• Nenhum resultado encontrado

A consumação e autoria do ilícito

No documento Contraordenaes Tributrias 2016 (páginas 33-36)

O DIREITO À NÃO AUTOINCULPAÇÃO NO PROCESSO CONTRAORDENACIONAL (E O DEVER DE COOPERAÇÃO NO PROCEDIMENTO DE INSPEÇÃO)

5. A configuração do ilícito

5.2. A consumação e autoria do ilícito

5.2.1. O caso do Dec.-Lei n.º 113/2011, de 29 de novembro (taxas moderadoras)

As taxas moderadoras são em regra cobradas no momento da realização das prestações de saúde. Mas caso tal não ocorra, o utente é interpelado para efetuar o seu pagamento no prazo de 10 dias – n.º 3 do art. 7º do Dec.-Lei n.º 113/2011. E só no caso de não pagamento após o decurso de tal prazo é que o utente é responsabilizado pela prática da contraordenação prevista no artigo 8º-A do mesmo diploma legal.

5 O n.º 5 do mesmo preceito especifica o que se entende por "mesma infraestrutura rodoviária".

33

CONTRAORDENAÇÕES TRIBUTÁRIAS - 2016

As "novas" contra-ordenações da competência da Administração Tributária e Aduaneira

5.2.2. O caso da Lei n.º 28/2006, de 4 de julho

A contraordenação prevista neste diploma legal consuma-se com a utilização de sistema de transporte coletivo de passageiros (em comboios, autocarros, troleicarros, carros elétricos, transportes fluviais, ferroviários, metropolitano, metro ligeiro e transporte por cabo), sem que o utente esteja munido de título de transporte válido, exiba título de transporte inválido ou recuse a sua exibição - artigo 7º, n.º 1.

5.2.3. O caso da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho

Não parece suscitar grandes dúvidas que nas situações de cobrança manual de portagens, a recusa de pagamento por parte do condutor da viatura e utilizador da infraestrutura rodoviária da taxa que lhe for cobrada e exigida pelo portageiro, o constitui como autor da infração e dá origem ao levantamento de auto de notícia, nos termos dos artigos 6º e 9º da Lei n.º 25/2006. Já o mesmo não ocorre, em regra, nos casos de transposição de barreira de portagem através de uma via reservada a um sistema eletrónico de cobrança de portagens ou no caso de infraestruturas rodoviárias que apenas disponham de sistema eletrónico de deteção de veículos (ex-SCUTs).

Nestes casos, em regra, o utilizador da infraestrutura rodoviária não é identificado e por outro lado a infração só se consuma com a verificação da falta de cobrança, ou porque não estava assegurada através de meio de pagamento válido ou porque não foi feito o pagamento no prazo especificado na lei. E só após o decurso desse prazo é que pode ser levantado auto de notícia.

Como foi referido supra a Lei n.º 46/2010, de 7 de setembro, aditou o artigo 4º-A ao DL 112/2009, o qual regulamenta a forma de pagamento de portagens nas infra-estruturas rodoviárias que apenas disponham de um sistema de cobrança electrónico de portagens, e estabelece quatro formas de pagamento:

a) Utilização do dispositivo eletrónico de matrícula; b) Utilização do dispositivo Via Verde;

c) Utilização de dispositivo temporário;

d) Pós-pagamento nos termos legalmente estabelecidos.

E por sua vez o seu n.º 3 dispõe que no caso da modalidade do "pós-pagamento" prevista na alínea d) o pagamento é efetuado no prazo máximo de cinco dias úteis.

A Portaria n.º 314-A/2010, de 14 de junho, veio regulamentar essa forma de pagamento, estabelecendo no artigo 17º que a mesma pode ser efetuada junto de uma entidade de cobrança de portagens (ECP) nos cinco dias posteriores à passagem num local de deteção de

CONTRAORDENAÇÕES TRIBUTÁRIAS - 2016

As "novas" contra-ordenações da competência da Administração Tributária e Aduaneira

veículos, a qual é acrescida de custos administrativos. E esclarecer que o pagamento abrange todas as taxas de portagens relativas às viagens realizadas no mesmo dia.

Nestes casos, não tendo sido identificado o agente da infração, há ainda que proceder a essa identificação. E após essa identificação é o mesmo ainda notificado para, no prazo de 15 dias, efetuar o pagamento da taxa de portagem, acrescida de custos administrativos - artigo 10º,

n.º 1 e 4 da Lei n.º 25/2006.

Dispõe a este propósito o citado artigo 10º que o dono do veículo é notificado para efetuar o pagamento da taxa e custos administrativos ou identificar o condutor do veículo. Subjacente à referida norma está o entendimento de que o dono do veículo é a pessoa (singular ou colectiva) responsável pela sua circulação na via pública e que a viatura identificada circulou no seu interesse.

Como é entendimento em direito civil, tem a direção efetiva do veículo aquele que, de facto, goza ou frui as vantagens dele, e quem, por essa razão, especialmente cabe controlar o seu funcionamento. Tem correntemente a direção efetiva do veículo o proprietário, o usufrutuário, o adquirente com reserva de propriedade, o comodatário, o locatário, o que o furtou, o condutor abusivo e, de um modo geral, qualquer possuidor em nome próprio - vidé Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, Vol. I, 3ª ed, pág. 485/486).

E é nessa medida que recai sobre o dono do veículo o dever de efetuar o pagamento da taxa de portagem que corresponde à utilização do bem de domínio público. É esse dever que atualmente se encontra expressamente previsto no artigo 4º-A do Dec. Lei n.º 112/2009, de 18 de maio, introduzido pela Lei n.º 46/2010, de 7 de setembro, ao fazer recair sobre o proprietário do veículo o dever de assegurar o pagamento da taxa de portagem.

Todavia e caso a circulação do veículo não tenha sido efectuada por sua conta e interesse, então deve identificar a pessoa que circulou com a viatura no seu próprio interesse de forma a exonerar-se da responsabilidade.

Ou seja, para afastar a sua presumida responsabilidade pelo pagamento da taxa de

portagem, o dono do veículo tem que identificar a pessoa responsável ou fazer prova de que

houve uma utilização abusiva da viatura por terceiro. A prova da utilização abusiva no prazo assinalado no n.º 1 (15 dias) foi abandonada na redação introduzida pela Lei n.º 55/2015, de 8 de junho.

Na redação introduzida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, foi acrescentado o n.º 6 ao artigo 10º, que dispõe que "O direito de ilidir a presunção de responsabilidade prevista no n.º 3, considera-se definitivamente precludido caso não seja exercido no prazo referido no n.º 1". Este normativo suscita dúvidas de constitucionalidade, por eventualmente ofender o direito de defesa do arguido. Uma das interpretações possíveis do disposto no referido n.º 6 do artigo 10º pode ser a de que as pessoas referidas no seu n.º 3 não podem discutir a responsabilidade contraordenacional no processo que lhes for instaurado, asserção esta com a qual não

CONTRAORDENAÇÕES TRIBUTÁRIAS - 2016

As "novas" contra-ordenações da competência da Administração Tributária e Aduaneira

podemos concordar. Com efeito, resultando que só posteriormente ao prazo de 15 (ou agora 30) dias para identificar o condutor do veículo é que é elaborado o auto de notícia e instaurado o processo de contra-ordenação, teríamos que o dono do veículo (ou qualquer das outras pessoas referidas no n.º 3) veria precludido o direito de defesa ao não puder discutir a sua responsabilidade pelo ilícito que lhe é imputado, o que viola o disposto no artigo 32º, n.º 10, da Constituição.

Numa interpretação conforme à Constituição consideramos que o sentido do disposto no n.º 6 é de que o dono do veículo ao não identificar o condutor do veículo admite que este circulava

por sua conta e no seu interesse, não podendo mais tarde vir por em causa tal facto. E nessa

medida é o dono do veículo que está onerado com o dever de assegurar o pagamento da contrapartida que resulta da circulação do veículo na infraestrutura rodoviária. Com efeito, é de admitir a existência de uma verdadeira presunção legal de direção efetiva e interessada do veículo por parte do seu proprietário, pois o conceito de direção efetiva e interessada cabe perfeita e legalmente dentro do conceito do direito de propriedade (Ac. S.T.J. de 27-10-88, Bol. 469; Ac. S.T.J. de 20-2-2001,Col. Ac. S.T.J., I, 2º, 125; Ac. S.T.J. de 6-11-2001, Col. Ac. S.T.J., IX, 141)6.

Todavia, afigura-se-nos que tal facto não obsta a que o dono do veículo possa invocar causas de exclusão da ilicitude do facto ou da culpa.

A propósito de similar presunção prevista no Código da Estrada (art. 171º), a jurisprudência dos tribunais comuns tem-se dividido, ora defendendo que o titular do documento de identificação do veículo, apesar de não ter oportunamente identificado o condutor, não fica inibido de, em sede de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, invocar e provar que não era ele o condutor do veículo momento da infração, logrando, desse modo, afastar a presunção legal7, ora considerando que decorrido o prazo que lhe é fixado para

identificação do condutor fica precludida essa possibilidade8.

No documento Contraordenaes Tributrias 2016 (páginas 33-36)