• Nenhum resultado encontrado

A COMUNICAÇÃO NAS SOCIEDADES VIRTUAIS

No documento Download/Open (páginas 32-56)

“[...] não são as palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc. A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial”. (Bakhtin, 1988).

O desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação (TICs), especialmente nos últimos trinta anos, tem dado um novo sentido à existência humana e levado a uma reelaboração do modo como os indivíduos vivem e se relacionam em sociedade. Desde seus estudos iniciais, Pêcheux perseguia um lugar para o discurso que, na linguística saussureana, não estava na língua, nem na fala. Ao apresentar as três tendências da linguística de então (formalista logicista, histórica e linguística da fala), dizia que a AD não inaugurava nem se pretendia uma quarta tendência. A Análise de Discurso é pensada, então, como uma ruptura epistemológica em relação ao que se fazia nas ciências humanas, articulando a questão do discurso com as do sujeito e da ideologia.

Conforme Pêcheux e Fuchs [1975 (1993)], o quadro epistemológico da AD configura- se na articulação de três regiões do conhecimento científico, a saber:

a) o materialismo histórico, como teoria das formações sociais e de suas transformações, compreendida aí a teoria das ideologias;

b) a linguística, como teoria dos mecanismos sintáticos e dos processos de enunciação; c) a teoria do discurso, como a teoria da determinação histórica dos processos semânticos (PÊCHEUX & FUCHS, 1993. p. 163).

Para Pêcheux (1975), discurso é efeito de sentido entre interlocutores. Ou seja, todo discurso produz diferentes sentidos possíveis - que podem ser encontrados, camuflados, nas imagens e nos discursos. Isto é, conforme as condições em que os enunciados dos discursos são reproduzidos e à formação ideológica do sujeito que os produz, ou de quem os ressignifica e interpreta. Daí a importância da gê nese dos discursos (MAINGUENEAU, 2007) e das “cenas da enunciação” (MAINGUENEAU, 2006).

Pêcheux entende, então, que palavras, proposições, imagens, etc., combinam sentido de acordo com as posições assumidas por aqueles que as empregam. Essa mudança vincula-se também às relações culturais, econômicas e políticas daqueles que as produzem/reproduzem. É no discurso, precisamente, que se concentram, se entrelaçam e se confundem - como um verdadeiro nó - as questões relativas à língua, à história e ao sujeito. E isto remete à formulação de Bakhtin (1981, p. 41) quanto aos “fios ideológicos”: “as palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e servem de trama a todas as relações sociais e em todos os domínios [...]”.

Consideram-se importantes estas avaliações, porque tendências atuais da internet apontam para a produção discursiva de múltiplos sujeitos, em sentido colaborativo - que resultam, portanto, em múltiplos discursos, diferentes sentidos de linguagem, fala e poder. Há, portanto, uma heterogeneidade constitutiva do discurso - são alterados o processo de autoria e poder deste (LEMOS, 2008). Aliás, a grande discussão no meio jornalístico em geral, na internet, é justamente a facilidade que a rede deu à audiência para publicar opiniões, e comp lementar as informações.

Segundo Maingueneau (2008), a AD, dentre suas abordagens, busca mostrar, ou não, a coerência e a conexão entre texto e contexto. Procura olhar o texto com todas as suas possibilidades e constrições – de língua (potencial semântico), delimitações de identidade (intermediados por outros discursos), de discurso pré-construído (valoriza certas facetas e ignora outras). Enfim, procura ver “os detalhes”, para a compreensão do texto em sua totalidade. Detalhes que podem dirigir para “image ns de si no discurso (ethos)” (AMOSSY, 2008), ou até mesmo para um “fazer persuasivo” (CORACINI, 2007).

A intenção, então, é verificar, por meio dos sentidos de determinados textos dos sites, os discursos de ciência, seus enunciadores sociais, históricos, ideológicos e suas condições de produção.

Em outra perspectiva, considerando que “discurso é sempre uma atividade que encena a conversação/enunciação e está na dimensão do mundo do ethos (comportamento) – ativados por sua vez, por marcas linguísticas e recursos para- verbais”, pode facilitar a identificação e cumplicidade dos ciberleitores com as mensagens veiculadas (MAINGUENEAU, 2008).

Percebe-se que outros analistas da linguagem também argumentam que no processo de elaboração dos conteúdos, visibilidade e recepção há metodologias empregadas e valores estratégicos embutidos. Já o público, de acordo com sua percepção e subjetividade, interpreta e reelabora as mensagens midiáticas para, então, legitimá-las.

No que concerne às práticas discursivas sobre saúde na mídia, recupera-se, também, as reflexões de Verón (1980, p. 197) ao considerar a noção de poder - “efeitos do discurso no interior de um tecido determinado de relações sociais”. [...] “Esses efeitos não podem ter outra forma que não seja a de uma outra produção de sentido”.

Assim, na concepção deste autor, o poder dos meios de comunicação sobre os interlocutores do processo comunicativo só existe sob a forma de sentido produzido. O “efeito ideológico” é apontado como “o do discurso absoluto: aquele discurso que se mostra como o único discurso possível acerca daquilo de que se fala”, em contraposição ao “efeito da cientificidade”, em que “o discurso é reconhecido como instaurador de uma relação com sua relação com o ‘real’ que descreve” (VERÓN, 1980, p. 198).

Já os teóricos Jakobson e Benveniste falam da importância do processo da enunciação. “Para poder captar a palavra que a voz designa, o espírito tem de ouvir a voz”. A pauta do pensamento estrutural de Jakobson gravita em torno do estabelecimento de relação entre signos e sistemas. É assim que ele concebe o vínculo entre a língua e os sistemas da cultura. Benveniste (1974 apud BRANDÃO, 2000. p. 14), “[...] dá relevo ao papel do sujeito falante no processo de enunciação”. Além disso, fala “[...] da relação que se estabelece entre o locutor, seu enunciado e o mundo”.

Mas é com Bakhtin que surge a teoria do enunciado, atribuindo um lugar privilegiado à enunciação como componente necessário do ato de comunicação verbal. A linguagem, assim, é vista como interação social (BRANDÃO, 2000. p. 10). Ele considera, também, que não há textos puros: “[...] por trás de todo texto encontra-se o sistema da língua [...]. Ao mesmo tempo, cada texto (em sua qualidade de enunciado) é individual, único, irreproduzível, sendo nisso que reside seu sentido - seu desígnio, aquele para o qual foi criado” (BAKHTIN, 1997, p. 331).

Se, como diz Bakhtin (1978), o discurso não é neutro e a língua não é o espelho da realidade, mas sim sua representação, todo texto apresenta, então, uma carga de produção do sentido (informações subentendidas). “A palavra, então, é o signo ideológico por excelência, pois, produto da interação social, ela se caracteriza pela plurivalência” (BRANDÃO, 2000).

Ressalta-se, também, que falar sobre saúde/doença envolve várias estratégias e artifícios para legitimar a posição do orador. A escolha dos fenômenos linguísticos, vistos como “shifters” (engatadores), no dizer de Jakobson (apud CORACINI, 2007, p. 21), podem camuflar uma subjetividade constitutiva do processo discursivo. O exemplo mais acessível do “shifter” é dado pelo pronome pessoal (eu, tu), “símbolo indicial” que reúne em si o laço

convencional e o existencial. Compreender “como está sendo dito”, então, é tão importante quanto compreender “o que é dito”.

Segundo Baccega (1988, p. 82), “não se preocupando com a constituição de sentido, a vertente inicial da Análise do Discurso se manifesta como uma extensão da linguística. [...] A AD, tal como a concebemos hoje, tem como fundamento a crítica ao paradigma saussureano com relação à linguagem e às ciências humanas”.

Ainda, de acordo com Orlandi (1990), “a AD não vai ao texto, para ‘extrair o sentido’, mas aprender a sua historicidade, o que significa se colocar no interior de uma relação de confronto de sentidos”. Por outro lado, “o discurso em que a língua se manifesta, qualquer que seja, apresenta-se como ideológico, no sentido quer da manutenção do sistema social vigente, com sua ordem constituída, quer da transformação, maior ou menor deste sistema” (ORLANDI, 1990. p. 19).

Comunicação em saúde, a partir dos conceitos de Rogers (1996)

a) é um campo especializado do estudo da comunicação que inclui o processo de agendamento dos meios para temas de saúde;

b) a defesa da saúde pelos meios;

c) comunicação científica entre cientistas e biomédicos; d) comunicação de médico para paciente;

e) o planejamento e avaliação de campanhas preventivas de saúde.

“Em um discurso sobre saúde, múltiplos discursos são ordenados, não só pelas regras inerent es à prática jornalística, mas também segundo condições dadas pelo exercício do poder e pela ideologia que permeiam as relações sociais” (FERRARETTO, 2005 s/r). De acordo com Althier-Révuz (1999, s/r), o discurso de divulgação científica é constituído pela “tradução” do discurso científico, e que tem sentido intersemiótico – ora é discurso científico, ora é divulgação. Percebe-se, então, a presença do discurso da verdade nos discursos da saúde e da ciência.

Recorda-se que a influência mais recente nas práticas comunicativas na saúde considera as teorias de polifonia social e linguística de Bakthin (1986, p. 38). Em sua concepção, no 1º caso, o processo de comunicação não se limita à transmissão de conteúdos prontos, mas é compreendido como processo de produção dos sentidos sociais. A polifonia social, ao reconhecer uma multiplicidade de vozes presentes a cada fala, representa interesses e posições diferentes na estrutura social, o que permitiria a compreensão dos conflitos sociais e das relações de poder presentes em todo ato comunicativo. Já a polifonia linguística é um

fenômeno também identificado como heterogeneidade enunciativa, que pode ser mostrada (no caso de citações de outros autores) ou constitutiva (como a influência de alguém e que não é mencionada diretamente, mas transparecida).

Em sentido complementar, evidencia-se as ponderações de Orlandi (2001, p. 151): “o

discurso de divulgação científica não é uma soma de discursos, ele é uma articulação específica com efeitos particulares, que se produzem pela injunção a seu modo de circulação, estipulando trajetos para a convivência social sobre a ciência”.

Assim, dois aspectos, para ela, retêm a atenção na divulgação científica: o fato de que um texto remete a outros textos e o de que o imediato faz ir para o não imediato:

Se refletirmos sobre o fato de que um texto remete a outros, temos a interessante questão que é a da relação de sentidos. Nesse caso, podemos considerar a relação entre jornais em torno da mesma notícia. É um exercício extremamente interessante o de expor o leitor à leitura de vários jornais falando da “mesma” coisa. Isto porque permite ao leitor compreender um aspecto importante do funcionamento da linguagem, que é o de que ao dizer de modo diferente podemos estar significando diferentemente o fato em questão. Assim, o leitor deixa de se iludir com a transparência da linguagem. Ou seja, ele passa a perceber que a linguagem tem sua espessura semântica, tem sua ordem, sua materialidade. Em consequência, passa também a considerar que a relação da linguagem com a realidade é complexa, não havendo uma relação direta entre a palavra e a coisa. Isto o expõe a um olhar menos automatizado, face à realidade. Em relação ao fato de que o imediato faz ir para o não imediato, um acontecimento pode levar à reflexão de todo um processo de constituição da própria vida social do cidadão (ORLANDI, 2004).

E continua:

De todo modo, o que se vê é sempre a reformulação se fazendo e isto se encena para o leitor de forma que ele possa apreciar as idas e vindas de um discurso de especialista para o discurso comum. O que lhe dá garantias de que ele está todo o tempo fazendo a travessia da ciência, embora não permaneça nela como o faz o especialista com sua metalinguagem (ORLANDI, 2004).

Sendo o discurso um mundo de práticas e com ordem própria, no universo discursivo de saúde, Maingueneau (2004) postula que as maneiras distintas de usar as variáveis (marcações) - enunciados, citações, valores, discurso direto e indireto, etc. - e dos posicionamentos, faz dar visibilidade ao hiperenunciador. O uso privilegiado do “discurso direto livre para produzir discursos clichês a todos e a ninguém, favorece, de algum modo, o

reconhecimento de segmentos aparentemente não atribuídos, na verdade, porém, atribuídos a uma pessoa qualquer” (ROSIER, 1999. p. 296 apud MAINGUENEAU, 2004. p. 3).

Em outro segmento, algumas participações implicam locutores coletivos. Elas visam à fusão imaginária dos indivíduos em um locutor coletivo que, por sua enunciação, institui e confirma o pertencimento de cada um ao grupo. Essas participações permitem reforçar a coesão de uma coletividade (ROSIER, 1999. p. 296 apud MAINGUENEAU, 2004. p. 10). Os slogans “amigo do coração”, “Tio Julião, o amigo do diabético”21 têm a função de unir e condicionam a participação. Eles implicam o lugar de um hiperenunciador, cuja autoridade institui o conjunto de “slogans” compatíveis no espaço da manifestação: essa entidade deve existir para além desse agrupamento fugaz, assegurar uma continuidade imaginária de um agrupamento a outro (ROSIER, 1999. p. 296 apud MAINGUENEAU, 2004. p. 12).

Segundo o filósofo Lévy (1998 apud MORAES JÚNIOR, 2008 s/r), “as atuais tecnologias implicam novas formas de ser e estar no mundo. Considerando que elas implicam também novas formas de comunicação, são, pois, novas formas de extensão de corporações empresariais e de homens”.

Maingueneau já advertira de que o mídium não é um simples meio. Uma mudança daquele modifica o conjunto de um gênero de discurso e a natureza dos textos. Isto é, todas as formas de produção de um conteúdo, bem como seu modo de consumo (MAINGUENEAU, 2001. p. 71-72).

A internet começou por questões estratégicas, de geopolítica, e evoluiu, junto com os computadores, por questões militares, de guerra. O acadêmico Tim Berners- Lee, em 1989, foi quem combinou “html” (linguagem de marcação de hipertexto) com “url” (localizador uniforme de recursos)22 e deu o próximo passo no campo do hipertexto e propôs, assim, a world wide web (www - serviço de recuperação de informações pela rede). Seu interesse era organizar os documentos das universidades interconectadas, e facilitar o acesso a eles – por meio de links. E quem alimentou a “www”, depois que ela foi aberta ao público, foram as empresas, as instituições e as pessoas.

Dessa maneira, o conceito de “aldeia global”, de McLuhan, foi concretizado muito além do que havia previsto. “As novas tecnologias permitiram a quebra do monopólio midiático tradicional. Com a possibilidade de acessar, produzir e veicular informação surge a oportunidade de romper também a chamada espiral de silêncio” (BARRETO, 2008. s/r).

21 Cf. em: <http://tiojuliao.diabetes.org.br/Draguloso/jogos/index.php>. 22

Esse endereço identifica o protocolo de acesso ao recurso desejado, a máquina a ser contactada; o caminho de diretórios até o recurso e o arquivo a ser obtido.

No Brasil, a internet surgiu, na década de 1980, de modo tímido, como assunto do Estado (redes de comunicação de dados) e em caráter comercial. Havia cerca de mil bases de dados, no país, porém, menos de 8% estavam disponíveis para acesso público.

Carvalho (2006, p. 73) conta que “a comunicação de dados rapidamente despertou o interesse da comunidade acadêmica nacional, à medida que a tecnologia de redes, a exemplo do que acontecia no exterior, se disseminava pelas universidades (meados da década de 1970).” Mas, mesmo com alternativas de acesso a dados diversos, o número de acessos ainda permaneceu baixo e com pouca penetração no mercado doméstico. Por volta de 1986, já havia mais de cinquenta redes acadêmicas em mais de trinta países (QUARTERMAN, 1989 apud CARVALHO, 2006. p. 76). Nas universidades nacionais, a evolução do projeto da rede só foi implantada em 1987.

Mas o fomento à informática só se estabeleceu com o fim da reserva de mercado de computadores, periféricos e equipamentos de telecomunicações, no início do governo Collor, em 1990 (QUARTERMAN, 1989 apud CARVALHO, 2006. p. 91). “A consolidação do acesso à internet no Brasil contou, não só com a participação do governo e de empresas privadas, mas, também, com novos e inesperados aliados advindos da sociedade civil, que forçaram novos rumos para as redes acadêmicas” (QUARTERMAN, 1989 apud CARVALHO, 2006. p. 106).

De lá para cá, em nível mundial, mais de um bilhão de pessoas estão conectadas. Os dados são do Ministério de Ciência & Tecnologia, e constam em relatório britânico divulgado em abril de 2006.23 De acordo com a pesquisa, o Brasil é o 11º país em número de internautas.

Nos dias atuais, segundo o Ibope Nielsen Online, a rede mundial superou o número de cerca de 40 milhões brasileiros com acesso à internet. A pesquisa foi realizada em maio de 2008 e reflete as Políticas Públicas de abertura de pontos de acesso à internet em escolas, bibliotecas, telecentros e muitos outros locais.24

Reafirma-se o que diz Castells (2005, p 135): que “a internet encerra um potencial extraordinário para a expressão dos direitos dos cidadãos e a comunicação de valores humanos [...]. Coloca as pessoas em contato numa ágora pública, para expressar suas inquietações e partilhar suas esperanças”. Para Moraes (2003, p. 367) “a rede web propõe um

23

O estudo utilizou cerca de 100 critérios quantitativos e qualitativos, organizados em seis categorias, como conectividade e infra-estrutura tecnológica, adoção das novas tecnologias por empresas e particulares, ambiente para os negócios, a legislação e os serviços eletrônicos de apoio.

24 Cf. dados em:

<http://www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/CalandraRedirect?temp=6&proj=PortalIBOPE&pub=T&db=cal db&comp=pesquisa_leitura&nivel=null&docid=F0BA65FF8A513A48832574750050527E>.

espaço de comunicação inclusivo, transparente e universal, que dá margem à renovação profunda das condições da vida pública no sentido de uma liberdade e de uma responsabilidade maior dos cidadãos”.

A popularização do meio impulsionou a transição da sociedade de sua forma clássica para uma nova forma, a sociedade em rede - a cibercultura - que teve sua origem, a partir do desdobramento da relação da tecnologia com a modernidade. Se para Heidegger (1954, apud LEMOS [A.], 2003. p. 11-23), “a essência da técnica moderna estava na requisição energético material da natureza para a livre utilização científica do mundo, a cibercultura seria, então, uma atualização dessa requisição [...]”.

1. 1 - Mudanças na linguagem da comunicação

A cultura contemporânea é, de maneira irreversível, marcada pelas novas formas de comunicação no ciberespaço - o cerne da revolução da virada de século. O termo foi criado em 1982, pelo escritor americano William Gibson25, para se referir ao ambiente virtual criado pelas redes de computadores. Em entrevista para o “Washingnton Post”, em setembro de 2007, ele revisitou o conceito: “[...] nos dias atuais, o que não nos importamos mais de chamar de ciberespaço está aqui e aqueles momentos sem conectividade, cada vez mais raros, estão lá (em 1982). E aí está a diferença” (GIBSON, 2007, grifos da autora). Também Clay Shirky, tecnólogo e professor da Universidade de Nova York, considerado um guru das tecnologias, falou em entrevista ao “The Guardian” (fevereiro deste ano) que, na atualidade, é um dos termos que estão em risco de extinção. Seu argumento baseia-se na ideia, que cresceu com ele, “a de estar em um lugar separado do mundo real, algo que os meus alunos não conseguem identificar mais”. Na verdade, dizem especialistas brasileiros, essa dimensão ciberespacial já se incorporou à realidade de nosso mundo concreto. Para a perita em mídias digitais, Recuero (2000), “o ciberespaço é um não lugar. Não concreto, não físico, mas real”. Isto é, “tem característica da não geograficabilidade do espaço em que se age e interage”.

Lévy entende esse campo cultural como o ambiente criado pelas tecnologias digitais, onde se desenvolvem e se estabelecem novas formas de relações sociais, numa espécie de projeção virtual da realidade: “o ciberespaço é o meio de comunicação que surge da

25

Em 1984, Gibson escreveu “Neuromancer”, que inspirou a trilogia “Matrix” - o trabalho mais conhecido do subgênero da ficção científica chamado “cyberpunk”. Informações em:

<http://blog.estadao.com.br/blog/cruz/?title=william_gibson_o_ciberespaco_e_aqui&more=1&c=1&tb=1&pb=1 &cat=191>;

<http://www.guardian.co.uk/lifeandstyle/2009/feb/15/this -much-i-know-clay-shirky-technology> e <http://www.tiagodoria.ig.com.br/2009/02/16/e-o-ciberespaco-foi-destruido/>.

interconexão mundial dos computadores [...]” (LÉVY, 1999, p. 15 e 17). Espaço em que circulam textos e estes dialogam com outros textos, que remetem a outras realidades, tais como imagens, sons, vídeos e quaisquer outras informações que venham possuir sua representação no formato digital.

Alguns experimentos estéticos no ciberespaço enfatizam a ideia de “presenteismo”. Nesses casos, os fluxos de informação, muitas vezes, desdobram-se através de experiências tais como telepresença, que acontecem no espaço/tempo compartilhado virtualmente (ALZAMORA, 2007 s/r).

A cibercultura, por sua vez, é uma mutação fundamental da própria essência da cultura. Lévy (1999, p. 15) formula a hipótese de que “a cibercultura leva a copresença das mensagens de volta a seu contexto como ocorria nas sociedades orais, mas em outra escala, em uma órbita completamente diferente”.

Longe de ligar a virtualização a uma ameaça da tecnologia atual ao homem, o filósofo fala em humanização e mostra que três dos processos que fizeram emergir a espécie humana - a linguagem, a técnica e as instituições sociais complexas - estão imbuídos de um movimento que encerra um potencial, um “devir outro”, que caracteriza o virtual (LÈVY, 1999. p. 47).

Já a noção de hiperespaço, Fragoso (2000) explica que vem do conceito de espaços com mais que três dimensões. “A expressão é também utilizada, com relativa frequencia, em relação aos sistemas baseados em hipertexto, de um modo geral, e ao ciberespaço, em particular”. Nelson (1960, apud FRAGOSO, 2000 s/r) já caracterizara hiperespaço no sentido ao “espaço informacional” construído com hiperlinks.

Diante do exposto, a penetração e alcance da internet conferem à web características de mídia de massa. Nesse sentido, Castells, em entrevista ao “El País” (2008), diz ser um

No documento Download/Open (páginas 32-56)

Documentos relacionados