacionais estão apostando muito do seu desenvolvimento econômico na biotecnologia; os investidores estão procurando novas oportunidades com menos ênfase em posição e mais na experiência das pessoas envolvidas e na qualidade da propriedade intelectual; há aumento da colaboração pesquisador-pesquisador e uso de grandes bancos de dados. Um fato novo percebido pelos analistas da Ernst & Young (2003a) é que algumas empresas já estão conseguindo ser viáveis por si próprias (QUADRO 15).

QUADRO 15

Resumo da biotecnologia no mundo em 2002

Global Aumento em relação

a 2001

E.U.A Europa Canadá Ásia/ Pacífico Empresas de capital aberto

Receita (milhão de US$ ) 41.369 15% 30.266 8.262 1.466 1.375 Gastos com P&D 22.012 34% 16.272 4.989 555 197 Número de funcionários 193.753 1% 142.900 33.304 7.785 9.764 Número de empresas Empresas públicas 613 -3% 318 102 85 108 Empresas privadas 3.749 3% 1.148 1.776 332 493 Empresas públicas e privadas 4.362 2% 1.466 1.878 417 601

FONTE – Adaptado de Ernst & Young (2003a), baseado em dados de janeiro a dezembro de 2002.

Ainda existe uma grande diferença entre as empresas americanas e as dos demais países. Por exemplo, a capitalização de todo o setor de biotecnologia na Europa em 2001 (US$ 51 bilhões) foi menor que uma única empresa americana, a Amgen´s, que foi na ordem de US$ 61,5 bilhões.

Os Estados Unidos têm se caracterizado como o país mais importante no cenário da biotecnologia. Como evidenciam Bonacelli e Salles-Filho (2000), a espiral virtuosa de crescimento da biotecnologia nos Estados Unidos está sendo criada há mais de 30 anos, fruto da adoção de mecanismos institucionais, como a legislação sobre propriedade intelectual, a estrutura de financiamento diversificada, a regulamentação liberal para organismos

transgênicos, as redes de pesquisa que integram agências governamentais, empresas e universidades, o que leva esse país a ter o mais desenvolvido campo de biotecnologia no mundo. Além de toda a tradição no desenvolvimento tecnológico, na década de 90, as empresas situadas nos Estados Unidos passaram a contar com mecanismos de captação de recursos financeiros diretamente das bolsas de valores (venture capital), como a NASDAQ, que tem facilitado a captação de recursos necessários para o aprimoramento de empresas, tirando a responsabilidade só do setor público. Já na Europa, existe uma variedade de mecanismos de sustentação financeira e de coordenação dos programas científicos e

tecnológicos, mas se conseguiu a mesma eficiência do modelo americano. Segundo Silveira (2001), há sistemas centralizados, como o alemão, até os mais ou menos centralizados, como o francês, mas, assim como no Brasil, os sistemas europeus em muitos casos são

desarticulados dos sistemas produtivos.

Outro ponto que merece destaque é o caráter cumulativo exigido pelo aprimoramento das pesquisas na área, que facilita cada vez mais aos países centrais tornarem-se produtores de conhecimento em biotecnologia. Esses países já possuem uma ampla infra-estrutura, tanto no sistema de inovação como no de transferência de recursos financeiros. A existência de parques industriais competitivos e empresas de expressão mundial também contribuem. A constatação das necessidades de vultosos investimentos, por si só, já sinaliza, segundo Velho e Velho (2001), um aprofundamento das desigualdades entre Norte e Sul também na área da

pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico e na apropriação de seus resultados, particularmente para o caso da biotecnologia.

É importante considerar que a biotecnologia, como área de concentração de pesquisa e desenvolvimento de produtos e serviços, apresenta algumas especificidades que a distinguem de outras atividades de geração de conhecimento. Isso é particularmente verdade no que diz respeito à necessidade de cooperação entre as diferentes regiões do globo, pelo fato de os recursos genéticos, matéria-prima na qual se fundamenta todo o desenvolvimento daquela especialidade, estarem concentrados em densidades qualitativa e quantitativamente superiores nos países do Sul (TRIGUEIRO, 2002). Entretanto,

a posse física dos recursos genéticos por esses países não representa per se uma vantagem competitiva inequívoca, posto que o conhecimento e as atividades científicas necessárias para sua transformação e utilização são de apropriação legal imediata e concentradas nos países do norte. Esse fato reforça a necessidade de interação entre essas regiões, de maneira a se difundir o conhecimento necessário para identificação, preservação e exploração comercial daqueles recursos para que se possa partilhar os resultados de maneira justa (TRIGUEIRO, 2002, p. 4-5).

Para Souza (2001), as empresas americanas de biotecnologia também se beneficiaram do desenvolvimento recente da informática, que aprimorou, no seio dos investidores, o conceito de capital de risco. Além do mais, eles se beneficiaram da sua experiência na integração entre universidades e setor produtivo, como também dos investimentos de risco. Numa análise comparativa entre Estados Unidos e Reino Unido, percebe-se que os

americanos estão conseguindo aproveitar melhor os avanços científicos, transformando-os em produtos e serviços, apesar de existirem recursos humanos disponíveis em ambos os países. Para Souza (2001), faltou no Reino Unido a ligação entre diversas instituições, como ocorreu nos Estados Unidos com a colaboração entre Estado, agência de pesquisa federal, cientistas, universidades e investidores de risco. Já no Reino Unido, a falta de uma estrutura de

comercialização e a demora na regulamentação fez as empresas britânicas perderem competitividade.

Essas diferenças tornam-se ainda mais evidentes, se se considerar os países que possuem parques industriais menos evoluídos, como é o caso do Brasil.