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1. CRIMES SEXUAIS NO BRASIL E O PROJETO DE LEI N 398/2013

2.1 A Castração química e o princípio da dignidade da pessoa humana

Por inibir o apetite sexual compulsivo de criminosos, a castração química é vista, para alguns, como medida benéfica, podendo punir os agressores e de forma eficaz, prevenir outros crimes sexuais. No entanto, dos maiores argumentos apresentados contra o é que essa medida afronta o texto da Constituição Federal de 1988 pois fere o princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Sabe-se que em todos os ramos do Direito há conflitos e divergência e esses precisam ser harmonizados. mas é no Direito Penal que se dão as discussões mais tensas, pois sua função é proteger bens considerados essenciais, como a vida, por exemplo.

Nessa linha, Alexandre Magno Fernandes Moreira Aguiar (2019), harmonizar é o um desafio para o legislador e para quem interpreta as normas jurídicas. A Constituição deixou claro os crimes hediondos, da mesma forma que proibiu vertas penas. Então, deve se analisar se Castração Química para crimes sexuais é admissível dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Segue o autor:

Primeiramente, a castração física deve ser rejeitada de pronto pelo motivo já colocado: trata-se de uma intervenção permanente no corpo da pessoa, o que é inviabilizado pela vedação constitucional das penas de caráter perpétuo. Aliás, só recentemente, a jurisprudência passou a admitir a castração voluntária realizada nas cirurgias de mudança de sexo.

O princípio da Dignidade da Pessoa Humana aflorou após a segunda guerra mundial, que até então, as pessoas eram consideradas descartáveis e abatidas iguais animais na Alemanha. O mundo, horrorizado com os acontecimentos da época, decidiu crias as Nações Unidas, cuja declarações falavam em Dignidade Humana, indispensável para o homem. (FERREIRA; GODINHO, 2019).

Segundo José Afondo da Silva (1998), só o ser humano é racional, sem qualquer distinção. Assim, fonte de imputação de valores. Todo ser humana reproduz no outro, reflexo de sua espiritualidade, sendo assim, se desconsiderarmos uma pessoa, desconsideramos a nós mesmo. Ela é o centro da imputação jurídica e o Direito existe para o seu desenvolvimento.

Dignidade da Pessoa Humana é um conceito abrangente e sua conceituação difícil. Analisando diversos conceitos trazidos por vários autores, pode-se dizer que a dignidade da pessoa humana concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerentes a pessoa humana. É um valor espiritual e moral inerente a pessoa humana e traz consigo a pretensão ao respeito das demais pessoas, assim, o ordenamento jurídico pode, apenas excepcionalmente intervir nos seus direitos, mas nunca menosprezando qualquer ser humano. (MORAIS, 2019).

Tudo tem preço ou dignidade. O que tem preço pode ser substituído por qualquer outra coisa equivalente, e a dignidade está acima de qualquer preço. Ve- assim, a dignidade um atributo intrínseco da essência da pessoa humana, que não admite substituição e se confunde com a própria natureza do ser humano. (DA SILVA, 1998).

A dignidade da pessoa humana não é uma criação da Constituição Federal, mas a reconheceu e transformou-a num supremo da ordem jurídica declarando-a como valores fundamentais. Não é um princípio apenas de ordem jurídica, é também de ordem social, política, social, econômica e cultural. (SILVA, 1998).

A dignidade da pessoa humana constitui um valor que atrai a realização dos direitos fundamentais do homem, em todas as suas dimensões, e, como a democracia é um regime político capaz de propiciar a efetividade desses direitos, o que significa dignificar o homem, é ela que revela como o seu valor supremo, o valor que dimensiona e humaniza. (SILVA, 1998).

Ingo Wolfgang Sarlet (2001, p.60) bem define a dignidade da pessoa humana:

Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos.

Para a autora citada, mesmo que o tratamento seja voluntário, não é proporcional, sendo essa medida bastante drástica e punindo de forma mais severa do que outros acusados por crimes piores.

Além disso, a Castração Química fere o principio da dignidade da pessoa humana, princípio esse que, visa garantir que a pessoa tenha o mínimo para suprimento de suas necessidades básicas e vitais. Cada pessoa deve ser considerada e tratada como um fim em si mesmo e não para obtenção de vantagem ou resultado para outrem. A dignidade da pessoa humana impede a exploração do homem por outro homem. (OLIVEIRA, 2019).

Ainda, a autora segue nesse sentido:

Desta forma, sendo a dignidade algo intrínseco à condição de ser humano, toda conduta que prevê sua violação deve ser totalmente rechaçada, por retirar do indivíduo algo que os demais, não sendo acometidos por qualquer tipo de enfermidade, têm como característica, que é a própria libido e a capacidade reprodutiva. Por essa razão, a castração química em criminosos no Brasil também desrespeitaria frontalmente a dignidade humana, retirando do condenado seu direito à vida nos conformes do enunciado pela Carta Magna, isto é, em sua plenitude. (OLIVEIRA, 2019). Finaliza afirmando que, a Castração Química também fere dois direitos fundamentais, que são: a prática de tortura e a tratamento desumano e degradante art 5º, III) e a proibição de penas cruéis art 5ºXLVII). Tal medida é atingida de forma

profunda, interferindo na integridade física da pessoa. E, segundo a doutrina majoritária, qualquer pena que atinja o corpo humano é cruel, portanto, afronta a carta Magna. (OLIVEIRA, 2019).

Ainda, para corroborar, Alexandre Magno Fernandes Moreira Aguiar (2019), em artigo publicado:

A privacidade do condenado é brutalmente atingida, pela interferência em sua integridade física. Além disso, a maior parte da doutrina nacional considera que qualquer pena que atinja o corpo do condenado é cruel e, portanto, vedada constitucionalmente. De modo mais explícito, o art. 5°, XLIX, dispõe que "é assegurado aos presos o respeito à integridade física e mental". Portanto, a castração, física ou química, é inaceitável como pena em nosso ordenamento jurídico, e os projetos de lei nesse sentido são flagrantemente inconstitucionais. A esse respeito, vide a contundente crítica de Spalding à lei da Flórida que prevê essa pena. Apesar de se referir ao ordenamento jurídico norte-americano, suas conclusões aplicam- se perfeitamente à situação brasileira.

Pela Constituição Federal, é assegurado aos presos o respeito a integridade física e moral. Então, mesmo que a Castração Química não resulte em dor, se tem a degradação moral pois também tem o objetivo de humilhar. Desta forma, não há possibilidade de adotar essa medida para punir o infrator penal, mesmo que seja de forma voluntária.

Carmem Lucia Antunes Rocha (2014) referiu-se ao Art 1º da Declaração dos Direitos humanos festejando o dispositivo que decreta a igualdade entre as pessoas referindo-se que todos são igual, mesmo cada um tendo alguma diferença, que todos tem medo, esperança, mas cada um vive do seu jeito e lida com seus problemas do seu modo.

Como já vimos anteriormente, a Castração Química interfere na vida sexual do paciente que faz o tratamento, e para os que defendem a inconstitucionalidade, privar o indivíduo de ter uma vida sexual ativa, se reproduzir é intervir e impor limites na sua vida privada, limitando direitos de conduzir a vida, violando assim, a dignidade da pessoa humana.

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