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OS LIVROS DIDÁTICOS POR VOLTA DOS ANOS 1960 E O MMM NO BRASIL: RELENDO AS PESQUISAS

2.4 FLAINER ROSA DE LIMA

A dissertação de Flainer Rosa de Lima, defendida em 2006, teve por título

GEEM – Grupo de Estudos do Ensino da Matemática e a Formação de Professores durante o Movimento da Matemática Moderna no Brasil. Objetivando focar o que foi

e como se processou a formação de professores realizada através das ações do GEEM durante o MMM brasileiro, explorou detalhadamente o Arquivo Pessoal Osvaldo Sangiorgi (APOS) e realizou entrevistas semiestruturadas “com seis docentes: quatro professores formadores que ministraram cursos no GEEM e dois professores-alunos participantes destes cursos” (LIMA, 2006, p. 24). Os professores- docentes entrevistados foram Ubiratan D’Ambrosio, Ruy Madsen Barbosa, Irineu Bicudo e Luiz Barco, e os professores-alunos, Clara Betanho Leite e José Bezerra Leite.

Seu trabalho exemplificou a riqueza de uma pesquisa histórica realizada a partir do tecido criado ao se trabalhar paralelamente arquivos (e, neste caso, particularmente com o arquivo de uma pessoa que foi visceral ao momento histórico em estudo) e depoimentos de pessoas envolvidas tempo-espacialmente com as questões da pesquisa. Lima trouxe contribuições “para a construção da história da Educação Matemática e do GEEM” (p. 16). Lembra Lima que “os documentos encontrados nesses arquivos vêm mostrar a importância da existência de arquivos

pessoais e escolares, pois são considerados por Chervel (1990) fontes primárias de uma pesquisa histórica, por revelarem fatos ocorridos na época, mesmo que, muitas vezes, contestem perspectivas ou situações trazidas por outros registros históricos” (p. 23).

Através do APUA, Lima teve acesso a anotações do dia a dia do GEEM. Tomou conhecimento da forma como normalmente acontecia a divulgação e inscrições para os cursos, inclusive em alguns casos tendo informações em relação a quantitativos. Esmiuçou cronogramas, ementas, nome dos professores dinamizadores, como se processava a avaliação, bem como locais e datas em que foram ministrados. Com relação ao teor destes cursos, além do ementário que permite saber qual foi o conteúdo trabalhado, há trechos que dão indícios do como estes aconteceram:

Uma das prioridades dos cursos do GEEM era a formação matemática do professor e não continham disciplinas relacionadas à didática, conforme relato do professor Ubiratan D’Ambrosio. [...] Nesse sentido o professor Irineu Bicudo assegurou, em entrevista, que:

[...] a ideia das disciplinas dadas, pelo menos a minha sempre foi assim, era no sentido de formação de professor, porque não exageraria muito se dissesse que poderia contar nos dedos os professores secundários assistindo aos cursos que tinham feito faculdade de Filosofia e se formado em Matemática.

Os conteúdos dos cursos estavam relacionados à Matemática Moderna, sendo puramente matemáticos (LIMA, 2006, p. 59-60). Ainda com relação às práticas docentes nestes cursos ministrados pelo GEEM e a partir do material coletado nas entrevistas, Flainer informou que:

[...] em alguns instantes desses cursos, um ou outro formador indicava qual a melhor forma para aquele conteúdo ser repassado aos alunos secundaristas [...] evidenciando uma atenção dada ao algoritmo matemático e o distanciamento entre a ciência Matemática, a didática e os processos de ensino-aprendizagem (LIMA, 2006, p. 82).

Por desconhecer até mesmo a que se referia o título (Método Trachteuberg) e a fim de o tomar como exemplo de curso com o olhar voltado para o lúdico e a praticidade que o conhecimento matemático pode vir a agregar ao aluno, optei por relembrar aqui a atuação, trazida a público em Lima (2006, p. 86), de Lucília

Bechara nas atividades do segundo aniversário do GEEM, em 1963: no curso

Método Trachteuberg56, Lucília explorou “o cálculo das operações elementares” (p.

86) e o cálculo mental.

No que tange à minha pesquisa e aos nomes envolvidos no “GRUEMA”, a pesquisa de Lima acrescentou peças ao quebra-cabeça com relação às atuações de Luiz Henrique Jacy Monteiro, Lucília Bechara e Manhucia Liberman junto aos cursos do GEEM. As crenças e leituras do que era o MMM para cada um destes três professores ficou explicitada pelos ementários resgatados no APUA.

Como afirma Lima, com base em Chartier (1991, p. 178), “a prática está relacionada com ‘gestos, espaços, hábitos’ dos personagens da escola” (p. 23). Mas é ela – a prática – que deixa desnuda uma ambiguidade interna no movimento, embora houvesse confluências em relação ao ideário do MMM.

Com relação às obras impressas produzidas pelo GEEM, destaquei alguns trechos em Lima:

O GEEM publicou guias para professores do Ensino Secundário, em quatro fascículos, intitulados Matemática – Curso Moderno, sob autoria do professor Sangiorgi e publicados pela Companhia Editora Nacional. De acordo com os professores Ruy Madsen Barbosa e Irineu Bicudo esses guias e toda a publicação do GEEM eram escritas não somente pelo professor Sangiorgi, mas com a colaboração de outros membros do Grupo (p. 102).

O GEEM publicou seu primeiro livro em 1962, intitulado Matemática Moderna para o Ensino Secundário, com patrocínio do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura – IBECC, com apoio da USP e do Programa de Emergência para o Ensino Primário e Médio. Constituído, além de artigos referentes ao MMM, [...] dos “Assuntos Mínimos para um Moderno Programa de Matemática para o Ginásio”, que, sem a pretensão de ser um programa definitivo, segundo declaração do professor Sangiorgi (1962:81), possuía orientações e sugestões para o desenvolvimento da formação das estruturas matemáticas junto aos alunos, as quais foram descritas nesse programa a partir das perspectivas dos membros do GEEM, expostas em reuniões do Grupo (p. 103).

56 O engenheiro e matemático russo Jakow Trachtenberg esteve preso em um campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. Nesta ocasião, para ocupar a mente, desenvolveu artifícios de cálculo, plausíveis de memorização, que o permitissem dar resultados de operações matemáticas elementares “de cabeça”, isto é, sem o uso de lápis e papel. Mais detalhes sobre o método podem ser facilmente encontrados na rede mundial de computadores.

Dentre os livros produzidos pelo GEEM, alguns “foram utilizados nas disciplinas dos cursos e eram comprados em livrarias ou na sede do Grupo” (p. 101 e 107).

Ao se analisar estas publicações, percebe-se no trabalho de Lima (2006) a presença dos autores do “GRUEMA”, quer assinando diretamente artigos/livros ou por meio da citação de suas experiências. É interessante desde já destacar que este exercício de autoria foi deflagrado antes da publicação dos primeiros exemplares da Coleção Curso Moderno de Matemática para as Escolas Elementares.