• Nenhum resultado encontrado

3. CAPÍTULO III A DESCRIÇÃO REALIZADA

3.7 A COLETA DE DADOS

A aproximação a esses usuários não foi difícil, conforme já mencionado anteriormente, porém cabe registrar um detalhe muito importante apontado por Gilberto Velho189, “a participação do pesquisador em atividades desviantes [...] sempre provoca problemas éticos, morais, para o investigador, além de ameaçar direta ou indiretamente a sua segurança e a do universo investigado”. Tais situações ocorreram por várias vezes com o pesquisador, pois neste trabalho foram necessários vários contatos com os sujeitos nos mais diferentes pontos, o que muitas vezes, com certeza, gerou comentários na região, principalmente por conta dos moradores estabelecidos na região que o conhecem há muitos anos.

A coleta de dados realizada em duas etapas teve algumas dificuldades, principalmente no que diz respeito aos horários das realizações das entrevistas, nem sempre cumpridos. Muitas vezes também os entrevistados não

189

compareceram por esquecimento, em razão de que quando do pré-agendamento estavam às vezes sob efeito de alguma substância tóxica.

Na primeira etapa, no mês de fevereiro do ano de 2007, procurou-se deixar os entrevistados à vontade em relação àquilo que tinham interesse em relatar sobre as suas histórias de vidas, comentando a respeito de suas infâncias, seus relacionamentos com os pais e o envolvimento com as drogas. Ressalte-se que em alguns momentos houve a necessidade de intervenção do pesquisador com a intenção de que não perdessem o raciocínio, pois não sabiam mais sobre o que falar.

A segunda etapa, no mês de outubro de 2007, foi norteada por um questionário, o qual se encontra em anexo (Anexo 1), o qual foi devidamente autorizado pelos entrevistados a ser utilizado neste trabalho (Anexo 2) . Mesmo com a utilização da entrevista semi-estruturada, percebeu-se que tiveram algum tipo de receio no avanço das declarações. Mesmo com a insistência do pesquisador, não conseguiram avançar em suas respostas.

Nesta segunda entrevista, a qual deu o maior suporte para o desenvolvimento do trabalho, foi necessário selecionar três novos integrantes do grupo, em virtude de alguns incidentes. Essa situação ocorreu devido aos seguintes motivos: um (Geraldo) se encontrava desaparecido há vários meses; o outro, segundo informações dos próprios companheiros, havia deixado o vício e havia obtido emprego, e por conseqüência não fazia mais parte do grupo, o que confirma que o não usuário não permanece entre eles; e o último (Felipe), encontrava-se bastante debilitado, com complicações psicológicas, em virtude do uso do crack. Mesmo com a seleção de três novos sujeitos, ainda assim, devido às relevantes contribuições das suas declarações ao presente trabalho, foram utilizados os depoimentos de Felipe e Geraldo. Portanto, totalizaram-se sete entrevistados que foram utilizados seus depoimentos na presente pesquisa.

A coleta de dados, em determinados momentos, tornou-se um pouco dificultosa também por causa da necessidade de ter que envolvê-la com a atividade profissional do pesquisador, pois nem sempre os sujeitos objetos desta pesquisa aceitavam os horários propostos.

Para a realização das entrevistas e a seleção dos sujeitos, o pesquisador contou com o auxílio de um interlocutor. O interlocutor foi Emanuel, uma pessoa que nasceu na vila e que conhece todos os moradores das imediações.

Também é uma pessoa que tem livre acesso a todos os locais da vila, principalmente na favela, e um bom relacionamento com os demais integrantes do grupo; diga-se, assim, que ele é uma pessoa que, embora não seja um líder, traz consigo certo carisma, fazendo com que os integrantes do grupo estejam sempre ligados a ele.

Nos contatos com Emanuel, normalmente realizados pelas ruas da vila, porém alguns ocorreram nos interiores de alguns bares, principalmente no estabelecimento nº. 2, foram no sentido de esclarecer a ele do que se tratavam as entrevistas e quais os objetivos que se pretendia alcançar por intermédio da realização das mesmas. Numa primeira conversa, foi esclarecido que as entrevistas seriam para contribuir para uma pesquisa social, a qual teria relevância no meio científico ante ao problema que se reveste o fenômeno. Já num segundo contato, após Emanuel ter um contato com alguns integrantes do grupo, questionou-se então a questão do sigilo, o que foi esclarecido pelo pesquisador de que em respeito a essa preocupação seriam utilizados nomes fictícios, com o intuito de se preservar obviamente suas verdadeiras identidades. Posteriormente a isso, Emanuel procurou o pesquisador informando que nessas condições estavam dispostos a contribuir à pesquisa, incluindo ele.

A partir de então surgiram alguns pequenos problemas, quais sejam, compatibilidades de horários. Tentava-se marcar, por intermédio de Emanuel, um determinado horário para as entrevistas que o pesquisador tivesse possibilidade e que não confrontasse com a sua atividade profissional, porém na maioria das vezes não era possível. Desconhecendo-se os motivos da impossibilidade dos sujeitos nos horários pré-estabelecidos, Emanuel apresentava outros horários que eles tinham disponibilidade, o que também não era possível por motivos de compromisso profissional do pesquisador.

Diante desses detalhes, todas as entrevistas foram realizadas no escritório profissional do pesquisador e de forma aleatória, pois quando menos se esperava aparecia Emanuel com algum integrante do grupo para que fosse realizada a entrevista. A partir da ocorrência da primeira entrevista desta forma, o pesquisador passou a deixar o gravador no seu escritório, pois quando menos se esperava tinha alguém disposto a dar um depoimento e colaborar com a pesquisa. Esclareça-se ainda que esses sujeitos foram selecionados por Emanuel depois que o pesquisador detalhou qual era o objeto da pesquisa, considerando principalmente

a condição de quem fosse mais velho no uso de tóxicos e tivesse mais peculiaridades sobre o assunto.

Registre-se também que em algumas oportunidades o pesquisador teve que procurar Emanuel com o intuito de lembrá-lo da realização das entrevistas. Essas oportunidades sempre foram nos sábados e o local para encontrá-lo era sempre no primeiro estabelecimento.

Essas entrevistas foram na maioria das vezes realizadas ao final da tarde, geralmente após às 17h e, por coincidência ou não, nas sextas-feiras. Muito poucas foram realizadas pela manhã e no início da semana, que se deduz a priori que no período matutino procuram dormir, até mesmo porque normalmente se reúnem para o consumo no horário noturno. Importante ainda o registro de que o pesquisador em todas as entrevistas não se sentiu à vontade, a tensão sempre foi marca registrada, isto porque o sempre iminente receio de que certas indagações pudessem até mesmo ofender o entrevistado, o que em nenhuma hipótese ocorreu.

E, por fim, além das entrevistas com os sete sujeitos da presente pesquisa, buscou-se colher depoimentos de pessoas estabelecidas para demonstrar quais as suas representações em relação aos usuários na Vila Vilela – os outsiders.

Colocaram-se à disposição dois moradores, um homem e uma mulher, ambos aposentados e com residência fixa naquela região com mais de 40 anos, que demonstraram um hábito mais conservador. São pessoas que contam atualmente com 71 e 73 anos, respectivamente.