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2.2. A teoria das representações sociais (TRS)

2.2.3. A contribuição da TRS para o campo educacional

A intenção propalada de propiciar mudanças através da educação exige que se compreenda os processos simbólicos que ocorrem na interação educativa, e esta não ocorre num vazio social. Em outras palavras, para que a pesquisa educacional possa ter maior impacto sobre a prática educativa, ela precisa adotar ‘um olhar psicossocial’, de um lado, preenchendo o sujeito social com um mundo interior e, de outro, restituindo o sujeito individual ao mundo social (MOSCOVICI, 1990 apud MAZZOTTI, 1994, p. 60).

A Teoria das Representações Sociais vem se difundindo nos meios acadêmicos brasileiros e solidificando-se em diferentes domínios, entre eles a Educação. Isso pode ser decorrente do desenvolvimento e solidificação da teoria como aporte teórico-metodológico, além de ser oriundo da crise de paradigmas científicos que colocou em discussão a tradição científica cartesiana como método de compreensão da realidade até então predominante nas pesquisas da área educacional.

A consolidação da teoria em nosso país também pode ser atribuída à criação de grupos de estudos e pesquisas, principalmente nos programas de pós-graduação, bem como aos debates e trocas entre esses grupos possibilitados pelos encontros regionais ocorridos no Brasil e nas Jornadas Internacionais de Representações Sociais (JIRS), evento bianual que vem acontecendo sistematicamente no Brasil desde 1998 e tem promovido repercussões importantes para o avanço da pesquisa em representações sociais. Do ponto de vista estratégico de ampliar os limites regionais, a Jornada Internacional sobre RS também vem sendo realizada em outros países, como ocorreu em 2009, quando o evento foi sediado em Buenos Aires, na Argentina. No que se refere à produção acadêmica referenciada na TRS, Jodelet (2001) atribuiu às representações três particularidades: vitalidade, transversalidade e complexidade. A primeira explica-se pela quantidade de publicações e pela diversidade de países onde é empregada, pelos domínios onde é aplicada e pelas abordagens metodológicas e teóricas que inspira. A localização das representações sociais na interface entre o psicológico e o social possibilita a multiplicidade de relações com disciplinas próximas, o que lhe confere o caráter de transversalidade. A complexidade é atribuída à dificuldade de sua definição e tratamento. Esses fatores presentes na noção de Representações Sociais fazem que os espaços de pesquisa nesse campo se ampliem.

Considera-se, pois, que as representações sociais oferecem instrumental teórico-metodológico de grande relevância na compreensão dos saberes, das modalidades de pensamento e das práticas que constituem os grupos sociais; e que os saberes do senso comum constituídos nos universos consensuais possuem particularidade e legitimidade nas relações sociais e no processo de apreensão da realidade. Nesse sentido, observa-se, nesta teoria, ênfase depositada no sujeito como agente produtor de conhecimento e transformador da sociedade.

A educação é, pois, um campo em que a noção de representação social tem sido privilegiada. É possível encontrar número significativo de trabalhos que fazem uso das representações sociais na Educação, embora parte deles estudem apenas alguns de seus aspectos (DOTTA, 2006).

Moscovici, principal teórico no campo das Representações Sociais, ao justificar a importância dessa abordagem teórica para estudos das questões educacionais, afirmou que:

A intenção propalada de propiciar mudanças através da educação exige que se compreendam os processos simbólicos que ocorrem na interação educativa, e esta não ocorre num vazio social. Em outras palavras, para que a pesquisa educacional possa ter maior impacto sobre a prática educativa, ela precisa adotar ‘um olhar psicossocial’, de um lado, preenchendo o sujeito social com um mundo interior e, de outro, restituindo o sujeito individual ao mundo social (MOSCOVICI, 1990 apud MAZZOTTI, 1994, p. 60).

Mazzotti (1994) corroborou essa concepção de que a dialética entre o individual e o social, contemplados na TRS, é essencial para a compreensão do fenômeno educacional, podendo elucidar aspectos preponderantes para a mudança qualitativa do processo educativo. Também, atribuiu à TRS relevância quando se propôs, a partir de seus pressupostos, investigar o fenômeno educativo, considerando que:

Por suas relações com a linguagem, a ideologia e o imaginário social e, principalmente, por seu papel na orientação de condutas e das práticas sociais, as representações sociais constituem elementos essenciais à análise dos mecanismos que interferem na eficácia do processo educativo (MAZZOTTI, 1994, p. 60-61).

Desse modo, a TRS possibilitaria a compreensão das múltiplas significações que os indivíduos atribuem aos objetos. Além do mais, Mazzotti (1994) destacou a possibilidade de caracterização dos grupos em função de sua representação social, ou seja, considera possível definir os contornos de um grupo pelo estudo das representações partilhadas por seus membros sobre dado objeto social. A análise dos

processos constituidores da aprendizagem profissional docente pelos professores do ensino médio pode trazer indicadores de características dessa categoria profissional, que possui suas especificidades e identidades próprias.

Gilly (1989), teórico francês citado por Mazzotti (1994), realizou ampla revisão do estudo das representações sociais no domínio educativo. Entre outras constatações acerca dos trabalhos que versam sobre essa intercessão, Gilly (1989) considerou que os grandes sistemas organizados de significações que constituem as representações sociais são úteis à compreensão do que se passa em classe durante a interação educativa propriamente dita, tanto do ponto de vista dos objetos do conhecimento a ser ensinado quanto dos mecanismos psicossociais em ação no processo educacional. A consideração desses sistemas é essencial à superação dos problemas que levam ao fracasso escolar, uma vez que, como observou Gilly (1989): [...] as representações sociais, enquanto sistemas autônomos de significações sociais, são fruto de compromissos contraditórios sob a dupla pressão de fatores ideológicos e de restrições ligadas ao funcionamento efetivo do sistema escolar, sendo que o peso destas últimas parece tão mais forte que os indivíduos são diretamente afetados por, ou implicados nas, práticas cotidianas. Vê-se, então que, face a uma instituição que está longe de realizar nos fatos as mudanças esperadas, os indivíduos se apóiam, para guiar e justificar seus comportamentos, em sistemas representacionais que privilegiam mais freqüentemente elementos e esquemas de forte inércia (GILLY, 1989 apud MAZZOTTI, 1994, p. 75).

Reportando-se a Martinez (2003), Dotta (2006) considerou que as representações sociais são características de nossa época, o que se justifica pela grande quantidade de informação que circulam em nosso meio, pela relativa brevidade de sua vigência e pela impossibilidade de estruturação de tantas ideias em um esquema teórico permanente. Essa autora salientou que é para a renovação dos saberes, necessária nessa sociedade em constante mudança, que a escola é concebida.

Um dos fatores que contribuem para que a aprendizagem profissional seja repensada é o caráter transitório da informação nos dias atuais. A TRS vem respaldar esta investigação, com seu aporte teórico-metodológico, tendo em vista a dinamicidade de produção de saberes presentes no exercício profissional docente.