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A criança e o jovem como indivíduos possuidores de direitos

A partir dos meados do século XX, a consciencialização da criança e do jovem como cidadão, o reconhecimento e a proclamação dos seus direitos torna-se uma realidade, muito devido ao contributo de diferentes áreas científicas e dos seus estudos, como por exemplo, a medicina, psicologia e pedagogia. Em Portugal a defesa dos direitos e a aposta na proteção da infância e da juventude surgiu com maior relevo com

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a Lei de proteção à infância aprovada pelo Decreto-Lei de 27 de maio de 1911, que introduz as medidas verdadeiramente importantes neste âmbito. A partir dessa altura a criança foi vista como um sujeito com direitos e criaram-se os primeiros tribunais de menores conhecidos por tutorias de infância. Segundo o Guia de orientação para os profissionais a tutoria de infância era «um tribunal colectivo especial, essencialmente de equidade, que se destina a defender ou proteger as crianças em perigo moral, desamparadas ou

delinquentes, sob a divisa: educação e trabalho» (CNPCJR, 2008: 47).

Com a Convenção dos Direitos da Criança adotada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 1989 e ratificada por Portugal em 1990, toda a criança tem valor próprio e possui um alargado conjunto de direitos fundamentais, distinguindo os direitos de provisão, os direitos de participação e os direitos de protecção (3 P’s). Soares (1997) esclarece os três P´s, explicando que em relação aos direitos de provisão, estes consistem em prover as crianças de alimentos, habitação, assim como a salvaguarda da saúde e educação, entre outros aspetos ligados aos recursos e necessidades básicas dos menores. Encontra-se presente a ideia que a criança é importante na construção da sociedade, logo deve ser provida de condições básicas de sobrevivência. Quanto aos direitos de participação, estes implicam naturalmente a participação mais ativa das crianças na sua própria vida, identificando por exemplo o direito à liberdade de expressão e o direito ao nome e à identidade. Nesta dimensão está presente a noção da criança como ser social que contribui para a comunidade, à qual se reconhece os seus saberes, valores e experiências. No que toca aos direitos de proteção, estes referem-se naturalmente à proteção dos menores, por exemplo, contra a violência, maus-tratos, exploração, descriminação e injustiça. Aqui encontra-se presente a conceção de criança vulnerável, necessitada de cuidados extra, principalmente as que apresentam mais necessidades. A Convenção dos Direitos da Criança foi o documento fundamental que consagrou os direitos do menor, consistindo num ideal aceite universalmente no âmbito dos interesses e da proteção das crianças (Madeira in Penha, 1996). Soares (1997) acrescenta que este documento reconheceu a individualidade das crianças e promoveu um estatuto digno para estas. Importa esclarecer que aqui quando se fala de criança está- -se a referir a qualquer pessoa com menos de dezoito anos de idade, logo falamos de crianças e jovens.

Estes não foram os únicos documentos que fizerem qualquer tipo de referência aos direitos e às políticas sociais de proteção à infância e juventude. Em 1962 foi aprovada a Organização Tutelar de Menores que se manteve em vigor até à aprovação

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da Lei Tutelar Educativa e da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo em 2001. Existe ainda outros instrumentos legais que reconhecem os direitos das crianças/jovens, tais como, a Declaração de Genebra em 1924, a Declaração dos Direitos das Crianças em 1959, a Constituição da República Portuguesa e o Código Civil Português. Estas leis são o reflexo da consciência social relativamente às características, necessidades e às problemáticas da infância e da juventude.

Na procura de garantir os direitos das crianças/jovens e de protegê-las mencionamos a intervenção e a responsabilidade do Estado neste sentido. Segundo a Convenção dos Direitos da Criança, os Estados Partes devem tomar

«todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educativas adequadas à protecção da criança contra todas as formas de violência física ou mental, dano ou sevícia, abandono ou tratamento negligente; maus tratos ou exploração, incluindo a violência sexual, enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles, dos representantes legais ou de qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada» (artigo 19º, ponto 1)

É necessário respeitar e cuidar das crianças e dos jovens, pois eles são o futuro da comunidade e são a próxima geração que garantirá a continuidade e o desenvolvimento da sociedade. Como tal, têm que crescer e viver num meio apropriado, feliz e harmonioso, à qual os indivíduos têm que respeitar os seus direitos. A proteção da infância e da juventude é uma necessidade e tornou-se um dever público, não competindo unicamente aos pais, mas também à sociedade e ao Estado, na qual

«esta responsabilidade não surge, apenas, como consequência da maior visibilidade das crianças [e dos jovens] na sociedade, mas também da preocupação em torno da descoberta de maus tratos e situações graves de negligência para com as crianças [e os jovens] dentro do seio familiar» (Rocha, 2011: 37).

Neste âmbito, o Estado assume um papel importante, pois além de promover a integração do indivíduo na sociedade deve proteger a criança e o jovem contra todas as formas de maus tratos por parte dos pais ou de outros responsáveis, salvaguardando os seus direitos e tendo em conta as suas necessidades. Como tal, compete ao Estado estabelecer programas e respostas sociais para a prevenção dos abusos e para tratar as vítimas, tendo em conta o interesse superior da criança/jovem (A Convenção sobre os Direitos da Criança, 1990). Neste sentido, surgem leis como a LPCJP que «define o regime jurídico da intervenção social do Estado e da comunidade nas situações em que aquelas

[crianças e jovens] se encontrem em perigo (…)» (Decreto-Lei n. 12/2008, Preâmbulo), e onde

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2.3. Acolhimento institucional num LIJ: suas intenções e práticas na