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2.2. A teoria das representações sociais (TRS)

2.2.4. Um diálogo com as pesquisas empíricas em RS

Considerando as reflexões apresentadas, podem-se destacar diálogos possíveis de serem estabelecidos entre a TRS e os estudos no campo da formação docente. Tendo como fonte de pesquisa os trabalhos de pesquisa disponibilizados em meio eletrônico pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

– Capes, nos últimos cinco anos buscou-se mapear os estudos atuais realizados no

Brasil sobre essas temáticas. Dos 85 trabalhos identificados1 que apresentam essa interface, destacam-se 15, nos quais os seus objetos de estudo são as práticas educativas; 11 que têm por objeto a identidade profissional; seis sobre a formação continuada; e seis que se referem ao trabalho docente. Identificam-se, também, cinco estudos que têm por objeto a aprendizagem profissional da docência, aproximando mais diretamente do objeto de estudo definido nesta investigação: Nascimento (2006), Filho (2007), Silva (2007), Melo (2008) e Marinho (2009).

Apesar do crescente número de pesquisas que apresentam a interface da TRS e formação docente, observa-se que a aprendizagem profissional docente ainda se caracteriza como campo incipiente de estudo. Considerou-se, no entanto, haver intercessão entre as categorias mencionadas, identidade profissional, formação continuada, trabalho docente e o objeto definido para esta dissertação. Para a apreensão dos saberes, atitudes e imagens mobilizadas pelos professores em sua prática, é necessário conhecer a identidade desse profissional, a maneira como ele concebe o ser professor. Da mesma forma, não se pode falar sobre a aprendizagem profissional docente sem remeter aos processos de formação continuada vivenciados por ele nem mesmo desconsiderar as condições de trabalho aos quais ele vem sendo submetido.

Tomando como referência os trabalhos, acima mencionados, que têm por objeto de estudo a aprendizagem profissional docente e por referencial teórico- metodológico a TRS, mencionaram-se algumas das contribuições apresentadas por elas, no sentido de reafirmar a relevância dos estudos nesse campo. Fazendo uma leitura dos resumos dos trabalhos de pesquisa realizados, identificaram-se objetos de estudo que fazem interface com o objeto de estudo na aprendizagem profissional da

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O mapeamento dos trabalhos disponibilizados pela Capes foi realizado em meio eletrônico e teve como critério de busca resumos que possuam o “assunto” formação de professores e representações sociais. Fonte: <http://capesdw.capes.gov.br/capesdw>.

docência: a construção da docência, formação pedagógica, constituição de habitus na profissão docente e implicações dos condicionantes que alienam o espaço escolar.

Com o foco na formação de professores para o ensino superior, Nascimento (2006) analisou as trajetórias de formadores de professores para as séries iniciais do ensino fundamental que atuam no Curso de Pedagogia de Universidades do Rio de Janeiro. Através de relatos orais das histórias de vida de 20 professores formadores, tendo como interlocutor privilegiado Pierre Bourdieu, este estudo teve por finalidade compreender como se deu nesses formadores a construção das disposições para a docência e para a atuação na formação de professores das séries iniciais em cursos de Pedagogia.

Nos aspectos relacionados à constituição do “ser professor”, essa autora

identificou uma multiplicidade de fatores que se interpenetraram, favorecendo a opção pela profissão ora interpretada como “vocação”, ora como “escolha do

necessário” ou como opção feita em função das oportunidades concretas que se

foram colocando. Quanto aos vestígios dos processos de socialização pré- profissionais, emergiram a força dos investimentos de suas famílias na escolarização e das imagens modelares, sobretudo para a escolha profissional, confirmando-se a perspectiva de que as estruturas de um habitus anterior comandam o processo de estruturação de novos habitus a serem produzidos por novas agências socializadoras. No tocante à socialização profissional, evidenciou-se a importância das entradas na profissão e das primeiras experiências profissionais na construção de suas identidades profissionais e das representações sobre o Curso de Pedagogia, sobre a formação de professores e sobre o campo em que exercem sua profissão. A referida autora conclui que, ao longo de suas trajetórias, esses professores constroem suas próprias práticas pelas quais reagem às condições sociais nas quais estão inseridos.

Também investigando a docência no ensino superior, Filho (2007) fez um estudo sobre a ação docente dos professores, buscando apreender as suas representações sociais sobre a importância da formação pedagógica para o exercício da docência no ensino superior. Foram levantadas reflexões sobre a importância e necessidade da capacitação didático-pedagógica da pesquisa e da produção do conhecimento como pontos fundamentais para uma boa atuação e desempenho do professor no cotidiano da sala de aula. Os dados revelaram a importância da criação de novos saberes nos processos formativos, uma percepção de como os investigados se veem como professores, e enfatizou-se como a formação pedagógica e o

conhecimento pedagógico são relevantes em todas as áreas de ensino da educação superior.

O foco do trabalho de tese de Silva (2007) concentrou-se na apreensão do

conteúdo e estrutura da representação social do “ensinar geografia” e sua relação

com o habitus que dá forma e visibilidade social ao ser professor dessa disciplina na cidade de Teresina, PI. Para tanto, buscou apoio na praxiologia de Pierre Bourdieu, particularmente nos conceitos de campo social, habitus e capital e na abordagem moscoviciana das representações sociais e do núcleo central de Jean-Claude Abric e Jean-Claude Flament. Sua hipótese inicial apoia-se na proposta teórica desenvolvida por Domingos Sobrinho (1997), segundo a qual existe estreita relação entre habitus e representação social. Os resultados revelaram a existência de um complexo processo de construção representacional e sua articulação com um habitus produzido pela síntese de múltiplos referentes situacionais e culturais, entre os quais se destacam a inserção num campo social de práticas exclusivamente voltadas para o ensino e a reprodução de um habitus professoral (SILVA, 2003) construído ao longo do processo de formação escolar ao qual esses professores e professoras foram submetidos. Esse autor considerou que a incorporação dos novos padrões do conhecimento científico geográfico é dificultada pela inexistência de um habitus científico, isto é, pelos sistemas de esquemas mentais que permitiriam ao professorado em questão relacionar-se adequadamente com a ciência e suas práticas.

Tendo como foco de estudo o processo de formação do professor de Matemática no ensino superior, Melo (2008) analisou ensaios (auto)biográficos, (auto)biografias (memoriais de formação) e fichas de contextualização, coletados ao longo da formação superior dos 12 informantes, e ancora-se na teoria das representações sociais. A análise revelou que as reminiscências da trajetória estudantil dos participantes influenciaram sua formação profissional, pois as imagens

que eles tinham do “ser professor” de Matemática estavam intrinsecamente

relacionadas ao modelo de mestres que eles tiveram. O estudo também revelou que essas representações foram sendo (des)construídas em rede à medida que eles ressignificavam a imagem que tinham da profissão para, em seguida, mudarem as representações da Matemática e do ensino dessa disciplina. Evidenciou, ainda, que o início da carreira docente dos colaboradores da pesquisa foi marcado por práticas mecânicas, influenciadas pelo modelo de professor que eles vivenciaram. Assim, tornar-se professor de Matemática, no caso dos atores desta investigação, se fez na

interface dos contextos familiar, escolar, profissional e na formação superior, através da escrita reflexiva sobre a trajetória de formação, as vivências e a relação com o outro.

Marinho (2009) buscou fazer uma análise sob o olhar da epistemologia marxiana, da abordagem da formação de professores pautada no “professor reflexivo”. Tendo isso em vista, o pressuposto do qual parte o estudo realizado por Marinho (2009) é de que estratégias de formação que não levem em conta os condicionantes que alienam o espaço escolar e, por extensão, o trabalho e a consciência do professor não têm chances de se firmarem como instrumentos reflexivos a serviço da transformação. Os dados deste estudo revelaram que o trabalho educativo, cuja finalidade é o desenvolvimento consciente das capacidades máximas dos indivíduos, tem sido permeado por relações sociais alienantes e, como consequência, a formação desses indivíduos, professor e aluno, tem sido cerceada pelos limites impostos por tais relações. Sendo a atividade do professor alienada, consequentemente o seu psiquismo estará também alienado. A educação pode romper e superar esses processos alienantes, porém, para isso, é necessário que aos seus sujeitos sejam oferecidas condições materiais objetivas e subjetivas de formação. Portanto, conforme postulou Saviani, a educação é essencial nesse processo, porém ela não transforma a realidade, mas as consciências dos sujeitos que vão atuar na prática social.

Dos estudos realizados no campo da aprendizagem profissional e fundamentados na Teoria das Representações Sociais, aquele desenvolvido por Marinho (2009) teve resultados que convergem com os obtidos nesta investigação sobre a aprendizagem profissional de professores do Ensino Médio. Esses resultados reforçam ainda mais a relevância a ser atribuída ao contexto de formação e atuação profissional dos professores.