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A Crítica: entre a crítica literária e a crítica sociológica

I- SILVIO ROMERO: PONTOS DE PARTIDA

2. A Crítica: entre a crítica literária e a crítica sociológica

Romero afirmava que escolhera a Crítica porque era o gênero que melhor se ajustara ao seu temperamento, “Existem em mim, encerram os germes de minhas tendências de analista e crítico. Aliadas as que tiveram origem no engenho Moreira, explicam em grande parte, toda a minha vida e toda a minha obra”. 70 Valeu-se da Crítica naturalista, alicerçada sob os paradigmas das Ciências

Naturais em voga na Europa, para delinear sua forma de ler o Brasil, submetendo a cultura de seu país a um processo de renovação mental, estendendo seu olhar aos mais variados campos de observação,

“É preciso que nos entendamos: eu também suponho ser naturalista, quero também a verdade dos fatos, e é justamente por isto que julgo estreita a fórmula de Zola” 71

Crítica, para Romero, era um instrumento por assim dizer metodológico de analisar todo um estágio de cultura, preocupando-se com os fatores condicionantes, para ele, responsáveis por toda e qualquer forma de produção artística emanada do espírito humano. Influenciado por mestres como

69 AUERBACH, Erich. Ensaios de Literatura ocidental: filologia e Crítica. São Paulo: Duas Cidades; Ed. 34, 2007. p. 359 70 ROMERO, Sílvio. Outros estudos de Literatura contemporânea. Op.Cit.p.222-223

71 ROMERO, Sílvio. O Naturalismo em Literatura. In: Literatura, História e Crítica. Rio de Janeiro: Imago; Sergipe:

Taine, Scherer, Saint-Beuve, a Crítica de Sílvio ultrapassava a Crítica descritiva, a seu ver, refém da Estética, da Metafísica e da Retórica, “A Crítica moderna não é antiga Crítica literária; é uma disciplina científica que se aplica a todas as manifestações da humanidade. Seu domínio não é a Literatura em sentido restrito, a beletrística em linguagem alemã: a Poesia, o romance e o drama. Seu domínio é a totalidade das criações da inteligência humana. Seu método é o histórico comparativa e por isso ela chama-se a Crítica histórica. A sua mais vigorosa aplicação na Alemanha foi as línguas, as mitologias e as religiões”.72

Elabora sua Crítica reunindo a contribuição das diversas áreas do conhecimento, em função da

influência dos procedimentos utilizados nas Ciências Naturais. Sua Crítica “literária” é sociológica porque despreza os verdadeiros fatores internos da obra criativa. Não pretendemos esmiuçar de maneira categórica os elementos pertinentes à Crítica científica, mas é indispensável abordar o modelo de Crítica para que se compreenda sua maneira de interpretar o Brasil amparado das grandes generalizações do momento formado pelos determinismos das leis evolucionistas.

Cabe-nos elucidar, de maneira breve, qual modelo de “Crítica literária” adotou Sílvio para empreender sua leitura de Brasil. Antes de tudo, vale salientar que fora a Crítica o maior instrumento do bacharel para legitimar sua visão e seus argumentos sobre o Brasil. Discorrendo sobre a dificuldade da concepção da Crítica no artigo Da Crítica e sua Exata Definição, onde traça um histórico a respeito da concepção de Crítica que sustentava, podemos compreender o modelo adotado por Sílvio. Concebida ora à luz da Poética ou da Retórica, da Estética, da História literária, dificultada ainda mais pela polissemia da palavra, Sílvio delimitava a importância da Crítica. Concluía que, “Ora, claro é que

uma coisa, que se tem aplicado a todas as criações da humanidade,- artísticas, religiosas, jurídicas, morais, políticas, econômicas, científicas, - nem podem ser uma ciência à parte, uma nova ciência livre, independente, autônoma; nem pode deixar asfixiar no mero estudo das Belas Letras e belas Artes” 73

No artigo em questão, ele arrolou os grandes nomes da critica, desde clássicos como Aristóteles, que concebia a Crítica ligada à Retórica, o que foi a “causa principal do mais sério desvio que tem

experimentado a Estética e a Crítica no correr dos séculos”, 74aos nomes da Crítica moderna, como

Henequim, Brunetière, Lessing, Saint-Beuave, Taine, dentre outros. Aqui, já podemos ter a noção daquilo que nortearia a visão do crítico literário e que moldaria, portanto, o perfil de Crítica modelador de suas análises. Após traçar um longo histórico sobre a concepção Crítica nos parágrafos finais do artigo, sintetiza que

72 Ibidem. p. 345

73 ROMERO, Sílvio. Da Crítica e sua exata definição. p. 391 74 Ibidem. p.376

“Vê-se, pois, claro, que a Crítica, na qualidade de disciplina mental, é alguma coisa que se pode aplicar não diretamente aos fenômenos ou fatos quaisquer da natureza ou da sociedade porque essa é a função própria da ciência, senão às vistas, teorias, doutrinas, interpretações que de tais fatos deram os que deles se ocuparam

Existe, entretanto, uma ciência que preside ao desdobrar das ciências, servindo para todas elas de elemento formador indispensável: a lógica, a ciência das formas do mundo subjetivo, as formas do pensamento, as formas da razão e do raciocínio. A Crítica é uma parte dessa ciência quando ela se encarrega praticamente de verificar se as leis que regem as criações espirituais foram convenientemente utilizadas pelos que delas escreveram”. 75

A Crítica de Romero era considerada por ele mesmo científica porque formada a partir das leis. Sabemos hoje que fora Sílvio um crítico literário limitado porque priorizou os fatores externos da produção, preterindo analisar o conjunto de obras produzidas e a relação com o surgimento de outras. Desconsiderou as formas e as normas do bom gosto, onde o estilo é predominante. Não é por acaso que Romero classifica o que seja ciência e não ciência porque busca a certeza que as leis podem oferecer e que os fatos históricos podem comprovar. Divide as diversas áreas do conhecimento a partir do que considera ciências propriamente ditas, quase ciências e falsas ciências para só então estudar os

fatos históricos, como ditavam as teorias do Positivismo e da evolução. Para Sílvio, os fatos históricos

comprovariam esta ou aquela hipótese porque pensava que “não é mais possível a História sem a Crítica, como não é admissível esta sem as Ciências Naturais” 76. Influenciado principalmente por

Taine, confiava nos nexos causais, generalizando toda e qualquer criação artística determinada pelo momento histórico, pela raça e pelo meio. Sílvio elaborara um modelo de Crítica “científica” e uma Literatura determinista. Em História da Literatura Brasileira falava, “Eis o grande fato firmado pelo

século XIX nos seus últimos anos: estabelecer os outrora ditos estudos morais sobre bases experimentais. O processo tem sido complicado e longo; foi mister passar em revista o método de todas as ciências e expulsar do seu conselho mais de uma pretendida sem validade em seus títulos. O desenvolvimento gradativo de todos os fatos observáveis, alçado a altura de principio dirigente, mostrou a necessidade de melhor estabelecer a genealogia cientifica: a nova classificação, quaisquer que sejam ainda as dissonâncias entre os filósofos, tem por base tal principio” 77

Nesse sentido, a Crítica literária de Romero é de cunho naturalista, prioriza os fatos sociais, os elementos étnicos e o momento histórico. Toda e qualquer espécie de criação funda raízes na sociedade e é representação direta da mesma. Com sua História da Literatura Brasileira, almejava traçar um quadro naturalista da Literatura nacional, mostrando suas fases e os escritores que contribuíram para representar o país. Seu modelo de Crítica é profundamente utilitarista e inseparável

75 Ibidem. p.396

76 ROMERO, Sílvio. História da Literatura brasileira. Op.Cit.p.70 77 Ibidem. p.70-71

da raça, do meio, dos antecedentes históricos, da influencia estrangeira, da dieta alimentar etc. Era indispensável o conhecimento da História do país para traçar de maneira pontual os fatores condicionantes dessa Crítica “cientifica”. Só mesmo diante dela, considerada por Sílvio imparcial, seria possível encontrar os nexos causais para julgar a situação cultural do país “O crítico deve ter

bastante ciência e bastante coragem para distribuir os papéis e dar a palma a quem merecer diante dos fatos e da verdade provada ” 78.

Antonio Candido arremata bem o método crítico de Romero: “Com todos esses elementos em

mão, pode repetir no Brasil a lição corrente na Europa- que o fenômeno literário não era uma criação saída ex-sponte da cabeça do escritor, fruto da razão e da vontade aplicadas ao sentimento, mas um produto, formado pelo concurso da vontade humana e dos fatores externos que lhe indicavam o caminho e lhe condicionavam as decisões. Pode, numa palavra, introduzir entre a noção de determinismo literário, o escritor sendo fruto da cultura, e esta um produto da raça, do meio, das tradições e das influências estrangeiras, submetida, como todos os fenômenos do mundo, a lei geral e básica da evolução transformista.79(grifo nosso)

Primeiramente, quando se fala que Sílvio fora o introdutor da Crítica moderna, como nos lembra Candido, não significa afirmar que antes dele não tenha existido Crítica no Brasil. Uma vez que para Sílvio a História literária estava inserida no campo maior da Crítica, é preciso pontuar três aspectos desta. O primeiro é formado pela História literária e disciplina afim, constituindo a investigação

metódica das criações literárias em relação com o tempo e a personalidade do autor; a teoria da

Literatura que se preocupa especificamente com o problema literário, seguida da Crítica propriamente dita, que é o esforço de interpretação direto da obra. O segundo é a teoria da Literatura formada pelos livros propriamente teóricos que são os manuais e compêndios de Retórica, Poética e Crítica, somado à Estética literária escrita pelos poetas. Figuras como Fernandes Pinheiro, Costa Honorato e Freire de Carvalho integram a primeira corrente, ao passo que Gonçalves de Magalhães, Junqueira Freire e Álvares de Azevedo compõem a segunda. O terceiro aspecto é Crítica propriamente dita, denominada por Candido por Crítica militante, elaborada nos jornais e revistas, e dentre as mais importantes entre nós, aparecem Niterói, Minerva Brasileira, Revista Brasileira, Guanabara e Revista Popular. Aqui, figuram nomes como os de Emilio Adet, Nunes Ribeiro, Joaquim Noberto, Pinheiro, Torres Homem, Machado de Assis e Francisco Otaviano.

O primeiro gênero a florescer são as antologias, por onde se processavam as análises e os estudos da Literatura portuguesa e brasileira. O mais importante desse gênero é Januário da Cunha Barbosa,

78 ROMERO, Sílvio. O Naturalismo em Literatura. Op.Cit.p.348

79

CANDIDO, Antonio. Introdução ao Método Crítico de Sílvio Romero. Op. Cit. p. 156. Ainda do autor. Silvio Romero; teoria, Crítica e História literária. Rio de Janeiro: Livros técnicos e científicos; São Paulo: Edusp, 1978.

autor de o Parnaso Brasileiro, de 1831. Com o mesmo nome e surgida em 1843, Pereira da Silva justifica a elaboração de seu Parnaso em função da dificuldade da obra de Januário da Cunha Barbosa. Em 1841, Joaquim Noberto traçava suas Modulações Poéticas. Nesse mesmo molde, surge, em 1825, o Parnaso Lusitano, de Almeida Garret. Mas obra capital para o despertar nacional viria com o

Discurso sobre a Literatura do Brasil, de Gonçalves de Magalhães. Obra de extrema importância, sem

as divagações anteriores é a de Varnhagen, “dando ao Brasil, com efeito, o primeiro exemplo do que

seja uma edição erudita, baseada no estudo da vida do autor, na pesquisa dos textos, suas variantes e circunstancias que os possam esclarecer. Retificador de erros e descobridor de subsídios, Varnhagen revela neste trabalho a sua vocação para a História”. 80

Para o Visconde de Porto Seguro, Literatura, “é um aspecto da sociedade dum dado tempo, cuja

fisionomia podemos apreender através das produções do espírito”. 81A Crítica de Varnhagem funda-

se estritamente na erudição. Sotero dos Reis, estudioso dos árcades brasileiros, dos poetas românticos e assíduo colaborador das revistas da época, é um típico crítico de sua época: suas biografias, repletas de dados, datas e informações, evidenciam sua paixão documental. Outro gênero da época era a formação das antologias e galerias dos homens ilustres, mas aqui se trata de uma nova forma de Crítica. Juntamente com Sotero dos Reis, aparece a figura de Pereira da Silva, que, ao contrário de Varnhagen, não estabeleceu um quadro orgânico da Literatura brasileira limitando-se ao comentário e informações sobre escritores brasileiros e portugueses. Professor de Retórica, a concepção literária de Pereira da Silva está intrinsecamente ligada a esta, sendo nada mais que “a expressão de conceitos,

sentimentos e paixões do espírito humano feita por modo agradável” 82. Com este olhar, vê a

Literatura portuguesa e brasileira conforme as regras e normas do bom gosto desconhecendo que uma obra literária influi sobre a outra, no que arrolava uma série de românticos, como Chateaubriand, Lamartine, Vitor Hugo, Manzoni, Foscolo, Schiller, Goethe, Byron, Moore e Martinez de La Rosa. Apontou esparsamente a influência do meio e da raça, mas duas questões são de alto relevo para o crítico: assim como seus predecessores, buscou inventariar os nomes célebres da Literatura portuguesa e por isso foi “o primeiro brasileiro que escreveu um livro sistemático sobre a evolução literária de

Portugal e do Brasil” 83

No campo da teoria literária, a Crítica era praticada por meio dos manuais de Retórica e Poética.

As Lições elementares de Poética nacional seguidas de um breve ensaio sobre a Crítica literária,

somadas à Eloqüência Nacional, são o modelo de obra que serve de referência aos tratadistas brasileiros. Em 1866, aparecem As Sinopses de Eloqüência e Poética nacional acompanhadas de

80 CANDIDO, Antonio. Introdução ao Método Crítico. Op. Cit. p. 18 81 Ibidem. p.18

82 Ibidem. p. 22 83 Ibidem. p. 23

algumas noções de Crítica Literária, do cônego Manoel da Costa Honorato, e em 1871, as Positivas de Retórica e Poética, de Fernandes Pinheiro. Estes eram os trabalhos através dos quais os jovens

críticos entravam em contato com o ideal crítico para feitura de seus quadros sinópticos e esquemáticos. Sotero dos Reis, Honorato e Fernandes Pinheiro, filiam-se à tradição clássica inspirada em Aristóteles, aprisionada pelo bom gosto, pelo belo e sublime, pontos centrais sobre os quais, tempos depois, incidiriam as Críticas de Sílvio com relação à concepção de Literatura. Neste âmbito, cabia a Crítica, formada pelo gosto e pelo bom senso, buscar na obra literária o belo. O gosto seria o ponto central na análise das obras literárias, avaliadas a partir dos meios retóricos e poéticos. O objetivo das análises é somente reparar aquilo que não é belo, esse é o princípio ponto da Crítica erudita, tributária do pensamento aristotélico. Fernandes Pinheiro concebe a análise literária da mesma maneira que Freire de Carvalho: cabe ao crítico, utilizar-se da Crítica na busca pelo belo, sendo indispensável à imparcialidade, a erudição sólida, a inteligência profunda e, acima de tudo, grande honestidade.

Contrastando com este modelo de Crítica formalística, ligada que era, a Retórica e a Poética, encontra-se a Crítica elaborada pelos poetas, figurando nomes como os de Álvares de Azevedo, e Junqueira Freire. Neste modelo de Crítica, o que prevalece é a análise pessoal do escritor, resultando na posição deste perante seu tempo e eivado de missão diante da sociedade, o que havia de certa forma empreendido a Crítica de Joaquim Noberto e Pereira da Silva, e ganharia força máxima com Sílvio.

Todos estes escritores estavam aprisionados à Retórica, amparados pela comparação e ampliação. No primeiro instante, não se pode caracterizar estes estudos tendo por base o método comparativo seguido por Sílvio, estimado e já consolidado pela Literatura Comparada: esse modelo de análise, de uma forma ou de outra, é sim teoria da Literatura, porque busca uma teoria que explique o surgimento dos gêneros literários e do fenômeno poético.

Por último, aparece a Crítica elaborada nos jornais e revistas, que fez avançar o interesse literário em função do estimulo interpretativo. Nas revistas é que saiam as notícias da civilização européia, era onde havia espaço para os folhetins, e para divulgação do desenvolvimento das ciências e das Artes. Poetas românticos surgiram no cenário nacional a partir de revistas conhecidas nacionalmente, como é o caso da Niterói, reduto dos primeiros criadores da identidade brasileira e como não poderia de ser, aqueles que primeiro realizaram a Crítica no país recém libertado. O que de mais importante há de ressaltar neste momento é a preocupação de tais escritores, seja por meio da prosa ou da Poesia, com a autonomia literária, tendo que para isso, encontrar elementos de brasilidade. Conhecido é o lema da

Niterói, publicada somente dois volumes, “Tudo para o Brasil e pelo Brasil”. A Minerva Brasiliense é a primeira revista literária publicada no Brasil, contendo a participação de Santiago Nunes Ribeiro, Emilio Adet e Joaquim Noberto. A Guanabara, dirigida inicialmente por Joaquim Manuel de Macedo,

Gonçalves Dias e Araujo Porto Alegre, onde tempos depois se somaria a participação de Joaquim Noberto, Capanema e outros, e depois orientada pelo cônego Pinheiro, após a ruptura provocada por Cândido Costa, em 1857, é outra importante revista. Dessa ruptura, surge a Revista Brasileira, consagrando pouco espaço para a elaboração e as análises literárias escritas principalmente por Norberto. Não menos importante é A Revista Popular, financiada pelo editor Garnier, com aspiração mais ambiciosa. A participação de Noberto e Pinheiro dotou a revista de um caráter bastante informativo com a produção de suas notas biográficas e esboços históricos. Nesta revista, figura o nome de Macedo Soares, que para Sílvio foi um homem de transição. Nele, aparece o importante papel da Crítica e sua azeda desavença está ligada ao jornalismo literário, comercial e político, feito da noite para o dia.

Adotando quatro modelos de Crítica, (contemplativa, administrativa, noticiosa, satírica), um ponto é tangente nas visões de Macedo Soares e Sílvio, o desejo por uma renovação ética literária. A importância das revistas se dá não apenas pela oportunidade literária para escritores e poetas, chegados à corte de todos os cantos do Brasil, mas sim porque estas despertavam o interesse e o gosto pela Literatura, facultando assim uma consciência de análise da obra. O jornalismo foi de fundamental importância para a divulgação literária e, simultaneamente, para despertar o gosto literário porque deixava espaço para os folhetins onde se mostravam as finezas européias e facultavam a evasão dionisíaca de mulheres tiranizadas por uma educação patriarcal. Futuros romances, os folhetins anunciavam no canto debaixo dos jornais a evasão e o desejo tanto de escritores frustrados como de mulheres sonhadora.

Diz Ubiratan Machado que “Mulheres e estudantes formavam a grande maioria do público dos

escritores românticos. Mulheres jovens e sonhadoras, ainda tiranizadas pela mão de ferro do pater famílias, mas já vivendo as primeiras aventuras da libertação – como a grande aventura espiritual de ler. Ou a aventura muito mais instigante e assustadora de não se dobrar a vontade paterna na imposição de um marido, resolução em boa parte influenciada pela rebeldia acintosa de algumas heroínas de romance. Heroínas francesas, ardendo de paixão, rompendo todos os laços sociais por amor, e heroínas brasileiras, tipos fisgados entre as exceções da vida nacional, mas que, ao se transformarem em modelos literários, iriam ampliar os impulsos recalcados de muita Iaiá em seu direito de escolha” 84. O folhetim foi o espaço privilegiado da geração romântica, servindo para a

formação de um publico leitor e conseqüentemente para despertar o gosto literário. Informa José Ramos Tinhorão que, “Os romances-folhetim, ou de folhetim, como passariam a ser chamados no

Brasil a partir da década de 1840, vinham representar no Brasil – repetindo o que acontecera na

França – uma abertura dos jornais no sentido da conquista de novas camadas do público, principalmente feminino, pois o tom da imprensa diária tinha sido, até então, o do comentário e doutrinação política, o que evidentemente só interessava a homens das áreas do governo, do capital, do comércio e da elite intelectual dos profissionais liberais”. 85Conclui Antonio Candido que o

“folhetim e a crônica contribuíram para a formação daquela atmosfera de civilidade, no bom sentido, sem a qual a Literatura não prospera e o gosto não se refina”. 86

Desse modo o que os salões fizeram nos séculos XVII e XVIII o jornalismo cumpriu no século

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