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A COMPANHIA EDITORA NACIONAL E OS DIDÁTICOS EM 1960/

BUSCANDO TRAÇOS DO PASSADO: A CAMINHO DO “GRUEMA”

3.1 A COMPANHIA EDITORA NACIONAL E OS DIDÁTICOS EM 1960/

Anterior à criação da CEN há várias ações no mercado editorial brasileiro que merecem destaque. As mais significativas sempre envolvem a parceria entre José Bento Monteiro Lobato e Octalles Marcondes Ferreira, oficializada em março de 1919, com a primeira sociedade entre eles: “Lobato sempre estava pondo em prática alguma ideia nova e brilhante, quase sempre desastrosa; e Octalles sempre atrás dele, procurando juntar os pedaços do desastre” (HALLEWELL, 2005; p. 345).

Dentre as ideias de Lobato que deram certo há que se registrar a estratégia que usou para ampliar o quantitativo de pontos de venda de livros: em pouco tempo, por volta de 1918, o que era feito nas únicas trinta livrarias do país passou a realizar- se em uma rede de cerca de dois mil pontos – “bancas de jornal, papelarias, farmácias ou armazéns que pudessem estar interessados em vender livros” (idem; p.

71 Não gravei estes depoimentos, cheios de carinho, pois me imaginava ainda andando por lá por um bom tempo, mas o súbito fechamento do Acervo aos pesquisadores, em 2008, não me permitiu fazê-lo.

320). Lobato revolucionou todos os aspectos daquele tipo de indústria e abriu as portas a novos autores.

Depois de falências, em novembro de 1925 surge a Companhia Editora Nacional. O dinheiro veio da venda de uma casa lotérica que os dois haviam comprado em sociedade, sob influência de Octalles, há algum tempo atrás. Nesta nova tentativa de parceria entre os dois, os papéis se inverteram: Ocalles ficou “em São Paulo à testa dos negócios e tomava todas as decisões no dia a dia da firma, Lobato dirigia uma filial no Rio de Janeiro. Isso lhe deixava tempo para escrever, o que fazia com uma assiduidade cada vez maior” (idem; p. 346).

Lobato foi aos Estados Unidos em 1927. Tornou-se depois adido comercial do Brasil em Washington. Em 1929, frente às perdas que sofrera com a quebra da bolsa de valores de Nova York, Lobato vendera seus 50% da firma a Themistocles Marcondes Ferreira, irmão de Octalles.

Themistocles “até sua morte, em 1965, foi diretor-presidente da editora. No entanto, o cargo era apenas nominal uma vez que a direção geral sempre esteve nas mãos de Octalles” (HALLEWELL; 2005: 346).

Quando Lobato voltou dos Estados Unidos, em 1930, foi convidado a assumir cargo na diretoria, mas preferiu continuar apenas produzindo suas obras, embora mais tarde assumisse a responsabilidade pela filial no Rio de Janeiro.

Octalles alargou a produção da editora ocupando boa parte das publicações com livros didáticos.

Em 1937, com a criação do Instituto Nacional do Livro (INL), surge no Brasil a definição de livro didático. “Numa deliberada tentativa de censura política” (HALLEWELL, 2005; p. 549) o governo federal cria com o Decreto 1.006/38 a Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) que regulamentava a produção, importação e o uso deste tipo de publicações. Com o Decreto-Lei no 8460/45 o Estado passou “a assumir o controle sobre o processo de adoção de livros em todos os estabelecimentos de ensino no território nacional” (HÖFLING, 2000), que aos poucos foi transferindo esta incumbência às Comissões Estaduais do Livro Didático (CELD). Nos anos sessenta a CNLD passou a Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático (COLTED), cuja existência durou de 1966 a 1971. De 1972 a 1975 o INL, através do Programa do Livro Didático (Plid), atuou como co-editor dos livros didáticos junto às editoras. A Fundação Nacional de Material Escolar (Fename), criada em outubro de 1967, a partir do Decreto nº 77.107/76 assumiu esta função.

Desta forma, “com o sistema de co-edição, de censor oficial dos livros didáticos usados nas escolas brasileiras, o Estado foi assumindo também o papel de financiador desses livros” (HÖFLING, 2000).

No que concerne à indústria do livro, o governo Juscelino (1956–1961) mudou o quadro que estava instaurado no país, em que ocorriam privilégios ao material importado72. Optou por aplicar a todo o território nacional a política que já vinha sendo exercida pelo Estado de São Paulo desde 1947, que “isentava o setor livreiro (e a indústria do papel para livros) de quase todos os impostos, com exceção do imposto de renda” (HALLEWELL, 2005; p. 533).

Graças a Kubitscheck, a indústria gráfica cresceria 143,3% entre 1950 e 1960, a quinta maior taxa de crescimento entre as indústrias do país. [...] a renovação e modernização do parque gráfico foi essencial para o aumento da capacidade editorial de então, permitindo também considerável progresso no que se refere ao aspecto material do livro brasileiro (idem).

A euforia que cercou o setor editorial, triplicando a produção de livros de 21.393.861 em 1955 a 66.559.000 em 1962 (HALLEWELL, 2005; p.514), foi arrefecendo com o aumento da inflação e a conseqüente perda de poder aquisitivo da população. Somou-se a este quadro a política adotada pelo governo Jânio Quadros, que “estendeu à importação de papel as taxas de câmbio do mercado livre como ainda retirou o subsídio compensatório aos fabricantes brasileiros de papel” (idem; p. 547), de forma que “antes do final de 1961, as editoras brasileiras de livros gastavam não menos de 75% de seus custos de produção – que perduraria até 1966 – na qual ninguém ousava pensar em publicar qualquer livro que não oferecesse a certeza de ser vendido rapidamente” (idem, p.549).

Com a entrada dos presidentes militares, a situação não mudaria muito. Hallewell lembrou que “[...] houve, por exemplo, um aumento de 50% nos custos gráficos apenas em sete meses, de novembro de 1965 a junho de 1966. [...] No entanto, em 1973, o governo proclamava ter reduzido a inflação do país a apenas 15% ao ano” (2005, p. 553), o que ainda não dava tranqüilidade ao setor empresarial.

72 “As medidas protecionistas para afastar o papel estrangeiro deram lugar a subsídios ao produto brasileiro para permitir sua competição com o importado”. (HALLEWELL, 2005, p. 533)

Enfim, a qualquer editor seria visto com muito bons olhos os autores que os fizessem superar estes tempos de crise. E, uma vez que o setor de didáticos estava propício – não só pelo aumento da população escolar, quanto pelos subsídios do governo – nada mais coerente do que aproveitar este nicho.

Gatti Júnior centrou sua pesquisa em livros escolares de história, produzidos entre 1970 – 90, mas também trouxe informes sobre a década de 60:

[...] parte-se da ideia de que, a partir da década de 1960, quando teve início o ainda inconcluso processo de massificação do ensino brasileiro, tenha ocorrido: a transformação dos antigos manuais escolares nos modernos livros didáticos; a passagem do autor individual à equipe técnica responsável pela elaboração dos produtos editoriais voltados para o mercado escolar; e a evolução de uma produção editorial quase artesanal para a formação de uma poderosa e moderna indústria editorial (GATTI JUNIOR, 2004, p. 16). Fato é que, principalmente depois dos anos 60, os livros didáticos passaram a “estabelec[er] grande parte das condições materiais para o ensino e a aprendizagem nas salas de aula de muitos países através do mundo” (APPLE, 1995, p. 81 apud GATTI JUNIOR, 2004, p. 27).