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A CHEGADAS DAS IMCORPORADORAS DE CAPITAL ABERTO AO

Como vimos no segundo capítulo desta pesquisa, as alterações institucionais e jurídicas iniciadas ainda na década de 1990 conduziram a um processo de abertura de capitais por parte das principais construtoras/incorporadoras nacionais a partir de 2006 (FIX, 2011). Este movimento de abertura, como explicado, se por um lado possibilitou que estas empresas obtivessem os recursos necessários à esperada expansão do mercado de habitações, até então restritos a faixa dos 30% mais ricos da população (MARICATO, 2011; FIX, 2011), por outro, contudo, submeteu estas empresas à lógica do capital financeiro, que esperava das mesmas a geração dos elevados dividendos prometidos (FERREIRA, 2010; FIX, 2011; TONE, 2010). Foi no bojo destas transformações, em meio ao movimento para o atendimento das elevadas expectativas do capital financeiro, que parte significativa das grandes construtoras/incorporadoras brasileiras realizaram um profundo processo de reestruturação de suas estratégias de atuação, lançando produtos e marcas especializadas no “seguimento econômico,” associando-se a empresas regionais e expandindo sua área de atuação para além dos seus mercados tradicionais (FIX, 2011, p.136).

Foi em meio a este contexto de transformações e expansão que as grandes incorporadoras nacionais de capital aberto chegaram ao mercado capixaba, associando-se em alguns casos a empresas locais (FERREIRA, 2010; GONÇALVES, 2010). A chegada destas empresas (MRV Engenharia, ROSSI Residencial, PDG Realty, só para citar alguns exemplos)117 ao mercado imobiliário capixaba, trouxe consigo novas estratégias de atuação que repercutiram sobre o tecido urbano da Grande Vitória, culminando na inclusão de novas áreas ao mercado

117 Segundo GONÇALVES (2010), além da mineira MRV Engenharia, da paulista ROSSI Residencial e da

Carioca PDG Realty, chegaram também ao Estado a Direcional Engenharia (MG), a Goldfarb (RJ) e a Impar (SP). A Goldfarb, contudo, desde 2008 tem 100% de suas ações detidas pela PDG Realty.

imobiliário local, bem como em novas formas de “morar,” mais em linha com a racionalização imposta pela busca de geração dos elevados dividendos prometidos ao capital financeiro.

A necessidade de gerar dividendos obrigou estas empresas a manterem um significativo fluxo de lançamentos e, ao mesmo tempo, realizar a busca pela redução dos custos de produção, obtidos em parte por meio da aquisição de terrenos grandes e baratos que não podiam ser encontrados dentro do tradicional círculo imobiliário local (FERREIRA, 2010, p.73). Neste sentido, o município de Serra, cuja integração ao movimento de industrialização nacional havia dado conformação a um tecido urbano fragmentado e disperso, surge como alternativa viável para instalação destes novos empreendimentos, pela disponibilidade de terrenos com preços e dimensões adequadas para os mesmos.

A chegada das construtoras/incorporadoras “estrangeiras” ao município de Serra, sob significativa pressão para gerar dividendos, trouxe consigo novos produtos imobiliários, cujas características estavam em linha com as exigências de redução de custos e aumento das margens esperados por seus novos acionistas (tamanho reduzido, padrão de acabamento inferior, localização fora do tradicional mercado imobiliário, dentre outros). As ações de marketing desenvolvidas por estas empresas, contudo, buscavam desviar o foco dos problemas do novo local de moradia (imagem de pobreza e violência do município de Serra), bem como das limitações das habitações, enfatizando as virtudes da área de lazer comum a todo o condomínio.

Neste sentido, como explicado por FERREIRA (2010), foi imprescindível trazer para o município de Serra um novo produto imobiliário, cuja área de lazer funcionasse como uma “cortina de fumaça” para as limitações inerentes a esta forma de produção, que prima pela redução dos custos e aumento das margens:

Os empreendimentos verticais produzidos antes da chegada das incorporadoras “estrangeiras” contavam com poucos itens de lazer. Piscina, churrasqueira, salão de festas e quadra de esporte estavam presentes em quase todos. Sauna e salão de fitness em apenas alguns empreendimentos. A estrutura de lazer dos empreendimentos construídos pelas grandes incorporadoras, em parceria ou não, é composta por no mínimo vinte itens. Na relação dos itens de lazer podem ser encontrados: adega / champagnerie, atelier, boliche, brinquedoteca, campo de golf, churrasqueira, cinekids, deck molhado, espaço gourmet, espaço mulher, espaço zen, fitness, home office, home theater, jardim, lan house, lounge, piscina adulto, piscina infantil,

playground, praças, quadra poliesportiva, quadra de squash, salão de beleza, salão de festas adulto, salão de festas infantil, salão de jogos adulto, salão de jogos adolescente, sauna, spa, e outros.118

Surge assim no município de Serra, empreendimentos com imóveis com dimensões e qualidade geral de acabamento reduzidas119, mas cujos nomes acompanhavam termos como “Park”, “Resort” e “Club”, repletos de equipamentos de lazer comuns a todo condomínio. Passou-se a desenvolver desta forma ações de marketing que buscavam produzir um novo estilo de “morar,” como “compre um apartamento e viva o condomínio”.

Na esteira destes empreendimentos que chegaram ao município de Serra, também “vieram os loteamentos de alto padrão que, por questão de mercado, são chamados de condomínios fechados” (Ferreira 2010, p.73 e 74). Um destes empreendimentos é muito conhecido nas regiões Sul e Sudeste do país, por adotar o mesmo nome em vários estados destas regiões. A empresa em questão pertence em parte a uma grande incorporadora nacional de capital aberto. A atuação no mercado de alto padrão no município, contudo, não se limitou somente a empresas de fora do Estado com capital aberto, tendo outro empreendimento semelhante sido realizado em parceria entre uma empresa capixaba e paranaense, ambas de capital fechado (Ibidem, p.74).

A chegada das empresas de capital aberto ao município de Serra, portanto, a partir da expansão da área de atuação das grandes construtoras/incorporadoras nacionais, inicia um novo capítulo do processo de formação do tecido urbano do município. O capital financeiro passa a desempenhar, a partir de então, papel relevante no processo de constituição/reestruturação do tecido urbano de Serra. Basta lembrar que as construtoras/incorporadoras que realizaram a oferta pública de suas ações, se comprometeram a prestar conta ao capital financeiro e orientar suas ações no sentido de garantir o cumprimento dos elevados dividendos prometidos a seus novos acionistas. Mesmo as

118 FERREIRA, Silma Lima. A produção imobiliária capixaba: panorama atual, p.73. 119

A queda do padrão de qualidade geral dos acabamentos, bem como a redução dos tamanhos dos imóveis a que nos referimos, se dá em termos relativos. Ou seja, embora tenham chegado ao município de Serra empreendimentos considerados como de “alto padrão” para o município, mesmo estes tinham dimensões e qualidade reduzida se comparado ao que o público alvo (de renda mais elevada) estava acostumado a adquirir no tradicional circuito imobiliário.

empresas capixabas de capital fechado não ficaram alheias ao processo de abertura de capital das empresas de fora do Estado, adaptando sua forma de atuação/produtos à nova realidade concorrencial, bem como a nova estrutura de custos decorrente das disputas por terrenos e mão-de-obra. Tudo isto se refletiu na forma como estas empresas passaram a produzir e se apropriar do espaço urbano do município, uma vez que não é possível se produzir a mercadoria habitação sem, necessariamente, consumir espaço e vendê-lo com a mesma. Não à toa a atividade da construção civil é conhecida pela sua indissociabilidade em relação ao processo de urbanização. Construir é, portanto, como explicado por PEREIRA (2006), simultaneamente um ato de produção e apropriação do espaço “novo” e do previamente existente.

4.2 A CONTRIBUIÇÃO DO MCMV PARA A RECUPERAÇÃO DO MERCADO